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Sumário. Texto Integral. Tribunal da Relação do Porto Processo nº

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Tribunal da Relação do Porto Processo nº 0230592

Relator: SALEIRO DE ABREU Sessão: 04 Julho 2002

Número: RP200207040230592 Votação: UNANIMIDADE

Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA.

LETRA PREENCHIMENTO ABUSIVO ÓNUS DA PROVA

AVALISTA PROTESTO

Sumário

I - O ónus da prova do preenchimento abusivo de uma letra, porque tal facto configura uma excepção peremptória, recai sobre o obrigado cambiário.

II - A falta de apresentação de uma letra a pagamento ou a falta de protesto por falta de pagamento não prejudica o direito de acção contra o avalista do seu subscritor.

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I.

A Caixa ... instaurou execução, com processo ordinário, contra

“Quiosque ..., Lda”, e Fernando ... e mulher Maria ... e outra, para pagamento da quantia de esc. 4.257.531$00 e juros de mora vincendos, apresentando, como título executivo, uma livrança subscrita pela primeira executada e avalizada pelos segundos.

Os executados Fernando ... e mulher deduziram embargos de executado, tendo alegado, em síntese, que:

- A exequente não apresentou a livrança a pagamento à subscritora, nem aos embargantes;

- A livrança não foi apresentada a protesto;

- Trata-se de uma livrança em branco, tendo sido abusivo o seu preenchimento;

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- O aval é nulo, por falta ou indeterminação do seu objecto.

Concluíram pela procedência dos embargos e consequente extinção da execução.

Contestou a exequente, alegando que tanto a subscritora, como os

embargantes, autorizaram o preenchimento da livrança (conforme documento que juntou); que os avalistas sabiam que a dívida não tinha sido

tempestivamente paga; e que não era necessário o protesto da livrança.

No despacho saneador proferiu-se decisão de mérito, tendo os embargos sido julgados improcedentes.

Inconformados, apelaram os embargantes, tendo rematado a sua alegação com as seguintes conclusões:

1. A livrança tal como a letra de câmbio é criada e circula com base na prática de actos ou negócios jurídicos cuja formação está sujeita à estrita observância da forma legal, como consequência dos princípios da autonomia, literalidade e abstracção (art. 1º, 2º , 14º, 16º, 17º, 20º, 21º, 38º, 39º I e III, 50º, 51º, todos da LULL, aplicando-se também os artigos 220º e 221º do CC.).

2. Os mesmos critérios formais aplicam-se ao contrato de preenchimento porque não há razão séria para que esse contrato seja uma excepção à

essência do titulo (cfr. Normas invocadas na conclusão anterior, maxime art.s 221º do CC e ainda o artº.10º da LULL).

3. Acresce que a validade do preenchimento de uma livrança em branco deve ser atestada pelo contrato de preenchimento, celebrado por escrito, para assim se curar da legalidade versus invalidade do preenchimento da livrança.

4. Na verdade, a livrança em branco não contém elementos que determinem a fonte ou a origem da obrigação, bem como da natureza licita ou ilícita desta (art. 280º).

5. O preenchimento, por isso, é nulo.

6. As livranças não foram apresentadas a pagamento aos Recorrentes, nem foram objecto de protesto ou aviso aos Recorrentes por falta de pagamento.

7. Assim, não se abriu a sua responsabilidade, por via de regresso (art. 53º da LULL):

8. Pelo que os embargos procedem, também por esta via.

Contra-alegou a apelada, pugnando pela confirmação da decisão recorrida.

Corridos os vistos, cumpre decidir.

II.

O tribunal a quo considerou provados os seguintes factos:

1. “Quiosque ..., Lda”, pela assinatura dos seus gerentes Fernando ... e Maria Alice ..., emitiu e entregou à Caixa ..., (por manifesto lapso, escreveu-se Caixa 1 ...) uma livrança em que figurava como subscritora e em cujo verso consta “dou o meu aval ao subscritor”, seguido das assinaturas,

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além de outra, de Fernando ... e Maria ..., aqui embargantes (tudo conforme documento junto a fls. 5 dos autos executivos e cujo teor se dá por reproduzido);

2. Tal livrança foi entregue à embargada com a importância e data de vencimento em branco.

Face à não impugnação dos embargantes, que dele foram notificados (cf. fls.

18), considera-se ainda assente o teor do documento (“declaração”) junto a fls.

17, onde consta:

“Em garantia do cumprimento das obrigações ou responsabilidades assumidas no contrato de crédito nº ..., de 03.11.97, e/ou dele emergentes, junto

remetemos uma livrança por nós subscrita em branco, a favor da Caixa ..., ficando V. Exas. autorizadas a preenchê-la, fixando-lhe a data, o vencimento, que poderá ser mesmo à vista, quando e como entenderem, o montante do capital mutuado, respectivos juros contratuais e quaisquer outras despesas, sempre que deixemos de cumprir qualquer das obrigações

emergentes deste contrato.

Os avalistas da Livrança de caução acima identificados dão o seu acordo às estipulações deste contrato, pelo que, em conformidade, assinam também a presente carta-contrato”.

Seguem-se a data (03.11.1997) e as assinaturas, incluindo as dos avalistas, ora embargantes.

III.

Como é sabido, são as conclusões da alegação dos recorrentes que delimitam o âmbito do objecto do recurso (arts. 684º, nº 3 e 690º, nº 1, ambos do CPC), razão por que não cabe a este Tribunal conhecer de questões que não tenham sido afloradas nas conclusões, ainda que versadas nas alegações (vd. Ac. do STJ, de 12.1.95, CJ/STJ, 1995, I, 20).

Apreciemos, então, as questões suscitadas.

A) Quanto à questão da nulidade do preenchimento da livrança:

Não vem questionada a admissibilidade da livrança em branco, a qual resulta do disposto nos arts. 10º e 77º da LULL.

A livrança pode, pois, ser emitida e entregue sem que contenha todos os seus requisitos, mas, uma vez preenchida antes do seu vencimento, passa a

produzir todos os efeitos próprios da livrança.

“Quem emite uma letra em branco atribui àquele a quem a entrega o direito de a preencher em certos e determinados termos”, escreveu Ferrer Correia (Lições de Direito Comercial – Letra de Câmbio, III, 128).

Ou seja, o subscritor atribui àquele a quem a entrega o direito de a preencher em conformidade com o pacto ou contrato de preenchimento.

Como a doutrina vem defendendo, a autorização para a letra em branco ser

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completada pode ser expressa ou mesmo ser conferida tacitamente, sendo de presumir que exista. E o próprio acordo de preenchimento pode ser expresso ou em branco (vd. Paulo Sendim, Letra de Câmbio, I, 190/191 e 225). Será expresso, quando as partes estipulam certos termos concretos; tácito, no caso de estar implícito nas cláusulas do negócio determinante da emissão do título, como se escreveu no Ac. do STJ, de 28.5.1996, BMJ, 457º-401.

Se a autorização para o preenchimento da letra ou livrança pode ser dada tacitamente, tal significa que não necessita de ser escrita.

Todavia, no caso vertente, e como vimos, a subscritora autorizou, por escrito, a exequente/embargada a preencher a livrança, tendo indicado os termos em que o poderia fazer (ao que os próprios avalistas deram o seu acordo).

Assim sendo, mesmo que se entendesse, como os recorrentes, que o contrato de preenchimento deve ser celebrado por escrito, não ocorre, in casu,

qualquer vício formal determinante da sua nulidade.

Dir-se-á, por último, que o ónus da prova da inexistência do acordo ou do preenchimento com desrespeito do acordo (preenchimento abusivo), porque configura uma excepção peremptória, recai sobre o obrigado cambiário, no caso, os embargantes – art. 342º, nº 2 do CC -, como tem sido jurisprudência uniforme (vd, por todos, para além do último aresto citado, o Ac. do STJ, de 14.5.96, para uniformizar a jurisprudência (versando o caso do cheque, mas perfeitamente aplicável às letras e livranças), in DR, II, de 11.7.96.

Ora, os embargantes não alegaram qualquer facto concreto susceptível de configurar um abusivo preenchimento da livrança dada à execução.

B) Quanto à questão da necessidade, ou não, do protesto da livrança relativamente ao avalista do seu subscritor:

Como é sabido, não há unanimidade na jurisprudência e doutrina sobre a solução a dar à questão de saber se é necessário o protesto para accionar o avalista do aceitante da letra ou do subscritor da livrança.

As normas legais a ter em consideração para análise dessa matéria são as dos arts. 32º, 53º e 77º da LULL.

Segundo o art. 53º, depois de expirados os prazos fixados para se fazer o protesto por falta de pagamento, o portador perdeu os seus direitos de acção contra os endossantes, contra o sacador e contra os outros co-obrigados, com excepção do aceitante.

O art. 32º, por seu turno, estatui que “o dador do aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada”.

Por força do art. 77º, o regime previsto por aqueles preceitos, é também aplicável às livranças.

A doutrina e jurisprudência dominantes vêm defendendo a tese da

desnecessidade do protesto, pois que, sendo o dador do aval responsável da

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mesma maneira que a pessoa de quem se constitui garante, não se vê razão para exigir o protesto do título quando a lei o dispensa para a pessoa de quem se constitui garante (o aceitante da letra ou o subscritor da livrança).

O art. 53º (que dispensa a necessidade do protesto contra o aceitante), não faz referência ao seu avalista, por tal – diz-se – ser desnecessário, o que resulta confirmado pelo art. 45º, ao dispensar o aviso da falta de pagamento pelo portador da letra ao seu aceitante omitindo alusão ao avalista deste.

De acordo com esta corrente, a responsabilidade do avalista mede-se pela do próprio aceitante, sendo um e outro obrigados directos e não de regresso.

Embora autónomas, há uma equiparação entre a obrigação do avalista e a do avalizado: “o dador do aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada”, sendo que esta expressão – “da mesma maneira” – “significa que o avalista, relativamente à sua própria obrigação (obrigação de

pagamento do título cambiário, se o avalizado não tiver honrado a sua

própria), ocupa posição igual àquele por quem deu o aval. Por isso, responde como obrigado directo ou de regresso consoante a obrigação do avalizado, como se fosse sacado, aceitante, etc., consoante a posição como subscritor cambiário do respectivo avalizado” (Ac. do STJ, de 28.3.1995, DR, I-A, de 20.5.1995).

Paulo Sendim e Evaristo Mendes, em A Natureza do Aval e a Questão da Necessidade ou não de Protesto para accionar o Avalista do Aceitante,

Almedina, 1991, têm entendimento contrário, ou seja, defendem que o avalista do aceitante está na mesma posição dos demais garantes do pagamento da letra, pelo que só responde pela falta de pagamento da letra pelo sacado- aceitante desde que tal facto se comprove por protesto.

Para tanto, partem do conceito e natureza do aval, concebendo-o como uma

“garantia do pagamento pontual da letra”. O avalista – tal como os demais subscritores da letra – garante que a ordem de pagamento dirigida ao sacado será pontualmente cumprida; “garante ao portador que o sacado, sendo-lhe apresentada a letra no tempo e no lugar em que é pagável, não recusará o seu pagamento, isto é, não se recusará a cumprir a ordem que por ela o sacador lhe dá” (ob. cit, pág. 99).

Assim, não comprovada, pelo protesto, a recusa, só a responsabilidade do aceitante subsiste, pois que, sabendo ele que não cumpriu a ordem, não há necessidade da prova da recusa.

O art. 32º terá apenas como objectivo definir o “conteúdo da

responsabilidade” do avalista. Dispõe sobre o conteúdo da sua obrigação e não sobre as condições em que ele responde ou não.

Reconhecemos que a matéria é delicada e a solução duvidosa. Todavia, postos perante o regime dos arts. 53º e 32º e os argumentos aduzidos por outros

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autores, julgamos ser de seguir a corrente maioritária, ou seja, de que a falta de apresentação da livrança a pagamento ou a falta de protesto por falta de pagamento não prejudica o direito de acção contra o avalista do seu subscritor (neste sentido, entre outros, Acs. do STJ, de 17.2.98 e 23.9.98, in internet, www.dgsi.pt, e de 17.3.88, BMJ, 375º-399 (onde são citados diversos e ilustres doutrinadores); Ac. da RL, de 2.4.98, CJ, 1998, II, 124 e da RC, de 4.10.88, BMJ, 380º- 551).

C) Na sua alegação, sustentam ainda os recorrentes que o aval é nulo por falta ou indeterminação do seu objecto.

Pese embora tal questão não tenha sido vertida nas “conclusões” (não se impondo, por isso, e como se disse, que este Tribunal dela conheça), sempre se dirá o seguinte:

Segundo o art. 280º, nº 1 do CC., é nulo o negócio jurídico cujo objecto seja indeterminável.

O objecto do negócio pode, portanto, ser indeterminado, mas não

indeterminável, e só nesta hipótese se considera nulo (P. de Lima e A. Varela, Código Civil anotado, I, 2ª ed., 240; Ac. do STJ, de 21.1.93, CJ/STJ, 1993, I, 71).

Como escreveu Menezes Cordeiro, in CJ, 1992, III, pg. 61, “a prestação é

indeterminada mas determinável quando não se saiba, num momento anterior, qual o seu teor, mas, não obstante, exista um critério para proceder à

determinação”; “a prestação é indeterminada e indeterminável quando não exista qualquer critério para proceder à determinação”.

O negócio será nulo, pois, por indeterminabilidade do seu objecto, sempre que, no momento da sua concretização, a prestação debitória não esteja definida e do contrato não resultem quaisquer critérios ou limites que a permitam definir ou delimitar no futuro.

Segundo Pedro Martinez e F. da Ponte, Garantias de Cumprimento, pág. 36, no que respeita à fiança, a determinabilidade “consiste na possibilidade do

fiador... prefigurar ex ante o tipo, o montante e a medida do próprio

compromisso”, impondo-se, por isso, “a necessidade de o fiador conhecer o critério ou critérios indispensáveis para delinear o limite do seu compromisso, sendo que a sua eventual obrigação futura deve ter conteúdo previsível no momento da estipulação da fiança”

Vaz Serra, in Fiança e Figuras análogas (BMJ, 171º-60/61) escreveu que “pela fiança podem ser garantidas também obrigações futuras ou condicionais, até aquelas que apenas se invocam com carácter genérico. Mas, no momento da fiança, deve ser determinado o título donde a obrigação futura poderá

resultar, ou, ao menos, saber-se como há-de ele ser determinado - sem o que o objecto da fiança seria indeterminado e indeterminável”.

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Por sua vez, o Prof. Mário Júlio de Almeida Costa, in Direito das Obrigações, 66ª ed., pág. 785, refere que “a validade da fiança para obrigações futuras supõe a fixação clara do critério ou critérios para a sua determinação (...).

E também no Ac. do STJ, para uniformização de jurisprudência, de 23.1.2001, in DR, I-A, de 8.3.2001, se escreveu que, para a determinabilidade do objecto da fiança, “têm de ser fixados critérios objectivos que permitam no futuro avaliar o conteúdo da prestação de forma que o fiador possa, ab initio, conhecer os limites da sua obrigação ou, pelo menos, os critérios objectivos que lhe facultem tal conhecimento”.

Ao prescrever-se a nulidade do negócio cujo objecto seja indeterminável, pretende-se, pois, evitar que o devedor fique ilimitadamente nas mãos do credor ou de terceiros.

No caso sub judice, na declaração (acordo de preenchimento) que acompanhou a livrança, ficou claro que os embargantes se propuseram garantir todas as obrigações decorrentes do contrato de crédito nº ...:

capital mutuado, respectivos juros contratuais e outras despesas.

O âmbito da responsabilidade assumida pelos ora embargantes ficou, pois, suficientemente delimitado pelo contrato donde derivavam as obrigações, encontrando-se, assim, fixado um critério objectivo para a determinação do objecto do aval.

Como se entendeu no Ac. do STJ, de 15.11.95, BMJ, 451º- 395, “o âmbito da responsabilidade assumida por avalistas de dívida consubstanciada em livrança assinada em branco mostra-se delimitado, através de critério

objectivo de determinabilidade, se do texto do contrato de preenchimento – no qual foi concedida autorização ao banco para oportuna integração do título, designadamente quanto ao montante – constar a natureza dos títulos de que poderão derivar as obrigações”.

Conclui-se, assim, pela inexistência da invocada nulidade do aval por indeterminabilidade da prestação.

IV.

Em face do exposto, julga-se improcedente a apelação, confirmando-se o saneador/sentença recorrido.

Custas pelos apelantes.

Porto, 4 de Julho de 2002 Estevão Vaz Saleiro de Abreu

Fernando Manuel de Oliveira Vasconcelos José Viriato Rodrigues Bernardo

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