EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA ____ VARA DA SEÇÃO
JUDICIÁRIA DO AMAZONAS
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, no exercício das suas atribuições
constitucionais e legais, vem, pelo Procurador da República infra-assinado, com fundamento nos
artigos 127 e 129, inciso III, da Constituição Federal, artigo 1º, inciso IV, da Lei 7.347/85, artigos 5º,
inciso III, alínea b, e 6º, inciso VII, alíneas a e b, e inciso XIV, alínea a, da Lei Complementar 75/93
propor
AÇÃO CIVIL PÚBLICA
COM PEDIDO LIMINAR
em face do CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DO AMAZONAS,
Autarquia federal, situada na avenida Senador Raimundo Parente, nº 06, Praça Walter Góes, Flores,
CEP nº69048-661, Manaus/AM, expondo e requerendo o que se segue.
I
-D
OOBJETODESTAAÇÃO1.
A presente demanda tem como suporte fático o Inquérito Civil nº
1.13.000.000717/2014-51, cujo objeto era apurar a observância, pelo C
ONSELHOR
EGIONALDEM
EDICINADOE
STADODOA
MAZONAS- CREMAM, do dever de realizar concursos públicos para o provimento dos seus cargos e a
aplicação do regime jurídico único aos seus servidores.
2.
Com a presente ação civil pública, o M
INISTÉRIOP
ÚBLICOF
EDERALvisa, por um lado,
garantir o direito difuso de todos aqueles que queiram ter acesso aos cargos públicos e, por outro,
zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos aos direitos assegurados nesta Constituição.
3.
Para melhor manuseio dos autos, informa-se que as folhas indicadas nesta inicial se
referem às consignadas no inquérito em anexo.
II
-D
OS FATOS4.
A investigação teve início a partir do Ofício ASSJUR n.º 0177/2014, no qual o C
ONSELHOR
EGIONALDEM
EDICINADOE
STADODOA
MAZONASmanifesta a intenção de realizar transição do regime de
contratação dos servidores da Autarquia, regidos pelo regime celetista, para o regime jurídico único,
propondo, desde logo, a celebração de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o M
INISTÉRIOP
ÚBLICOF
EDERAL, nos mesmos moldes do acordo celebrado entre a Procuradoria da República no
Distrito Federal e o Conselho Federal de Medicina..
5.
Ao analisar o modelo proposto a ser replicado no Estado do Amazonas, esta Procuradoria
deparou-se com o texto da Cláusula Segunda que prescreve:
“Cláusula Segunda – O Conselho Federal de Medicina – CFM, para fiel cumprimento
deste Compromisso, estabelece, nesta ocasião, novo Regulamento de Pessoal (anexo), adaptado aos dispositivos da Lei n.º 8.112/90, sobretudo no que concerne à forma de provimento dos cargos constantes do plano de carreira da autarquia, aos direitos e deveres do servidor, aos requisitos de admissão aos cargos, à estabilidade, às vantagens e vedações ao servidor, à jornada de trabalho, às licenças e aos
afastamento, às faltas disciplinares, às penalidades e ao processo administrativo disciplinar.
Parágrafo único. A presente modificação de regime jurídico deve ser imediatamente averbada nas Carteiras de Trabalho e Previdência Social dos servidores do CFM, permanecendo apenas os detentores de cargos em comissão (direção, chefia e assessoramento) no regime celetista.”
6.
Visto isso, foi indagado ao Departamento Jurídico da Autarquia, via e-mail, se, de
fato, a intenção do CRM-AM seria de apenas transmutar o regime jurídico celetista dos servidores do
Conselho para o regime jurídico único, previsto na lei 8.112/90, ou se havia a real intenção de
dispensá-los e realizar a contratação de novos servidores via concurso público.
7.
Em resposta, assinada pela Dra. Jussara Carvalho, foi respondido o seguinte:
“Dr. Alexandre,
Boa tarde, em resposta ao seu questionamento, tem-se que os funcionários efetivos serão mantidos, e a mudança do regime deve ser averbada na CTPS dos servidores. Então, o entendimento de Vossa Senhoria está correto, no sentido de que o CRM irá manter os atuais ocupantes dos cargos.
Trata-se de averbação somente, sem baixa, já que se pretende manter os funcionários efetivos, mesmo os sem concurso, que foram efetivados por força da Adin 1717, decisão em 18/05/2001, e que determinou que a partir desta data os Conselhos de Medicina só poderiam contratar através de concurso público.
Segundo a Assessoria do CFM, a Procuradora Sra. Luciana Loureiro, da Procuradoria dos Direitos do Cidadão, em Brasília, tem muito conhecimento sobre a área, e pode dirimir dúvidas sobre o assunto.
Espero ter colaborado Att,
Jussara Carvalho
8.
Ocorre que, em que pese o entendimento da Procuradoria da República no Distrito
Federal, a Procuradoria da República no Amazonas entende juridicamente inválido convalidar
o ingresso dos servidores atualmente no exercício de cargos efetivos sem a prévia realização de
concurso público, pois, ao contrário do entendimento esposado pelo Departamento Jurídico do
CRM-AM, a ADIn 1.717 não efetivou de nenhum modo os servidores admitidos sem concurso,
senão veja-se.
III
-D
AOBRIGATORIEDADE DEREALIZAÇÃO DECONCURSOPÚBLICO ESUBMISSÃO DOSSERVIDORESPÚBLICOS DOS CONSELHOSDEFISCALIZAÇÃOPROFISSIONALAOREGIME
JURÍDICO ÚNICO
(
ART. 39
DACF/88
EART. 1
ºDALEINº8.112/90)
9.
A Constituição Federal de 1988, ao arrolar as atividades administrativas da União, a
serem exercidas de forma exclusiva, dispõe no artigo 21, inciso XXIV, que é da sua competência
“organizar, manter e executar a inspeção do trabalho”.
10.
Embora não exista dúvida acerca do ente federativo responsável pela fiscalização
profissional, a grande maioria das corporações profissionais brasileiras foram criadas por leis
esparsas, tanto anteriores como posteriores à promulgação da vigente Constituição, sob a
denominação de Conselhos ou Ordens, sem um marco legal claro que dispusesse de forma uniforme
a respeito do seu regime jurídico, gerando profundas divergências na doutrina e na jurisprudência
sobre suas características.
11.
Assim sendo, visando regulamentar os Conselhos Profissionais, a lei 9.649/98 assim
dispôs sobre os serviços de fiscalização de profissões:
“Art. 58. Os serviços de fiscalização de profissões regulamentadas serão exercidos em caráter privado, por delegação do poder público, mediante autorização legislativa. (Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 1o A organização, aestrutura e o funcionamento dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas serão disciplinados mediante decisão do plenário do conselho federal da respectiva profissão, garantindo-se que na composição deste estejam representados todos seus conselhos regionais.
(Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 2o Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, dotados de personalidade jurídica de direito privado, não manterão com os órgãos da Administração Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico.
(Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 3o Os empregados dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas são regidos pela legislação trabalhista, sendo vedada qualquer forma de transposição, transferência ou deslocamento para o quadro da Administração Pública direta ou indireta.
§ 4o Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas são autorizados a fixar, cobrar e executar as contribuições anuais devidas por pessoas físicas e jurídicas, bem como preços de serviços e multas, que constituirão receitas próprias, considerando-se título executivo extrajudicial a certidão relativa aos créditos decorrentes.
(Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 5o O controle das atividades financeiras e administrativas dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas será realizado pelos seus órgãos internos, devendo os conselhos regionais prestar contas, anualmente, ao conselho federal da respectiva profissão, e estes aos conselhos regionais.
(Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 6o Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, por constituírem serviço público, gozam de imunidade tributária total em relação aos seus bens, rendas e serviços.
(Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 7o Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas promoverão, até 30 de junho de 1998, a adaptação de seus estatutos e regimentos ao estabelecido neste artigo.
(Vide ADIN nº
1.717-6)
§ 8o Compete à Justiça Federal a apreciação das controvérsias que envolvam os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, quando no exercício dos serviços a eles delegados, conforme disposto no caput.
(Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 9o O disposto neste artigo não se aplica à entidade de que trata a
Lei n
o8.906, de 4 de
julho de 1994.
”12.
Destacando-se que a lei federal prescrevia a natureza de direito privado dos Conselhos
Profissionais, foi proposta a ADIn 1.717-6/DF suscitando a inconstitucionalidade de todos os
dispositivos legais supracitados, haja vista, entre outras razões, a inafastável natureza de autarquias
destes entes federais, já ressaltada pela doutrina e jurisprudência à época.
13.
Ao apreciar o mérito da ação, o Supremo Tribunal Federal acolheu parcialmente os
pedidos, para declarar a inconstitucionalidade do artigo 58, caput, e seus parágrafos, com exceção do
§ 3º, restando a seguinte ementa:
“DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 58 E SEUS PARÁGRAFOS DA LEI FEDERAL Nº 9.649, DE 27.05.1998, QUE TRATAM DOS SERVIÇOS DE FISCALIZAÇÃO DE PROFISSÕES REGULAMENTADAS.
1. Estando prejudicada a Ação, quanto ao § 3º do art. 58 da Lei nº 9.649, de 27.05.1998, como já decidiu o Plenário, quando apreciou o pedido de medida cautelar, a Ação Direta é julgada procedente, quanto ao mais, declarando-se a inconstitucionalidade do "caput" e dos § 1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º do mesmo art. 58.
2. Isso porque a interpretação conjugada dos artigos 5°, XIII, 22, XVI, 21, XXIV, 70, parágrafo único, 149 e 175 da Constituição Federal, leva à conclusão, no sentido da indelegabilidade, a uma entidade privada, de atividade típica de Estado, que abrange até poder de polícia, de tributar e de
punir, no que concerne ao exercício de atividades profissionais regulamentadas, como ocorre com os dispositivos impugnados.
3. Decisão unânime.”
(STF, Pleno, ADIN 1.717-6/DF, Rel. Min. Sydney Sanches, j. 07.11.2002, v.u, DJ 28.03.2003.)
14.
Dessa forma, a partir deste julgamento sedimentou-se que os Conselhos
Profissionais são autarquias federais, de natureza especial, criadas por lei, que possuem
personalidade jurídica de direito público, autonomia administrativa e financeira, afetadas à
fiscalização do exercício profissional.
15.
Com relação ao regime jurídico dos seus servidores, é importante compreender que
conquanto a constitucionalidade do § 3º, do artigo 58, tenha sido impugnada em face da redação
originária do artigo 39, caput, da Constituição Federal, diante da alteração constitucional promovida
no dispositivo pela Emenda 19/98, o pedido declaratório não foi conhecido naquela oportunidade,
circunstância já assentada quando do julgamento da medida cautelar:
“DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 58 E SEUS PARÁGRAFOS DA LEI FEDERAL Nº 9.649, DE 27.05.1998, QUE TRATAM DOS SERVIÇOS DE FISCALIZAÇÃO DE PROFISSÕES REGULAMENTADAS.
1. Está prejudicada a Ação, no ponto em que impugna o parágrafo 3o do art. 58 da Lei nº 9.649, de 27.05.1988, em face do texto originário do art. 39 da C.F. de 1988. É que esse texto originário foi inteiramente modificado pelo novo art. 39 da Constituição, com a redação que lhe foi dada pela E.C. nº 19, de 04.06.1988. E, segundo a jurisprudência da Corte, o controle concentrado de constitucionalidade, mediante a Ação Direta, é feito em face do texto constitucional em vigor e não do que vigorava anteriormente.
2. Quanto ao restante alegado na inicial, nos aditamentos e nas informações, a Ação não está prejudicada e por isso o requerimento de medida cautelar é examinado.
3. No que concerne à alegada falta dos requisitos da relevância e da urgência da Medida Provisória (que deu origem à Lei em questão), exigidos no art. 62 da Constituição, o Supremo Tribunal Federal somente a tem por caracterizada quando neste objetivamente evidenciada. E não quando dependa de uma avaliação subjetiva, estritamente política, mediante critérios de oportunidade e conveniência, esta confiada aos Poderes Executivo e Legislativo, que têm melhores condições que o Judiciário para uma conclusão a respeito.
4. Quanto ao mais, porém, as considerações da inicial e do aditamento de fls. 123/125 levam ao reconhecimento da plausibilidade jurídica da Ação, satisfeito, assim, o primeiro requisito para a concessão da medida cautelar ("fumus boni iuris"). Com efeito, não parece possível, a um primeiro exame, em face do ordenamento constitucional, mediante a interpretação conjugada dos artigos 5o, XIII, 22, XVI, 21, XXIV, 70, parágrafo único, 149 e 175 da C.F., a delegação, a uma entidade privada, de atividade típica de Estado, que abrange até poder de polícia, de tributar e de punir, no que tange ao exercício de atividades profissionais.
5. Precedente: M.S. nº 22.643.
6. Também está presente o requisito do "periculum in mora", pois a ruptura do sistema atual e a implantação do novo, trazido pela Lei impugnada, pode acarretar graves transtornos à
Administração Pública e ao próprio exercício das profissões regulamentadas, em face do ordenamento constitucional em vigor.
7. Ação prejudicada, quanto ao parágrafo 3o do art. 58 da Lei nº 9.649, de 27.05.1998.
8. Medida Cautelar deferida, por maioria de votos, para suspensão da eficácia do "caput" e demais parágrafos do mesmo artigo, até o julgamento final da Ação.” (grifou-se.)
(STF, Pleno, ADIn 1.717-6 MC/DF, Rel. Min. Sydney Sanches, j. 22.09.1999, v.u, DJ 25.02.2000.)
16.
Nada obstante, é consabido que o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar em sede de
cognição sumária a ADIn 2.135/DF, a qual impugna a Emenda Constitucional (EC) 19/98, deferiu
parcialmente a medida cautelar pleiteada, de forma a suspender a vigência, com efeitos ex nunc, da
nova redação do artigo 39, repristinando o texto original do dispositivo, que institui o regime jurídico
único dos servidores públicos da Administração Pública direta, autárquica e fundacional:
“MEDIDA CAUTELAR EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PODER CONSTITUINTE REFORMADOR. PROCESSO LEGISLATIVO. EMENDA CONSTITUCIONAL 19, DE 04.06.1998. ART. 39, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. SERVIDORES PÚBLICOS. REGIME JURÍDICO ÚNICO. PROPOSTA DE IMPLEMENTAÇÃO, DURANTE A ATIVIDADE CONSTITUINTE DERIVADA, DA FIGURA DO CONTRATO DE EMPREGO PÚBLICO. INOVAÇÃO QUE NÃO OBTEVE A APROVAÇÃO DA MAIORIA DE TRÊS QUINTOS DOS MEMBROS DA CÂMARA DOS DEPUTADOS QUANDO DA APRECIAÇÃO, EM PRIMEIRO TURNO, DO DESTAQUE PARA VOTAÇÃO EM SEPARADO (DVS) Nº 9. SUBSTITUIÇÃO, NA ELABORAÇÃO DA PROPOSTA LEVADA A SEGUNDO TURNO, DA REDAÇÃO ORIGINAL DO CAPUT DO ART. 39 PELO TEXTO INICIALMENTE PREVISTO PARA O PARÁGRAFO 2º DO MESMO DISPOSITIVO, NOS TERMOS DO SUBSTITUTIVO APROVADO. SUPRESSÃO, DO TEXTO CONSTITUCIONAL, DA EXPRESSA MENÇÃO AO SISTEMA DE REGIME JURÍDICO ÚNICO DOS SERVIDORES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. RECONHECIMENTO, PELA MAIORIA DO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, DA PLAUSIBILIDADE DA ALEGAÇÃO DE VÍCIO FORMAL POR OFENSA AO ART. 60, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. RELEVÂNCIA JURÍDICA DAS DEMAIS ALEGAÇÕES DE INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL E MATERIAL REJEITADA POR UNANIMIDADE.
1. A matéria votada em destaque na Câmara dos Deputados no DVS nº 9 não foi aprovada em primeiro turno, pois obteve apenas 298 votos e não os 308 necessários. Manteve-se, assim, o então vigente caput do art. 39, que tratava do regime jurídico único, incompatível com a figura do emprego público.
2. O deslocamento do texto do § 2º do art. 39, nos termos do substitutivo aprovado, para o caput desse mesmo dispositivo representou, assim, uma tentativa de superar a não aprovação do DVS nº 9 e evitar a permanência do regime jurídico único previsto na redação original suprimida, circunstância que permitiu a implementação do contrato de emprego público ainda que à revelia da regra constitucional que exige o quorum de três quintos para aprovação de qualquer mudança constitucional.
3. Pedido de medida cautelar deferido, dessa forma, quanto ao caput do art. 39 da Constituição Federal, ressalvando-se, em decorrência dos efeitos ex nunc da decisão, a subsistência, até o
julgamento definitivo da ação, da validade dos atos anteriormente praticados com base em legislações eventualmente editadas durante a vigência do dispositivo ora suspenso.
4. Ação direta julgada prejudicada quanto ao art. 26 da EC 19/98, pelo exaurimento do prazo estipulado para sua vigência.
5. Vícios formais e materiais dos demais dispositivos constitucionais impugnados, todos oriundos da EC 19/98, aparentemente inexistentes ante a constatação de que as mudanças de redação promovidas no curso do processo legislativo não alteraram substancialmente o sentido das proposições ao final aprovadas e de que não há direito adquirido à manutenção de regime jurídico anterior.
6. Pedido de medida cautelar parcialmente deferido.” (grifou-se.)
(STF, Pleno, ADIn 2.135 MC/DF, Rel. Min. Ellen Gracie, j. 02.08.2007, v.m, DJe 06.03.2008.)
17.
Dessa forma, ressalvadas as situações jurídicas consolidadas sob a égide da EC
19/98, é inafastável, para os Conselhos de Fiscalização Profissional, na qualidade de autarquias,
a obrigatoriedade de adoção do regime jurídico único disciplinado pelos artigos 37 e seguintes
da Constituição Federal e pela lei 8.112/90, sendo relevante destacar para o caso em tela, a
obrigatoriedade de contratar mediante prévio concurso público.
18.
Nesse sentido, é pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:
“AGRAVO REGIMENTAL NO MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO.
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. NATUREZA JURÍDICA. AUTARQUIA FEDERAL. EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO. OBSERVÂNCIA DO ART. 37, II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. FISCALIZAÇÃO. ATIVIDADE TÍPICA DO ESTADO. PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO DA CONFIANÇA LEGÍTIMA. ANÁLISE. AGRAVO REGIMENTAL PROVIDO PARA RESTAURAR O DEVIDO PROCESSAMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA E POSSIBILITAR UM MELHOR EXAME DA MATÉRIA.
1. Os conselhos de fiscalização profissional têm natureza jurídica de autarquias, consoante decidido no MS 22.643, ocasião na qual restou consignado que: (i) estas entidades são criadas por lei, tendo personalidade jurídica de direito público com autonomia administrativa e financeira; (ii) exercem a atividade de fiscalização de exercício profissional que, como decorre do disposto nos artigos 5º, XIII, 21, XXIV, é atividade tipicamente pública; (iii) têm o dever de prestar contas ao Tribunal de Contas da União (art. 71, II, CRFB/88).
2. Os conselhos de fiscalização profissional, posto autarquias criadas por lei e ostentando personalidade jurídica de direito público, exercendo atividade tipicamente pública, qual seja, a fiscalização do exercício profissional, submetem-se às regras encartadas no artigo 37, inciso II, da CRFB/88, quando da contratação de servidores. Precedente: RE 539.224, 1ª Turma Rel. Min. Luiz Fux, DJe.- 18/06/2012.
3. A fiscalização das profissões, por se tratar de uma atividade típica de Estado, que abrange o poder de polícia, de tributar e de punir, não pode ser delegada (ADI 1.717), excetuando-se a Ordem dos Advogados do Brasil (ADI 3.026).
4. In casu, está em discussão tese relacionada à contratação dos impetrantes, ocorrida há mais de 10 (dez) anos, e a alegação de desrespeito ao processo de seleção e às regras constitucionais
aplicáveis (art. 37, II, CRFB/88), fatos que tornam imperativa a análise mais apurada do mandado de segurança, sobretudo em decorrência do princípio da proteção da confiança legítima.
5. Agravo regimental provido apenas para possibilitar um melhor exame do mandado de segurança e facultar às partes a oportunidade de sustentação oral.” (grifou-se.)
(STF, 1ª Turma, MS 28.469 AgR-segundo/DF, Rel. Min. Luiz Fux, j. 19.02.2013, v.u, DJe 09.05.2013.)
19.
Outrossim, segue a mesma linha a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
“AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. PRETENSÃO DE PREQUESTIONAMENTO DE DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. INADMISSIBILIDADE. CONSELHOS DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. NATUREZA JURÍDICA. AUTARQUIAS CORPORATIVAS. REGIME JURÍDICO DE CONTRATAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS. CONVERSÃO DO REGIME CELETISTA PARA O ESTATUTÁRIO. INCIDÊNCIA DA LEI Nº 8.112/90. DEMISSÃO IRREGULAR. NECESSIDADE DE PRÉVIO PROCESSO ADMINISTRATIVO. INAPLICABILIDADE DA LEI Nº 9.649/98.
1. Não há vício consistente em omissão, contradição ou obscuridade quando o Tribunal de origem decide, fundamentadamente, todas as questões postas ao seu crivo. O mero inconformismo da parte com o julgamento contrário à sua pretensão não caracteriza falta de prestação jurisdicional. 2. Não cabe a esta Corte Superior, na via especial, a análise de violação a dispositivos constitucionais, ainda que com o objetivo de prequestionamento visando à interposição do apelo extraordinário, sob pena de haver a usurpação de competência do Supremo Tribunal Federal. 3. Este Tribunal Superior consagrou o entendimento de que, por força no disposto no Decreto-Lei nº 968/69, o regime dos funcionários dos Conselhos de Fiscalização de Profissões era o celetista. Após a Constituição Federal de 1988 e com o advento da Lei nº 8.112/90, foi instituído o regime jurídico único, sendo os funcionários dessas autarquias alçados à condição de estatutários, situação que perdurou até a Emenda Constitucional nº 19/98 e a entrada em vigor da Lei nº 9.649/98, a qual instituiu novamente o regime celetista.
4. No julgamento da ADI nº 1.717/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do art. 58 e seus §§ 1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º, da Lei nº 9.649/98, afirmando que os conselhos de fiscalização profissional possuem natureza de autarquia de regime especial, permanecendo incólume o art. 58, § 3º, que submetia os empregados desses conselhos à legislação trabalhista.
5. Posteriormente, no julgamento da ADI nº 2.135 MC/DF, foi suspensa a vigência do caput do art. 39 da Constituição Federal, com a redação dada pela EC nº 19/98. Dessa forma, subsiste, atualmente, para a Administração Pública direta, autárquica e fundacional, a obrigatoriedade de adoção do regime jurídico único, ressalvadas as situações consolidadas na vigência da legislação editada nos termos da aludida emenda declarada suspensa.
6. No caso dos autos, a autora foi admitida pelo Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Estado do Rio de Janeiro por concurso público em 1º/3/1965, pelo regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), e, com o advento da Lei nº 8.112/1990, passou à condição de servidora pública federal estatutária, de modo que não poderia ter sido demitida e 6/3/1997 sem a observância das regras estatutárias então vigentes.
7. Agravo regimental a que se nega provimento.” (grifou-se.)
(STJ, 5ª Turma, AgRg no REsp 1.164.129/RJ, Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 05.02.2013, v.u, DJe 15.02.2013.)