• Nenhum resultado encontrado

O luto nos enfermeiros de cuidados paliativos : serviço de medicina paliativa do Hospital do Fundão

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "O luto nos enfermeiros de cuidados paliativos : serviço de medicina paliativa do Hospital do Fundão"

Copied!
134
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE DE LISBOA

Faculdade de Medicina

O luto nos Enfermeiros de Cuidados Paliativos

Serviço de Medicina Paliativa do Hospital do Fundão

Ana Filipa Nunes de Pina

Curso de Mestrado em Cuidados Paliativos

Lisboa, 2012

(2)

FACULDADE DE MEDICINA

O luto nos Enfermeiros de Cuidados Paliativos

Serviço de Medicina Paliativa do Hospital do Fundão

Ana Filipa Nunes de Pina

Orientador: Doutora Maria de Lurdes dos Santos Martins, Escola Superior de Saúde, Instituto Politécnico de Setúbal

Co-orientador: Professor Doutor António Barbosa, Faculdade de Medicina, Universidade de Lisboa

Todas as afirmações contidas neste trabalho são da exclusiva responsabilidade do candidato, não cabendo à Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa qualquer responsabilidade

Curso de Mestrado em Cuidados Paliativos

(3)

Esta dissertação foi aprovada pelo Conselho Científico da Faculdade de Medicina da

(4)

RESUMO

A morte, com a evolução sociocultural do último século e o aumento da longevidade de vida dos indivíduos, tornou-se cada vez mais institucionalizada/hospitalizada e escondida da sociedade. (Zorzo, 2004; Barbosa, 2002). Os enfermeiros de Cuidados Paliativos, não só estabelecem uma relação terapêutica estreita para responder às necessidades da díade doente-família (Gerow et al, 2010), como também experienciam um número anual acrescido de mortes dos seus doente, inerente às especificidades do seu trabalho (Desbiens e Fillion, 2007). Como tal, estão expostos a vários factores de stress físico, emocional, psicológico e socio-cultural que os faz desenvolver processos de luto melhor ou pior adaptados à realidade encontrada e que lhes permite lidar com o seu próprio sofrimento (Desbiens e Fillion, 2007). Tendo em conta que um luto mal vivido pode levar a consequências nefastas para o próprio indivíduo, para a instituição onde trabalha e para a sociedade onde pertence, torna-se crucial reconhecer a legitimidade do mesmo e identificar precocemente os sinais e sintomas decorrentes de um processo de luto mal vivido.

O objectivo deste trabalho foi o de conhecer como o processo de luto é vivenciado pelos enfermeiros de Cuidados Paliativos do Serviço de Medicina do Hospital do Fundão, quais os sentimentos implicados e quais os factores que, segundo os mesmos enfermeiros, condicionam o seu luto. O método de colheita de dados foi qualitativo, através da aplicação de um questionário misto (com a caracterização sociodemográfica e o guião para entrevista semi-estruturada). Foram seleccionadas doze entrevistas das treze efectuadas, tendo estas sido analisadas segundo o método qualitativo de análise de conteúdo. Desta análise pôde-se concluir que são diversos os pôde-sentimentos experienciados pelos enfermeiros de Cuidados Paliativos aquando a morte de um dos seus doentes. Sentimentos positivos (como tranquilidade, paz, alívio e de dever cumprido) e sentimentos negativos (como tristeza,

(5)

revolta, perda, frustração) estão muitas vezes associados a diferentes contextos de morte e a diferentes factores (facilitadores ou dificultadores) do processo de luto do enfermeiro. Foram considerados: uma idade jovem, a existência de filhos pequenos e dependentes, a própria identificação do enfermeiro com o doente e/ou família e o seu maior grau de envolvência com os mesmos, factores com impacto negativo (dificultadores) do processo de luto do enfermeiro. Pelo contrário, foram identificados como factores de impacto positivo: a previsibilidade e a tranquilidade da morte do doente; a sua preparação e aceitação da parte do doente, família e enfermeiro e a partilha da experiência em equipa. Perante os sentimentos evocados pelo sofrimento e morte de alguém com quem estabeleceram uma relação terapêutica de proximidade, e os factores que condicionam o seu processo de luto, é impreterivelmente importante que os enfermeiros criem e/ou desenvolvam estratégias de coping que os ajudem a lidar com estas experiências e situações de stress. Essas estratégias evoluem com o tempo e com a experiência pessoal e profissional de cada um (Lazarus, 1993; Gerow et al, 2010) e envolvem processos de introspecção, reflexão e auto-aprendizagem. Os enfermeiros deste estudo identificam e recorrem a estratégias de racionalização da morte do seu doente, à partiha de experiências em equipa, ao apoio familiar e a actividades extra-laborais.

Só conhecendo como se vive um processo de luto na primeira pessoa, contextualizado, é que se poderá partir para formas de intervenção e promoção de processos de luto saudáveis com todos os seus benefícios para o indivíduo, instituição e sociedade em geral.

Palavras chave: enfermeiro(s), luto, morte, grief, grieving, bereavement, patient death, nurse(s), good death

(6)

PALIATIVE CARE NURSES’ GRIEVING PROCESS – ABSTRACT

Death, with sociocultural developments of the last century and individuals’ increasing longevity of life, has become more institutionalized and hidden from society. (Zorzo, 2004; Barbosa, 2002). Palliative Care Nurses, not only set close therapeutic relationship to meet the needs of the patient-family dyad (Gerow et al, 2010), but also experience an increased annual number of deaths of their patients (Desbiens and Fillion, 2007). As such, they are exposed to various stress factors, as physical, emotional, psychological and socio-cultural, that make them develop a better or worse adapted mourning to the actual situation and that allows them to deal with their own suffering. (Desbiens and Fillion, 2007). Given that a poorly lived grief can lead to harmful consequences for the individual, for the institution where he/she works and for the society where he/she belongs, it is crucial to recognize the legitimacy of it and identify early signs and symptoms resulting from a process poorly lived.

The aim of this study was to understand how the grieving process is experienced by nurses of Palliative Care Medicine Service, at the Hospital of Fundão, what are the feelings involved and which factors, according to the same nurses, may condition their grief. The method for data collection was qualitative, by applying a mixed questionnaire (with the sociodemographics and the script for a semi-structured interview). Twelve of thirteen interviews were selected and analyzed by the qualitative method of content analysis. From this analysis it was concluded that various feelings are experienced by nurses at Palliative Care at the death of one of their patients. Positive feelings (such as tranquility, peace, relief and accomplishment) and negative feelings (such as sadness, anger, loss, frustration) are both often associated with different contexts of death and with different factors (facilitating or hindering) of the nurse´s grieving process. These nurses considered young aged, the existence of small children and dependents, nurses’ identification with patients and / or with their families and a major degree of involment with them, as negative impact factors (hindering) in their own grieving process. Rather, they identified as positive impact factors:

(7)

predictability of death; the patients’ tranquility at this moment; preparation and assumption of death by their patients, relatives and nurses themselves; and team sharing experience process. Given the evoked feelings by someone’s suffering and death (with whom nurses have established a therapeutic relationship of proximity) and the factors that influence the process of mourning, it is absolutely important that nurses create and / or develop coping strategies to help themselves to deal with these experiences and stressful situations. These strategies evolve over time with the personal and professional experience of each one (Lazarus, 1993; Gerow et al, 2010) and involve processes of introspection, reflection and self-learning. In this study, nurses identified and used strategies to rationalize the death of their patients, team sharing experience, family support and stimulating activities outside work.

Only by knowing how a mourning process is lived in the first person perspective, you can go up forms of assistance and promote healthy grieving process with all its benefits for the individual, institution and society in general.

Keywords: enfermeiro(s), luto, morte, grief, grieving, bereavement, patient death, nurse(s), good death

(8)

ÍNDICE

Introdução... 4

1. Metodologia ... 8

1.1. Desenho do estudo de investigação ...8

1.2. Quadro de referência...8

1.2.1. Luto...9

1.2.2. Coping ...10

1.3. Tipo de estudo ...11

1.4. Instrumento de colheita de dados ...12

1.4.1. Limitações da metodologia da colheita de dados...15

1.5. Tratamento e análise de dados...15

1.5.1. Categorias e subcategorias ...29

2. Análise e discussão dos resultados ...32

2.1. Caracterização sociodemográfica da população alvo ...32

2.2. Análise e discussão do conteúdo das entrevistas...36

(9)

2.2.2. Estratégias de coping do enfermeiro para a realização do luto de um doente 41

2.2.3. Factores que podem influenciar o processo de luto do enfermeiro...48

3. Aspectos éticos...60

4. Aprendizagens e limitações do estudo ...61

5. Conclusão...65

(10)

ANEXOS

Anexo I - Instrumento de colheita de dados (Questionário Sociodemográfico)

Anexo II - Instrumento de colheita de dados (Entrevista Semi-estruturada)

Anexo III - Pedidos Formais para a realização do estudo no Hospital do Fundão ao Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar Cova da Beira (CHCB), ao Director do Hospital do Fundão e à Direcção de Enfermagem do CHCB

Anexo IV - Documento comprovativo da aprovação do estudo de investigação emitido pelo Núcleo de Investigação do Centro Hospitalar Cova da Beira, E.P.E.

Anexo V - Quadro da Caracterização Sociodemográfica da Amostra

Anexo VI - Transcrição das Entrevistas

(11)

4 INTRODUÇÃO

Os grandes avanços da medicina ocorridos no século XX, levaram a um aumento da longevidade de vida da população Mundial, sem que tal implicasse um aumento da qualidade da mesma ou de uma melhor morte. De facto, em Portugal, à semelhença de outros países, o aumento da esperança de vida trouxe também um aumento da prevalência de doenças crónicas e um aumento acrescido do tempo de perda de autonomia (Lynn e Clark referidos em Neto (2010) in Barbosa & Neto (2010)), . Este facto, segundo os mesmos autores, associado às mudanças sociais desencadeadas pelo aumento da industrialização, da entrada da mulher no mundo do trabalho e da redução das famílias alargadas, condicionou drasticamente o apoio existente a este cada vez mais crescente número de doentes crónicos, com as suas necessidades específicas. Em resposta a tal desenvolvimento sociodemográfico, na área da saúde, começaram a surgir correntes e movimentos (os primórdios) dos actualmente conhecidos Cuidados Paliativos1, direccionados para este tipo de doentes e famílias.

Tendo em conta como a morte é encarada e vivida pela nossa sociedade actual (por um lado, banalizada pelos meios de comunicação social (e como estes nos invadem o

1 Em 2002 a Organização Mundial de Saúde (OMS) definiu os Cuidados Paliativos como ”uma

abordagem que visa melhorar a qualidade da vida dos seus doentes - e suas famílias- que enfrentam problemas decorrentes de uma doença incurável e/ou grave e com prognóstico limitado, através da prevenção e alívio do sofrimento, com recurso à identificação precoce e tratamento rigoroso dos problemas não só físicos, como a dor, como também dos psicossociais e espirituais.”.

(12)

5 dia), por outro evitada e até escondida numa tentativa vã de se negar uma das fases inevitáveis do nosso ciclo de vida (Zorzo, 2004), não é difícil de compreender porque é que a morte se tornou medicalizada/instrumentalizada e institucionalizada nos dias de hoje (Costa e Lima, 2005; Barbosa, 2002). Como consequência da morte ter passado a ocorrer em instituições, o grupo de profissionais de saúde que presta, durante 24 horas, cuidados holísticos2 a estes doentes e respectivas famílias, é o dos enfermeiros (Simpson e Keegan referidos em Carrol e Terry, 2008). Logo, não é de estranhar que estes sejam mais afectados com a morte dos seus doentes. São estes quem mais desenvolve relações pessoais com os doentes, quer pela maior frequência de contacto, quer pela intimidade envolvida na sua prestação de cuidados (Peterson et al, 2010). De facto, segundo Costa e Lima (2005), a existência de uma relação terapêutica implica necesssariamente envolvimento para que seja autêntica e se crie um ambiente propício para a empatia, um conhecimento profundo e uma resposta adequada às necessidades destes doentes, ou seja, para um cuidar holístico de excelência. E, é neste contexto que, quando a morte iminente é esperada ou mesmo surge, é desejado que o enfermeiro desenvolva um processo de luto saudável por esse doente de modo a evitar eventuais repercussões pessoais e profissionais nefastas de um luto mal vivido. Este luto, ainda é pouco reconhecido pela nossa sociedade e pelos próprios profissionais. É, inclusivamente, muitas vezes escondido e reprimido, por ser considerado

2 Cuidados em que a pessoa doente é abordada como um todo, maior do que a soma de todas as suas

dimensões pessoais e interpessoais, e que requerem uma visão desse mesmo indivíduo como um todo integrado que interage com um mundo interno e externo (Berg et al, 2005). Ou seja, o indivíduo é cuidado como um todo, tendo em conta as suas dimensões biológica, psicológica, sociocultural e espiritual (e respectivas interações), e não apenas como um corpo doente a ser tratado/curado.Abordagem da pessoa doente versus abordagem da doença per si (modelo biomédico).

(13)

6 não profissional e por implicar o tal envolvimento pessoal que se julga comprometer (e não enriquecer) a relação terapêutica. Este luto conhecido como disenfranchised, como qualquer luto mal resolvido ou trabalhado, pode ter consequências físicas, psicológicas, sociais e económicas bastante nefastas, tanto para o indivíduo como para a própria instituição e sociedade (aumento de burnout, menor eficácia dos cuidados, diminuição da qualidade dos cuidados, aumento dos custos hospitalares e aumento das taxas de absentismo (Brosche, 2007)). Pelo contrário, se o luto for reconhecido, trabalhado e aceite, pode tornar-se uma fonte de crescimento e desenvolvimento pessoal e profissional (Anderson e Gaugler, 2007).

O presente estudo de investigação apresenta os seguintes objectivos:

- Objectivo Geral: Conhecer como o processo de luto é vivido pelos enfermeiros de cuidados paliativos no Serviço de Medicina Paliativa do Hospital do Fundão;

- Objectivos Específicos: Conhecer os sentimentos envolvidos durante o processo de luto do enfermeiro; Identificar as estratégias de coping utilizadas por estes enfermeiros; Conhecer os diferentes contextos em que o luto pode ocorrer.

A estrutura do presente trabalho apresenta-se em 6 capítulos:

- O primeiro é a Introdução, onde se faz uma breve abordagem ao tema, se definem os objectivos do trabalho e se descreve sucintamente a estrutura do estudo;

- O segundo capítulo contém a metodologia aplicada neste estudo de investigação, começando pelo seu desenho de estudo, quadro de referência (onde se abordam os

(14)

7 conceitos de luto e de coping), tipo de estudo e o porquê da sua escolha, instrumento de colheita de dados (questionário misto, com as suas limitações). Seguido do tratamento e análise de dados (onde, através de uma análise de conteúdo, se explicita a categorização e os conceitos contemplados nessa mesma categorização);

- No capítulo que se segue, o da Análise e Discussão de resultados, caracteriza-se sociodemograficamente a amostra e procede-se à análise e discussão do conteúdo das entrevistas de forma fundamentada.

- O quarto capítulo, aborda Aspectos éticos que foram tidos em atenção ao longo da realização deste trabalho de investigação;

- O quinto, intitulado: Aprendizagens e Limitações do estudo, pretende ser uma reflexão sobre o trabalho realizado e dos seus resultados a nível pessoal e de investigação;

- Por último, a Conclusão, onde se apresenta o conhecimento mais relevante decorrente da realização do presente estudo; se identifica os seus aspectos dificultadores; e se propõe alguns estudos de investigação futuros relevantes para o tema.

(15)

8 1. METODOLOGIA

1.1. Desenho do estudo de investigação

Para a fundamentação teórica deste estudo foi feita pesquisa bibliográfica alargada recorrendo a “motores de busca” científicos em duas fases: uma em 2010 (aquando da escolha do tema e realização do projecto); a segunda em 2011/2012 aquando da elaboração do presente trabalho. As palavras chave utilizadas foram: enfermeiro(s), luto, morte, grief, grieving, bereavement, patient death, nurse(s), good death. Os motores de busca consultados foram: Pubmed, Medline, Scielo, B-On e Scirus. A selecção dos documentos utilizados foi realizada pela data mais recente de publicação e pela pertinência do seu conteúdo para o estudo. A data da publicação mais recente é de 2010 e a mais antiga de 1993 (sendo esta a única publicação utilizada anterior ao ano de 2002).

1.2. Quadro de referência

O conceito preponderante deste trabalho, é o conceito de luto. Como tal irá ser este o conceito mais desenvolvido neste quadro de referência, tendo a particularidade de ser abordado na sua especificidade, enquanto reconhecido e vivido, na profissão de enfermagem. Outro conceito que será abordado será o de coping uma vez que está, mesmo que indirectamente, relacionado com o tema deste estudo de investigação, como forma dos enfermeiros lidarem com o seu próprio processo de luto.

(16)

9 1.2.1. Luto

Luto é definido por Grove (2005) como o conjunto de emoções sentidas em resposta a uma perda relacional, através de um processo de morte de um dos seus intervenientes. Uma vez que, não só o enfermeiro se encontra permanentemente exposto à vida e morte dos seus pacientes, como também é essencial o seu envolvimento emocional na relação terapêutica que se estabelece (Costa e Lima, 2005), o seu sofrimento aquando a morte de um doente, é inevitável. De salientar que, o enfermeiro que presta cuidados na área dos Cuidados Paliativos, é o que mais lida com factores de stress emocionais desta natureza (por ser inerente à sua prática quotidiana), como: ansiedade perante a morte, exposição a múltiplas perdas e o lidar com sentimentos de impotência perante a morte e sofrimento do doente e dos seus familiares (Fillion et al, referido em Desbiens e Fillion, 2007).

Apesar de ser irrefutável a existência do luto do enfermeiro, vários estudos apontam para que este tenda a não ser reconhecido e, muitas vezes, até escondido ou mal-vivido por ser interpretado ou como falta de profissionalismo, ou como uma forma do próprio profissional se proteger do sofrimento que lhe está inerente (por este não se sentir preparado para conviver com as suas manifestações somáticas e emocionais) (Costa e Lima, 2005; Gerow et. al., 2010). De facto, e segundo Gerow et al (2010), o enfermeiro, perante a morte de um dos seus doentes, pode-se encontrar em conflito de papéis. Por um lado é esperado que ele seja o elemento da relação que se mantém forte e que presta suporte aos que ficam (familiares e amigos). Por outro lado, ele próprio é afectado por essa mesma morte, a morte de alguém com quem esteve emocionalmente envolvido. Surgem

(17)

10 sentimentos de perda, de tristeza, de revolta e mesmo de saudade (Grove 2005). Este conflito de papéis pode muitas vezes levar a adopção de estratégias de coping ineficazes a longo prazo (Gerow et. al., 2010), como o evitamento3 e a compartimentação4 da experiência, e a um luto mal vivido. As consequências deste facto podem ter grande impacto físico, psicológico, social e económico, tanto para o indivíduo como para a própria instituição onde este trabalha e para a sociedade em geral (aumento de burnout, menor eficácia dos cuidados, diminuição da qualidade dos cuidados, aumento dos custos hospitalares e aumento das taxas de absentismo (Brosche, 2007)). Pelo contrário, se o luto for reconhecido, trabalhado e aceite, pode tornar-se uma fonte de crescimento e desenvolvimento pessoal e profissional (Anderson e Gaugler, 2007).

1.2.2. Coping

Segundo Lazarus (1993) coping é definido como o esforço cognitivo e comportamental de um indivíduo para gerir exigências específicas (internas ou externas) que excedem os seus recursos intrínsecos, ou seja, que lhe provocam stress psicológico. Por outras palavras, é a forma como un indivíduo lida com um factor ou situação que lhe provoca desconforto psicológico, e que lhe exige um esforço acrescido ao habitual. Alguns autores consideram

3 Evitamento é a estratégia de coping utilizada por um indivíduo que se recusa pensar muito no assunto ou a

deixar-se envolver, tenta esquecer por completo o sucedido ou evita o contacto com a situação desencadeadora de stress (Lazarus, 1993);

4 Compartimentação é a estratégia utilizada quando o indivíduo isola a situação desencadeadora de stress do

resto da sua vida pessoal e profissional. Como se esse momento fosse fechado ou isolado num compartimento da sua vida (por trás de uma cortina), que raramente ou nunca mais se volta a abrir. (Gerow et al, 2010)

(18)

11 o coping um estilo característico e intrínseco de se lidar com uma ameaça (algo estanque) . Outros encaram-no como um processo de se lidar com uma ameaça e que poderá evoluir e mudar ao longo da nossa vida. O objectivo primordial da utilização desta estratégia é o de salvaguardar a saúde física e mental de quem a utiliza. As suas consequências podem ser positivas ou negativas consoante o contexto onde o stress ou a ameaça é vivida e por quanto tempo se utiliza a mesma estratégia, podendo a mesma ser adequada num determinado tempo mas, se perpetuada, ter efeitos nefastos para o indivíduo.

É essencial reconhecer a importância e a existência do processo de luto do enfermeiro (por parte da sociedade e por parte do próprio profissional de saúde) para que este possa ser vivido de uma forma mais saudável e que tenha menos repercussões nefastas tanto para este, como para aqueles de quem cuida, instituição onde trabalha e para a própria sociedade em geral. As estratégias de coping utilizadas para lidar com a morte de um doente são essenciais para que o luto seja o mais saudável possível e fonte de crescimento e desenvolvimento pessoal e profissional. Como tal, é crucial não só identificá-las, como também saber reconhecer o seu grau de eficácia e de adequação, para que se possa evitar sofrimento desnecessário, lutos patológicos, mal vividos e respectivas sequelas.

1.3. Tipo de estudo

O tipo de estudo realizado é de natureza qualitativa, exploratório e descritivo. Tendo em conta o objectivo geral e os objectivos específicos do estudo, tornou-se relativamente fácil e evidente qual a metodologia apropriada para abordar o tema (qualitativa), e qual o tipo de estudo adequado à mesma (Flick, 2005). O âmago do trabalho é conhecer o processo de

(19)

12 luto dos enfermeiros a partir das perspectivas e sentimentos individuais de cada um dos enfermeiros de Cuidados Paliativos perante a morte de um doente (estudo exploratório), sem ter como intuito quantificar ou generalizar os resultados obtidos. Pelo contrário, pretende-se evidenciar a diversidade dessas mesmas perspectivas e sentimentos, na primeira pessoa do enfermeiro em luto, sendo as inter-relações encontradas, descritas e analisadas no contexto específico da enfermagem em Cuidados Paliativos no Serviço de Medicina Paliativa do Hospital do Fundão. (Flick, 2005)

O método utilizado para a análise de dados foi o da Análise de Conteúdo segundo Bardin (2009).

1.4. Instrumento de colheita de dados

Foi utilizado como instrumento de colheita de dados um questionário misto. A primeira parte deste questionário visava caracterizar sociodemograficamente os enfermeiros entrevistados e foi aplicado em formato escrito (Anexo I). A segunda parte, composta por uma entrevista semi-estruturada, pretendia responder aos objectivos específicos deste estudo (Anexo II), e foi gravada sob formato digital, com o consentimento prévio de cada um dos entrevistados. O intuito desta entrevista ter sido gravada directamente e não aplicada sob a forma escrita foi o de: por um lado, ser mais cómodo e requerer menos tempo da parte dos entrevistados (estes foram entrevistados no seu local de trabalho em horários combinados e aceites por ambas as partes), bem como o de os resultados obtidos serem mais institivos, menos pensados e elaborados (Nogueira-Martins e Bógus, 2004). Segundo Bardin (2009, p. 92), “(...) a entrevista é mais um discurso espontâneo do que um

(20)

13 discurso preparado”. Os dados colhidos foram então mais reais, mais em bruto, mesmo correndo o risco de estarem condicionados pelo(s) contexto(s) pessoais e laborais do momento da entrevista.

Este questionário misto foi previamente aplicado sob a forma de pré-teste a duas enfermeiras, a exercerem funções em instituições/serviços reconhecidos como prestadores de cuidados paliativos (Unidade de Cuidados Continuados e Paliativos do Hospital da Luz e Unidade de Cuidados Paliativos do Hospital de Tomar), no mês de Maio de 2011. Após a realização, transcrição e análise dos respectivos pré-testes, não foram realizadas alterações ao questionário inicial, por se ter percepcionado que ambas as entrevistadas compreenderam as perguntas colocadas e que, as suas respostas, responderam aos objectivos do estudo (Foddy, 2003).

Antes da realização do estudo propriamente dito (no Serviço de Medicina do Hospital do Fundão), foram elaborados três pedidos formais (Anexo III): ao Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar da Cova da Beira, ao Director do Hospital do Fundão e à Direcção de Enfermagem do CHCB (Centro Hospitalar Cova da Beira), para permissão da realização da colheita de dados, uma vez que a abordagem aos entrevistados seria realizada em instituição hospitalar. O projecto do presente trabalho de investigação foi aprovado a 24 de Outubro de 2011, pelo Núcleo de Investigação do Centro Hospitalar Cova da Beira, E.P.E.(Anexo IV). Foi então realizado o primeiro contacto, via mail, com a Directora e o Enfermeiro Coordenador do Serviço de Medicina Paliativa do Hospital do Fundão, com o intuito de dar a conhecer os objectivos do estudo e agendar datas possíveis

(21)

14 para a respectiva colheita de dados, com a maior colaboração de ambas as partes. A colheita de dados foi realizada em três períodos distintos a destacar:

- 22 de Novembro de 2011; - 15 a 16 de Dezembro de 2011; - 2 a 4 de Janeiro de 2012.

Relativamente à amostra: inicialmente, eram os enfermeiros do Serviço de Medicina Paliativa do Hospital do Fundão, com mais de dois anos de experiência na área dos Cuidados Paliativos, como critérios de inclusão. No entanto, face à realidade encontrada, houve necessidade de adequar a amostra integrando novos critérios de inclusão, em termos do número de indivíduos entrevistados e ao tempo de experiência na respectiva área de cuidados, de modo a que, não só os objectivos fossem alcançados, como os dados colhidos fossem suficientemente elucidativos da actual realidade vivida neste serviço. As alterações não previstas encontradas foram: a mudança do espaço físico do serviço (dentro das instalações do próprio Hospital do Fundão), com a respectiva fusão com um dos serviços de Medicina Geral, incluindo parte dos seus enfermeiros. Se não hovesse uma adequação da amostra, o número de enfermeiros entrevistados seria diminuta e os dados colhidos não corresponderiam à realidade daquele serviço, não respondendo aos objectivos do estudo. Assim, do total de dezassete enfermeiros do Serviço actual, foram entrevistados treze (dois não acederam a ser entrevistados e dois não foram entrevistados por incompatibilidade de horários). Como um dos entrevistados tinha uma experiência em cuidados paliativos

(22)

15 inferior a um mês, a sua entrevista não foi considerada. No total, o corpus5 da amostra deste estudo é de doze questionários (ver capítulo Análise de Conteúdo).

1.4.1. Limitações da metodologia da colheita de dados

Por não haver um espaço próprio disponível no serviço, a maioria das entrevistas foram realizadas no gabinete da Directora do Serviço, sempre que tal foi possível. No entanto, houve entrevistas realizadas em locais com pouca privacidade (mesmo à porta fechada) quando este gabinete estava ocupado. Como tal, o facto destas entrevistas terem sido gravadas no próprio local e horário de trabalho, talvez não tenha permitido a alguns enfermeiros, a desejada atenção, concentração e disponibilidade para responder às perguntas, pelos condicionantes: tempo, privacidade e interrupções.

1.5. Tratamento e análise de dados

Cada questionário e respectivas folhas de consentimento informado, foram identificadas (aquando da sua aplicação) com uma letra do abcedário, seguindo ordem alfabética,com o conhecimento dos entrevistados. Foi a partir desta identificação que os dados foram posteriormente trabalhados, identificados e citados sempre que necessário (mantendo a confidencialidade e o anonimato dos participantes).

5 Segundo Bardin (2009) corpus é o conjunto de documentos finais (resultantes de uma selecção prévia), que

são submetidos ao processo analítico. Esta selecção é feita segundo critérios específicos como: exaustividade, pertinência, representatividade e homogeneidade da informação contida nesses documentos, tendo em conta os objectivos do estudo.

(23)

16 A primeira parte do questionário foi preenchida no momento imediato que antecedeu a aplicação de cada uma das entrevistas (segunda parte do questionário). Para facilitar a análise de dados, foi posteriormente transcrita sob a forma de preenchimento de um quadro (Anexo V), contendo os items questionados.

As entrevistas gravadas (segunda parte do questionário) foram transcritas, na íntegra, em dias diferentes (com o mínimo de um dia de diferença e máximo de uma semana). As respectivas transcrições encontram-se em anexo para eventual consulta (Anexo VI). Os registos digitais encontram-se disponíveis no respectivo gravador, devidamente identificados por datas e número de entrevista. Após transcrição das entrevistas (e seguindo o método de análise de conteúdo de Bardin (2009)), foi realizada uma primeira leitura transversal de todas estas, para se obter uma ideia geral das respostas dadas e um plano geral de análise. Das treze entrevistas iniciais, escolheram-se doze para constituirem o corpus de análise, (foi excluída a entrevista identificada com a letra I pelo motivo anteriormente citado). Foi atribuído a cada pergunta da entrevista e respectivo tema subjacente (sentimentos perante a morte de um doente, estratégias de coping para realização do luto e factores que pudessem influenciar esse processo) uma côr. Através de uma análise, agora mais detalhada, de cada texto transcrito, foram sublinhadas frases e palavras consideradas chave, referentes a cada tema, com a côr respectiva. Seguidamente, as transcrições das entrevistas foram relidas mais algumas vezes e, as frases e palavras chave começaram a ser organizadas e incoporadas em conceitos similares de Unidades de Registo. Tendo sido dentificadas as Unidade de Registo, estas foram sido faseadamente organizadas em sub-categorias de modo a facilitar a exposição, análise e interpretação dos

(24)

17 resultados obtidos. Por fim, foi realizado um quadro esquemático (Quadro 1) onde estão organizadas por categoria e sub-categoria, cada Unidade de Registo. Surge, numa última coluna desse quadro, a frequência com que cada Unidade de Registo aparece/ é referida no corpus da amostra. Considerou-se pertinente este dado uma vez que pode evidenciar um certo destaque/ importância dada a algumas das Unidades de Registo pelos entrevistados, pelo número de vezes que estas surgem (muitas vezes superior) ao próprio corpus da amostra, ao longo das entrevistas.

Apresenta-se de seguida o quadro com as respectivas categorias, subcategorias, unidades de registo e frequência das mesmas.

(25)

18

Categorias Sub-categorias Unidades de Registo Frequência das Unidades de Registo

Paz/Tranquilidade/Calma 17 Dever cumprido 6 Naturalidade 5 Alívio 12 Empatia 1 Humanização 1 Sentimentos do enfermeiro perante a morte de um doente Positivos Compaixão 1

Quadro 1 – Categorização, subcategorização, unidades de registo e frequências das unidades de registo após Análise de Conteúdo das entrevistas

(26)

19

Categorias Sub-categorias Unidades de Registo Frequência das Unidades de Registo

Sofrimento 1 Tristeza 6 Perda 6 Choque 1 Revolta/Frustração 5 Saudade 2 Culpabilidade 2 Sentimentos do enfermeiro perante a morte de um doente Negativos Conflito 2

Quadro 1 – Categorização, subcategorização, unidades de registo e frequências das unidades de registo após Análise de Conteúdo das entrevistas (cont.)

(27)

20

Categorias Sub-categorias Unidades de Registo Frequência das Unidades de Registo

Medicação 1 Racionalização 17 Partilha em equipa 11 Actividades extra-laborais 13 Família 4 Identificadas pelo enfermeiro Fuga 6 Racionalização 21 Estratégias de coping do enfermeiro para a realização do luto de um doente Reconhecidas e vividas

pelo enfermeiro Partilha em equipa 9

Quadro 1 – Categorização, subcategorização, unidades de registo e frequências das unidades de registo após Análise de Conteúdo das entrevistas (cont.)

(28)

21

Actividades extra-laborais 6

Categorias Sub-categorias Unidades de Registo Frequência das Unidades de Registo

Reconhecidas e vividas pelo enfermeiro Família 4 Racionalização 6 Estratégias de coping do enfermeiro para a realização do luto de um doente

Não reconhecidas mas

vividas pelo enfermeiro Partilha em equipa 2

Quadro 1 – Categorização, subcategorização, unidades de registo e frequências das unidades de registo após Análise de Conteúdo das entrevistas (cont.)

(29)

22

Categorias Sub-categorias Unidades de Registo Frequência das Unidades de Registo

Morte esperada 10

Tranquilidade da morte 6

Preparação e presença da família 3

Formação profissional prévia 3

Sentimento de dever cumprido 3

Idosos 2

Momento único 1

Controlo sintomático 4

Factores que podem influenciar o processo de luto do

enfermeiro

Positivos

Aceitação da morte pelo doente 2

Quadro 1 – Categorização, subcategorização, unidades de registo e frequências das unidades de registo após Análise de Conteúdo das entrevistas (cont.)

(30)

23

Categorias Sub-categorias Unidades de Registo Frequência das Unidades de Registo

Aceitação da morte pelo enfermeiro 1

Bem estar pessoal do enfermeiro 2

Maior experiência profissional 3

Partilha em equipa 2

Maior tempo de internamento 2

Morte do doente com o enfermeiro 1

Factores que podem influenciar o processo de luto do

enfermeiro

Positivos

Abordagens e terapêuticas menos invasivas

2

Quadro 1 – Categorização, subcategorização, unidades de registo e frequências das unidades de registo após Análise de Conteúdo das entrevistas (cont.)

(31)
(32)

25

Categorias Sub-categorias Unidades de Registo Frequência das Unidades de Registo

Experiência recente de morte ou doença terminal de pessoa significativa

5

Maior proximidade com o doente 9

Jovens 12

Identificação com o doente e/ou família 9

Maior tempo de internamento 1

Maior tempo de agonia 2

Filhos pequenos/dependentes 12

Factores que podem influenciar o processo de luto do

enfermeiro

Negativos

Sofrimento familiar 1

Quadro 1 – Categorização, subcategorização, unidades de registo e frequências das unidades de registo após Análise de Conteúdo das entrevistas (cont.)

(33)

26

Categorias Sub-categorias Unidades de Registo Frequência das Unidades de Registo

Sofrimento do doente 1

Não aceitação da morte pelo doente 1

Envolvência familiar 1

Stress emocional do enfermeiro 1

Doente deixa algo por fazer 1

Não controlo sintomático 3

Doente não está preparado para morrer 5

Comunicação ineficaz na equipa 1

Factores que podem influenciar o processo de luto do

enfermeiro

Negativos

Patologias desfigurantes 1

Quadro 1 – Categorização, subcategorização, unidades de registo e frequências das unidades de registo após Análise de Conteúdo das entrevistas (cont.)

Quadro 1 – Categorização, subcategorização, unidades de registo e frequências das unidades de registo após Análise de Conteúdo das entrevistas (cont.)

(34)

27

Categorias Sub-categorias Unidades de Registo Frequência das Unidades de Registo

Estilo de vida próprio do enfermeiro 1

Preparação dos familiares 1

Conhecimento prévio sobre cuidados paliativos

1

Funcionamento da equipa 1

Tipo de morte 2

Experiências pessoais 1

Factores que podem influenciar o processo de luto do

enfermeiro

Impacto não especificado

Experiência profissional 1

Quadro 1 – Categorização, subcategorização, unidades de registo e frequências das unidades de registo após Análise de Conteúdo das entrevistas (cont.)

(35)

28

Categorias Sub-categorias Unidades de Registo Frequência das Unidades de Registo

Proximidade com família 1

Identificação com o doente 1

Tempo de relação/internamento 2

Factores que podem influenciar o processo de luto do

enfermeiro

Impacto não especificado

Idade 1

Quadro 1 – Categorização, subcategorização, unidades de registo e frequências das unidades de registo após Análise de Conteúdo das entrevistas (cont.)

(36)

29 1.5.1. Categorias e subcategorias

Através do quadro, fica claro que, neste trabalho existem três categorias principais que são: os sentimentos dos enfermeiros perante a morte de um doente; estratégias de coping do enfermeiro para a realização do luto de um doente e factores que podem influenciar esse mesmo processo de luto do enfermeiro.

Dentro da categoria dos Sentimentos dos enfermeiros perante a morte de um doente podemos encontrar as subcategorias:

- Sentimentos positivos – que são definidos como aqueles que, não só levam à auto-realização e bem estar pessoal, como também à construção de recursos intrínsecos de resiliência a novos stressores. Estes sentimentos positivos trazem benefícios adaptativos indirectos e a longo prazo (Fredrickson, 2004);

- Sentimentos negativos – que são definidos como aqueles que geram sofrimento ao indivíduo mas que, em situações extremas e/ou de ameaça à própria sobrevivência, geram habitualmente acções adaptativas directas e imediatas, cruciais a essa mesma sobrevivência (Fredrickson, 2004).

Dentro da categoria de Estratégias de coping do enfermeiro para a realização do luto de um doente foram criadas três subcategorias:

(37)

30 - Identificadas pelo enfermeiro – são aquelas que o enfermeiro identificou directa e imediatamente quando questionado sobre as estratégias de coping que conhecia. Não são obrigatoriamente aquelas a que, ele próprio, recorre;

- Reconhecidas e vividas pelo enfermeiro – são as estratégias de coping que o enfermeiro identifica e utiliza na sua vida profissional e pessoal;

- Não reconhecidas mas vividas pelo enfermeiro – são as estratégias de coping que o enfermeiro não reconhece que utiliza mas que, ao longo da sua entrevista, refere que as adopta. Ou seja, não reconhece que as pratica mas fá-lo, mesmo que inconscientemente. Esta sub-categoria não implica que o enfermeiro não saiba identificar estratégias de coping, mas apenas que não reconhece que adopta algumas.

Dentro da categoria de Factores que podem influenciar o processo de luto do enfermeiro foram criadas três subcategorias:

- Factores positivos – factores identificados pelos enfermeiros como facilitadores do seu processo de luto, causadores de menor sofrimento;

- Factores negativos – factores identificados pelos enfermeiros como sendo mais difíceis para gerir o seu processo de luto e mais difíceis de se lidar;

- Impacto não especificado – factores que foram identificados pelos enfermeiros mas sem qualquer conotação positiva ou negativa.

(38)

31 Desta análise de dados surgem também duas categorias emergentes: o conceito de boa morte e o conceito de má morte (a serem consideradas como eventual tema de investigação futura). Estão indirectamente relacionados com o tema deste trabalho mas, não fazendo parte dos seus objectivos, não serão aprofundados. Contudo, é de salientar, que já existe literatura sobre o tema (Khel, 2006) e que estes conceitos englobam várias das unidades de registo encontradas e que, consequentemente, condicionam um bom e um mau (ou mais difícil) luto por parte do enfermeiro.

(39)

32 2. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

O seguinte capítulo vai debruçar-se sobre a caracterização sociodemográfica dos enfermeiros entrevistados e a análise de conteúdo das respectivas entrevistas.

2.1. Caracterização sociodemográfica da população alvo

A maioria dos enfermeiros entrevistados encontram-se nas faixas etárias entre os 30 e os 49 anos de idade, apesar de existirem dois elementos mais novos, na faixa dos 20 anos.

Gráfico 1 – Número de enfermeiros por faixa etária

A faixa etária dos indivíduos desta amostra pode-se repercutir na maior probabilidade de terem tido experiências prévias com a morte de doentes, familiares e/ou pessoas próximas, que irão condicionar o seu processo de luto actual. Segundo Hopkinson e Hallett (2002), a experiência do enfermeiro da morte de alguém que lhe é próximo, tem impacto no modo como este passa a percepcionar os cuidados prestados a um doente a morrer e como encarará a sua consequente morte. Gerow et al (2010), defende ser evidente

(40)

33 que a forma como os enfermeiros lidam com a morte de um dos seus doentes varia consoante as experiências que vão vivendo ao longo da sua vida pessoal e profissional.

Gráfico 2 – Número de enfermeiros por anos de experiência profissional em Cuidados Paliativos

Os enfermeiros entrevistados trabalham nesta área há uma média de 6.6 anos, sendo que, cinco enfermeiros trabalham há mais de dez anos nesta área e, por outro lado, três trabalham há apenas um ano. Tendo em conta que a média de mortes experienciadas anualmente por dez destes enfermeiros (dois não souberam especificar quantas), é de 38.6 mortes/ano, estes enfermeiros estão expostos a um número elevado de óbitos/ano, acrescido aos seus anos de experiência profissional e, consequente e eventualmente, a um número elevado de processos de luto e estratégias de coping desenvolvidos. Segundo Grove (2008), as memórias que ficam de algumas mortes de doentes, são duradouras para os enfermeiros que as vivem e têm repercussões nas suas vidas pessoais e profissionais.

(41)

34 Gráfico 3 – Número de enfermeiros com formação prévia em Cuidados Paliativos ou Luto

Relativamente à sua formação profissional, dos doze enfermeiros entrevistados, apenas três tiveram formação avançada na área dos Cuidados Paliativos apesar de tal parecer não evidenciar diferenças na forma como vivenciam a morte dos seus doentes, comparativamente com os seus colegas que apenas tiveram a formação base. Poderá este facto dever-se aos anos de experiência profissional da maioria dos enfermeiros deste serviço (média de 6,6 anos) e/ou devido às diversas formações básicas que o próprio serviço e o Centro Hospitalar da Cova da Beira vão desenvolvendo. Seria algo que poderia ser investigado. Segundo Gerow et al (2010), fazendo referência a Wright e Hogan (2008), apesar da enfermagem já ir reconhecendo a existência do luto do enfermeiro quando um dos seus doentes morre, a maioria destes profissionais de saúde continua sem receber formação ou treino nesta área.

Todos os profissionais lidaram com a morte de um dos seus doentes ainda como alunos de enfermagem.Segundo Gerow et. al. (2010), são as primeiras experiências de morte que

(42)

35 estabelecem a forma como os enfermeiros, no futuro, vão encarar e lidar com as mortes dos seus doentes e desenvolver o seu processo de luto. Todos os enfermeiros entrevistados tiveram essa experiência numa fase precoce da sua vida profissional, ainda durante a sua formação base, como alunos.

A maioria dos enfermeiros desta amostra têm uma idade superior a 30 anos, com uma média de experiência profissional de 6,6 anos. Apesar da alguma diversidade de faixas etárias existente e de haver poucos elementos com formação avançada na área de Luto e de Cuidados Paliativos, tal parece não se repercutir no modo como os diferentes elementos da equipa lidam com o luto dos seus doentes.

(43)

36 2.2. Análise e discussão do conteúdo das entrevistas

2.2.1. Sentimentos do enfermeiro perante a morte de um doente

Como previamente descrito, os sentimentos referidos pelos enfermeiros entrevistados foram sub-categorizados em positivos e negativos para uma maior facilitação de análise. Como tal iremos abordar estes mesmos sentimentos segundo esta sub-categoria.

Dos sentimentos positivos mencionados pelos enfermeiros aquando da morte de um dos seus doentes, os que mais se destacaram foram os de paz, tranquilidade, calma e os de alívio.

“Vivo a morte de uma forma muito serena, como algo expectável e que deve ser

vivido, de facto, num momento único para aquela pessoa e para quem o

acompanha. (...) Quando morre alguém... por vezes de alívio. De alívio do

sofrimento, não é?, que é visível...” – enfermeiro D

“Como digo, às vezes é de paz, acima de tudo ver paz naquela pessoa que está em

sofrimento...” – enfermeiro E

Muitas vezes estes sentimentos estão associados à forma como se viveram os últimos momentos por parte do doente e família:

(44)

37 “ (...) se o doente estiver em muito sofrimento, foi o melhor que ... ou está com

muita dispneia, ou a família está muito desesperada por ele estar assim, sinto que é

também um alívio para ele, também, me sinto aliviada eu, porque a pessoa partiu,

porque já não havia outra... outra hipótese.” – enfermeiro L

Se o doente estiver tranquilo, eu também vivo isso com tranquilidade.” –

enfermeiro M

Segundo Kavanaugh, referido em Grove (2005), alívio é um dos sete estadios do luto, logo, um sentimento esperado e natural de ser vivido pelo enfermeiro neste processo. Segundo Grove (2005), este sentimento está habitualmente associado, a um cessar do sofrimento alheio ou então a um sentimento de dever cumprido em relação aos desejos do doente falecido. Dados que corroboram os testemunhos dos enfermeiros entrevistados.

Foram também referidos inúmeras vezes os sentimentos de naturalidade (associada talvez a uma certa expectabilidade da morte) e o de dever cumprido.

“Com naturalidade. É um processo normal da vida, ainda mais nestes doentes, às

vezes até é um alívio. (...) mas pronto, além de tudo é o sentimento de ter ajudado,

acima de tudo, aquela pessoa a morrer, não é? E aliviar o sofrimento dela. Acho

que é o sentimento mais forte que sinto.” – enfermeiro E

“Normalmente, normalmente as mortes que acontecem no serviço são esperadas.

(45)

38 as aceito, são muito raras as mortes que não acontecem... que acontecem sem

serem esperadas. Por isso é uma coisa natural.” - enfermeiro A

“Gosto sempre de pensar que a pessoa falece e a gente já tentou, já tentou tudo

por tudo fazer o melhor por ela. E o sentimento que... que eu faço para eu me sentir

melhor é sempre pensar que eu fiz, por exemplo num turno, tudo para que ele sentisse melhor, (...) se eu souber que a pessoa esteve sem dor, se ela não vomitou,

se esteve calma, para mim é um sentimento bom, eu pensar que estou a fazer o melhor para aquela pessoa..” – enfermeiro L

“ (...) quando as coisas acontecem com tranquilidade e porque têm de acontecer, é

um sentimento de dever cumprido, que as coisas aconteceram porque tinham que

acontecer...” – enfermeiro A

Segundo Brady et al (1999), referido em Desbiens e Fillion (2007), a necessidade de encontrar um sentido, é considerado um factor de peso para a diminuição do stress emocional de quem vive o luto, e torna-se um factor promotor de melhor qualidade de vida do mesmo. De facto, Folkman (1997) referido no mesmo artigo, defende que esta atribuição de um sentido, permite a vivência de uma experiência psicológica positiva, mesmo na presença de uma situação de stress intensa, a quem sofre a perda. Os sentimentos de alívio, o de dever cumprido e o de encarar a morte com tranquilidade (referidos pelos enfermeiros neste estudo), parecem enquadrar-se nesta tentativa de dar um sentido à morte e à sua acção enquanto enfermeiros, perante o sofrimento e morte de um doente.

(46)

39 Dos sentimentos negativos dos enfermeiros perante a morte de um dos seus doentes o que maior destaque e realce tiveram foram os de tristeza e perda.

“Depende do doente... se fôr um caso, pronto, mais novo, que tenha dependentes de

família, pronto, que tenha crianças dependentes ou assim, um momento de

tristeza” – enfermeiro C

“Acaba por se sentir...pronto, acaba-se por sentir também o processo como se

fosse, se calhar, uma perda um bocadinho nossa... as famílias também estão muito

presentes aqui no nosso serviço... e acabamos por sentir um bocadinho, como se a

perda fosse um bocadinho nossa, não é?” – enfermeiro B

“(...) eu sempre, penso que é sempre uma perda para mim mas, se quanto mais tempo eu lidei com esse doente pior para mim porque sinto mais a perda do

doente.” – enfermeiro L

Também foram referidos, apesar de um menor destaque, sentimentos de revolta e de frustração.

“Se fôr um caso novo, de frustração...” – enfermeiro C

“Neste momento, tenho vivenciado muitos momentos de revolta. (...)E... também

temos tido algumas situações em que a partida do doente não é assim tão tranquila

(47)

40

frustração não podermos fazer as coisas de outra maneira, se calhar como

gostaríamos de fazer. Isso é o sentimento que mais mexe comigo.” – enfermeiro K

Segundo Grove (2005), referindo Plutchick (2001), sentimentos como tristeza e revolta são comuns num processo de luto de um enfermeiro pelo seu doente. Inclusivamente, a tristeza, segundo a mesma autora (referindo Plutchick (2001)), é dos sentimentos mais comuns presentes na perda de uma relação através do processo de morte e inclui o desespero, sofrimento, meditação e reflexão. Já os sentimentos de revolta e frustração, segundo Lazarus (1991) referido pela mesma autora, estão associados a uma falta de controlo percebida, um sentimento de injustiça acerca da morte e/ou sentimentos mal resolvidos com o doente falecido. De facto, os enfermeiros que referiram este tipo de sentimentos, associaram-nos a situações em que não conseguiram lidar bem com a morte do doente (idade jovem) ou como este morreu. De ressalvar que, apesar de tudo, e segundo Parkes (1993) e Litlewood (1992) referidos por Grove (2005), a revolta é um sentimento esperado e aceite com melhor tolerância num processo de luto, tendo em conta o contexto acima referido.

São diversos os sentimentos experienciados pelos enfermeiros em Cuidados Paliativos que fazem o luto dos seus doentes. Sentimentos positivos e sentimentos negativos estão associados a diferentes contextos de morte, a tentativas de dar algum sentido ao falecimento do doente e à sua acção enquanto enfermeiros. Todos estes sentimentos previamente incluídos e estudados por vários autores como comuns num processo de luto habitual.

(48)

41 2.2.2. Estratégias de coping do enfermeiro para a realização do luto de um doente

O enfermeiro de Cuidados Paliativos está exposto permanentemente à morte e sofrimento dos seus doentes, inerente à especificidade do seu trabalho (Desbiens e Fillion, 2007). Como tal, e instintivamente, cria e desenvolve estratégias que lhe permitam lidar melhor com o sofrimento alheio e gerir os seus sentimentos e o seu próprio sofrimento.

Os enfermeiros entrevistados, quando questionados sobre este tema, identificaram estratégias de coping das quais se destacaram: a racionalização, as actividades extra-laborais e a partilha de experiências em equipa. No entanto, e apesar destas estratégias se sobreporem, nem todos os enfermeiros que as identificaram, dizem utilizá-las na sua prática profissional ou reconhecem directamente que as utilizam (mesmo que o façam).

Dentro da racionalização, encontram-se referências à compartimentação da experiência, ao dar um sentido à morte do doente (reinterpretação positiva6) e à auto-reflexão ( e consequente auto-aprendizagem).

6 Reinterpretação positiva consiste em dar um sentido positivo à experiência vivida e implica um crescimento e

mudança do indivíduo que utiliza esta estratégia, fazendo-o encontrar novas esperanças e sair da experiência uma melhor pessoa do que quando entrou (Lazarus, 1993).

(49)

42 “E... e pronto, e passamos...é assim, não se apaga, não se põe um ponto final

nessas memórias mas continuamos. As coisas continuam para a frente e, logo a seguir, no quarto ao lado, temos outro doente que precisa de nós. Por isso não ficamos bloqueados naquele momento, naquele doente que morreu naquela hora. As coisas continuam, não é? Avançamos e acho que é um bocado assim... não

sei.” – enfermeiro A

(compartimentação)

“Nos primeiros anos de trabalho, temos aquele sentimento que vamos salvar o

mundo e que nenhum doente nos pode morrer, e quando morriam eras um

fracasso. Depois não, vamos aceitando que a vida não é assim. Que faz parte de um ciclo e o ciclo também se tem de fechar. E acho que é um bocadinho assim... e

às vezes até penso na minha também assim nesses termos... e acho que é assim

que a coisa tem que concluir.” – enfermeiro F

(sentido à morte/reinterpretação positiva)

“(...) todos nós temos o nosso cemitério pessoal, não é? Ou, como se costuma

dizer, algumas mortes deixam algumas marcas, alguma saudade, que com o tempo se transforma em saudade, não é? E se fala com alguma calma sobre essas

mortes (...).” - enfermeiro D

(50)

43 “Se eu já utilizei estratégias... Eu acho que não é uma questão de utilizar

estratégias é, é... vivenciar as coisas como um processo natural e que... ainda mais

trabalhando, neste serviço, é um processo normal e natural que, para eles é o fim e é o fim para nós também de o ver a sofrer tanto. Nós também temos sentimentos,

não é?” – enfermeiro E

(sentido à morte/reinterpretação positiva)

“Não sei, como é que eu faço? Não sei... lembro-me... penso e ao mesmo tempo

digo: não, as coisas podem ser diferentes, podem caminhar de outra maneira diferente, tento pôr aspectos positivos....” – enfermeiro L

(reinterpretação positiva)

“(... ) é assim, ao longo destes anos todos, eu tenho criado estratégias em mim

mesma. Eu tenho tentado ser o mais resiliente possível, eu tenho tentado gerir no

meu interior as emoções, eu tenho tentado ser eu a gerir as coisas, eu a mudar... e

mudei. Eu, como pessoa a trabalhar em cuidados paliativos, mudei. Eu acho que

não há ninguém que trabalha, que não mude. Todos mudamos. Porque com as vivência, nós vamos aprendendo, nós vamos crescendo e estamos sempre a crescer a trabalhar em cuidados paliativos.” – enfermeiro K

(auto-reflexão e auto-aprendizagem)

Esta técnica da compartimentação da experiência, de tentar dar-lhe um sentido, até de uma certa reinterpretação positiva do acontecimento, ajuda os enfermeiros a lidar com o seu

(51)

44 dia-a-dia e a desempenhar as suas funções sem um sofrimento exacerbado, comprometedor do seu bem-estar pessoal e profissional (Gerow et al, 2010; Desbiens e Fillion, 2007).

Há enfermeiros que referem algumas das suas actividades extra-laborai ou que identificam as prováveis (para quem as utiliza), e incluiem o apoio na família também como estratégia de coping.

Ginásio. Acho que o facto de nós termos outras actividades para além da nossa

actividade profissional, acho que é muito bom. Ginásio, o contacto com a família, o voluntariado...” – enfermeiro D

“É assim, suporto-me muito na família, que são os meus mais que tudo, que

acabam por... é a estratégia que eu uso... para me afastar destas coisas, não é?

Tenho uma hortinha, portanto, dedicar-me ao espaço livre, à agricultura, ao jardim... também é uma estratégia que eu tenho porque , às vezes, a casa até nem

está muito bem mas não interessa, tenho que ir para a rua. Mas é, mas é... são as

minhas duas estratégias: é a família e os meus espaços” enfermeiro K

“Então sei lá... sair daqui, fazer... ir dançar, ir ao cinema, namorar... (risos), fazer ginásio...” – enfermeiro H

Há também inúmeras referências à partilha de experiências dentro da equipa de enfermagem e, curiosamente, esta é uma das estratégias de coping que nem sempre é

(52)

45 directamente identificada pelos enfermeiros mas que, a posteriori, ao longo das suas entrevistas, referem utilizá-la com frequência.

“É assim, acho que é mais entre grupo... propriamente, estratégias específicas,

não. Mas em grupo, por exemplo, passagens de turno, falamos de alguém que morreu, por exemplo, mais novo, e dizemos custou-me um bocadinho porque morreu comigo e... falamos. Acho que a estratégia que nós usamos mais é falar um bocado sobre o assunto. E acabamos por, a pouco e pouco, ir esquecendo mais

facilmente. (...)” – enfermeiro M

“(...) falo com algumas colegas pronto, ... é óbvio que a gente, às vezes, conversa com algumas colegas, conversamos em equipa, já fizemos mais isso, agora nesta fase de mudança, não temos as reuniões multidisciplinares mas é mais, só realmente, as conversas com os colegas... no sentido de que, vivenciam as mesmas

coisas... e o facto de se falar, pronto, ajuda a libertar-nos das coisas...”- enfermeiro B

“Pois eu acho que é sobretudo isso, a partilha, a discussão dos assuntos, para que a pessoa não sinta, não leve para casa, não sinta ou, se aconteceu, se culpabilize por alguma atitude... poder... poder clarificar as coisas para que não se, para que

não fiquem a pensar na... e não se levem para além do que é aceitável.” – enfermeiro F

(53)

46 Tanto a estratégia de se apoiarem na família como a da própria partilha dentro do seu grupo de pares, estão incluídas na estratégia de coping de procura de um apoio social7 (Lazarus, 1993) e de ventilação de sentimentos (Carver et al (1989) em Desbiens e Fillion (2007)), que têm mais resultados positivos para o indivíduo que as utiliza do que as estratégias de distanciamento ou de evitamento (fuga) também utilizadas por alguns destes enfermeiros (Folkman et al (1986), citado em Lazarus (1993)).

“(...) é por isso que uma das formas de coping é evitar o envolvimento (...)” - enfermeiro C

“não, por acaso nã é, em termos de , de... não... fugir assim das situações, não... já tive uma altura que sim, pronto, se calhar... agora não, já cá ando há 25 anos e

não, a falar a sério, não são situações que fujo porque é quando as pessoas mais

precisam de nós.” - enfermeiro B

No entanto, e por outro lado, o coping parece ser mais um processo em evolução do que propriamente um modo de estar ou de ser intrínseco (Lazarus, 1993). O que hoje ajuda a gerir sentimentos e sofrimento, amanhã pode já não resultar ou fazer sentido.

“. E às vezes transporto muito... a partir que me aconteceu isso, [morte de uma colega] transporto muito as situações para a minha vida, e antes não fazia isso,

7 Apoio social: Quando procuramos a opinião de terceiros que nos podem ajudar a lidar com a situação

(54)

47

tentava sempre... sempre separar. Custa-me mais agora enfrentar um bocadinho

mas tem de ser.” – enfermeiro L

“É assim, ao fim de alguns anos de trabalhar em cuidados paliativos... tentamos

criar formas de lidar... é assim, eu lidava pior no início do que lido agora com a morte do doente. Aprendi a defender-me, aprendi a criar um limite de sentimentos, que leva a que eu consiga trabalhar 11 anos em cuidados paliativos, senão, não conseguia, n’é?” – enfermeiro K

“ (...) inicialmente sofri um bocadinho quando vim para este serviço, sofri um bocadinho porque vivenciava demais as situações. Entretanto tive de criar defesas porque senão sofria muito com isso. Dava comigo a chorar, pronto...” –

enfermeiro E

Segundo Gerow et al. (2010), o modo como o enfermeiro vê e lida com a morte de um doente muda ao longo do tempo e com a experiência. Este aprende a defender-se para que esse sofrimento não passe dos limites suportáveis para ele próprio. Dos enfermeiros entrevistados, alguns mencionam as mudanças de estratégias de coping uilizadas no passado e actualmente no presente. Mudança essa que parece resultar de um processo de introspecção, auto-reflexão e aprendizagem resultante exactamente das suas experiências pessoais e profissionais ao longo do tempo. Referem recorrer à racionalização da morte do doente, a algumas actividades extra-laborais, à família e à partilha em equipa. No entanto, há enfermeiros que não reconhecem que, na sua prática quotidiana, utilizam algumas destas

(55)

48 estratégias de coping para lidar com a morte dos seus doentes. Seria interessante talvez, tentar encontrar a razão para este facto.

2.2.3. Factores que podem influenciar o processo de luto do enfermeiro

“A separação e a perda são experiências universais, particulares, peculiares e individuais,

companheiras constantes na vida do ser humano e ninguém pode afirmar que nunca as

viveu” citando Costa e Lima (2005, p.155). No entanto, como cada pessoa vive essa perda pode fazer a diferença no seu próprio processo de luto.

Quando questionados sobre os factores que consideravam poder afectar o seu processo de luto, os enfermeiros do Serviço de Medicina Paliativa do Hospital do Fundão identificaram dois grandes grupos: factores positivos (facilitadores) e factores negativos (dificultadores), consoante o impacto no seu processo de luto. Houve ainda enfermeiros que indentificaram alguns factores mas que não lhes deram qualquer sentido ou atribuiram qualquer impacto (positivo ou negativo) quanto ao processo de luto.

Dentro dos factores positivos destacam-se a expectabilidade da morte, a tranquilidade do doente no momento e a sua própria aceitação da morte. De facto, segundo Hopkinson e Hallet (2002), uma boa morte é aquela em que tanto o doente, como os familiares e os enfermeiros estão à espera e preparados (dentro do aceitável) para a iminência da morte. Por outro lado, os mesmos autores defendem que, a tranquilidade que se vive aquando a morte de um doente, é extensível à tranquilidade e aceitação do próprio doente, familiares e enfermeiros desse momento. Essa tranquilidade e preparação trazem

Imagem

Gráfico 1 – Número de enfermeiros por faixa etária
Gráfico  2  –  Número  de  enfermeiros  por  anos  de  experiência  profissional  em  Cuidados Paliativos

Referências

Documentos relacionados

No Julgamento de Rimas com Palavras Faladas, há 40 pares de palavras, dos quais 10 rimam e têm ortografia congruente (e.g., “vaca-faca”, “festa-testa”), 10 rimam e têm

Seja o operador linear tal que. Considere o operador identidade tal que. Pela definição de multiplicação por escalar em transformações lineares,. Pela definição de adição

The students who agreed to participate in the study were randomly allocated into two groups: control group n=64 (traditional) and experimental group n=65 (PBL),

As implicações dessa prática foram conceituadas pelo psiquiatra Richard Gardner (2002) como Síndrome da Alienação Parental (SAP), mas no Brasil caracteriza-se

The findings indicate that: (i) not surprisingly, children with the lowest coordination level perform significantly poorer in FMS tasks, than their HMC peers;

Deste modo, encontramos, logo na quadra nº 2, da primeira parte, alguns versos da cantiga dos olhos castanhos, tão popularizada que regista alguma variação, com variantes

Destes movimentos epistemológicos no campo da cultura coloquemos como exemplo o caso dos movimentos em torno do discurso, da linguagem entre os estruturalistas e

B4 Identificação dos compostos presentes nas amostras de bio-óleo obtidos via pirólise catalítica da fibra de casca de coco utilizando carvão ativado (ABC) e