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A importância do inquérito policial sob a perspectiva de sua (in)dispensabilidade

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA GABRIEL DOS SANTOS MIGUEL

A IMPORTÂNCIA DO INQUÉRITO POLICIAL SOB A PERSPECTIVA DE SUA (IN) DISPENSABILIDADE

Araranguá 2020

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GABRIEL DOS SANTOS MIGUEL

A IMPORTÂNCIA DO INQUÉRITO POLICIAL SOB A PERSPECTIVA DE SUA (IN) DISPENSABILIDADE

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Renan Cioff de Sant’Ana, Esp.

Araranguá 2020

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GABRIEL DOS SANTOS MIGUEL

A IMPORTÂNCIA DO INQUÉRITO POLICIAL SOB A PERSPECTIVA DE SUA (IN) DISPENSABILIDADE

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado à obtenção do título de Bacharel em Direito e aprovado em sua forma final pelo Curso de Graduação em Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Araranguá, 16 de dezembro de 2020.

______________________________________________________ Professor e orientador Renan Cioff de Sant’Ana, Esp.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Prof. Laércio Machado Júnior, Me.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Prof. Chesman Pereira Emerim Júnior, Esp.

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A Deus, primeiramente, que por seu Filho e por sua Mãe, Nossa Senhora, me concederam a graça de estar onde estou. À minha família e ao meu Amor, Carolini. Por fim, a um grande amigo, André da Silva Ronchi, in memoriam.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, principalmente, a Deus por me proporcionar a vida.

À minha família, que me apoiou desde o primeiro dia de aula, sempre com um olhar de orgulho e amor incondicional.

À minha namorada, minha maior incentivadora, pois foi quem me mostrou qual caminho seguir quando não havia mais opções.

Aos meus professores que caminharam comigo nesta jornada, em especial, ao meu orientador por compartilhar seu conhecimento na elaboração deste trabalho.

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“Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados” (Evangelho de Mateus, 5: 6).

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RESUMO

Este trabalho de conclusão de curso trata do estudo do inquérito policial, com ênfase na discussão doutrinária quanto à sua importância na persecução penal, bem como, sua necessidade para um processo criminal democrático. Tem como objetivo principal trazer à tona os posicionamentos doutrinários e dar voz à doutrina minoritária que milita em favor do referido procedimento. Possui, ainda, como objetivos específicos, analisar minunciosamente as nuances do inquérito policial e da investigação criminal, assim como questionar o emprego de investigações por parte do Ministério Público. A metodologia empregada refere-se a uma pesquisa bibliográfica e documental. As principais conclusões obtidas foram que se faz necessário mudar a forma como o instituto é lecionado e abrir campos para que novas correntes, como a apresentada no trabalho, tenham cada vez mais relevância no campo acadêmico e prático.

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ABSTRACT

This course conclusion paper deals with the study of police investigation with emphasis on doctrinal discussion regarding its importance in criminal prosecution, as well as its need for a democratic criminal process. The objective was to highlight the doctrinal positions and give voice to the minority doctrine that militates in favor of the referred procedure. While the specific objectives were to scrutinize the nuances of the police investigation and that of the criminal investigation, as well as to question the use of investigations by the Public Ministry. The methodology applied was bibliographic and documentary research. The main conclusions were that it is necessary to change the way in which the institute is taught, as well as to open fields so that new currents, such as the one presented in the work, are increasingly relevant in the academic and practical field.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 10

2 SISTEMAS PROCESSUAIS PENAIS E INQUÉRITO POLICIAL ... 12

2.1 SISTEMAS PROCESSUAIS PENAIS... 12

2.1.1 Sistema inquisitorial ... 12

2.1.2 Sistema acusatório ... 13

2.1.3 Sistema misto ou francês ... 14

2.2 INQUÉRITO POLICIAL ... 14 2.2.1 Conceito ... 14 2.2.2 Natureza jurídica ... 15 2.2.3 Características ... 16 2.2.3.1 Escrito ... 16 2.2.3.2 Sigiloso ... 16 2.2.3.3 Oficialidade ... 17 2.2.3.4 Oficiosidade ... 17 2.2.3.5 Inquisitório ... 18 2.2.3.6 Dispensável ... 18 2.2.4 Finalidade ... 19 2.2.5 Competência (atribuição) ... 20 2.2.5.1 Critério territorial... 20 2.2.5.2 Critério material ... 21 2.2.6 Evolução histórica ... 22

2.2.7 Investigação criminal pelo mundo ... 23

2.2.7.1 Estados Unidos da América ... 23

2.2.7.2 Inglaterra e País de Gales ... 24

2.2.8 Inquérito policial no sistema penal brasileiro ... 24

3 DA (IN) DISPENSABILIDADE DO INQUÉRITO POLICIAL ... 27

3.1 IMPORTÂNCIA DO INQUÉRITO POLICIAL ... 27

3.2 INVESTIGAÇÕES CRIMINAIS REALIZADAS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO .. 29

3.2.1 Doutrina a favor do poder investigatório ministerial ... 29

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3.2.3 Posição do Supremo Tribunal Federal sobre o tema ... 34

3.3 ENTENDIMENTO DA DOUTRINA MODERNA ... 38

3.3.1 Moderno conceito do inquérito policial ... 38

3.3.1.1 Processo administrativo ... 39 3.3.1.2 Delegado natural ... 39 3.3.1.3 Apuratório ... 40 3.3.1.4 Informativo e probatório ... 41 3.3.1.5 Preservador e preparatório ... 43 3.3.1.6 Indispensável ... 44 4 CONCLUSÃO ... 49 REFERÊNCIAS ... 51

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1 INTRODUÇÃO

O inquérito policial é o principal instrumento de investigação criminal utilizado em nosso ordenamento jurídico. O referido procedimento, é presidido por delegados de polícia de carreira, integrantes da Polícia Civil dos Estados ou da Polícia Federal.

Contudo, o referido procedimento se justifica diante da imensa quantidade de crimes perpetuados em nosso país, servindo, assim, como um filtro processual, a fim de que só vá a julgamento fatos relevantes e seus autores, sem qualquer tipo de parcialidade, preservando direitos e garantias fundamentais.

O presente trabalho traz à baila questões pertinentes aos operadores do Direito, dado que, existindo uma maior atenção à importância do inquérito policial, por meio de estudos mais aprofundados sobre o tema, tem-se uma maior amplitude de proteção de direitos, tornando nossa persecução penal menos morosa e seletiva.

Assim, o principal objetivo deste trabalho é demonstrar e difundir a importância do inquérito policial no sistema de justiça criminal, criando e ampliando o palco para debates no meio acadêmico sobre o tema, à luz da moderna doutrina.

Além disso, tem-se como objetivo secundário analisar o papel do Ministério Público na investigação criminal, bem como demonstrar os principais apontamentos doutrinários sobre o tema.

Neste trabalho, utilizaram-se diversas fontes doutrinárias, por meio de livros, artigos e periódicos e meio eletrônico, tal como jurisprudência pertinente ao tema e a legislação vigente.

O método utilizado fora o dedutivo, o qual norteou o estudo doutrinário, chegando até o resultado.

Desse modo, o presente trabalho foi dividido em dois capítulos, os quais foram suficientes para abarcar todo o tema com a devida profundidade. No primeiro capítulo, introduzir-se-á o estudo ao inquérito policial e o segundo aprofundará a indispensabilidade do instituto em nosso ordenamento.

No primeiro capítulo, discorrer-se-á sobre os sistemas processuais penais e suas particularidades, bem como o conceito de inquérito policial, natureza jurídica,

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suas características, finalidade e competência, tal como a evolução histórica do inquérito policial.

No segundo e derradeiro capítulo, adentrar-se-á no cerne do trabalho, introduzindo o moderno conceito e a importância do inquérito policial. Também será abordada a discussão da investigação criminal executada pelo Ministério público e concluindo com a posição doutrinária sobre a indispensabilidade do referido procedimento.

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2 SISTEMAS PROCESSUAIS PENAIS E INQUÉRITO POLICIAL

2.1 SISTEMAS PROCESSUAIS PENAIS

2.1.1 Sistema inquisitorial

O surgimento deste sistema se deu por volta do século XIII, com o Direito canônico se propagando pela Europa ocidental rapidamente, tendo como principais premissas o fato de o poder concentrar-se em apenas um indivíduo, ou seja, o juiz inquisidor, o qual tinha por função investigar, acusar e julgar o réu (LIMA, 2017, p. 38).

Desse modo, garantias importantes para que haja um processo justo são distanciadas do julgamento, tais como contraditório e ampla defesa, bem como a imparcialidade do juiz, além de que o réu preso em função do processo era considerado incomunicável (LIMA, 2017, p. 38).

No Brasil, esse sistema ainda é visto em nosso Código de Processo Penal, o qual é datado de 1941, tendo inspiração no direito italiano, que elevava a figura do juiz a um patamar de superioridade hierárquica às partes, sem qualquer preservação de sua imparcialidade.

Távora e Alencar (2017, p. 55) explicam a influência desse sistema no direito processual penal brasileiro:

O código então centralizou no juiz a gestão da prova, com a possibilidade de sua duração sem necessidade de provocação das partes, conferindo-lhe poderes como os de iniciar ação penal através do procedimento denominado judicialiforme (sem observar o princípio ne procedat iudex ex

officio), de controlar a função investigatória mediante a fiscalização do

inquérito policial e de modificar não só a capitulação dada ao fato imputado pelo Ministério Público (emendatio libeli), mas também o de tomar a iniciativa para dar novo enquadramento jurídico ao fato narrado, provocando o órgão acusatório a aditar a inicial (mutatio libeli).

Por sua vez, pode-se aferir que as características do sistema inquisitório persistiram em nosso ordenamento, mesmo após reformas ocorridas no ano de 2008, como o art. 156, inciso I, do CPP, no que tange ao poder do juiz de ordenar a

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produção de prova a qual, no seu entendimento, seja viável para aferição dos fatos (TÁVORA; ALENCAR, 2017, p. 55).

Vejamos o que ensina o art, 156, I, do CPP:

Art. 156. A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício:

I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida;

[...] (BRASIL, CPP, 2020).

2.1.2 Sistema acusatório

Doutro norte, este sistema tira do poder do juiz a produção probatória e deixa com as partes a função provar o alegado. A iniciativa probatória do juiz mostra-se passiva, com o intuito de aflorar a imparcialidade, deixando com que as partes elejam as provas, ficando o juiz em segundo plano quanto a isso, mediando o feito por meio de sua atividade instrutória (LIMA, 2017, p. 40).

Lima (2017, p. 40) ainda acrescenta que:

No sistema acusatório, a gestão das provas é função das partes, cabendo ao juiz um papel de garante das regras do jogo, salvaguardando direitos e liberdades fundamentais. Diversamente do sistema inquisitorial, o sistema acusatório caracteriza-se por gerar um processo de partes, em que autor e réu constroem através do confronto a solução justa ao caso penal. A separação das funções processuais de acusar, defender e julgar entre sujeitos processuais distintos, o reconhecimento dos direitos fundamentais ao acusado, que passa a ser sujeito de direitos e a construção dialética da solução do caso pelas partes, em igualdade de condições, são, assim, as principais características desse modelo.

Visto isso, é de fácil percepção que o sistema acusatório se contrapõe ao inquisitorial, trazendo mais garantia para as partes, retirando da esfera do juiz o ônus probatório, tornando o processo mais justo.

Um exemplo desse procedimento, se deu na reforma do Código de Processo Penal ocorrida pela Lei 13.964/19, o qual retirou do juiz a possibilidade de decretar a prisão preventiva de offício, devendo haver requerimento do Ministério Público, do ofendido ou representação da autoridade policial.

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2.1.3 Sistema misto ou francês

Esse sistema surgiu por influência da Revolução Francesa em conjunto de movimentos sociais da época, espalhando-se por toda Europa continental (TÁVORA; ALENCAR, 2017, p. 56).

Segundo Lima (2017, p. 41), o sistema misto é subdividido em duas fases:

É chamado de sistema misto porquanto o processo se desdobra em duas fases distintas: a primeira fase é tipicamente inquisitorial, com instrução escrita e secreta, sem acusação e, por isso, sem contraditório. Nesta, objetiva-se apurar a materialidade e a autoria do fato delituoso. Na segunda fase, de caráter acusatório, o órgão acusador apresenta a acusação, o réu se defende e o juiz julga, vigorando, em regra, a publicidade e a oralidade.

Segundo Távora e Alencar (2017, p. 57), o sistema misto ou francês contém as seguintes características:

(a) investigação preliminar, a cargo da polícia judiciária; (b) instrução preparatória, patrocinada pelo juiz instrutor; (c) julgamento: só este último, contudo, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. (d) recurso: normalmente há o "recurso de cassação", no qual se impugnam apenas as questões de direito, mas também é possível o "recurso de apelação", no qual são impugnadas as questões de fato e de direito

Assim, percebe-se que esse sistema se aproxima do inquisitivo, mas também se diferencia, por garantir mais direitos as partes. Em contrapartida, traz consigo, na fase investigativa, resquícios do sistema inquisitivo.

Portanto, diante de características e similitudes, é denominado de misto.

2.2 INQUÉRITO POLICIAL

2.2.1 Conceito

O Inquérito policial é um instrumento utilizado pelo sistema de justiça criminal com o fim de elucidar fatos criminosos em busca de angariar elementos de prova e indícios suficientes de autoria delitiva.

Assim, Capez (2012, p. 111) nos ensina que:

É o conjunto de diligências realizadas pela polícia judiciária para a apuração de uma infração penal e de sua autoria, a fim de que o titular da ação penal possa ingressar em juízo (CPP, art. 4º). Trata-se de

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procedimento persecutório de caráter administrativo instaurado pela autoridade policial. Tem como destinatários imediatos o Ministério Público, titular exclusivo da ação penal pública (CF, art. 129, I), e o ofendido, titular da ação penal privada (CPP, art. 30); como destinatário mediato tem o juiz, que se utilizará dos elementos de informação nele constantes, para o recebimento da peça inicial e para a formação do seu convencimento

quanto à necessidade

de decretação de medidas cautelares.

O instituto, ora estudado, tem fundamental importância para a conjuntura jurídica de uma sociedade, pautada e estruturada em um estado democrático de direito.

No Brasil, o inquérito policial fica a cargo da polícia judiciária, a qual é representada, no âmbito Federal, pela Polícia Federal e, no âmbito estadual, pelas Polícias Civis, dirigidas e conduzidas por delegados de polícia de carreira.

A corrente majoritária costuma classificar o inquérito policial quanto a sua natureza jurídica, suas características, e quanto sua finalidade.

2.2.2 Natureza jurídica

Sobre a natureza jurídica do inquérito policial, Lima (2017, p. 105) conceitua como:

[...] procedimento de natureza administrativa. Não se trata, pois, de processo judicial, nem tampouco de processo administrativo, porquanto dele não resulta imposição direta de nenhuma sanção. Nesse momento, ainda não há o exercício de pretensão acusatória. Logo, não se pode falar em partes stricto sensu, já que não existe uma estrutura processual dialética, sob a garantia do contraditório e da ampla defesa.

Lopes Junior (2013, p. 46) esclarece que:

Quanto à natureza jurídica do inquérito policial, vem determinada pelo sujeito e pela natureza dos atos realizados, de modo que deve ser considerado como um procedimento administrativo pré-processual. A atividade carece do mando de uma autoridade com potestade jurisdicional e por isso não pode ser considerada como atividade judicial e tampouco processual, até porque não possui a estrutura dialética do processo.

Destarte, podemos concluir que segundo a doutrina clássica, o inquérito policial não pode ser equiparado a um processo judicial, visto que não observa algumas garantias processuais, tampouco impõe sanção de qualquer natureza, objetivando angariar elementos de provas para uma futura ação penal.

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2.2.3 Características

2.2.3.1 Escrito

A primeira de suas características é ser um procedimento escrito. Lima (2017, p. 112) elucida que:

De acordo com o art. 9º do CPP, todas as peças do inquérito policial serão, num só processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e, neste caso, rubricadas pela autoridade. Diante do teor desse dispositivo, discute-se na doutrina, acerca da possibilidade de se utilizar de recursos de gravação audiovisual no curso das investigações.

Desta forma, constata-se que as sequências dos atos praticados no inquérito devem ser documentadas no procedimento, garantindo maior segurança e garantia dos atos ali praticados.

Doutro norte, com o avanço da tecnologia, o procedimento policial vem sendo incrementado, para melhor eficiência e confiabilidade dos atos.

Podemos citar, como exemplo, os depoimentos prestados por sistema audiovisual (PCSC WebConf), assim como o Sistema Integrado de Segurança Pública (SISP), os quais reúnem elementos e informações compartilhados entre os órgãos de segurança pública.

2.2.3.2 Sigiloso

O inquérito policial deve ser sigiloso, ou seja, deve tramitar com o máximo de discrição para que nenhum elemento de prova seja prejudicado na busca da verdade.

Capez (2012, p. 117) dispõe o seguinte:

A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade (CPP, art. 20). O direito genérico de obter informações dos órgãos públicos, assegurado no art. 5º, XXXIII, da Constituição Federal, pode sofrer limitações por imperativos ditados pela segurança da sociedade e do Estado, como salienta o próprio texto normativo.

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Outrossim, cabe salientar que o sigilo do inquérito policial não é absoluto, cabendo sua relativização em caso de acesso pelo advogado do investigado, com ou sem procuração. No entanto, em caso de sigilo decretado judicialmente, deverá haver autorização judicial expressa de acesso, sendo em todos os casos, as diligências já documentadas (CAPEZ, 2012, p. 117).

2.2.3.3 Oficialidade

A investigação de um crime, não pode ficar fora do radar do Estado, não pode ocorrer por livre disposição do particular, exercendo o poder que é reservado à justiça (CAPEZ, 2012, p. 118).

Desse modo, toda investigação deve ser oficial, e sobre a oficialidade do inquérito policial, Capez ensina que “o inquérito policial é uma atividade investigatória feita por órgãos oficiais, não podendo ficar a cargo do particular, ainda que a titularidade da ação penal seja atribuída ao ofendido” (CAPEZ, 2012, p. 118).

2.2.3.4 Oficiosidade

A atuação da autoridade policial não depende de provocação nas ações penais públicas, tendo como base os princípios da obrigatoriedade, visto que, ao tomar conhecimento de qualquer ilícito penal, deverá instaurar inquérito policial, buscando a materialidade e autoria do fato criminoso (TÁVORA; ALENCAR, 2017, p. 150).

Sobre o tema, Távora e Alencar (2017, p. 150) afirmam que:

Havendo crime de ação penal pública incondicionada, a autoridade policial deve atuar de ofício, instaurando o inquérito e apurando prontamente os fatos, haja vista que, na hipótese, sua atuação decorre de imperativo legal (art. 5º, I, do CPP) dispensando, pois, qualquer autorização para agir.

No entanto, a característica de oficiosidade resta mitigada em casos em que o crime seja de ação penal privada e até mesmo em delitos que dependem de representação, haja vista que no primeiro deve haver autorização do querelante e no segundo a vítima deve representar contra o acusado (TÁVORA; ALENCAR, 2017, p. 151).

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O procedimento investigatório não pode ser arquivado pelo delegado de polícia, trazendo à baila sua indisponibilidade.

O art. 17, do Código de Processo Penal, traz expressamente essa característica quando diz que “A autoridade policial não poderá mandar arquivar autos de inquérito” (BRASIL, CPP, 2020).

2.2.3.5 Inquisitório

Assim sendo, podemos dizer que o inquérito é inquisitivo. Isso porque as atividades de investigação ficam a cargo de apenas uma autoridade que, com discricionariedade, conduz o procedimento, não necessitando, segundo a doutrina majoritária, de observar o contraditório e ampla defesa.

Capez (2012, p. 119) nos diz o seguinte sobre o poder inquisitivo do inquérito policial:

Caracteriza-se como inquisitivo, o procedimento em que as atividades persecutórias concentram-se nas mãos de uma única autoridade, a qual, por isso, prescinde, para a sua atuação, da provocação de quem quer que seja, podendo e devendo agir de ofício, empreendendo, com discricionariedade, as atividades necessárias ao esclarecimento do crime e da sua autoria. É característica oriunda dos princípios da obrigatoriedade e da oficialidade da ação penal. É secreto e escrito, e não se aplicam os princípios do contraditório e da ampla defesa, pois, se não há acusação, não se fala em defesa.

Assim, o delegado de polícia, de acordo com seu entendimento, não precisa acatar requerimentos da defesa do investigado, podendo indeferi-los, de acordo com a melhor persecução da prova.

2.2.3.6 Dispensável

Por fim, o ponto central desse trabalho gira em torno da característica que a doutrina alude como sendo a dispensabilidade do procedimento investigatório.

No momento, cabe trazer o que a doutrina majoritária leciona sobre o tema.

Távora e Alencar (2017, p. 153) constatam que:

Da leitura de dispositivos que regem a persecução penal preliminar, a exemplo art. 39, §5º, CPP, podemos concluir que o inquérito não é

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imprescindível para a propositura da ação penal. Se os elementos que venham a lastrar a inicial acusatória forem colhidos de outra forma, não se exige a instauração do inquérito. Tanto é verdade que a denúncia ou a queixa podem ter por base, como já ressaltado, inquéritos não policiais, dispensando-se a atuação de polícia judiciária. Contudo, se o inquérito for a base para a propositura da ação, este vai acompanhar a inicial acusatória apresentada (art. 12, CPP).

Porém, como veremos no próximo capítulo deste trabalho, a doutrina, por sua maioria, juízes e promotores, distorceu o conteúdo do referido artigo, tornando o que era para ser a exceção uma regra, a qual foi difundida por anos no meio acadêmico.

Ainda, Lima (2017, p. 113) contextualiza a intenção de menosprezar o procedimento investigatório conduzido pelo delegado de polícia. Vejamos:

Por sua vez, o art. 27 do CPP dispõe que qualquer pessoa do povo poderá provocar a iniciativa do Ministério Público, nos casos em que caiba a ação pública, fornecendo-lhe, por escrito, informações sobre o fato e a autoria e indicando o tempo, lugar e os elementos de convicção. Ora, se qualquer pessoa do povo é capaz de trazer ao órgão do Ministério Público os elementos necessários para o oferecimento da denúncia, não haverá necessidade de se requisitar a instauração do inquérito policial.

É de fácil percepção que a corrente majoritária milita em favor de maior atuação do órgão do Ministério Público no âmbito investigativo, trazendo para o campo de atuação das promotorias as tarefas de investigar e acusar, concentrando poder na mão de apenas uma autoridade, o que pode ser prejudicial a um processo que é abarcado pelo estado democrático de direito.

Dadas as primeiras tratativas sobre discussão deste trabalho, fica o aprofundamento do tema para o capítulo específico.

2.2.4 Finalidade

O inquérito policial tem por finalidade precípua a angariação de provas a fim de que se chegue à comprovação da materialidade e autoria de determinado delito, consubstanciando uma futura ação penal (LIMA, 2017, p. 105).

Para Lima (2017, p. 106):

A partir do momento em que determinado delito é praticado, surge para o Estado o poder-dever de punir o suposto autor do ilícito. Para que o Estado possa deflagrar a persecução criminal em juízo, é indispensável a presença de elementos de informação quanto à autoria e quanto à materialidade da

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infração penal. De fato, para que se possa dar início a um processo criminal contra alguém, faz-se necessária a presença de um lastro probatório mínimo apontando no sentido da prática de uma infração penal e da probabilidade de o acusado ser o seu autor.

Apenas pela análise de sua finalidade, já se pode aferir a importância desse procedimento em um processo, pois o inquérito é o garantidor de direitos fundamentais, tanto da vítima como de um suposto autor, dando mais segurança aos operadores do direito ao aplicar a norma penal ao caso concreto.

Desse modo, o inquérito policial acaba por dirimir dúvidas da integridade das provas produzidas, as quais plainam um fato criminal, sendo conduzido por um órgão imparcial, que não tem interesse na causa, mas sim na verdade real.

2.2.5 Competência (atribuição)

Não obstante o art. 4º do Código de Processo Penal expressar a ideia de que o delegado de polícia possui competência, o mais correto, no ponto de vista interpretativo, é que a autoridade policial possui atribuição, visto que a matéria afeta à competência, refere-se ao magistrado da causa (TÁVORA; ALENCAR, 2017, p. 154).

Quando se fala em competência ou atribuição no inquérito policial, pode-se valer dos pode-seguintes critérios:

2.2.5.1 Critério territorial

Segundo Távora e Alencar, “delegado com atribuição é aquele que exerce suas funções na circunscrição em que se consumou a infração (art. 4°, caput, CPP). Circunscrição significa a delimitação territorial na qual o delegado exerce as suas atividades” (TÀVORA; ALENCAR, 2017, p. 154).

Já para Lima (2017, p. 112):

[...] tem-se que, nos mesmos moldes como é fixada a competência territorial do juízo para processar e julgar o crime, a atribuição para as investigações também é determinada em virtude do local onde se consumou a infração penal, ou no caso de tentativa, com base no local em que foi praticado o último ato de execução. Assim, se um crime de competência da Justiça Estadual foi perpetrado na cidade de Sete Lagoas/MG, temos que a

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atribuição para investigá-lo recai sobre a autoridade policial da circunscrição a que pertencer o referido município.

Ainda, para o autor, mesmo o crime ocorrido dentro de sua circunscrição, nada impede de que a autoridade policial efetue diligências em outra circunscrição, porém, deve ser na mesma Comarca, senão deverá o delegado mandar expedir carta precatória para que seja realizada a diligência (LIMA, 2017, p. 154).

Nesse sentido, o Códex processual penal vigente, em seu art. 22 explica:

Art. 22. No Distrito Federal e nas comarcas em que houver mais de uma circunscrição policial, a autoridade com exercício em uma delas poderá, nos inquéritos a que esteja procedendo, ordenar diligências em circunscrição de outra, independentemente de precatórias ou requisições, e bem assim providenciará, até que compareça a autoridade competente, sobre qualquer fato que ocorra em sua presença, noutra circunscrição (BRASIL, CPP, 2020).

2.2.5.2 Critério material

Pelo critério material, é importante primeiro distinguir qual polícia judiciária possui atribuição para apurar determinado crime.

Para isso, o art. 144 da Constituição Federal nos dá uma noção, vejamos:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: I - polícia federal;

[...]

§ 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a:

I - apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei;

II - prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos nas respectivas áreas de competência;

III - exercer as funções de polícia marítima, aérea e de fronteiras;

III - exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras;

IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União. [...]

§ 4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia

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judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares (BRASIL, CRFB. 2020).

Ademais, após feita esta distinção, pode-se delimitar a competência no que tange a natureza das infrações penais, as quais são de responsabilidade de “delegacias especializadas na investigação e no combate a determinado tipo de infração, a exemplo das delegacias especializadas em homicídios, entorpecentes, furtos e roubos, etc.” (TÁVORA; ALENCAR, 2017, p. 154).

2.2.6 Evolução histórica

Apesar de ser bem ampla a discussão da origem histórica do inquérito policial, deve-se ter em conta que a época romana foi de fundamental importância para o desenvolvimento do direito. Em Roma, a investigação era realizada por agentes do Estado Romano, no entanto, não se via um procedimento justo, mas sim eivado de arbitrariedades, bastando que houvesse uma denúncia, legítima ou não, para que se iniciasse a investigação, a qual era denominada “inquisitivo” (ALMEIDA, 2012, p. 1).

Almeida (2012, p. 1) ainda traz à baila que o sistema de polícia judiciária que conhecemos hoje é inspirado e derivado das evoluções romanas de lidar com ilícitos, conforme se depreende a seguir:

Ao longo do tempo, houve, com a evolução do sistema penal, a especialização e, consequentemente, a divisão das funções necessárias à aplicação da Justiça Criminal. Nesse contexto, surgiu em Roma um grupo de funcionários incumbidos de fazerem o levantamento das circunstâncias dos fatos e da sua autoria, pelo denominado “Cognitio Extra Ordinem”. Tal sistema serviu de base para as Polícias Judiciárias existentes em todo o mundo, devido à independência do sistema de apurações, pois, segregado, mostrou-se mais eficiente. Essa divisão ainda trouxe, também, maiores e melhores garantias aos direitos fundamentais do ser humano, ainda mais quando os investigados eram vítimas de denúncias infundadas ou até mesmo inverídicas.

Outrossim, Walkmer (2006, p. 199) apresenta o inquérito implantado na época da inquisição, quando o domínio do sistema penal era da Igreja Católica:

As evidências do crime eram investigadas e avaliadas mediante regras meticulosamente formuladas, o que dava ao processo de inquérito o caráter de racionalidade, que fazia com que os padrões de prova, nesse tipo de processo, fossem extremamente rigorosos. Toda uma tradição de direito romano-canônico prescrevia exatamente a natureza e a eficácia da prova.

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As provas dividiam-se em: diretas, indiretas, manifestas, imperfeitas ou, ainda, as provas plenas (testemunho ocular de duas pessoas), indícios próximos (chamados de provas semiplenas) e os indícios longínquos (opinião pública, má fama do suspeito, etc.) (WALKMER, 2006, p. 199).

A partir desse momento, surgem os chamados juízes inquisidores, tornando o processo de investigação bastante rígido, pois as funções de investigar, acusar e julgar estavam concentradas nos juízes e nos oficiais dos tribunais. O procedimento era regido de forma sigilosa e restrita, não trazendo qualquer garantia de direitos aos investigados (WOLKMER, 2006, p. 198).

Remetendo-se aos séculos XVII e XIX, destaca-se o surgimento de pequenos corpos de investigadores na França e na Inglaterra, pois, devido ao aumento de crimes consequentes da expansão econômica que Revolução Industrial trouxe, nasceu a necessidade de reprimir os crimes que estavam acontecendo, por meio de saberes investigativos, os quais são empregados até os dias de hoje, inclusive, sendo base, também, ao sistema de polícia judiciária difundido pelo mundo (BRAGA, 2007, p. 1).

2.2.7 Investigação criminal pelo mundo

2.2.7.1 Estados Unidos da América

O sistema penal americano se diferencia dos demais, porque possui diversos aspectos que influenciam no andar de uma investigação criminal.

A fase investigativa é conduzida pela polícia, mas com participação ativa do órgão acusador (CABRAL, 2009, p. 1).

Segundo Stafusa (2017, p. 1), o órgão acusador, no sistema estadunidense, tem grande protagonismo, devido a estar ligado ao caso desde o princípio da investigação até a futura ação penal, tendo poder de barganha para “negociar” a pena e as condições do processo.

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2.2.7.2 Inglaterra e País de Gales

O sistema de investigação criminal inglês determina que a função de apurar as infrações penais é da polícia, de modo que a condução, a coleta de informação e a formação do conjunto probatório ficam a cargo do referido órgão (AMARAL, 2019, p. 274).

Conforme afirma Amaral (2019, p. 274):

Desta forma, na Inglaterra e no País de Gales, a polícia possui a direção da investigação criminal e não atua sob a comando do juiz ou do órgão acusador na apuração de delitos, os quais não estão autorizados a dirigirem as atividades da polícia.

O autor ainda exprime que a polícia, quando conduz a investigação criminal, vê-se como um terceiro isento, sem subordinação ao magistrado, muito menos ao órgão acusador, tornando um procedimento imparcial, com o objetivo de buscar a verdade por meio das provas, as quais podem ser benéficas tanto para acusação quanto para a defesa (AMARAL, 2019, p. 274).

O inquérito policial inglês pode ser divido em etapas, sendo a primeira chamada de provocação, em que o órgão policial toma ciência do cometimento de algum crime, logo em seguida vem a apuração inicial, servindo para confirmar a veracidade das informações. Após a etapa de apuração inicial, ocorre a etapa na qual é analisada a necessidade de continuação da investigação ou de seu encerramento. Tendo a investigação prosseguido, o investigador responsável irá traçar os planos para investigação de acordo com a melhor técnica para que se chegue à autoria e materialidade do crime (AMARAL, 2019, p. 275).

Verifica-se de plano, que o sistema de persecução penal inglês é o que se encaixa ao que a doutrina moderna brasileira, encabeçada por delegados de polícia, tenta introduzir em nosso ordenamento, atribuindo mais autonomia e importância ao inquérito policial.

2.2.8 Inquérito policial no sistema penal brasileiro

Em 1832, com o Código de Processo instituído, surge, no Brasil, o primeiro resquício do inquérito policial e os sistemas de investigação criminal. Na

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época, existiam espécies de Inspetores de Quarteirões, os quais não eram policiais nem exerciam atividade policial (PICOLIN, 2020, p. 1).

O autor supramencionado desvenda o surgimento do primeiro conceito de inquérito policial no ordenamento jurídico brasileiro:

No entanto, com a Lei nº 2.033, de 20/09/1871, regulamentada pelo Decreto nº 14.824, de 28/11/1871 (art. 4º, § 9º), surgiu, entre nós o Inquérito Policial com essa denominação, sendo que o artigo 42 da referida lei chegava inclusive a defini-lo: "O Inquérito Policial consiste em todas as diligências necessárias para o desenvolvimento dos fatos criminosos, de suas circunstâncias e de seus autores e cúmplices, devendo ser reduzido a instrumento escrito" (PICOLIN, 2020, p. 1).

Com a promulgação da Constituição de 1937, instituiu-se o Código de Processo Penal de 1941, reafirmando o instituto do inquérito policial, conforme ensina Romeiro (1978, p. 48):

A Constituição de 1934 restaurou a unidade legislativa processual da União, o que se fez ratificado pela Constituição de 1937, providenciando-se em seguida a promulgação do atual Código de Processo Penal (Decreto Lei n.º 3.689 de 30 de outubro de 1941), bem como da Lei de Introdução ao Código de Processo Penal Decreto Lei 3.931 de 11 de dezembro de 1941), esta destinada a adaptar a nova legislação aos processos pendentes. O novo Código manteve o Inquérito Policial, configurando-o tal como fora herdado do Império, mas estabeleceu a instrução plenamente contraditória e separou de vez as funções acusatória e julgadora, eliminando quase por completo o procedimento ex offício, que só permaneceu para as contravenções, restando por restringir, ainda mais, a competência do júri, traçando enfim todas as formas procedimentais sob fiel observância do sistema acusatório, à despeito de conviver com procedimentos especiais sob o império do processo inquisitivo e sem garantias para os acusados, à exemplo do que se fazia no Tribunal de Segurança (Lei n.º 244/36), ao amparo da Constituição Federal de 1937.

Assim, seguiu-se até a atual constituição de 1988, que consolidou o inquérito policial instituído no Código de Processo Penal de 1941, porém com diversas reformas as quais inovaram nos direitos e garantias do referido procedimento.

A base constitucional do inquérito policial se concentra no art. 144 da Constituição Federal, que assim dispõe:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: I - polícia federal;

II - polícia rodoviária federal; III - polícia ferroviária federal; IV - polícias civis;

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V - polícias militares e corpos de bombeiros militares. VI - polícias penais federal, estaduais e distrital.

§ 1º - A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, estruturado em carreira, destina-se a:

§ 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a:

I - apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei;

II - prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos nas respectivas áreas de competência;

III - exercer as funções de polícia marítima, aérea e de fronteiras;

III - exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras; IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União. [...] (BRASIL, CRFB, 2020).

No que se tem da legislação infraconstitucional, o art. 4º do Código de Processo Penal expõe:

Art. 4º A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá, por fim, a apuração das infrações penais e da sua autoria (BRASIL, CPP, 2020).

Com efeito, o inquérito policial, na atualidade, está presente em diversas legislações de nosso ordenamento jurídico, cumprindo seu papel de garantidor de direitos.

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3 DA (IN) DISPENSABILIDADE DO INQUÉRITO POLICIAL

3.1 IMPORTÂNCIA DO INQUÉRITO POLICIAL

Como já mencionado quando falado de seu conceito, é de fundamental importância o inquérito policial no sistema processual brasileiro.

Isso porque é garantidor dos direitos fundamentais assegurados constitucionalmente que, por meio de sistemas de investigação, impede acusações infundadas, clareando fatos e, consequentemente, evitando processos penais temerários fadados ao insucesso, bem como ao desperdício de dinheiro público.

Carvalho (2007, p. 1) é direto ao defender que “dada a importância dessa atividade de polícia judiciária, não tem mais como sustentar que o Inquérito Policial é uma mera peça de informação”. Assim, ao se estudar a fundo este tema, pode-se verificar que não é um procedimento simples e descartável, como trata a doutrina tradicional, mas sim um grande instrumento de justiça social.

Podemos verificar um exemplo que pode ter não só o inquérito policial, mas atividade de polícia judiciária quando exercida pelo delegado de polícia, que é o reconhecimento do crime bagatelar pela autoridade policial no momento da apresentação do flagrante.

O princípio da insignificância, em apertada síntese, é aplicado quando determinadas condutas não são capazes de lesionar o bem jurídico, apesar de, formalmente, parecer afetar, dessa forma, excluindo a tipicidade material, consequentemente, excluindo o crime.

Sobre esse tema, Carvalho (2007, p. 1) explana:

Doutrinariamente se tem discutido acerca da aplicação ou não do princípio da bagatela dentro dessa fase policial, vez que não se justifica a movimentação da máquina estatal quando a lesão ao bem jurídico protegido é irrisória ou insignificante. Certamente deverá o Delegado de Policial, na condição de aplicador do Direito, fazer valer o bom senso, a equidade, podendo sim, mesmo diante da falta de aparato doutrinário, deixar de lavrar um eventual auto de prisão em flagrante em razão de um furto, por exemplo, de um aparelho de barbear ou uma caneta. Não há, nesses modestos exemplos, s.m.j, violação a nenhum bem jurídico capaz de levar alguém ao cárcere.

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Desse modo, como bem diz o autor acima citado, a autoridade policial tanto pode como deve não lavrar o Auto de Prisão em Flagrante em casos como o de um furto de desodorante em uma farmácia.

Outra discussão importante é a análise pelo delegado de polícia das causas excludentes de antijuridicidade. A doutrina majoritária entende que não cabe à autoridade policial a verificação dos requisitos de configuração de um crime, tendo para isso momento adequado, a fase processual. De outra maneira, a corrente moderna, ainda minoritária, entende que o delegado tem capacidade jurídica para a verificação desses casos, com vista à celeridade e economia processual (CARVALHO, 2007, p. 1).

A doutrina contemporânea acredita que a autoridade policial não pode fechar os olhos diante das causas de antijuridicidade e culpabilidade.

Castro (2016, p. 1) salienta que “para conduzir com êxito o procedimento policial, a autoridade de polícia judiciária faz diversas análises técnico-jurídicas (artigo 2º, parágrafos 1º e 6º da Lei 12.830/13), prognósticas ou diagnósticas”, ou seja, a autoridade é instada a tomar decisões no âmbito de uma investigação de acordo com o andamento dos fatos e pelo que lhe é apresentado.

Ainda, Castro (2016, p. 1) manifesta que “análise dos requisitos do crime insere-se no contexto do juízo de diagnose, especialmente no momento da decisão sobre a custódia flagrancial”, isso quer dizer que a prisão em flagrante, por exemplo, deve ser afastada quando constatada a existência de justificante ou dirimente.

Por fim, destacamos as investigações dos crimes de colarinho branco

(White-collar crime), sendo a “operação lava jato” uma grande aliada ao combate à

corrupção e, consequentemente, instrumento para o retorno de aproximadamente 13 bilhões de reais aos cofres públicos, demonstrando a sociedade a importância de uma investigação criminal pautada na imparcialidade e munida da melhor estrutura pessoal e tecnológica para que se chegue ao fim esperado.

Assim, podemos concluir que a participação técnica do delegado de polícia no procedimento investigatório mostra-se eficiente frente às demandas da sociedade, sendo garantidor de direitos e trazendo celeridade ao procedimento judiciais, bem como benefícios aos cofres públicos.

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3.2 INVESTIGAÇÕES CRIMINAIS REALIZADAS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

No Brasil, entende-se que a investigação criminal não é de exclusividade das polícias judiciárias devido ao texto normativo da Constituição Federal não trazer um conceito exato de investigação criminal (MANDRIGAL, 2017, p. 1).

Mandrigal classifica a investigação criminal em uma tríplice, sendo elas a; Investigação criminal pura, a investigação criminal prevista na carta magna e atribuída às Polícias Federal e Polícias Civis, pois é o padrão estabelecido no país; ainda, traz a investigação criminal derivada, sendo essa exceção do padrão utilizado no Brasil, porém com matriz também constitucional, podendo citar como exemplo as investigações militares e as comissões parlamentares de inquérito; Por fim, a investigação criminal impura seria aquela que está fora do âmbito constitucional, não podendo garantir os direitos previstos no texto maior (MANDRIGAL, 2017, p. 1).

Desse norte, surge uma discussão que são as investigações criminais realizadas pelos promotores de justiça, intituladas “procedimento investigatório criminal”, realizado no âmbito das promotorias, sem participação da polícia judiciária.

3.2.1 Doutrina a favor do poder investigatório ministerial

Em uma análise geral, é possível concluir que a maioria dos doutrinadores militam em favor do poder do Ministério Público, por vezes, pôr-se a frente de investigações criminais.

Para Avena, adepto da corrente majoritária, o fundamento que legitima a investigação pelo parquet está disposto no art. 129, VI, da Constituição Federal, visto que o referido dispositivo assegura ao Ministério Público a possibilidade de que expeça notificações nos procedimentos administrativos, nada opondo que seja considerado em investigações criminais (AVENA, 2017, p. 163).

Outro fundamento trazido pelo autor está na Lei Complementar 75/1993, a qual disciplina o Ministério Público da União, conferindo ao representante ministerial a possibilidade de proceder investigações criminais no âmbito das promotorias federais, também atingindo, por simetria, os Ministério Públicos Estaduais (AVENA, 2017, p. 163).

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Além disso, Avena (2017, p. 163) desenvolve seu entendimento de que não é de exclusividade das polícias judiciarias a investigação criminal:

Como se vê, os §§ 1.º, IV, e 4.º, do art. 144, distinguem claramente as funções de apuração de crimes e de polícia judiciária. Assim, no que concerne à Polícia Federal, a Carta Política apenas assegurou exclusividade quanto à função de polícia judiciária (§ 1º, IV) e não à de apuração de crimes (§ 1.º, I). Por outro lado, quanto à Polícia Civil, a par de persistir a distinção entre funções de polícia judiciária e de apuração de infrações penais, opostamente ao que consta no § 1.º, IV, não estabeleceu o § 4.º qualquer cláusula de exclusividade, quer para as funções de polícia judiciária, quer para as funções de apuração de crimes. Logo, não há no texto constitucional a previsão de exclusividade das polícias no que toca à investigação criminal.

Santin (2007, p. 65) declara que não é exclusiva a atividade de investigar por parte da polícia judiciária, tendo como princípio norteador o da universalização da investigação.

O autor é mais um adepto, o qual afirma que é incoerente dizer que o Ministério Público é o titular da ação penal e impedi-lo de fazer apuração de fatos criminais (SANTIN, 2007, p. 246).

Da mesma banda, Brito deslinda que a constituição Federal não deixou a cargo da polícia judiciária a exclusividade da investigação criminal, pois apenas trata a exclusividade de exercer a polícia judiciária, mas não a investigação criminal em sentido amplo (BRITO, 2015, p. 52).

O autor ainda fala que o principal argumento usado para fundamentar a posição majoritária está pautado na Teoria dos Poderes Implícitos, a qual quer explanar que a Carta Magna outorgou ao Ministério Público a função de proteger os direitos por todos os meios adequados, principalmente pelo ajuizamento de ação penal, consequentemente, empreendendo investigações criminais (BRITO, 2015, p. 52).

Continuando seu pensamento, Brito (2015, p. 52) ainda cita mais dois argumentos que embasam a investigação criminal ministerial, um deles:

[..]parte de uma analogia entre o inquérito civil público e a investigação criminal, para estabelecer que se o parquet dirige o inquérito civil público para obter elementos embasadores de uma ação civil pública, também poderia promover diligências investigatórias no âmbito criminal, com vistas à propositura de uma futura ação penal.

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[...]de que o inquérito policial não é um meio indispensável para a propositura da ação penal, podendo o Ministério Público embasar sua denúncia em outros elementos informativos. Assim, ainda que as diligências requeridas pelo parquet não sejam consideradas como uma investigação propriamente dita, elas poderiam ser consideradas peças de informação, ensejando o oferecimento de denúncia, na forma do art. 40 do CPP.

Desse modo, deixa claro que a doutrina majoritária considera como se regra fosse a dispensabilidade do inquérito policial, a ponto de considerar como argumento para que tome as rédeas de investigações criminais.

O autor conclui que “a melhor solução, sem dúvida, seria a regulamentação da atividade de investigação”, ou seja, o autor não veria, no ponto de vista técnico, a realização de procedimentos investigatórios por promotores de justiça, mas o recomendável seria a confecção de lei federal regulando a matéria (BRITO, 2015, p. 53).

Pacelli ressalta que não é certo dizer que o Ministério Público tem legitimidade para instaurar inquérito policial, porém afirma que a Constituição Federal garante ao órgão do Ministério Público o exercício de investigações preliminares, devendo estas serem regidas da mesma forma que outros procedimentos administrativos, inclusive o inquérito policial (PACELLI, 2018, p. 88).

Pacelli (2018, p. 89) ainda expõe que:

Por óbvio, o que aqui se sustenta é que, se a última palavra acerca da existência de um fato criminoso é atribuída constitucionalmente ao Ministério Público, há de se lhe reservar também os meios para afirmar seu convencimento, sobretudo quando contrário àquele defendido pela autoridade policial.

Por derradeiro, verifica-se que os argumentos, numa visão geral, são fundamentados no texto constitucional, no entanto, baseados em apenas interpretações, visto que a carta política brasileira não é clara e específica sobre o tema.

3.2.2 Doutrina contrária ao poder investigatório ministerial

Inicia-se este tópico com uma grande crítica ao entendimento de muitos promotores de justiça e outros profissionais do direito em desmerecer a inteligência jurídica do delegado de polícia.

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Nas palavras de Tourinho filho (2010, p. 343):

Ademais, sabemos que os nossos Delegados de Polícia têm a mesma formação universitária dos membros do Ministério Público. São Bacharéis em Direito. Por que, então, diminuir as atividades da Polícia e aumentar as do Ministério Público?

A resposta nos parece simplista. Concentrar o poder e aumentar o ego de alguns, fazendo ainda mais distinções de classes e cargos, sem necessidade jurídica alguma de inverter o polo da investigação, colocando em risco direitos fundamentais do cidadão.

Corroborando este entendimento, Tourinho Filho esclarece que em muitos casos em que o órgão ministerial procede as investigações, “ele procura, apenas, as provas que lhe interessam e os casos que têm repercussão” (2010, p. 343), não sendo verdadeiramente imparcial, assim como é quando ao denunciar, escolhem as testemunhas que melhor se encaixam em sua tese, supondo que “se é assim quando denunciam, é fácil imaginar qual seria sua postura se devessem investigar” (2010, p. 343).

Tourinho Filho encerra sua fala criticando a atuação de promotores que buscam se promover em casos de grande repercussão, envolvendo pessoas influentes, pois “é muito cômodo, do gabinete, proceder às requisições... O difícil mesmo é ir ao locus delicti, procurar saber quem foi o autor do crime” (2010, p. 344), sendo que quem busca enfrentar a criminalidade de perto é a polícia, a qual luta incessantemente na prevenção e repressão de variados crimes sem qualquer distinção (TOURINHO FILHO, 2010, p. 344).

Para Castro, apesar de muito se pontuar o inverso, “a investigação criminal no Brasil é, sim, tarefa exclusiva da polícia judiciária” (CASTRO, 2019, p. 1).

Não se ignora o que dispõe o art. 4º do CPP, porém, em uma análise superficial, tende-se a compreender que por ser legítimo outras autoridades administrativas procederem investigações, estas também possam apurar crimes, o que não é o correto (CASTRO, 2019, p. 1).

Castro ainda aponta que o modelo de investigação criminal e de persecução penal não é inferior a outros países, como é comum ouvir. Projeta-se como ideal alguns modelos, como o da Espanha, no qual ao Ministério Público é atribuída a função de investigar, ou até mesmo como na Austrália, em que a polícia

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judiciária oferta ações penais. No entanto, a Constituição Federal se mostra como a mais democrática, quando divide as funções investigar, acusar e julgar (CASTRO, 2019, p. 1).

Como se bem sabe, por força jurisprudencial, o Ministério Público pode proceder investigações no âmbito de suas promotorias, o chamado PIC (Procedimento Investigatório Criminal). Contudo, Castro alerta que o promotor deve levar a cabo a investigação, ou seja, deve ser o presidente da investigação desde da instauração até a conclusão, não podendo, em caso de fracasso de seu procedimento, encaminhar as peças para a polícia judiciária continuar as investigações, visto que, por óbvio, esta última não é subordinada ao órgão ministerial (CASTRO, 2019, p. 1).

Sobre o que Henrique Hoffmann afirma acima, Nucci (2016, p. 173) expõe que:

[...] a polícia judiciária não é órgão subalterno do Ministério Público, que possui, constitucionalmente, o seu controle externo, vale dizer, a fiscalização dos atos policiais. Em segundo lugar, a polícia judiciária não foi comunicada da investigação, que se iniciou muito tempo antes, para que pudesse efetivamente colaborar; logo, não é depósito de PICs malsucedidos.

Para Nucci, depositar os PICs que não lograram êxito em sua empreitada na responsabilidade do delegado de polícia é o mesmo que desconsiderar a figura da citada autoridade. Ainda, quando o Ministério Público assume o ônus investigatório deve levá-lo até a conclusão. Em caso de não conter arcabouço probatório para embasar a denúncia, deve requerer o arquivamento e não remeter para a polícia judiciária, atitude essa que se mostra prejudicial aos direitos do investigado (NUCCI, 2016, p. 173).

Além disso, o autor entende como “inviável que o promotor de justiça, titular da ação penal, assuma sozinho a postura de órgão investigatório, sem qualquer fiscalização, substituindo a polícia judiciária e produzindo inquéritos” (NUCCI, 2016, p. 142), sendo que tais procedimento, “como regra, são conduzidos em absoluto sigilo, sem nenhuma previsão legal do procedimento” (2016, p. 142).

Corroborando os argumentos expostos, Nucci explana que a atribuição de investigar foi concedida pela Constituição Federal à polícia judiciária (Federal ou

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Civil), em seu art. 144. Ao órgão ministerial, a Carta Magna designou o papel de ajuizamento da ação penal, ressalvados os casos previstos em lei. Ainda, no art. 129, inciso III, da CF/88, atribuiu ao referido órgão a instauração de inquérito civil, além de expedir notificações em procedimentos administrativos, o que não quer dizer que possa fazê-lo em infrações penais (NUCCI, 2016, p. 142/143).

Ademais, contrapondo o argumento trazido no tópico anterior, o qual explica um dos principais argumentos favoráveis ao poder investigatórios do parquet, a teoria dos poderes implícitos, Cabette e Sannini Neto (2013, p. 1) versam que:

Devemos destacar que a teoria dos poderes implícitos não pode ser aplicada quando tratarmos de matéria em que sejam atribuídos poderes explícitos. Ora, o artigo 144, parágrafo 1°, inciso IV e parágrafo 4°, da Constituição da República, confere às Polícias Judiciárias (Federal e Civil) atribuição para realizar as investigações criminais. Isso significa que o legislador constitucional reservou às Policias Civil e Federal um campo de atividade exclusiva que não pode ser desrespeitado por normas infraconstitucionais ou, pior, por atos administrativos (v.g. Resoluções do Ministério Público).

Assim, a teoria dos poderes implícitos cai por terra, visto que o texto constitucional é explícito ao afirmar a quem cabe a investigação criminal, não restando espaço para interpretações contrárias (CABETTE; SANNINI NETO, 2013, p. 1).

3.2.3 Posição do Supremo Tribunal Federal sobre o tema

O STF, por meio do RE 593727/MG, entendeu que o Ministério Público possui legitimidade para proceder investigações criminais, bem como estabeleceu parâmetros para a sua aplicação.

Em repercussão geral, o plenário da suprema corte proferiu a seguinte tese:

O Ministério Público dispõe de competência para promover, por autoridade própria, e por prazo razoável, investigações de natureza penal, desde que respeitados os direitos e garantias que assistem a qualquer indiciado ou a qualquer pessoa sob investigação do Estado, observadas, sempre, por seus agentes, as hipóteses de reserva constitucional de jurisdição e, também, as prerrogativas profissionais de que se acham investidos, em nosso País, os Advogados (Lei 8.906/94, artigo 7º, notadamente os incisos I, II, III, XI, XIII, XIV e XIX), sem prejuízo da possibilidade – sempre presente no Estado democrático de Direito – do permanente controle jurisdicional dos atos,

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necessariamente documentados (Súmula Vinculante 14), praticados pelos membros dessa instituição (BRASIL, STF, 2015).

Este é o mais recente entendimento, todavia, há divergências entre as turmas do STF, mas a doutrina favorável fundamenta seus argumentos no citado julgado e sua tese fixada.

Por outro lado, tem-se um importante posicionamento para a doutrina moderna quanto ao tema, que se extrai do voto do Ministro Marco Aurélio no RE 593727/MG:

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – O recurso volta-se a infirmar acórdão mediante o qual o Tribunal de Justiça Estado de Minas Gerais recebeu denúncia contra Prefeito do Município de Ipanema, tendo como fundamento investigação realizada diretamente pelo Ministério Público. A questão de fundo do extraordinário, a ser examinado sob o ângulo da repercussão geral, consiste em definir se o Ministério Público possui legitimidade para, por meios próprios, investigar condutas criminosas. O relator, ministro Cezar Peluso, conheceu e deu provimento ao recurso, admitindo, entretanto, a atribuição do Ministério Público para realizar diretamente atividades de investigação da prática de delitos em situações excepcionais e taxativas, no que foi acompanhado pelo ministro Ricardo Lewandowski. Os ministros Gilmar Mendes, Celso de Mello, Ayres Britto, Joaquim Barbosa e Luiz Fux negaram provimento ao extraordinário, consignando a existência de base constitucional para os poderes de investigação do Ministério Público (BRASIL, STF, 2015).

Continuando a expor, o ministro Marco Aurélio esclarece a importância do tema e o seu debate:

O tema é de grande relevância jurídica, pois tem por finalidade a elucidação de balizas concernentes à atuação do Ministério Público na persecução penal. Com a promulgação da Constituição de 1988, as atribuições do Ministério Público foram superdimensionadas, sendo preciso harmonizá-las com as funções das demais instituições da República. A possibilidade de investigação autônoma pelo Órgão gera debates jurídicos há tempo travados na doutrina e nos Tribunais. As realidades fáticas heterogêneas presentes no Brasil fizeram com que o Ministério Público se deparasse com a “necessidade” de investigar por conta própria. Entre os diversos motivos para tanto, destacam-se a falta de estrutura das polícias ou desvios de conduta dos agentes policiais. O cenário, então, levou o Ministério Público a apresentar justificativa para essa atuação anômala. Nesse panorama, surgiram argumentos para legitimar a investigação independente. Os fundamentos se resumem à ausência de exclusividade investigatória das polícias judiciárias e à interpretação do artigo 129 da Carta da República sob o enfoque da teoria dos poderes implícitos. Alega-se que a própria Constituição confere poderes investigatórios a outros órgãos. Citam-se como exemplos as Comissões Parlamentares de Inquérito, nos termos do disposto no artigo 58, § 3º, do Diploma Maior (BRASIL, STF, 2015).

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Sobre os argumentos legais em que se baseiam os defensores da investigação pelo parquet:

Apontam-se outras normas legais que autorizam investigação por órgãos diversos, como os procedimentos administrativos do Conselho de Controle de Atividades Financeiras – Lei nº 9.613/98 –, da Receita Federal e outros. Sustenta-se não ser razoável entender que o titular da ação penal e destinatário das investigações criminais não pudesse buscar, por meios próprios, os elementos para convencimento, reforçando tal ideia no axioma jurídico “quem pode o mais pode o menos”. A análise constitucional das premissas utilizadas revela não subsistir a assertiva. Inicialmente, vale consignar que a Carta, ao estabelecer competências, visa assegurar o equilíbrio entre os órgãos públicos, o qual também funciona como garantia para o cidadão (BRASIL, STF, 2015).

Sobre um dos pontos mais importantes os quais saltam aos olhos de quem não admite tal modalidade de investigação, Marco Aurélio diz que:

A concentração de poder é prejudicial ao bom funcionamento do Estado Democrático de Direito, razão por que as interpretações ampliadoras de poderes devem ser feitas com reservas, sob pena de ruptura da harmonia preconizada pelo constituinte. As normas que tratam das funções e atribuições do Ministério Público – artigos 127 a 129 da Carta Federal – são bem claras ao descreverem-nas. Em nenhuma delas, pode-se concluir estar autorizada a investigação criminal, ao contrário. Ao estabelecer, no inciso VII do artigo 129, o exercício do controle externo da atividade policial e, no inciso seguinte, atribuir o poder de requisitar diligências investigatórias e instauração de inquérito policial, o constituinte evidenciou a opção de não permitir que o Ministério Público proceda à investigação criminal, e sim zele pela lisura das atividades policiais e cuide para que a apuração possa ser concluída de forma a viabilizar a futura ação penal. A vontade constitucional fica evidenciada quando se comparam as normas relativas ao inquérito civil e as alusivas à investigação criminal (BRASIL, STF, 2015).

No que tange à discussão constitucional, o Ministro explana que:

[...] na Constituição, acabou-se por dividir atribuições entre dois órgãos, objetivando que o destinatário das atividades preparatórias pudesse, com isenção, avaliar o trabalho desenvolvido. A postergação do controle para fase judicial, caso o Ministério Público investigasse, implicaria descompasso com os ditames constitucionais que buscaram garantir um controle obrigatório antes da fase judicial, isso para não prolongar sofrimento passível de existir como consequência de uma apuração criminal infundada. Legitimar a investigação por parte do titular da ação penal é inverter a ordem natural das coisas: quem surge como responsável pelo controle não pode exercer a atividade controlada. O desenho constitucional relativo ao Ministério Público, na seara penal, pauta-se na atividade de controle externo da polícia, ou seja, deve ser tutor das garantias constitucionais no estágio inquisitivo. Na fase processual, tem a função de titular da ação penal. Todavia, nem mesmo quando funciona como parte, o constituinte retira-lhe a qualidade de fiscal da lei. Atribuir novos poderes nesse campo significa desvirtuamento sem amparo constitucional. [...]

A Constituição Federal e as normas de um modo geral devem ser interpretadas com base nas regras de hermenêutica. Uma das mais

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