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A SOCIEDADE, O ESTADO E O AVIÃO:

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Academic year: 2021

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A SOCIEDADE, O ESTADO E O AVIÃO: DEBATES E IDEIAS SOBRE A DEFESA NACIONAL E A AVIAÇÃO NA SOCIEDADE CIVIL BRASILEIRA (1911)

Bruno de Melo Oliveira* Andréa Silva da Costa** Jairo de Paula Baptista***

RESUMO

O presente artigo visa expor uma análise embrionária sobre a interação entre sociedade civil e sociedade política no debate acerca do uso do aeroplano como ferramenta de atuação militar e de manutenção de soberania. O ano de 1911 baliza nossa reflexão por ter sido o momento no qual setores da sociedade marcaram posição diante do uso do meio aéreo pelo aparelho estatal e empreenderam esforços para viabilizar a criação da atividade aeronáutica no Brasil. Integrantes da classe política, membros da imprensa, empresários, profissionais liberais e parte do meio militar expressaram seus anseios e organizaram-se diante do impacto das transformações tecnológicas manifestadas na passagem do século XIX para o século XX, do desenvolvimento de novos meios de guerra e do acirramento das tensões e disputas fronteiriças entre os países da América do Sul. Materializando esta dinâmica, o Aero-Club Brazileiro e a Confederação Aérea Brazileira, associações fundadas no Rio de Janeiro, configuram-se como importantes conexões entre frações da sociedade brasileira e o Estado.

Palavras-chave: Aviação militar. Sociedade civil. Defesa nacional.

SOCIETY, THE STATE AND THE PLANE: DEBATES AND IDEAS ON NATIONAL DEFENCE AND AVIATION IN BRAZILIAN CIVIL SOCIETY (1911)

ABSTRACT

This paper aims to expose an embryonic analysis of the interaction between civil society and political society in the debate about the use of the airplane as a military operations tool and sovereignty maintenance. The year of 1911 delimits ____________________

* Doutor (2010) e Mestre (2006) em História pelo Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal Fluminense (UFF), graduado em História pela UFF (2004). Professor Adjunto da Universidade da Força Aérea, onde ministra a disciplina História da Aviação Militar Brasileira e coordena do Grupo de Pesquisa em História do Poder Aéreo Brasileiro (GEHPAER). Contato: <campeator@yahoo.com.br>

** Graduada em História pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2010). Atualmente, é chefe do Centro de Memória do Ensino (CME), Universidade da Força Aérea. Contato: <andreacosta.unifa@hotmail.com>. *** Graduado em Marketing pela Universidade Estácio de Sá (2008), especialista em Marketing e

Comunicação Institucional pela Universidade Castelo Branco e pelo Centro de Estudos de Pessoal e Forte Duque de Caxias (CEP/FDC) (2009), especialista em Gestão Cultural pelo SENAC-RJ (2011) e especialista em História Militar Brasileira pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO) e Instituto de Geografia e História Militar do Brasil (IGHMB) (2012). É pesquisador do Centro de Memória do Ensino (CME) da Universidade da Força Aérea. Contato: <baptistajpb@gmail.com>.

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our reflection because the moment in which sectors of society marked position on the use of air through the state machine and made efforts to facilitate the creation of aeronautical activity in Brazil. Members of the political class, the press, the entrepreneurs, the professionals, and part of the military circles expressed their concerns and they organized under the impact of technological change, manifested during the late Nineteenth-Century to the Twentieth-Century, developing new means of warfare, and intensified tensions and border disputes between the South America countries. Materializing this dynamic, the Aero-Club Brasileiro and the Air Force, associations founded in Rio de Janeiro, are configured as important connections between fractions of Brazilian society and the State.

Keywords: Military aviation. Civil society. National defense.

LA SOCIEDAD, EL ESTADO Y EL AVIÓN: DEBATES E IDEAS SOBRE LA DEFENSA NACIONAL Y LA AVIACIÓN EN LA SOCIEDAD CIVIL BRASILEÑA (1911)

RESUMEN

En este artículo se pretende exponer un análisis embrionario de la interacción entre la sociedad civil y la sociedad política en el debate sobre el uso del avión como una herramienta de actuación militar y del mantenimiento de la soberanía. El año de 1911 orienta nuestra reflexión porque fue el momento en el que los sectores de la sociedad se posicionaron ante el uso de medios aéreos por el aparato estatal y hicieron esfuerzos para facilitar la creación de actividad aeronáutica en Brasil. Integrantes de la clase política, los miembros de la prensa, los empresarios, profesionales liberales y parte de los militares expresaron sus anhelos y se organizaron ante el impacto de las transformaciones tecnológicas manifestadas a finales del siglo XIX al siglo XX, del desarrollo de nuevos medios de guerra y la intensificación de las tensiones y disputas fronterizas entre los países de Sudamérica. Al materializar esta dinámica, el Aero-Club Brasileño y la Confederación Aérea Brasileña, asociaciones fundadas en Rio de Janeiro, se configuran como importantes conexiones entre fracciones de la sociedad brasileña y el Estado.

Palabras clave: Aviación militar. Sociedad civil. Defensa nacional. 1 INTRODUÇÃO

O presente artigo visa expor uma análise embrionária sobre a interação entre sociedade civil e sociedade política no contexto do uso do aeroplano como ferramenta de atuação militar e de manutenção de soberania.

A década de 1910 iniciou-se de forma agitada no ambiente político brasileiro. No seio da estrutura partidário-eleitoral, a chamada Reação Republicana marcou o período com fortes campanhas de oposição para desmobilizar o pensamento monárquico e seu possível retorno ao poder. Os republicanos, fortalecidos, marcaram as eleições de 1910 e puseram em pauta discussões relativas à tentativa de ruptura

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do modelo oligárquico e sua hegemonia política, obtendo grande repercussão em sociedade. Preocupações relativas à manutenção da integridade territorial do Brasil compreendiam também parte importante dos temas com os quais se deparavam os cidadãos. Os púlpitos do Congresso Nacional mostravam-se como o espaço para acirradas arengas sobre a necessidade de defesa do país e debates sobre a necessidade de modernizar as forças armadas.

O conturbado cenário geopolítico sul-americano contribuía para a ampliação das vozes daqueles que propunham empreender esforços pelo reaparelhamento das instituições militares já que o material bélico se mostrava cada vez mais potente e mortífero. Os prós e os contras da vinda de uma missão de instrução militar e os temores de a soberania do Brasil ser posta em cheque delimitavam uma parcela significativa das preocupações de segmentos sociais, políticos e militares. Foi então com a preocupação de constituir meios eficientes de proteger o Brasil que veio a se manifestar o interesse em criar um serviço de aviação militar junto ao Exército.

Nossa reflexão encontra-se em um período no qual o Marechal Hermes da Fonseca ocupava a presidência da República, esse mesmo personagem que já havia, quando Ministro da Guerra, favorecido o envio de oficiais do Exército Brasileiro a academias militares alemães como parte de um projeto de modernização dessa força armada (FAUSTO; HOLANDA, 2007, p. 143). Segundo Bóris Fausto e Sérgio Buarque de Holanda (2007, p. 145), “Hermes negociou com a Alemanha o envio de uma missão para supervisionar a reorganização do Exército.”.

Confrontamo-nos com um contexto um tanto diferente do que se apresenta no princípio do século XXI. Hoje, discutir defesa de um Estado e desenvolver reflexões e apresentar medidas que visam à proteção da soberania estatal são ações realizadas dentro de espaços especializados neste tipo de tema. Setores dentro do aparato burocrático estatal civil ou militar, agências, instituições de ensino, centros de estudo e grupos de pesquisa integram a realidade atual.

No Brasil, há cem anos, pensar defesa nacional não era monopólio de setores profissionalmente e academicamente voltados a analisar defesa ou estratégia. Em princípios do século XX, além dos militares ou da esfera dos discursos de políticos no Congresso, debater a situação da proteção territorial do país e os problemas gerados pela defasagem material e doutrinária das forças armadas era um ato compartilhado por diferentes frações da sociedade brasileira.

Às vozes inflamadas de congressistas somavam-se as tintas dos jornais da época com artigos e notas destinadas a abordar os mais diversos aspectos atinentes à proteção dos limites territoriais do Brasil e o incremento do aparato militar. Paralelamente a esse momento, as primeiras realizações de apresentações aéreas passaram a ser executadas no Rio de Janeiro, de modo similar ao que ocorria nos países vizinhos e no hemisfério norte.

O aeroplano, máquina criada há não muito tempo, representava também uma parcela significativa dessa modernização. Ainda que despertasse desconfiança de certos circuitos militares, que, no máximo, atentaram para o aperfeiçoamento

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do material bélico já existente, e não passasse de uma curiosidade desportiva ou um espetáculo para uma grande massa da população, o avião foi capaz de seduzir alguns poucos para seu emprego em possíveis ambientes de combate.

2 PRIMEIROS VOOS E SUAS REPERCUSSÕES NO BRASIL

Apesar de o primeiro aeroplano, concebido como um aparelho capaz de levantar voo por si só, de se estabilizar no ar e pousar de maneira controlada, ter sido inventado em 1906, foi somente em 1910 que os céus brasileiros puderam contar com sua presença. Quatro anos separam a performance de Alberto Santos Dumont sobre o 14-Bis, no Campo de Bagatelle e na cidade paulistas de Osasco.

O empreendimento de Dimitri de Sensaud de Lavaud, um industrial oriundo de uma família francesa radicada no Brasil (ALEXANDRIA; NOGUEIRA, 2010), auxilia na identificação preliminar do círculo social que passou a ter um acesso mais íntimo com as primeiras atividades aeronáuticas e que passou a ter um importante protagonismo nessas pioneiras aventuras.

Lavaud fizera seus primeiros estudos na França e na Suíça, mas, por conta da vivência nas oficinas da olaria de seu pai e outras oficinas em Osasco, bem como dos livros de mecânica importados, aproximou-se da engenharia. A partir de 1908, graças às repercussões dos feitos aeronáuticos na Europa, Dimitri de Lavaud passou a consumir revistas técnicas dedicadas às novas máquinas voadoras, alimentando o projeto de construir, financiado pelo pai, o Barão Evariste de Lavaud, um aeroplano.

Voar nada mais era do que uma iniciativa para muito poucos. Era uma diversão perigosa de pessoas abastadas, jovens filhos de famílias ricas que tinham condições de transitar entre a alta sociedade brasileira e os ambientes europeus nos quais o avião aparecia como um bólido capaz de se lançar no ar. Como ressalta Cláudio Passos Calaza (2007, p. 38), “[...] a aviação tornava-se um esporte de jovens intrépidos mais inclinados ao pragmatismo do que à filosofia.”.

Em língua portuguesa não encontramos muitos trabalhos sobre esta relação entre atividade desportiva, aeronáutica e mídia. Nada há que trate dessa relação na realidade brasileira. A dissertação de Francisco Pinheiro (2009), cujo foco se direciona para a história da imprensa desportiva portuguesa, pelo menos, auxilia a criar um parâmetro. No que se refere à aviação, é possível fazer uma aproximação, já que nos deparamos com um contexto similar ao experimentado no Brasil quanto à assimilação das novidades tecnológicas. No ano de 1911, veio a ser publicado o primeiro número do Boletim do Aero-Club de Portugal. Seu editorial explicita a meta fundamental da agremiação que, por meio de sua publicação, pretendia despertar os cidadãos portugueses para a novidade que se apresentava. Infelizmente, o tema aviação não é muito desenvolvido, mas identifica o seu aparecimento junto ao meio desportivo divulgado pelos jornais e revistas lusitanas, mais precisamente inserindo-a junto à prática automobilística, o que representa certo avanço no reconhecimento de parte do pano de fundo de nosso tema.

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O principal centro difusor dessa prática foi a própria França, como destacou Alberto Santos Dumont em seu livro Meus balões. A França era, conforme relatava, um país com as principais condições para realizar o desenvolvimento da aeronáutica, pois era detentor de meios materiais e imateriais para levar a cabo esta empreitada (DUMONT, 1986).

Essa realidade, contudo, distanciava-se consideravelmente do que se poderia encontrar no Brasil. Estamos tratando de um país fundamentalmente rural; ainda que possuidor de alguma indústria, não era dotado de um parque industrial que pudesse fazer frente à pujança europeia ou norte-americana. Comparado às economias centrais do hemisfério norte, o Brasil não contava com centros de produção científica. Conforme apresentam Sintia Said Coelho e Maria Celi Chaves Vasconcelos, a própria constituição das universidades no Brasil apresentam grande atraso, se comparado às práticas educacionais vigentes na Europa e na América Hispânica. Segundo as autoras:

Permanecia o modelo de formação dos profissionais liberais em estabelecimentos isolados e visava-se assegurar um diploma profissional com direito a ocupar postos privilegiados em um mercado de trabalho restrito, além da garantia de prestígio social. (COELHO; VASCONCELOS, 2009, p. 3).

Não eram cursos voltados para produção do conhecimento ou fomento de atividades eminentemente científicas. De acordo com Jorge Nagle (2009, p. 144), “[...] a criação de universidade oficial no Brasil vinha se arrastando há muito tempo.”. Desde fins do período imperial, as discussões acerca da criação desta instituição de ensino superior ocorreram de maneira titubeante. “Na verdade, durante os trinta primeiros anos do regime republicano, apenas algumas vozes esparsas levantaram-se contra o descaso e a pouca frequência com que levantaram-se propunha eslevantaram-se problema fundamental da cultura brasileira.” (NAGLE, 2009, p. 144).

Diante desse ambiente pouco ou nada promissor para o desenvolvimento aeronáutico, havia um número restrito de indivíduos que foram capazes de fazer a interlocução entre as promessas da modernidade do Velho Mundo e as terras periféricas do Continente Americano, do qual fez parte o já citado Dimitri de Lavaud. Os aventureiros do ar brasileiros, algumas vezes, criados em solo europeu, tentavam reproduzir suas experiências em solo tropical. A língua de cultura, a arquitetura, as vestimentas e os hábitos pautavam-se no prestígio oferecido pela alta sociedade francesa, como pode ser verificado nas construções comerciais e prédios governamentais no Centro da Cidade do Rio de Janeiro. Como bem observa Margarida de Souza Neves (2010, p. 19), “[...] o Brasil [...] procurava imitar [...] os modos de viver, os valores, as instituições, os códigos e as modas daquelas que então eram vistas como as nações progressistas e civilizadas.”. Os primeiros aviadores saíram desta conexão cultural França-Brasil (em outros casos Inglaterra-Brasil ou Alemanha-Brasil).

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aos brasileiros. O que ocorria no Brasil estava ocorrendo sincronicamente em outros países sul-americanos, reunindo o mesmo perfil de pessoas, com experiências de vidas similares e frequentadores dos mesmos ambientes sociais1.

O aperfeiçoamento de balões dirigíveis e o surgimento do aeroplano estavam ultrapassando o espaço das oficinas de inventores e foram ocupando terreno em centros de exposição, como pode ser evidenciado na transcrição, contida no Diário Oficial da União, da Revue Scientifique. Divulgado pela imprensa oficial brasileira em 14 de janeiro de 1911, a reportagem é uma recolha de informações sobre o desenvolvimento da indústria aeronáutica desde 1889 (EXPOSIÇÃO..., 1911, p. 514). O foco central da notícia corresponde ao êxito da Segunda Exposição Internacional de Locomoção Aérea, realizada entre os dias 17 de outubro e 2 de novembro de 1910, na cidade de Paris. Aqui já podemos verificar um momento de acelerada mudança, no qual a aerostação passou para o segundo plano diante do aperfeiçoamento dos aviões (EXPOSIÇÃO..., 1911, p. 514).

A mencionada nota do Diário Oficial da União é uma pequena amostra do interesse despertado na sociedade brasileira pela nascente aeronáutica. Jornais e revistas publicadas na antiga capital federal revelam em suas páginas a atratividade que os meios aéreos exerciam sobre a população. A novidade do voo era consumível na forma de feito inusitado e extraordinário, porém, progressivamente transformado como espetáculo. Conforme ressaltou Tânia Vicente de Souza, a reconstituição dos primeiros voos no Rio de Janeiro, antes de 1911, é encoberto em dúvidas e notícias esparsas. Segundo a autora, em 1909, a Gazeta de Notícias publicou uma reportagem informando sobre a construção de um avião no bairro carioca da Gávea e do fato de seu piloto ter alçado voo. Porém, o responsável pela matéria não foi testemunha ocular do evento (SOUZA, 2012, p. 46).

Por sua vez, a Revista A Careta noticiou em janeiro de 1910 que Gastão de Almeida teria sobrevoado a Baía de Guanabara (SOUZA, 2012, p. 46). No Natal de 1910, o aviador alemão Henrique Oelerich tentou decolar, sem sucesso, com seu aeroplano na pista de corrida do Derby Club. O alemão Franz Rode e o português Magalhães Costa também tentaram voar no Jockey (SOUZA, 2012, p. 46-47). Somente em janeiro de 1911, o público pôde ver o primeiro voo com sucesso de um aparelho mais pesado que o ar (Figura 1). Ainda acrescenta Tânia Vicente de Souza:

[...] Ruggerone realizou três voos no mesmo dia, cada um deles com menos de cinco minutos e sete milhas de distância, percorrendo as áreas próximas ao Jockey Club. Cabe ressaltar que o Marechal Hermes da Fonseca estava presente a essa exibição aérea. (SOUZA, 2012, p. 48)

1 Carlos Adolfo de la Jara (1975) e Alberto Fernandez Prada Effio (1975) identificam similar processo no Peru; Luis Hernán Paredes (1978), Amalia Villa de la Tapia (1974), Angel Maria Zuloaga (1948), respectivamente para os casos da Venezuela, Bolívia e Argentina.

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A realização desses “espetáculos aviatórios”, como denomina Tânia Vicente de Souza(2012), era acompanhado diretamente pela imprensa carioca da época. O recém- criado jornal A Noite criticou as façanhas realizadas por Ruggerone, posicionando-se explicitamente em favor da efetuação de voos em um verdadeiro campo de aviação, em um espaço que não pudesse gerar perigo para quem vinha assistir aos feitos das máquinas voadoras.

Figura 1 – Preparativo da exibição aérea do piloto italiano Ruggerone no Jockey Club

Fonte: O MALHO, 1911.

Essa demanda apresentou-se na reportagem intitulada “Plauchut voará...”. Edmond Plauchut, aviador e mecânico, exaltado nas publicações d’A Noite, era formado pela Escola de Pau2 e desejava fomentar as atividades aeronáuticas no Brasil (SOUZA, 2012, p. 49). O francês, conforme divulgava A Noite, era uma autoridade em questões aeronáuticas, sendo, inclusive, citado em audiências com o Presidente Hermes da Fonseca. Os eventos nos quais Plauchut atuava eram incensados pelas páginas do citado A Noite.

2 Considerado um dos primeiros campos dedicados à aviação, Pau foi o lugar onde os Irmãos Wright e Louis Blériot ministraram seus cursos de pilotagem (AUBOUT, 2011).

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A passagem de 1910 a 1911 traz aos nossos olhos o ambiente no qual a inovação aeronáutica se destacava e era apresentada a um grande público. As antigas pistas de corrida de cavalos localizadas nos bairros de São Cristóvão, Tijuca e Maracanã possuíam as condições materiais necessárias para tornar o voo de aeroplanos possível. O Derby Club, o Turfy Clube e o Prado Fluminense eram pontos de convergência da diversão de uma modalidade competitiva de grande importância social.

Figura 2 – Corte da planta da cidade do Rio de Janeiro organizada na administração do Prefeito General Bento Ribeiro – 1913

Fonte: DIRECTORIA GERAL DE OBRAS E VIAÇÃO, 1913.

As competições de cavalos haviam ascendido como uma relevante atração e espetáculo de massa. As pistas de corrida encontravam-se próximas a uma das principais vias férreas da cidade do Rio de Janeiro, possibilitando o acesso de seus frequentadores, tanto aqueles que vinham da Estação Central do Brasil quanto das terras distantes do atual Zona Oeste da cidade (Figura 2). Linhas de bonde, que atuavam no transporte das populações dos bairros do entorno em direção a estas pistas, contribuíam para ampliar o número de espectadores, não apenas de velozes cavalos, como também dos primitivos aeroplanos.

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Figura 3 – Público reunido no Jockey-Club para a exibição de Ruggerone. O Marechal Hermes da Fonseca, inesperadamente, compareceu ao evento

(O Malho)

Fonte: O MALHO, 1911.

Os prados de corrida, que reuniam uma parcela da população ansiosa em lograr vencer o páreo e as competições equestres, também se constituíam em espaços adequados aos pousos e decolagens. Tais ambientes representavam um lugar de convivência social (Figura 3). Não direcionaremos o foco de estudo para a base da sociedade, ao trabalhador comum, operário, artesão, tipógrafos, sapateiros, trabalhadores da estiva, que, apesar de engrossarem o número de componentes da plateia, não foram estes os principais atores da vinda do aeroplano para o Brasil.

A “nata da sociedade” fluminense correspondia a uma parcela da sociedade brasileira da época que desejamos considerar como os protagonistas deste contato com a modernidade advinda da Europa. Este círculo reduzido em comparação com a massa do povo, bem-nascidos, abastados, educados segundo os padrões considerados como refinados, era o setor social que ativamente participou do desenvolvimento da aeronáutica em terras brasileiras. No interior da alta roda social, havia aqueles que se aproximavam dos aventureiros dos ares desse começo

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do século XX, personalidades que não se posicionavam como meros consumidores ou admiradores passivos dos “espetáculos aviatórios”. Dimitri de Sensaud de Lavaud e figuras notórias do período, como Gastão de Almeida, integravam a posição de primeiros aeronautas a cortar os ares brasileiros.

Desses membros da “alta sociedade”, que era composta de membros da política nacional, empresários, donos de periódicos e jornalistas, havia um círculo menor, que, além de transitar pelas alas privilegiadas dos jóqueis clubes, assentavam em sua arquibancada, que se confraternizavam nas confeitarias francesas no centro do Rio de Janeiro, entre confeitos e reuniões acaloradas, lançavam-se com mais ímpeto nas discussões políticas, nos debates sobre a modernização das forças militares e do emprego do avião para finalidades bélicas e comerciais.

Em pouco tempo, o que era apenas um espetáculo e simplesmente um negócio passou a ser encarado como algo necessário para a manutenção da soberania brasileira. O ano de 1911 baliza, dessa maneira, nossa reflexão.

Esse período abre uma nova fase no que tange à Aeronáutica, pelo fato de ter sido o momento no qual setores da sociedade marcaram posição diante do uso do meio aéreo pelo aparelho estatal e empreenderam esforços para viabilizar a criação da atividade aeronáutica no Brasil. Do mesmo grupo social do qual saíram os pioneiros aventureiros brasileiros do ar e frequentadores dos cafés, teatros e jóqueis clubes, veio a se desenvolver outro, só que mais atento ao cenário político, aos riscos no plano internacional e às possíveis implicações de seu emprego em um futuro não muito distante.

A fração da sociedade mencionada expressou seus anseios e organizou-se diante do impacto das transformações tecnológicas manifestadas na passagem do século XIX para o século XX, do desenvolvimento de novos meios de guerra e do acirramento das tensões e disputas fronteiriças entre os países da América do Sul. Vale destacar que da mesma maneira que os bens de luxo e prestígio vindos da Europa eram consumidos e considerados, a aviação de natureza beligerante igualmente era percebida. Em 1909, a França foi o primeiro país a constituir uma aviação militar, frota composta por Farman, Voisin e Blériot, sendo seguida pela iniciativa alemã, em 1910, e pela Itália, que debutou o uso do avião em conflitos armados na Guerra Ítalo-Turca, em 1911 (CALAZA, 2007, p. 39-40). Estes eventos revelam o desenvolvimento da arma aérea em seus primeiros momentos. Como bem nota Mauro Vicente Sales (2009, p. 14), “[...] o debate de criação da aviação militar no Brasil não se limitou à esfera militar, mas encontrou forte eco nos meios civis interessados na modernização das Forças Armadas.”.

3 ORGANIZANDO-SE PARA PENSAR E EXECUTAR A AVIAÇÃO

Pudemos, até agora, identificar, de maneira sucinta, que categoria social tinha suas atenções voltadas às atividades aeronáuticas, dentro e fora do Brasil.

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O conjunto de seus partícipes integrava um seleto grupo de homens bem-nascidos e com forte articulação com aquilo que ocorria nos planos políticos, sociais e culturais europeus. A vivência particular fomentou a formação de entidades organizadas, pautadas em um projeto muito claro, no seu tempo, que era viabilizar a aviação no país. Diante dessa realidade, consideramos relevante empregar, aqui, o conceito de Sociedade Civil. Ainda que outros pensadores tenham feito uso deste conceito, como o alemão Hermann Heller, optamos, por hora, pela perspectiva gramsciana. Segundo Antonio Gramsci, sociedade civil constitui um espaço onde as instituições sociais surgem e agem para promoção de vontades coletivas que tenham a capacidade de elaborar e empreender objetivos e projetos marcados por certas visões de mundo (GRAMSCI, 1968). Acerca desta referência, Sônia Regina Mendonça destaca que:

O cerne do conceito de sociedade civil em Gramsci refere-se à organização e à produção de vontades coletivamente organizadas, implicando visões de mundo, em consciências sociais e em formas de ser adequadas – ou opostas – aos interesses burgueses. (sic). (MENDONÇA, 2012, p. 2). Quando a historiadora destaca tal concepção, lembra que essa modalidade associativa corresponde a um “[...] conjunto de aparelhos privados de hegemonia, instâncias de associação voluntária, diversas de empresas e instituições estatais.” (MENDONÇA, 2012, p. 3). As sociedades civis visam, portanto, à “[...] organização de vontades coletivas, calcadas em valores e eticidade próprios, em prol da afirmação de projetos – de mudança ou conservação – que se tornem hegemônicos.” (MENDONÇA, 2012, p. 3).

No caso, apesar de estarem no mesmo estrato social, de auxiliarem, por exemplo, a Companhia de Aviação do Derby Clube, que tinha finalidades puramente econômicas, o que começou a gestar de forma rápida tinha um perfil distinto. A necessidade de interferir no tecido sócio-político e de unir forças ao aparato estatal, agindo como uma força agregadora e definidora de um projeto claro para o país é uma marca fundamentadora destas ”sociedades civis”.

No que se refere ao desenvolvimento da aviação e sua respectiva divulgação, surgiram agremiações, em primeiro lugar, na Europa e, em seguida, na América, denominadas de aeroclubes. Na França, já no século XIX, foi fundado o Aéro-Club de France, em 1898. De início, dedicado ao fomento da aerostação, a partir de 1901 e 1906, passou a estimular a realização de competições entre inventores e aviadores, respectivamente, de dirigíveis e

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aeroplanos. Esta associação mostrou-se como modelo de outras organizações similares, dentro e fora do Velho Continente.

No que tange à experiência brasileira, esta filiação, ou melhor, inspiração é bastante clara. Não temos a intenção de esgotar esta reflexão, já que não temos preocupação em gerar um aprofundamento neste tema em especial, mas sim usá-lo como ligação com nosso presente objeto. Em resumo, pensamos em articular a formação de uma entidade dedicada a realizar, defender e divulgar a prática de aviação junto à sociedade e em apoio ao Estado.

Com notícias bastante pontuais, destacamos o Aero-Club de São Paulo3, instituição que, até o presente momento, seria a primeira preocupada com o fomento das atividades aeronáuticas no Brasil. Pelo que pudemos levantar, sua fundação dataria do ano de 1909 (APROVAÇÃO..., 1909). Segundo o Diário Oficial do Estado de São Paulo, datado de 14 de dezembro de 1909, foi aprovado o estatuto da referida agremiação (DIÁRIO..., 1909), sendo despachada, em expediente de 12 de janeiro de 1910 (INFORMANDO..., 1910), a lista de sócios entregue no mesmo mês de dezembro do ano anterior.

No Rio de Janeiro, identificamos outra associação, denominada simplesmente de Aero-Club. Logramos encontrar no Diário Oficial da União de 1º de fevereiro de 1911 seu estatuto, que foi fruto de uma reunião realizada em 1º de junho de 1910. Chama-nos a atenção o Capítulo I, artigo 1º, em que se define a sua finalidade: “[...] desenvolver e estimular a aviação aérea, organizando concursos, distribuindo prêmios.” (ESTATUTO..., 1911). Pouco ou nada sabemos efetivamente sobre essa sociedade civil. Nada foi escrito por ela. Possuímos algumas poucas notícias esparsas e breves vestígios em notas de jornal e no Diário Oficial da União. Não conhecemos o seu fim. No atual momento, concentramo-nos muito sucintamente na identificação geral de um movimento em prol da aviação na capital do Brasil e que ela estabeleceu mecanismos (prêmios e concursos) para a intervenção direta neste novo segmento que então se desenvolvia. Não nos é permitido afirmar se havia alguma pretensão de intervir junto ao Estado na promoção da aeronáutica nacional, fato que demandaria uma investigação pormenorizada.

Seguindo a este processo, destacamos aqui, em primeiro lugar, aquela que foi a organização mais atuante no Brasil no seio dos entusiastas da aviação: o Aeroclube do Brasil. Na sua primeira reunião registrada em ata, ocorrida no

3 Não temos condições de confirmar uma relação genética deste Aero-Club (sic) de São Paulo fundado em 1909 com o Aero-Club (sic) de São Paulo de 1931. No momento da pesquisa, apenas logramos encontrar duas notícias extremamente esparsas e desconhecemos os filiados da agremiação criada em 1909.

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dia 14 de outubro de 1911, o presidente deste evento, o Almirante José Carlos de Carvalho, pronunciou-se “[...] salientando a conveniência e necessidade da fundação de uma sociedade que se encarregasse de fomentar no Brasil o desenvolvimento da nobre e futurosa arte da aviação.” (ACTA..., 1911b, f. 1). Contando, na data de criação, com trinta e seis membros, o Aeroclube Brasileiro tinha entre seus signatários fundadores importantes autoridades políticas, como os deputados federais Dunshee de Abranches e Correia Defreitas, o aviador francês Edmond Plachut, o aviador alemão Franz Rode, além de militares e empresários. Dunshee de Abranches teve um importante papel nos debates relativos à modernização do Exército Brasileiro, tendo posicionamento notório em favor da vinda de uma missão de instrução alemã (BUENO, 2003, p. 453)

Entre suas fileiras, contava, também, com o jornalista da Gazeta de Notícias (AVIAÇÃO..., 1911) e futuro dono do jornal A Notícia, Cândido Torres Rangel de Campos, o diplomata Leopoldo Lima e Silva, neto de Duque de Caxias, e Visconde de Dampierre, iminente descendente da secular e nobre Casa Dampierre. O secretário que presidiu este primeiro encontro foi Victorino de Oliveira, redator do jornal A Noite, que é identificado como idealizador do Aeroclube Brasileiro. Em breve matéria publicada pelo próprio periódico, intitulada A fundação do Aero Club Brazileiro. Uma iniciativa d’A NOITE fica reproduzida em síntese o conteúdo da ata de criação da associação, disponibilizando para o público leitor seus objetivos (A FUNDAÇÃO..., 1911). Fica clara a postura d’A Noite em divulgar os resultados das reuniões do clube e suas íntimas conexões com a aviação, como se explicita no caso da constante propaganda feita sobre o aviador Plauchut, a cobertura dos “espetáculos aviatórios” e de se posicionar como principal meio de divulgação da aviação no país no ano de 1911. Esta agremiação arvorou-se como responsável nacional pela divulgação e desenvolvimento da aviação no Brasil, proposta de hegemonia em um campo ainda em estágio inicial de formação. Diferente do Aero Club de São Paulo e do Aero Club, o Aero Club Brazileiro ultrapassou o nível unicamente financeiro da aeronáutica, passando a imprimir uma pressão sobre os meios políticos, tendo o jornal A Noite como ferramenta de atuação social, criadora também de “opinião pública”4.

4 O jornal A Noite não foi a única publicação que punha em evidência a aviação, mas era empresa midiática que tinha um vínculo visceral com o Aero Club Brazileiro [sic], disponibilizando suas dependências para sua reunião de fundação. As publicações O Malho, A Careta, A Ilustração Brazileira [sic], Revista da Semana, Fon-Fon, Jornal do Brasil, O Paiz, A Gazeta de Notícias, entre outros, dedicavam amplas páginas aos aeroplanos, pilotos e shows aéreos.

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Figura 4 – O aviador Planchut na Praça Mauá, preparando-se para disputar o prêmio de dez contos

Fonte: A CARETA, 1911.

O referido periódico carioca teve um importante papel na formação da aviação no Brasil, tendo agido de forma atuante neste campo por muitos anos. Na Acta da Assembléa Geral que elegeu o Conselho e a Directoria, em trez de novembro de 1911, selecionamos o seguinte trecho:

O Sr. almirante José Carlos de Carvalho propoz para que a secretaria fosse comunicar a criação do Aero Club Brasileiro ao Sr. Presidente da Republica, pedindo-lhe no mesmo tempo o seu appoio para a criação do campo de aviação. Foi nomeado para essa incumbencia o sr. Marechal Bormann, presidente do Conselho, que ficou de marcar o dia para a apresentação da directoria ao Sr. Presidente da Republica. (ACTA..., 1911a, f., 4, verso [sic]).

Nesta ata da segunda reunião realizada pelo recém-fundado aeroclube, é possível identificar claramente parte de suas estratégias de aproximação com as autoridades nacionais. Dar conhecimento à Presidência da República da criação

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da associação devotada a fomentar a aeronáutica no país representa um ato não somente informativo, mas corresponde a uma tentativa de aproximação com a esfera do poder decisório do Brasil a fim de levar a êxito suas proposições relativas à aviação no país. Dirigir-se, aqui, ao presidente significa a apresentação de uma demanda de um grupo que se posicionava como o detentor de conhecimento e autoridade sobre as temáticas aeronáuticas. Apresentar suas pretensões diante da chefia nacional é gerar um posicionamento oficial que visa canalizar as graças do aparato de governo e os recursos da estrutura estatal para um projeto que, neste caso, permanecia em estágio bastante incipiente em termos de formalização de uma instituição dedicada a uma realidade demasiadamente recente e em constante transformação.

Apesar de estar em seus primeiros meses de existência, o Aero-Club Brazileiro já expressava a necessidade da constituição de um espaço exclusivo destinado à prática da aviação. Inferimos que solicitação de auxílio para a criação de um “campo de aviação” demonstra, nesse momento, a limitação das pistas de corrida e dos prados dos jóqueis clubes para pouso e decolagem de aeronaves. De fato, se prestarmos atenção na imagem do Jockey-Club no dia do voo do italiano Ruggerone, é possível notar que a aglomeração reunida no lugar poderia oferecer dificuldades para os pilotos empreenderem o lançamento dos aeroplanos, além de esses aparelhos oferecerem risco àqueles que vinham assistir aos “espetáculos aviatórios”. No voo de Edmond Plauchut, divulgado n’A Careta, o espaço deixado à disposição de pouso e decolagem, a Praça Mauá (Figura 4), mostrava-se pouco propícia para uma evolução segura. Vale lembrar que estamos tratando de máquinas rudimentares para os padrões atuais e que não ofereciam proteção tanto para o piloto quanto para os que estavam ao seu redor. A potência do motor, a estabilidade e a firmeza da estrutura constitutiva dos primeiros aviões não poderiam ser consideradas como consolidadas, não inspirando, portanto, muita segurança. Nem praticantes, nem plateia e nem edificações estavam livres de acidentes.

Encontramos, assim, uma ruptura com aquilo que era efetuado até então. Da aviação no Rio de Janeiro, surgida como aeronáutica-espetáculo, com seus pilotos itinerantes e seus shows com hora marcada, eclodiu uma nova perspectiva do que deveriam ser os lugares exclusivamente planejados para aviões e pilotos. Corroborando com as pretensões apresentadas na ata de fundação do Aero-Club Brazaileiro, a ata de reunião de novembro agregou mais um componente na formação de uma infraestrutura básica para a aviação, vislumbrando a associação mais um passo na especialização desta atividade. Notemos que não estamos falando da criação de uma instituição destinada à instrução de pilotos, mas apenas de um terreno suficientemente plano, amplo e apartado de grandes multidões.

Em fins de 1911, 18 de dezembro, cerca de dois meses depois da fundação do Aero-Club Brazileiro, foi fundada outra sociedade na capital federal: a Confederação Aerea Brazileira (Figura 5). Da forma semelhante

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à agremiação surgida nas instalações do jornal A Noite, a confederação era constituída com o mesmo segmento de classe, com a mesma categoria de indivíduos que transitavam na alta roda da sociedade fluminense e dos círculos políticos e militares. Debrucemo-nos sobre os nomes que integraram sua primeira turma de sócios, os quais podem ser identificados em seu manifesto. Seus membros são personagens correntes nas revistas e nas notas dedicadas à alta sociedade carioca. Alguns deles ainda eram representantes da burocracia e das fileiras militares que frequentam os mesmos ambientes socioculturais, consomem os bens culturais que se caracterizam como objetos de distinção social e compartilham perspectivas políticas que permitem a convergência de pensamentos e ações em prol de um projeto.

Figura 5 – Da esquerda para direita: Heitor Telles, José Ribas Cadaval, Lauro Müller (?), os demais membros não puderam ser identificados

Fonte: O MALHO, 1912.

Para o presente momento, não iremos nomear todos os seus integrantes, mas apresentar alguns nomes e breves informações que auxiliem na

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identificação do perfil dos associados à confederação. Na posição de presidente, encontramos o Engenheiro General Müller de Campos, apresentado como um dos altos signatários da mensagem de pêsames pelo falecimento do irmão do presidente Hermes da Fonseca, em 1911, constante no Diário Oficial da União. Por sua vez, o Tenente Coronel Lauro Severino Müller possuía franca atividade política, tendo atuado como governador provisório de Santa Catarina na época da Proclamação da República, deixando o cargo para tomar posse como Deputado Federal no Rio de Janeiro, e, em 1902, foi nomeado Ministro da Viação e Obras Públicas. O engenheiro Carlos Sampaio era o urbanista responsável pelas grandes obras na capital do Brasil. O engenheiro Arthur Getulio das Neves foi vice-governador do Rio de Janeiro na chapa Francisco Portela, nos últimos anos do século XIX. O engenheiro Adolpho Del Vecchio foi responsável pela construção da “[...] sede da Guardamoria e quartel dos guardas da Alfândega.” (DEL PRIORE, 2003, p. 31), edificação que veio a ser conhecida como a Ilha Fiscal. Del Vecchio havia gozado de muito prestígio junto ao Imperador D. Pedro II, apreço que lhe “[...] garantiu a indicação para diretor de obras do ministério da Fazenda.” (UZEDA, 2007, p. 3). O capitão-de-corveta Tancredo Burlamaqui de Moura e o engenheiro João Mattoso Sampaio Corrêa foram, respectivamente, adido naval brasileiro em Haia (1907) e membro do Clube de Engenharia. O engenheiro Arthur Getulio das Neves “[...] foi professor catedrático da própria Politécnica, vice-governador do estado do Rio de Janeiro, diretor do Banco do Brasil, presidente da Companhia de Ferro-Carril Jardim Botânico e vice-presidente do Clube de Engenharia.” (FERREIRA, 2008, p. 91). É digno de nota mencionar a presença do afiliado Tenente Mário Hermes da Fonseca, filho do Presidente da República Marechal Hermes da Fonseca.

Dessa lista destacamos ainda o nome de José Ribas de Cadaval, médico, inventor e oficial da Marinha do Brasil. Ribas Cadaval foi um dos primeiros a produzir trabalhos no Brasil sobre as potencialidades do emprego da aviação, como fica patente em seu livro Tratado de aeronautica. A publicação dessa obra foi objeto de notícia no jornal A Imprensa, com a matéria Um tratadista da Navegação Aérea, em 8 de abril de 1911. Seu tratado foi objeto do concurso instituído pelo rei da Bélgica para estimular a produção de reflexões e pesquisas que visassem viabilizar a “navegação aérea” (UM TRACTADISTA..., 1911, p. 5). Curiosamente, não foi o periódico carioca a vir até a notícia, mas o contrário, Ribas Cadaval foi ao encontro d’A Imprensa fazer a divulgação de seu trabalho. No dia seguinte, o militar foi notícia de primeira capa do jornal, o qual publicou a referência de sua obra e uma breve entrevista acerca dos seus futuros projetos: o “Aerostoplano Cadaval” e o “Aeromóvel estável Cadaval”, máquinas voadoras experimentais que, ao que tudo indica, não foram construídas.

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Figura 6 – Capa do manifesto da Confederação Aérea Brazileira - 1911

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O citado manifesto da Confederação Aérea foi publicado também em fins de 1911, apresentando as diretrizes a serem adotadas pela agremiação e as medidas a serem implementadas em sociedade em parceria com o aparelho estatal. Intitulado Synthese do grandioso programma da sociedade nacional Confederação Aerea Brazileira: Escola official de aeronautica para a defesa do Brazil, a agremiação posiciona-se claramente quanto a seu papel no contexto político, apresentando como “uma associação eminentemente nacional, grandemente distribuída por todo o Brazil [...]”. Tem ainda a pretensão de se colocar como elemento de interlocução entre as diversas regiões do país, além de sintetizar sua missão. Delimitamos aqui algumas de suas proposições: “1º, cooperar efficazmente para a defesa do Brazil[...]”; “4º, confeccionar a cartographia nitida, exacta, precisa de todo nosso incommensuravel Brazil por meio de photographia aérea [...]”; “5º, fazer a efficiente repressão do contrabando nas nossas fronteiras [...]”; “6º, Iniciar o serviço de correio extra-rapido por meio das aeronaves [...]” (SYNTHESE..., 1911, p. 1). Tais elementos representam o que seria atribuição e competência da confederação, ou seja, fazer, utilizando o aeroplano, o domínio efetivo da territorialidade brasileira.

No referido documento, não encontramos quaisquer vestígios sobre a idealização de uma escola de pilotagem, apesar do “subtítulo” da confederação Escola official de aeronautica para a defesa do Brazil. De maneira geral, o manifesto está focado na função da associação e nos possíveis ganhos para a nação. Em notícia divulgada n’O Paiz, datada de 1º de dezembro de 1911, trata da inauguração da Confederação Aérea Brazileira, que estava prevista para o dia 16 de dezembro (CONFEDERAÇÃO..., 1911). No texto, podemos identificar a primeira menção à formação de uma escola de aviação. Esta associação era a portadora dos “segredos de guerra”, que estariam dispostos apenas para “Escola Nacional de Aeronautica e aos estados-maiores do exercito e da marinha.” (SYNTHESE..., 1911, p. 4). Somente em 29 de dezembro de 1911, no jornal A Gazeta de Notícias, pudemos identificar os primeiros esforços para se empreender a fundação de uma escola de aviação, com a constituição de uma comissão para darem execução ao projeto de criação de uma instituição voltada para formação de aviadores, estando à frente o capitão Pinho Bastos (SYNTHESE..., 1911, p. 4). Para o curto período que estamos abordando, a implementação de uma instituição de ensino aeronáutico não ultrapassou o nível dos discursos e desejos.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não esgotamos aqui nosso empreendimento. Muito pelo contrário, estamos abrindo uma possibilidade de análise que se inicia sobre um objeto ainda muito pouco abordado pela historiografia. O surgimento do Aero-Club Brazileiro e da Confederação Aérea Brazileira nos faz refletir, nestas breves páginas, sobre o papel que tais instituições e seus integrantes construíam no desenvolvimento

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da atividade aeronáutica no Brasil. Seus associados, ainda que sendo membros de aparelho estatal e do jogo político profissional, não agiam como partes da burocracia, do governo e das forças armadas, ao contrário, pareciam atuar de forma autônoma, formalizando a criação de organismos que se propunham a trabalhar em cooperação ao Estado. Personalidades como o deputado federal Dunshee de Abranches, Almirante José Carlos de Carvalho Marechal Bormann e o tenente Mário Hermes da Fonseca não canalizavam diretamente os recursos advindos das instituições políticas e militares para fazerem as proposições e objetivos de suas associações encontrarem êxito.

Desta forma, já podemos sinalizar para a oposição das suas sociedades com o Aero-Club de São Paulo e o Aero-Clube. Estas últimas restringiam-se a operar como agenciadores de aviadores e espetáculos, expondo uma faceta mercadológica, atuavam na divulgação da aviação e seus circos aéreos enquanto entretenimento de massa, preponderantemente. Em comparação com seus precedentes, o Aero-Clube Brazileiro e a Confederação Aérea Brazileira projetaram suas intenções para a esfera pública, para o ambiente de atuação política e estatal, e não tão somente como uma associação de cunho econômico. Não bastava constituir uma instituição fomentadora, era necessário ter uma massa crítica capaz de pensar para além do corriqueiro e do imediato. O aspecto econômico-desportivo do qual originou a aviação no Brasil passou a estimular outras maneiras de utilizar o aparelho.

Ainda que nesses tempos não houvesse distinção entre um avião enquanto experimento científico, espetáculo ou esporte, rapidamente segmentos da sociedade começaram a concebê-lo dentro de projetos para a aviação militar no Brasil. A partir dessas idealizações veio a se constituir uma aeronáutica dotada com finalidades político-militares. A partir das sociedades civis Aero-Club Brazileiro e Confederação Aérea, iniciou-se um processo para canalizar esforços para se cobrar do poder público a constituição de meios aéreos para a defesa nacional, o que permite vislumbrar uma separação entre o que era o poder de atuação dos afiliados dessas associações e suas atribuições como funcionários do poder público. No nascente setor aeronáutico, não era efetivamente o Estado a empreender e conduzir as maiores discussões sobre o tema, mas sim representantes de uma dada visão de mundo e interesses sociais.

Nascidas no seio dos espetáculos aéreos e dos circos e da exibição de intrépidos aviadores, tais associações emergiram de um ambiente no qual o aeroplano começou a ser pensado como uma ferramenta de defesa dos interesses nacionais. Eram os ambientes primordiais dessas discussões, criando e ocupando um campo ainda pouco ou nada abordado pelos mecanismos estatais. Assim congregaram-se os homens que criaram os aeroclubes em diversos países, agindo de maneira coletiva, em nome dos interesses nacionais, desenvolvendo um projeto, estabelecendo parâmetros e apontando necessidades a serem atendidas.

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Recebido em: 11/11/2016 Aceito em: 14/12/2016

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Figura 1 – Preparativo da exibição aérea do piloto italiano Ruggerone no Jockey Club
Figura 2 – Corte da planta da cidade do Rio de Janeiro organizada na  administração do Prefeito General Bento Ribeiro – 1913
Figura 3 – Público reunido no Jockey-Club para a exibição de Ruggerone.
Figura 4 – O aviador Planchut na Praça Mauá, preparando-se para disputar o  prêmio de dez contos
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