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CONTRATO DE ARRENDAMENTO ENTRADA NO GOZO DO IMÓVEL CONTRATO-PROMESSA DE ARRENDAMENTO COM ANTECIPAÇÃO DO GOZO DA COISA

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Tribunal da Relação do Porto Processo nº 3802/10.6YYPRT-A.P1 Relator: VIEIRA E CUNHA

Sessão: 13 Setembro 2011

Número: RP201109133802/10.6YYPRT-A.P1 Votação: UNANIMIDADE

Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO.

CONTRATO DE ARRENDAMENTO ENTRADA NO GOZO DO IMÓVEL

CONTRATO-PROMESSA DE ARRENDAMENTO COM ANTECIPAÇÃO DO GOZO DA COISA

Sumário

I - A entrada no gozo do imóvel não caracteriza irreversivelmente o contrato como um verdadeiro contrato definitivo de arrendamento, da mesma forma que, se um promitente comprador, entra no gozo do imóvel prometido vender, não se poderá concluir que o passou a possuir em nome próprio, à semelhança do proprietário.

II - Se as partes previram a “necessidade de obtenção da licença a que alude o art° 5° do D.-L. n° 160/2006 de 8 de Agosto”, só após a obtenção de tal

licença, se podendo celebrar, no prazo de 15 dias, o contrato de

arrendamento, tal elemento mostra-se decisivo para o declaratário normal visse na vontade de vinculação a referência a um contrato-promessa.

Texto Integral

● Rec. 3802/10.6YYPRT-A.P1. Relator – Vieira e Cunha. Adjuntos – Des. Mª das Dores Eiró e Des. João Proença Costa. Decisão recorrida de 14/3/2011.

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto

Os Factos

Recurso de apelação interposto na acção com processo incidental de oposição à execução comum, com o nº3802/10.6YYPRT-A, do 2º Juízo de Execução do Porto (3ª Secção).

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Oponente – B….

Exequente – C….

Tese da Oponente

A Exequente enviou uma notificação judicial avulsa à Executada alegando rendas atrasadas e não pagas, superiores a três meses; todavia, inexiste título executivo.

De facto, um contrato promessa de arrendamento não é um arrendamento, para efeitos do disposto no artº 15º nº1 al.e) NRAU, nem o contrato dos autos se poderá em tal converter, uma vez que o local arrendado não cumpre com o condicionalismo do disposto nos artºs 1070º nº2 C.Civ. e 5º D.-L. nº 160/2006 de 8 de Agosto.

Tese da Exequente

O contrato em causa deve ser qualificado como um verdadeiro arrendamento – nele se estabelece cedência do gozo, retribuição, duração e fim do contrato.

À data da celebração do contrato, o prédio possuía alvará de licença para habitação e ocupação – nº …, de 2/12/1964. A exibição da licença de utilização supre quaisquer vícios, a esse respeito (artº 4º D.-L. nº 160/2006).

Saneador-Sentença Recorrido

Na decisão recorrida, a Mmª Juiz “a quo” julgou a oposição improcedente, por não provada, absolvendo do pedido a Exequente.

Conclusões do Recurso de Apelação da Oponente (resenha):

1º O tribunal recorrido incorreu em manifesto erro de direito ao qualificar o contrato junto ao requerimento executivo, como sendo um contrato definitivo de arrendamento para habitação.

2º Desde logo, de todas as suas nove cláusulas, oito delas são próprias e constitutivas de um contrato-promessa de arrendamento, sendo, apenas uma delas, mais concretamente a cláusula segunda própria de um contrato

definitivo, mas não é imprópria e muito menos incompatível com uma promessa de arrendamento.

3º Aliás, o conteúdo das suas cláusulas terceira, sexta, sétima e nona, não são compagináveis com e num contrato prometido de arrendamento, por o teor das mesmas não serem sequer susceptíveis de integrar o regime do contrato de arrendamento definitivo.

4º Sendo inclusive, o teor das cláusulas sexta, sétima e nona, incompatível com o regime do contrato de arrendamento definitivo para habitação, o qual pressupõe e exige a prévia existência da licença a que alude o artigo 5º, do

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Decreto-Lei nº 160/2006, de 08 de Agosto, licença essa, que nunca foi obtida pela exequente.

5º Visto que, a exequente enquanto proprietária do locado estaria a usar a faculdade de o arrendar, visando um resultado proibido pela norma do artigo 5º do Decreto-Lei nº 160/2006, de 08 de Agosto, que para a sua celebração definitiva, impõe a existência da licença, incorreu a Exequente em fraude à lei.

6º Acresce que, em virtude da exigibilidade dessa licença, o regime do

arrendamento urbano não pode recair sobre o locado objecto da execução, por força do disposto no artigo 1070º, nº 1, do Código Civil.

7º Por conseguinte, inexiste título executivo, o qual no presente caso, teria de ser constituído por um contrato de arrendamento definitivo.

8º Foram violados os artigos 45º, nº 1, 814º, nº 1, alínea a), 929º, nº 1, todos do Código de Processo Civil, artigo 1070º, nº 1, do Código Civil e artigo 5º do Decreto-Lei nº 160/2006, de 08 de Agosto.

Factos Provados

1 – A exequente C…, a qualidade de cabeça-de-casal da herança aberta por óbito de sua mãe D…, instaurou em 20 de Janeiro de 2010 a presente

execução para entrega de coisa certa contra B… com os fundamentos que constam do requerimento executivo (falta de pagamento de rendas) e apresentando como título executivo os seguintes documentos:

a) – Documento escrito denominado Contrato Promessa de Arrendamento para Habitação, outorgado entre D…, na aí declarada qualidade de primeira

outorgante, e a executada, na aí declarada qualidade de segunda outorgante e por terceira pessoa como fiadora, do qual consta, designadamente, que:

«Entre a primeira e segunda contraente, ajustou-se e reduz-se a escrito o presente contrato promessa de arrendamento (…) tudo se subordinando às seguintes cláusulas:

Primeira: A primeira contraente (…) promete dar de arrendamento à segunda contraente, para habitação desta, o quarto andar, de um prédio com cinco pavimentos, sito na Rua …, com o número … de polícia, no Porto, inscrito na matriz urbana sob o artigo 2.502.

Segunda: O arrendamento terá início em 1 de Fevereiro de 2007, e é

celebrado pelo prazo de cinco anos, ao abrigo do disposto nos artigos 1095.º e seguintes do Código Civil, renovando-se por períodos de um ano, se não for denunciado por qualquer das partes dentro dos prazos e sob a forma

legalmente previstos.

Terceira: A segunda contraente fica, desde já, autorizada a habitar o local prometido arrendar na data referida na cláusula anterior.

Quarta: A renda mensal que a segunda contraente vai pagar à primeira

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contraente através de depósito na conta bancária (…) no primeiro dia útil do mês anterior àquele a que respeitar, será de 350 € (…).

Sexta: O contrato de arrendamento definitivo será celebrado quinze dias após a obtenção da licença a que alude o artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 160/2006, de 8 de Agosto.

Sétima: A não celebração do contrato de arrendamento definitivo por causas estranhas à vontade da primeira contraente, não confere à segunda

contraente o direito de reaver o montante global das importâncias que haja pago àquela nos termos da cláusula quarta.

Oitava: A terceira contraente fica fiadora da segunda contraente pelo escrupuloso cumprimento deste contrato junto da primeira contraente, designadamente pelo pontual pagamento das rendas, renunciando ao benefício de excussão prévia.

Nona: O marido da terceira contraente outorgará e assinará o contrato

definitivo a celebrar, ambos na qualidade de fiadores da segunda outorgante.

(…)».

Tal documento encontra-se datado de 20 de Janeiro de 2007 e está assinado, designadamente, pela referida D… e pela executada e pela terceira

outorgante. – Teor do documento junto a fls. 22 a 24 dos autos de execução que, em tudo o mais aqui não expressamente transcrito, se dá por

reproduzido.

b) – Notificação judicial avulsa da executada, efectuada em 3/3/2010, na sua própria pessoa, do requerimento cuja cópia se encontra junta a fls. 8 a 13 dos autos de execução, e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, em que a aqui exequente requereu a notificação da requerida de que, dada a falta de pagamento da contraprestação pelo uso e fruição do imóvel acordada no contrato referido na al. a) desde o Mês de Agosto de 2007, e a manutenção da executada no imóvel sem pagar tais montantes, prometendo pagá-los, se

encontra em dívida a quantia de € 10.150,00 relativo às ‘rendas’ ou

‘contraprestações’ pelo uso do imóvel, alegando ainda que apesar de denominado “contrato-promessa de arrendamento, ambos os outorgantes visaram, com a celebração daquele contrato, uma cedência efectiva e imediata do imóvel em causa para a executada, a fim de esta o habitar mediante o

pagamento de um montante mensal a título de “renda”, pelo que, ocorrendo uma situação de mora por parte da executada superior a 3 meses, é inexigível a manutenção do contrato de arrendamento de acordo com o disposto no artigo 1083.º, n.º 3, do Código Civil, requerendo, para além do mais que do mesmo consta, a notificação judicial avulsa da executada/arrendatária da resolução do contrato de arrendamento relativo ao quarto andar, de um prédio com cinco pavimentos, sito na Rua …, com o número … de polícia, no Porto,

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inscrito na matriz urbana sob o artigo 2.502 e, consequentemente, para a mesma entregar o locado no estado em que o mesmo se encontrava quando lhe foi cedido o gozo do mesmo nos termos do artigo 1087.º do Código Civil.

– Teor da cópia da notificação judicial avulsa composta pelo requerimento, despacho, documentos e certidão junta a fls. 7 a 29 dos autos de execução.

2 – Encontra-se junta a fls. 23 e 24 dos autos de oposição folha anexa ao Alvará de licença n.º … de 1964 para habitação e ocupação de edifícios, datado de 9 de Dezembro de 1964, referente a 12 fogos a habitar em edifício de 3 pavimentos construído, sito na Rua …, n.s … – … – … - … – … – … e de … n.º . e ..., e vistoriado a 19 de Novembro de 1964, tendo sido efectuado, em 2 de Agosto de 1965, averbamento que rectificou o número de prédios «(…) que passa a ser de dois prédios distintos, cabendo a um deles os números de

polícia … a … da Rua … e os n.s . e .. da Rua …, e ao outro o n.º … da Rua …, tudo conforme consta da cópia do documento em causa, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. – Teor do documento junto a fls. 23 e 24 dos autos de oposição.

3 – Encontra-se junta a fls. 21 dos autos de execução certidão matricial

referente ao prédio em propriedade horizontal, aí descrito como casa de cinco pavimentos, sito na Rua …, com o número … de polícia, no Porto, que no mais, aqui se como reproduzida. – Teor da certidão matricial junta a fls. 21 dos autos de execução.

Fundamentos

Em função das conclusões do recurso e do despacho em crise, a única questão que o presente recurso suscita será a de saber se existe, de facto, título

executivo nos autos, tal como invocado pela Exequente, na petição executiva.

Vejamos então.

I

A primeira “démarche” interpretativa da hipótese sub judice prende-se com a adequada caracterização do contrato que integra o título executivo.

Será um contrato-promessa de arrendamento, nome que as partes adoptaram e que a Oponente propugna que seja, ou será antes, por actividade

interpretativa, um contrato de arrendamento, do mesmo possuindo as

características essenciais, como sustenta a Exequente e é defendido, de forma consistente, na douta sentença recorrida?

Estamos em face de uma matéria de interpretação do contrato.

Como é doutrina do ordenamento jurídico português (artº 236º nº1 C.Civ.), “a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do

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declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele”.

A doutrina da impressão do destinatário, recondutível ao âmbito do princípio da protecção da confiança, impõe ao declarante um ónus de clareza na

manifestação do seu pensamento, desde forma se concedendo primazia ao ponto de vista do destinatário da declaração, a partir de quem tal declaração deve ser focada (Paulo Mota Pinto, Declaração Tácita, pg. 206) – no caso, dois destinatários, a “promitente senhoria” e a “promitente arrendatária”.

Todavia, a lei não se basta com o sentido compreendido realmente pelo declaratário, significando o entendimento subjectivo deste, mas apenas concede relevância ao sentido que apreenderia o declaratário normal, colocado na posição do real declaratário – a pessoa com capacidade,

razoabilidade, conhecimento e diligência medianos (ut P. Mota Pinto, op. cit., pg. 208); não se impõe ao declaratário uma investigação sobre o que o

declarante pretendeu significar com esse comportamento, mas antes a

apreensão do sentido objectivo que resulta da declaração, independentemente da cognoscibilidade da verdadeira intenção do declarante.

Ora, no sentido de que estamos perante um verdadeiro contrato de arrendamento, encontramos determinadas cláusulas, como a 1ª e a 2ª, estabelecendo um prazo para o arrendamento e a respectiva data de início (com a concomitante transferência de gozo do locado para a declaratária).

Todavia, outras cláusulas existem que apontam para a celebração de uma promessa de arrendamento – referimo-nos a expressões como “promete dar de arrendamento” (cláusula 1ª), “o contrato definitivo será celebrado quinze dias após (…)” - cláusula 6ª, “a não celebração do contrato definitivo (…) não

confere à segunda contraente o direito de reaver o montante global de

importâncias que haja pago a título de renda mensal” – cláusula 7ª, bem como a referência ao contrato definitivo na cláusula 9ª.

Cláusulas existem, também, relativas ao valor da renda, que tanto quadram com a promessa, como com o contrato definitivo.

Um elemento, porém, nos parece decisivo para que se veja na vontade de vinculação das partes a de um mero contrato preparatório, que não de um contrato definitivo – trata-se da “necessidade de obtenção da licença a que alude o artº 5º do D.-L. nº 160/2006 de 8 de Agosto” e do facto de, só após a obtenção de tal licença, se poder celebrar, no prazo de 15 dias, o contrato de arrendamento (cláusula 6ª).

Esta “necessidade” é lícito efectivamente que se extraia do disposto nos artºs 1070º nº1 C.Civ. e 5º nº1 D.-L. nº 160/2006 de 8 de Agosto.

No primeiro dos citados normativos lê-se “o arrendamento urbano só pode recair sobre locais cuja aptidão para o fim do contrato seja atestada pelas entidades competentes, designadamente através de licença de utilização,

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quando exigível”.

No segundo dos aludidos normativos pode ler-se que “só podem ser objecto de arrendamento urbano os edifícios ou suas fracções cuja aptidão para o fim pretendido pelo contrato seja atestada pela licença de utilização”.

Portanto, parece lógico assumir-se que, na inexistência de licença de

utilização, seria impossível a celebração do contrato, sem que a necessidade de licença afectasse, como é óbvio, uma mera promessa, com a componente de aquisição futura da licença em causa (como é a exacta hipótese dos presentes autos) – neste sentido, com relação à promessa de compra e venda, veja-se Ac.R.C. 28/10/08 Col.IV/36.

Ainda no mesmo sentido, versando um contrato-promessa de arrendamento, o Ac.R.L. 28/4/05 Col.III/65, ancorado, v.g., no Ac.S.T.J. 29/2/96 Col.I/107, considerou a validade da promessa, bem como a invalidade do contrato definitivo por falta de emissão de licença de utilização; da mesma forma, considerou nula a cláusula da promessa que possibilitasse a utilização de um locado, sem que o locador para tanto possuísse licença, pelo facto de uma tal cláusula visar atingir um fim proibido por lei – artºs 281º e 405º C.Civ.

Acrescente-se, finalmente, que a entrada no gozo do imóvel não caracteriza irreversivelmente o contrato como um verdadeiro contrato definitivo, da mesma forma que, se um promitente comprador, entra no gozo do imóvel prometido vender, não se poderá concluir apodicticamente que o passou a possuir em nome próprio, à semelhança do proprietário.

II

Nos presentes autos, foi junto, já na presente fase de oposição à execução, uma “folha anexa ao alvará de licença nº …/1964, da Câmara Municipal …, para habitação e ocupação de edifícios”.

Acrescenta-se que “as construções não podem ser utilizadas, no todo ou em parte, para fins diferentes dos indicados no respectivo projecto” e que “a construção só pode ser utilizada a partir de 2 de Dezembro de 1964”, sendo o documento datado também de 2/12/64.

Considere-se este, ou não, o alvará de licença de habitação em falta para a celebração do contrato definitivo, a verdade é que o dito contrato definitivo não foi celebrado e, dessa forma, o instrumento contratual trazido à execução não deixa de continuar a ser um verdadeiro “contrato promessa de

arrendamento”, com a atribuição do gozo da coisa prometida arrendar, mediante o pagamento imediato de uma renda.

Todavia, acerca da nulidade decorrente da inobservância do disposto nos artºs 1070º nº1 C.Civ. e 5º nº1 D.-L. nº 160/2006 de 8 de Agosto, somos também de opinião, com a douta sentença recorrida, que nos encontramos perante uma invalidade de regime misto – precisamente o regime estabelecido

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nos nºs 5 a 7 do citado artº 5º - sujeição do senhorio a uma coima, do

montante indicado no referido nº5 e possibilidade de o arrendatário resolver o contrato, com direito a indemnização.

Na verdade, como escrevem Laurinda Gemas, Albertina Pedroso e João Caldeira Jorge, Novo Regime do Arrendamento Urbano Anotado, 3ª ed., pgs.

720 e 721, citados na douta sentença recorrida, “sempre se está aqui perante uma nulidade atípica, na medida em que não pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal, nem invocada pelo senhorio, sempre que o arrendatário,

confrontado com a inexistência de licença de utilização (quando a mesma é necessária) e por causa imputável ao senhorio, não quis resolver o contrato”.

A posição assumida por estes autores extraía-se já do posicionamento da jurisprudência face à validade dos contratos de arrendamento, relativos a edifícios ou fracções urbanas sem licença de utilização, na exegese do

disposto no artº 9º R.A.U. (norma paralela à do artº 5º nº1 D.-L. nº 160/2006) – Ac.R.L. 27/6/96 Col.III/129, Ac.R.L. 14/1/93 Col.I/107 ou Ac.R.L. 21/1/93 Col.I/115.

Ora, o contrato não foi resolvido pela promitente locatária e a defesa que integra o douto petitório de oposição salienta o não preenchimento da

condição de obtenção da licença de utilização e o facto de não existir contrato de arrendamento definitivo, da mesma não se extraindo referência á nulidade da promessa, enquanto tal.

Daí que haja de se considerar a validade da promessa.

III

No caso dos autos, deparamo-nos com um verdadeiro contrato promessa com feição reguladora autónoma e distinta do contrato definitivo, como alude o Prof. Menezes Cordeiro, Tratado, Dtº das Obrigações, II/307 – o contrato promessa exprime uma situação estável entre as partes, e, inexistindo pressa na celebração do contrato definitivo, o contrato promessa vale por si.

No artº 410º nº1 C.Civ., sob a epígrafe “regime aplicável”, na subsecção II (contrato-promessa), do capítulo II, sobre as Fontes das Obrigações, no livro do Código Civil referente ao Direito das Obrigações, lê-se que “à convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato são aplicáveis as

disposições legais relativas ao contrato prometido, exceptuadas as relativas à forma e as que, por sua razão de ser, não se devem considerar extensíveis ao contrato promessa”.

Na sua conhecida monografia O Contrato-Promessa e o seu Regime Civil, a Profª Ana Prata dá alguns exemplos de regras inaplicáveis à promessa – as regras do contrato prometido que, “não definindo efeitos do contrato

prometido, tenham a sua razão de ser nesses efeitos” (2001, pg. 445).

E, entre tais regras, elenca as relativas à resolução do contrato de

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arrendamento prometido por parte do senhorio, ao abrigo do disposto no artº 64º R.A.U. – precisamente por não se lidar, na hipótese que a Autora analisa, com consequências do incumprimento do contrato prometido.

Da mesma forma conclui o Prof. Gravato Morais, Contrato-Promessa em Geral, Contratos-Promessa em Especial, 2009, pgs. 313 e 314.

Porém, e sempre com o respeito devido por tão consagrados autores e pela jurisprudência que citam, não vemos razão ponderosa para a afirmação de que as regras da resolução do contrato definitivo se não aplicam à promessa, por duas razões essenciais:

- em primeiro lugar, porque a promessa antecipou o contrato definitivo, nos seus efeitos essenciais (gozo da coisa e pagamento da renda), com carácter estável e duradouro;

- depois porque a economia do contrato é uma só, e parece manifesto que o bom pai de família, perante o incumprimento da obrigação de pagamento de renda, se desinteressaria justificadamente da celebração do contrato

definitivo, e invocaria a resolução do contrato (resolução enquanto extinção com carácter unilateral e vinculada – ut Pessoa Jorge, Lições, 75/76, pg.

211);

- finalmente, porque figura da promessa com tradição da coisa possui já hoje consagração legal, designadamente no disposto no artº 442º C.Civ., não podendo considerar-se uma figura residual ou meramente acessória da

promessa, submetida ao estrito regime desta, no que concerne o seu objecto principal de simples compromisso de celebração futura de um contrato.

Desta forma, entendemos que ao contrato-promessa de arrendamento, com antecipação do gozo da coisa e do pagamento da renda, podem aplicar-se as cláusulas relativas à resolução do contrato definitivo, se este ainda não foi celebrado, por aplicação do disposto na 1ª parte do nº1 do artº 410º C.Civ.

A hipótese dos autos, enquanto reveladora da possibilidade de manutenção estável do contrato promessa antecipador dos efeitos do contrato prometido, é aliás um caso notório – está em causa um montante em dívida de cerca de três anos de rendas (€ 10.150), ascendendo a renda mensal da fracção habitada a

€ 350.

Razões formais ou conceptuais não seriam aptas a afastar as finalidades da lei, interpretadas por forma a irem ao encontro das disposições contratuais postas por essas mesmas partes.

Assim, o regime dos artºs 1083º e 1084º deve valer para o contrato

promessa de arrendamento, com antecipação do gozo da coisa, na hipótese de incumprimento da obrigação de pagamento de rendas, por aplicação do

disposto no artº 410º nº1 1ª parte C.Civ.

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Resumindo a fundamentação:

I – A entrada no gozo do imóvel não caracteriza irreversivelmente o contrato como um verdadeiro contrato definitivo de arrendamento, da mesma forma que, se um promitente comprador, entra no gozo do imóvel prometido vender, não se poderá concluir que o passou a possuir em nome próprio, à semelhança do proprietário.

II – Se as partes previram a “necessidade de obtenção da licença a que alude o artº 5º do D.-L. nº 160/2006 de 8 de Agosto”, só após a obtenção de tal licença, se podendo celebrar, no prazo de 15 dias, o contrato de

arrendamento, tal elemento mostra-se decisivo para o declaratário normal visse na vontade de vinculação a referência a um contrato-promessa.

III – A nulidade decorrente da inobservância do disposto nos artºs 1070º nº1 C.Civ. e 5º nº1 D.-L. nº 160/2006 de 8 de Agosto produz uma invalidade de regime misto – precisamente o regime estabelecido nos nºs 5 a 7 do citado artº 5º.

IV – Se o contrato promessa de arrendamento, com antecipação do gozo da coisa, exprime uma situação estável entre as partes, o regime dos artºs 1083º e 1084º C.Civ. deve valer para a hipótese de incumprimento da obrigação de pagamento de rendas, por aplicação do disposto no artº 410º nº1 1ª parte C.Civ.

Com os poderes conferidos pelo disposto no artº 202º nº1 da Constituição da República Portuguesa, decide-se neste Tribunal da Relação:

Na improcedência do recurso de apelação, confirmar o douto saneador- sentença recorrido.

Custas pela Apelante.

Porto, 13/IX/2011

José Manuel Cabrita Vieira e Cunha Maria das Dores Eiró de Araújo

João Carlos Proença de Oliveira Costa

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