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INSTITUTO DE FÍSICA UERJ II SEMANA DE FÍSICA

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Academic year: 2021

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INSTITUTO DE F´ISICA – UERJ II SEMANA DE F´ISICA

DISCURSO DE ABERTURA

Caros alunos e prezados colegas. Nesta II Semana de F´ısica que hoje se inicia, promovida pelos alunos do Instituto de F´ısica da UERJ, f´ısicos de diversas ´areas vir˜ao aqui, durante alguns dias, falar sobre o est´agio atual do conhecimento cient´ıfico em sua

´area de atua¸c˜ao, ou de aspectos da evolu¸c˜ao hist´orica da F´ısica.

Gostaria, portanto, de abordar um tema que transcende os limites t´ecnicos da Ciˆencia, partindo da exposi¸c˜ao de alguns fatos indi- cadores de como as autoridades brasileiras olham para a Ciˆencia, ou de como a Ciˆencia (em particular a F´ısica) est´a inserida no contexto s´ocio–pol´ıtico–econˆomico atual. Espero que todos vocˆes encarem isto como um convite `a reflex˜ao.

Talvez a Ciˆencia no Brasil esteja ficando doente, ou, pelo menos, est˜ao querendo coloc´a–la como tal. O primeiro grande sintoma disto ´e a falta de um programa cient´ıfico nacional e o afas- tamento da comunidade cient´ıfica no que diz respeito `a sua par- ticipa¸c˜ao ativa em todos os processos decis´orios de defini¸c˜ao dos programas, para os quais ela deveria ser precisamente a primeira a ser consultada e ouvida.

Um exemplo claro disto ´e o Programa Nuclear Brasileiro, comprado da Alemanha como uma caixa preta. ´E importante lembrar que, por volta do in´ıcio da d´ecada de 50, o Brasil se encontrava num est´agio compar´avel ao de v´arios outros pa´ıses adiantados, no que se refere a estudos de F´ısica Nuclear. Entre- tanto, desde aquela ´epoca, os cientistas brasileiros n˜ao tiveram a oportunidade de levar avante seus projetos, por falta de apoio institucional, e muito menos foram ouvidos, mais recentemente, quando criticaram e se opuseram `a importa¸c˜ao de um programa j´a desenvolvido em outro pa´ıs.

Outro aspecto que demonstra a falta de prest´ıgio de nossa comunidade cient´ıfica junto ao governo est´a relacionado ao novo projeto nacional, recentemente divulgado: o PIC (Programa de

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Importa¸c˜ao de C´erebros). Este projeto vai se encarregar de trazer pesquisadores estrangeiros, por per´ıodos de at´e 3 anos, nas ´areas de inform´atica, constru¸c˜ao naval e outras duas que n˜ao me lembro.

O mais incr´ıvel ´e o sal´ario que eles receber˜ao: aproximadamente US$ 5,000.00 mensais. Se algu´em tiver curiosidade, pergunte a um pesquisador brasileiro qual ´e o seu sal´ario. Para vocˆes terem um termo de compara¸c˜ao, este valor equivale a aproximadamente 22 bolsas de doutorado, ou 35 bolsas de mestrado no pa´ıs. “Mas se podemos comprar pronto, para que fazer?”.

Essa ´e outra forma que arranjaram para (des)incentivar a Ciˆencia no nosso pa´ıs: a pol´ıtica de forma¸c˜ao de novos pesquisa- dores. Os atuais valores das bolsas do CNPq e da CAPES s˜ao os seguintes: aproximadamente Cr$ 71.000,00 para a bolsa de Mestrado e Cr$ 111.000,00 para a de Doutorado. Isto quer dizer que a bolsa de Mestrado equivale hoje a cerca de 2 sal´arios m´ıni- mos, enquanto que h´a quatro anos ela valia aproximadamente 5 sal´arios m´ınimos. E isto porque houve um reajuste de 50% dado

`as bolsas, com a promessa de um pr´oximo reajuste de 40% em setembro. A conseq¨uˆencia disso ´e t˜ao simples quanto s´eria. Muitos bolsistas acabam sendo obrigados a procurarem outras atividades, as quais, na maioria das vezes, nada tem a ver com sua ´area espec´ıfica de trabalho, e o resultado ´e ´obvio.

No entanto, como somos muito otimistas, pensamos que de- pois de passarmos cerca de 8 anos como bolsistas de p´os–gradua-

¸c˜ao, finalmente seremos contratados por uma Institui¸c˜ao e, por fim, teremos boas condi¸c˜oes de trabalho. Isto muitas vezes n˜ao ´e o que acontece, infelizmente, e outros tipos de empecilho come¸cam a surgir. Por exemplo, falta de verba para equipamentos, falta de recursos para participa¸c˜ao em conferˆencias nacionais e interna- cionaisetc.

Apesar deste quadro desfavor´avel, devemos buscar for¸cas na pr´opria hist´oria da Ciˆencia. Na Gr´ecia Antiga, o fil´osofo, matem´a- tico e astrˆonomo Tales de Mileto constantemente ouvia a acusa¸c˜ao de seus estudos n˜ao terem sentido pr´atico, e lhe era constante- mente lembrada a pobreza em que vivia. Assim, um dia, para mostrar que os fil´osofos tamb´em s˜ao capazes de ganhar dinheiro,

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comprou, a presta¸c˜ao, todas as prensas de oliva que havia na localidade e passou a cobrar uma taxa pelo uso destas prensas.

Tornou–se, deste modo, um rico comerciante. A´ı ele disse: “os que permanecem pobres, ´e porque tˆem alguma coisa mais impor- tante a fazer do que ganhar dinheiro”. Quero dizer, com esta cita¸c˜ao, que apesar de todas as dificuldades que vislumbramos,

´e preciso que tenhamos como valor, como “a coisa mais impor- tante”, nosso ideal; ´e preciso trabalhar duro, muito duro, para alcan¸c´a–lo. Este ´e o caminho de alcan¸carmos a maior riqueza:

nossa satisfa¸c˜ao pessoal e intelectual.

Outra quest˜ao que gostaria de abordar ´e o papel do Instituto de F´ısica da UERJ na forma¸c˜ao b´asica de futuros pesquisadores e professores, no contexto acima.

Vocˆes, ao realizarem esta Semana de F´ısica, est˜ao mostrando que a vontade de trabalhar dentro de uma Universidade n˜ao ´e um privil´egio dos mais experientes, nem t˜ao somente dos professores.

O fato de nos reunirmos aqui diariamente, durante uma semana, para discutirmos F´ısica ´e uma prova de que ´e poss´ıvel fazer coisas boas suplantando a falta de apoio com muito dedica¸c˜ao. Isto n˜ao quer dizer, entretanto, que n˜ao se deva almejar um reconhecimento amplo, traduzido em forma de apoio concreto a iniciativas como esta.

E importante que todos juntos, professores, alunos e diri-´ gentes, lutem para evitar que a Universidade caia no mero aca- demicismo. Em particular, ´e preciso que professores e alunos do nosso Instituto de F´ısica se conscientizem de que, na sua atual fase, ainda h´a uma carˆencia bem grande de debates cient´ıficos, semin´arios especializados e col´oquios. Por isto, aproveito esta oportunidade para assinalar que o esp´ırito que domina este Encon- tro de F´ısica, desde sua programa¸c˜ao at´e sua realiza¸c˜ao, deveria se manter aceso durante todo o ano. Estou me referindo ao pouco interesse demonstrado pelo corpo docente e discente com rela¸c˜ao ao programa de semin´arios semanais que tivemos nos ´ultimos dois anos. Em resumo, lamento profundamente que estes semin´arios tenham sido suspensos por falta de interesse e participa¸c˜ao de todos.

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Por outro lado, ´e uma pena que nosso Instituto esteja sempre come¸cando, no que concerne `a forma¸c˜ao de seu corpo docente.

Apesar da boa iniciativa de contratar, sempre que poss´ıvel, seus ex–alunos que se destacaram no curso e est˜ao inscritos em pro- gramas de p´os–gradua¸c˜ao, o Instituto de F´ısica carece de uma infra–estrutura que fixe estes novos professores. Temos v´arios e- xemplos de professores que foram fazer doutorado no exterior, sem vencimentos, e, portanto, sem v´ınculo com a UERJ, e ´e freq¨uente o professor concluir seu Mestrado ou Doutorado e ser convidado para ingressar em outro Universidade, ficando, quando muito, em tempo parcial na UERJ.

Uma vez decidido que devemos realmente formar aqui na UERJ um Instituto de Pesquisas em F´ısica — e acho que de- vemos — esta conjuntura deve imediatamente ser alterada. Deve haver incentivo a contrata¸c˜oes de professores com hor´ario integral e dedica¸c˜ao exclusiva para que haja a possibilidade de forma¸c˜ao de grupos de pesquisa cient´ıfica aqui no Instituto de F´ısica.

E claro que uma Universidade impossibilitada, por decreto,´ de comprar livros e peri´odicos editados em idioma estrangeiro para suas bibliotecas fica fadada a n˜ao ter chances de poder gerar condi¸c˜oes m´ınimas para forma¸c˜ao de grupos de pesquisa, e mesmo de trabalho.

Apesar de todos os problemas, a atual dire¸c˜ao do Instituto de F´ısica deu um grande passo ao definir as diretrizes de uma pol´ıtica interna de capacita¸c˜ao docente visando propiciar o surgimento de alguns grupos de pesquisa. Sem d´uvida alguma, este ´e o caminho certo a seguir. O fortalecimento de um grupo, capaz de apresentar projetos `as institui¸c˜oes de fomento `a pesquisa e desenvolvˆe–los aqui na UERJ, viabilizar´a a forma¸c˜ao de novos grupos com o passar do tempo.

J´a quanto `a parte acadˆemica, tenho a certeza de que o Insti- tuto de F´ısica da UERJ atingiu um n´ıvel comparado ao de outras Universidades do Rio de Janeiro. Um indicador a favor desta afirma¸c˜ao ´e o bom rendimento de nossos ex–alunos em progra- mas de p´os–gradua¸c˜ao em v´arias institui¸c˜oes. Acredito, por´em, que ainda h´a muito o que fazer para melhorar nossa gradua¸c˜ao,

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e j´a estamos trabalhando neste sentido. Por exemplo, estamos empenhados em melhorar as condi¸c˜oes de apoio `as atividades de ensino. Recentemente foi criada a sala de estudos do I.F., est˜ao sendo estudados mecanismos de incentivo `a publica¸c˜ao de notas de aula, monografias e livros dos professores do I.F., reservando um espa¸co para eventuais publica¸c˜oes dos alunos (“mem´orias”).

Um terceiro passo nesse sentido consiste em dar particular aten¸c˜ao ao curso de Licenciatura em F´ısica. Sobre este curso gostaria de falar alguma coisa, dirigindo–me, em especial, aos alunos que es- colheram ou pensam em escolher a carreira de magist´erio. N˜ao pautem nunca sua escolha no fato do curso ser “mais f´acil” do que o Bacharelado. A sua escolha deve ser por aptid˜ao, por amor, pois ´e preciso ter consciˆencia e orgulho da responsabilidade que ´e formar pessoas. Quanto ao I.F., cabe a ele dar todo apoio a este curso que considero fundamental para a mudan¸ca, a longo prazo, da qualidade da forma¸c˜ao b´asica de alunos de segundo grau.

Concluindo, gostaria de dizer que espero que o velho sonho do nosso querido Mestre Armando Dias Tavares de ver implan- tada a p´os–gradua¸c˜ao no Instituto de F´ısica, quando tiver que ser realizado, n˜ao seja atrav´es da imposi¸c˜ao de mais um “pacote fechado”, mesmo que o embrulho seja de presente. Ao contr´ario, espero que haja em torno da P´os–Gradua¸c˜ao uma ampla discuss˜ao envolvendo o corpo docente e discente, uma vez que s˜ao os princi- pais interessados. Acredito, sinceramente, que isto ser´a poss´ıvel a m´edio ou longo prazo, desde que haja um investimento, por parte da UERJ, na especializa¸c˜ao de seus professores e na forma¸c˜ao de grupos de pesquisa.

Espero n˜ao ter me estendido muito e agrade¸co enormemente o convite para participar da cerimˆonia de abertura desta II Semana de F´ısica da UERJ. Desde j´a, parabenizo o comitˆe organizador e desejo que este Encontro seja um grande sucesso.

Rio de Janeiro, 16/05/1983

Francisco Caruso

Referências

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