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A reinvenção do rococó pela indústria de luminária francesa e alemã no último quartel do século XIX

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Academic year: 2023

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REVISTA DE HISTÓRIA DA ARTE E CIÊNCIAS DO PATRIMÓNIO REVISTA DE HISTÓRIA DA ARTE E CIÊNCIAS DO PATRIMÓNIO

NÚMERO/07-08 ANO/2019-2020

08 07

EM PORTUGAL

O ROCOCÓ NAS VIATURAS DE GALA

A ARTE DOS GERMAIN

A BAIXELA REAL

E INFLUÊNCIAS FRANCESAS NA OURIVESARIA ROCOCÓ

NA AZULEJARIA

O ESTILO REGÊNCIA EM PORTUGAL

ANDRÉ SOARES (1720-1769)

A DIFÍCIL ESCOLHA ENTRE O ROCOCÓ E O TARDOBARROCO

AUTOR CONVIDADO

PETER FUHRING

ROCOCÓ ROCOCÓ

(2)

REVISTA DE HISTÓRIA DA ARTE E CIÊNCIAS DO PATRIMÓNIO

REVISTA DE HISTÓRIA DA ARTE E CIÊNCIAS DO PATRIMÓNIO

(3)

2ª série, n.º 7/8, dezembro de 2020 Tema: Rococó

A revista ARTIS é publicada com arbitragem científica

DIRETOR

Vítor Serrão

VICE DIRETORA

Maria João Neto

EDITORES

Eduardo Pires de Oliveira Joaquim Rodrigues dos Santos

CONSELHO CIENTÍFICO

Alexandre Alves Costa André Teixeira António Pimentel Aziz Oliveira Pedrosa Beatriz Coelho Carlos Moura Celso Mangucci Clara Moura Soares

Fernando António Baptista Pereira Fernando Grilo

João Vieira Caldas

José Alberto Gomes Machado José Manuel Fernandes José Manuel Tedim Luís Urbano Afonso

Manuel Joaquim Moreira da Rocha Maria Alexandra Trindade Gago da Câmara Maria Eduarda Moreira da Silva

Maria Isabel Fernandes Maria João Neto

Maria Regina Emery Quites Miguel Cabral Moncada Paulo Pereira

Pedro Lapa Regina Anacleto Sílvia Ferreira Teresa Leonor Vale Vítor Serrão

FOTOGRAFIA DA CAPA

Pormenor do Retábulo de Nossa Senhora do Rosário, Igreja do Mosteiro de São Domingos, Viana do Castelo (fotografia: Adelino Silva)

DESIGN GRÁFICO

António Queirós, design

PAGINAÇÃO

Nuno Pacheco Silva Nuno Ribeiro

PERIODICIDADE

Anual

TIRAGEM

1000 exemplares

DEPÓSITO LEGAL

187650/02

ISBN

978-989-658-690-4

PREÇO

????? Euros (IVA inc. a 6%) REVISTA DE HISTÓRIA DA ARTE E CIÊNCIAS DO PATRIMÓNIO

Os textos são da inteira responsabilidade dos respetivos autores bem como os critérios ortográficos adotados.

Os textos e as imagens desta publicação não podem ser reproduzidos sem autorização prévia.

EDIÇÃO E DISTRIBUIÇÃO

Caleidoscópio – Edição e Artes Gráficas, S. A.

Rua Cidade de Nova Lisboa, Quinta Fonte do Anjo, 1-A 1800-108 Lisboa – PORTUGAL

Tel.: (+351) 21 981 79 60 · Fax: (+351) 21 981 79 55 e-mail: caleidoscopio@caleidoscopio.pt www.caleidoscopio.pt

APOIO

PROPRIEDADE

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EDITORIAL

O Rococó é um estilo ainda não completamente entendido no que à cultura artística portuguesa diz respeito. A verdade é que, mesmo na época histó- rica em que foi produzida a maioria das obras que se reclamam desse epíteto – o terceiro quartel do século XVIII –, ele não foi entendido nem pelas eli- tes portuguesas, nem pelos artistas coevos, senão em certas sugestões e dinâmicas ornamentais.

Todavia, na cidade de Braga, no coração do Noroeste português, as comunidades locais acolheram este novo estilo, naquilo que trazia de arrebatamento de formas e inovação inventiva; e aceitaram-no – como também o aceitaram os seus artistas e as elites res- ponsáveis pelas encomendas – porque o Rococó foi dado a conhecer à sombra do gosto do Arcebispo Primaz bracarense, a mais importante personali- dade religiosa e civil da cidade. O facto (mais impor- tante ainda) de esse mesmo arcebispo ser D. José de Bragança, o irmão do “Magnânimo” rei D. João V de Portugal, não pôde deixar de ter peso determi- nante na aceitação dos novos formulários artísticos.

Ou seja: as gentes de Braga aceitaram o Rococó, tal como chegava por via das opções do mais alto dig- nitário da Igreja local; mas, em boa verdade, não o compreenderam totalmente porque em mui- tas obras importantes o preenchimento dos espa- ços e os volumes continuaram a ser os do barroco!

Ao pretender impor um novo ciclo na Arquidiocese bracarense, que seria marcado pelo seu magisté- rio, no que toca aos novos empreendimentos cons- trutivos e ao seu equipamento ornamental, o arce- bispo D. José de Bragança socorreu-se de um artista de génio, André Soares, que iria ter papel prepon- derante na implantação desse novo estilo artístico nas decorações pétreas e de entalhe produzidas em Braga: o Rococó.

De facto, tirando o caso de Braga, único no pano- rama português de Setecentos, o Rococó não será inteiramente entendido nas demais cidades por- tuguesas. Lisboa, apesar de ter recebido a cele- brada Baixela Germain, preferiu o Pombalino, um

“estilo” essencialmente pragmático, como pragmá- tico era o seu mentor… O centro artístico do Porto também o terá entendido muito mal: a sua arquitec- tura passa do Barroco para o Neoclassicismo, usando

o vocabulário do Rococó apenas e só (ou quase) na arte da talha e do mobiliário. Mas o que dizer, fora da rota das grandes cidades, de um monumento como o Santuário de Nossa Senhora de Aires, em Viana do Alentejo, obra emblemática colocada em pleno pulmão dos campos de lavoura baixo-alente- jana, inscrito no meio de uma paisagem sem outras construções à sua volta, fazendo lembrar os san- tuários bávaros do Rococó, situados longe de tudo e todos? E a insólita Casa de Vila Boa de Quires, em Marco de Canaveses, que não passou da fachada e, aos olhos de hoje, antes parece um pitoresco cená- rio de cinema? Ou aquelas espantosas obras gordas e espessas do Rococó brasileiro de Minas Gerais, que de certa forma espelham as raízes minhotas de mui- tos dos artistas que levaram o novo estilo europeu àquela região do outro lado do Atlântico? Ou, ainda, aquelas fachadas e talhas das igrejas de Goa, intensa e ricamente esculpidas como se fossem obras de ourivesaria devidamente aclimatadas aos gostos locais hindustânicos?

O Rococó será pois, em Portugal, uma arte de equí- vocos... Mas a verdade é que, sendo o Rococó um estilo livre, é na sua essência mais pura um estilo que aceita a diferença; quando confrontados, o Rococó francês é muito diferente do da Baviera, como o da Baviera é diferente daquele que se vê em Portugal!

Aqui, no extremo ocidental da Europa, estava- -se longe dos espíritos esclarecidos, palacianos, das opulentas construções francesas; ou de muitas outras que se podem ver pela Europa germânica, em que o Rococó se vai assumir, em moldes grandilo- quentes, através de um espírito mais pujante. Algo que o mundo lusitânico muito dificilmente acom- panhou, tendo que se restringir ao conhecimento do novo gosto artístico mediante gravuras que iam chegando da pequena cidade de Aubsburgo – gravu- ras essas que se assumiram como a principal forma de difusão dos modelos e repertórios do novo gosto Rococó, desde a Polónia à Sicília, a Portugal ou a Minas Gerais.

Aqui chegados, não deixa de ser curioso que, se é verdade que o novo estilo do Rococó não foi (e nem poderia ser) bem entendido no Portugal de mea- dos do século XVIII, também não é menos verdade

EDUARDO PIRES DE OLIVEIRA / JOAQUIM RODRIGUES DOS SANTOS / VÍTOR SERRÃO

que ainda hoje continua a ser um “estilo” sem clara declinação ou óbvias balizas cronológicas no tempo histórico em que se manifestou. Entre uma historio- grafia de arte que lhe nega a existência como estilo autónomo – pesem os estudos basilares de Philippe Minguet (Esthétique du Rococo, 1966) ou de Julio Seoane (La Política Moral del Rococó, 2000) –, e uma outra que o vê apenas como o estertor declinante do Barroco, desenham-se hoje outras correntes e ten- dências que, a partir de uma revisão séria do “estado da arte”, buscam fixar-lhe as características intrín- secas e a sua validade como estilo próprio…

O mesmo se passou com a discutida existência do Maneirismo, entre o Renascimento e o Barroco, visto tanto como uma mera derivação epigonal (e indisciplinada) do classicismo, ora como um verda- deiro estilo autónomo, com tempo histórico definí- vel e base repertorial precisa. E poderiam debater-se igualmente as questões relativas ao Manuelino ou ao estilo Chão, que vão desde a atribuição a meras deri- vações de outros estilos ou modas artísticas, até ao seu reconhecimento estilístico... No caso das dis- cussões sobre o Rococó, a verdade é que a força da reacção neoclássica, manifesta em todas as latitu- des, ao visar justamente as excrescências e bizar- rias do gosto rocaille, acaba por lhe dar atestado de existência! E o mesmo se passa, também, em terras portuguesas, com Braga a sobressaír como caso de estudo indiscutível – que se poderia estender à sua alma gémea mineira, de terras brasilienses.

Esta é assim a principal razão para se produzir este número da revista Artis: cumpre lembrar aos portu- gueses (e aos brasileiros, e franceses, e alemães, e a outros...) que o Rococó foi um estilo deveras rele- vante, importando por isso desvendá-lo, revelá- -lo, compará-lo e debatê-lo em conjunto, ana- lisar a sua componente teórico-prática, os seus modelos, obras, artistas, mecenas, áreas de expan- são, influências, materiais, permanências... E este é, muito precisamente, o momento ideal para tal debate alargado: os anos de 2019 e 2020, datas em que se comemoram respectivamente os 250 anos da morte e os 300 anos do nascimento de André Soares, o principal vulto do Rococó português.

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sumário

Rococó

Isabel Mayer GodInho Mendonça

estuques DecoratiVos em portugal e a DiVulgação Do rococó

Pág. 106

João Castel-branCo PereIra

o rococó nas Viaturas De gala em portugal

Pág. 114 luIsa Penalva João MaGalhães

a arte Dos germain: a BaiXela real e influÊncias francesas na ouriVesaria rococó em portugal

Pág. 124

MarIa da ConCeIção borGes de sousa

tão inVulgar como eXtraorDinária:

a fonte com mesa Do museu nacional De arte antiga

Pág. 134

José vIeIra GoMes

forma e informação em trÊs retáBulos De anDrÉ soares

Pág. 140

JoaquIM rodrIGues dos santos

a talha rococó em goa:

retáBulos e pÚlpitos

Pág. 148 raquel seIxas

Barroco e rococó:

Dois estilos em complemento – o santuário De nossa senhora De aires como caso De estuDo

Pág. 64

doMInGos tavares

Desenhar na paisagem

Pág. 72

José Carlos Meneses

as oBras Do fiDalgo em Vila Boa De quires – marco De canaVeses: uma simBiose De Barroco e rococó

Pág. 80

vítor serrão

uma Brisa rococó na arquitectura sacra Do alenteJo

a igreJa De nossa senhora Da assunção em messeJana e o moDelo De fachaDa simÉtrica com torres roDaDas

Pág. 88

andré GuIlherMe dornelles danGelo vanessa borGes brasIleIro

as fontes De DiVulgação Do rococó nas minas gerais setecentistas:

noVas contriBuiçÕes soBre o tema e seus agentes culturais

Pág. 98 Peter FuhrInG autor conViDaDo

rococó

Pág. 10

eduardo PIres de olIveIra JoaquIM rodrIGues dos santos

entreVista a

mYriam riBeiro De oliVeira

Pág. 20

eduardo PIres de olIveIra

anDrÉ soares

\1720-1769

a Difícil escolha entre o rococó e o tarDoBarroco

Pág. 28

José MeCo

o estilo regÊncia na aZuleJaria em portugal

Pág. 38 hélder CarIta

JoaquIM rodrIGues dos santos

a sala Do trono Do palácio De queluZ e o estilo regÊncia

Pág. 48

dIoGo leMos

o Despontar Do rococó em portugal:

o genre pittoresque e os retratos Da sala Dos tuDescos Do palácio De Vila Viçosa

Pág. 58

FranklIn PereIra

o rococó nos couros artísticos (estofos, saco De omBro e frontal De altar )

Pág. 158

PatríCIa Cotta

moBiliário portuguÊs Do 3º quartel Do sÉculo XViii:

rococó ou “D. JosÉ”

Pág. 166

ana MarGarIda dIas da sIlva

apontamentos para a história Do traJe ciVil rococó em portugal

Pág. 174

kellen CrIstIna sIlva

minerVa colonial: uma Deusa rococó em terras mineiras

Pág. 180

antónIo Cota FevereIro

a reinVenção Do rococó pela inDÚstria De luminária francesa e alemã no Último quartel Do sÉculo XiX

Pág. 188

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sylvIe deswarte-rosa

um retrato De nicolau clenarDo em ÉVora por antónio De holanDa em 1537?

Pág. 200

soFIa braGa

uma noVa eXpressão estÉtica na oBra Dos artistas francisco Vilaça, Domingos costa e BenVinDo ceia

Pág. 204

sónIa duarte

notas para o estuDo Da aZuleJaria Do refeitório Do eXtinto colÉgio De santo antónio Da peDreira, em coimBra

\ c.1760

Pág. 208

Gonçalo de vasConCelos e sousa

assim ViVia um casal Da elite possiDente De mariana (minas gerais), nos finais De setecentos

Pág. 212

saGara JayasInGhe

altares DecoratiVos De igreJas missionárias oratorianas no sri lanKa

Pág. 216

Mayur thakare

casas aBanDonaDas:

reDescoBrinDo as resiDÊncias senhoriais portuguesas na antiga proVíncia Do norte

\ 1534-1739 Pág. 220

raMIro a. Gonçalves

o misterioso monsieur lannoY:

marchanD parisiense Do conDe De Daupias, Do conDe De BurnaY e Da rainha D. maria pia

Pág. 224

eduardo PIres de olIveIra

um estuDo magistral De marie thÉrÈse manDrouX-frança soBre a graVura rococó em portugal

Pág. 228

sónIa duarte

recensão ao liVro “Watteau, music, anD theater”

Pág. 232

vítor serrão

recensão ao liVro “o culto a camÕes e o mosteiro Dos Jerónimos:

o restauro Do monumento no sÉculo XiX”

Pág. 234 vítor serrão MarIa João neto

eVocação De manuel BatorÉo

Pág. 236

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ana margarida dias da silva

Técnica superior na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra / Centro de História da Sociedade e da Cultura, Universidade de Coimbra andré guilherme dOrnelles dangelO

Professor Associado no Departamento de Análise Crítica e Histórica da Arquitetura e do Urbanismo (Escola de Arquitetura / Universidade Federal de Minas Gerais)

antóniO cOta fevereirO

Investigador no ARTIS - Instituto de História da Arte, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa

diOgO lemOs

Investigador na Universidade de Coimbra / Bolseiro de Investigação da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT)

dOmingOs tavares

Investigador no Centro de Estudos de Arquitectura e Urbanismo, Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto

eduardO pires de Oliveira

Investigador no ARTIS - Instituto de História de Arte, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa

franklin pereira

Investigador no ARTIS - Instituto de História da Arte, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa

gOnçalO de vascOncelOs e sOusa

Professor Catedrático da Escola das Artes da Universidade Católica Portuguesa / Investigador no CITAR - Centro de Investigação em Ciência e Tecnologia das Artes, Escola das Artes da Universidade Católica Portuguesa

hélder carita

Investigador no Instituto de História de Arte, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade NOVA de Lisboa

isabel mayer gOdinhO mendOnça

Investigadora no Instituto de História de Arte, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade NOVA de Lisboa

JOãO castel-brancO pereira

Director jubilado do Museu Calouste Gulbenkian / Antigo Conservador do Museu Nacional dos Coches / Antigo Director do Museu Nacional do Azulejo

JOãO magalhães

Director e especialista sénior na Sotheby’s JOaquim rOdrigues dOs santOs

Investigador e professor convidado no ARTIS - Instituto de História de Arte, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa

JOsé carlOs meneses

Professor no ISCE DOURO - Instituto Superior de Ciências Educativas do Douro (Penafiel) / Investigador no CEPESE - Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade, Universidade do Porto

JOsé mecO

Membro da Academia Nacional de Belas Artes JOsé vieira gOmes

Investigador no ARTIS - Instituto de História da Arte, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa / Bolseiro de investigação (doutoramento) da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) kellen cristina silva

Coordenadora do Ninfa - Núcleo Interdisciplinar de Estudos da Imagem, Universidade Federal de Minas Gerais / Professora do Ensino Público de Minas Gerais - EESFA

luísa penalva

Técnica superior no Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA)

maria da cOnceiçãO bOrges de sOusa

Antiga conservadora das coleções de Arte da Expansão Portuguesa e de Mobiliário do Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA) de Lisboa maria JOãO netO

Professora associada, directora e investigadora no ARTIS - Instituto de História da Arte, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa

mayur thakare

Assistente técnico no Directorate of Archaeology and Museums, Government of Maharashtra (Índia) myriam ribeirO de Oliveira

Professora aposentada na Universidade Federal do Rio de Janeiro / Antiga conselheira consultiva do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN)

patrícia cOtta

Investigadora no ARTIS - Instituto de História da Arte, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa

peter fuhring

Consultor científico na Foundation Custodia ramirO a. gOnçalves

Assistente da Coleção de Pintura/Comunicação, Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA) raquel seiXas

Investigadora no Instituto de História da Arte, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade NOVA de Lisboa / Bolseira de investigação (doutoramento) da FCT - Fundação para a Ciência e a Tecnologia (SFRH/

BD/1089973/2015) sagara Jayasinghe

Investigador no ARTIS - Instituto de História da Arte, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa / Professor no Departamento de Design Integrado, Universidade de Moratuwa (Sri Lanka) sOfia braga

Investigadora no ARTIS - Instituto de História da Arte, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa

sónia duarte

Investigadora no ARTIS - Instituto de História da Arte, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa / Investigadora no CESEM - Centro de Estudos de Sociologia e Estética Musical, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade NOVA de Lisboa / Bolseira de investigação (doutoramento) da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT)

sylvie deswarte-rOsa

Diretora de pesquisa “Émérite” do CNRS na École Normale Supérieure de Lyon, Institut d’Histoire des Représentations et des Idées dans les Modernités

vanessa bOrges brasileirO

Professora Associada da Escola de Arquitetura, Universidade Federal de Minas Gerais

vítOr serrãO

Professor catedrático e investigador no ARTIS - Instituto de História da Arte, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa

autores que colaBoraram neste nÚmero

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A REINVENÇÃO DO ROCOCÓ

PELA INDÚSTRIA DE LUMINÁRIA FRANCESA E ALEMÃ NO ÚLTIMO QUARTEL DO SÉCULO XIX

No decurso da investigação em torno da luminária da extinta Casa Real Portuguesa, constatamos a existência de uma quantidade significativa de luminária francesa neorrococó do último quartel do século XIX nos palácios nacionais. A mesma tendência foi seguida na Alemanha; esta propensão em comum intensificou- se após a guerra franco-prussiana (1870-1871). Nos dois países desenvolveram- se determinadas características que importam dar aqui a conhecer. Este estudo é sustentado pelo cotejamento de bibliografia e documentação coeva, foca-se nas diferentes abordagens e contextualizações com novas reflexões, colmatando assim a escassez de estudos sobre luminária oitocentista.

The reinvention of Rococo by the French and German lighting industry in the last quarter of the 19th century

During an investigation of the former lighting fixtures of the Portuguese Royal House, a significant amount of French rococo revival lamps from the last quarter of the 19th century was found to exist in the national palaces. And the same trend was followed in Germany. This mutual tendency intensified after the Franco-Prussian War (1870-1871) and certain characteristics developed in both countries require further analysis. This study is complemented by the examination of bibliography and documentation from the period in question, focusing on different approaches and contextualizations and offering new reflections, thereby countering the almost complete absence of studies on 19th-century lighting.

ANTÓNIO COTA FEVEREIRO

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FIG. 1 \ Palácio Foz, Gabinete, Epocha Luiz XV, 1891, M. Caetano de Portugal (atrib.); prova fotográfica em papel direto de colódio mate; 18x24 cm (fonte: Col. Álbum do Palácio dos Marqueses da Foz I FCG – Biblioteca de Arte e Arquivos, CFT172.018, Lisboa)

INTRODUÇÃO

O presente artigo aborda as particularidades da pro- dução francesa e alemã de luminária neorrococó no último quartel do século XIX. Para compreender- mos a relação entre o desenho e a função, é neces- sária uma breve contextualização sobre a evolução histórica, tipológica e estética da luminária oito- centista europeia.

Ao longo do texto usaram-se as seguintes siglas: PNA para Palácio Nacional da Ajuda, PNP para Palácio Nacional da Pena, PNM para Palácio Nacional de Mafra, PNS para Palácio Nacional de Sintra e MNAA para Museu Nacional de Arte Antiga, as quais apare- cem conjuntamente com os números de inventário de peças que fazem parte do seu acervo.

O NEORROCOCÓ NO DESENHO DA LUMINÁRIA OITOCENTISTA

O movimento Rococó desenvolveu-se em França e caracteriza-se pelas linhas sinuosas, orgânicas e sensuais. Foi propagado pelo rei Luís XV de França (1710-1774) e sua favorita, a Madame de Pompadour (1721-1764), sensivelmente no período de 1730 a 1765, como reflexo de um estilo de vida sofisticado e exuberante, enfatizando a assimetria e a natureza no desenho arquitetónico e nas artes decorativas.

No reinado de Luís XVI (1754-1793) prevaleceu um gosto pela época clássica e pela simetria, que deu origem ao neo-classicismo. Com a queda do monarca e a Revolução Francesa (1789-1799), sur- giu uma nova conjuntura social e política euro- peia, nomeadamente a ascensão da burguesia e o desenvolvimento industrial. É neste contexto que Napoleão Bonaparte (1769-1821) se torna, em 1804, o primeiro imperador de França. O gosto pelo clas- sicismo e a simetria continuou no seu período e evo- luíu para o denominado estilo Império. A queda do imperador e, posteriormente, a ascensão ao trono de França, em 1830, do rei Luís Filipe I (1773-1850), primo dos monarcas anteriores, coincide com o for- talecimento da burguesia e do poder de compra. É no seu reinado que nasce em França o ecletismo, tomando como fonte de inspiração a época gótica, da renascença, a barroca e a do rococó. Todavia, parte desta apetência foi provavelmente incenti- vada pelo rei por estar relacionada com a dos seus antepassados, por ser parente próximo dos últimos reis de França e por relembrar uma certa nostalgia do Ancien Régime. Pretendia-se legitimar assim a sua posição no trono de França.

O Neorrococó encontrou assim um campo fér- til para novas abordagens desenvolvidas no mobi- liário, na decoração interior, na ourivesaria e na arquitetura. O principal centro difusor foi a França, mas rapidamente alastrou para a Alemanha, Reino Unido e Estados Unidos da América, tornando-se sinónimo de aristocracia, bon goût, requinte, luxo e sofisticação pelas classes dirigentes coevas e satis- fazendo desta forma a necessidade de apropriação do façon de vivre da realeza setecentista pela nova burguesia emergente1.

Paralelamente, desenvolveu-se a iluminação arti- ficial a óleo vegetal. A cidade de Paris tornou- -se no maior centro produtor e exportador mun- dial de candeeiros, sobretudo os do tipo Carcel e modérateur2. Este último foi considerado pelo his- toriador belga Phillipe Deitz la reine des lampes du XIXe siècle3. As principais fábricas foram: Carcel;

Gagneau; Gotten; Hadrot; Joseph Schlossmacher;

Levavasseur Fréres; Neuburger e Noël Bosselut, entre outras. Estas souberam acompanhar as ten- dências em voga e lançaram no mercado luminária inspirada nas várias épocas do Passado, mas tam- bém na cultura chinesa, japonesa e árabe4.

Criaram-se candeeiros em que confluíram várias tendências num só exemplar: pode-se referir como por exemplo um modérateur com montagens em bronze neorrococó adaptado a um vaso em por- celana oriental, dita Imari, na biblioteca neor- renascença do banqueiro russo barão Alexander von Stieglitz (1814-1884), em São Petersburgo5. A mesma combinação é visível em dois modérateurs (PNA, inv. 1302 e 1384) que pertenceram à rainha D. Maria Pia de Portugal (1847-1911)6. Finalmente, há que salientar um par de modérateurs adquiridos pelo rei D. Fernando II de Portugal (1816-1885) com pés em metal dourado neorrococó e corpo exte- rior em porcelana, mas com originais ornatos neor- renascentistas/neorrococós e grinaldas de flores (PNA, inv. 42031)7. Toda esta metalística está em consonância com o desenho setecentista, mas foi adaptada para a luminária.

1 IGRA, Caroline – Reviving the Rococo: Enterprising Italian Artists in Second Empire Paris. Art History. 3: 28 (2005), pp. 346-347.

2 O candeeiro Carcel foi inventado em 1800 pelo relojoeiro francês Bernard Guillaume Carcel (1750-1818), sendo também designado como de relojoeiro, de maquinismo ou mecânico. O modérateur foi patenteado em 1836 pelo engenheiro francês Charles-Louis- Felix Franchot (1809-1881) [ALLEMAGNE, Henry-René d’ – Histoire du Luminaire depuis l’époque romaine jusqu’au XIXè siècle. Paris:

Alphonde Picard, 1891, pp. 503-504 e 516].

3 DEITZ, Philippe – Histoire des luminaires. Liège: Editions du Perron, 2009, p. 138.

4 PAYNE, Christopher – 19th Century European Furniture. Suffolk:

Antique Collector’s Club, 1989, pp. 21-27; SASSONE, Adriana Boidi – Eclecticism In DISERTORI, Andrea, COZZI, Elisabeth, coord.

– Furniture: From Rococo to Art Deco. Colónia: Evergreen, 1998, p.

442; SCIOLLA, Gianni Carlo – The many faces of Eclecticism. In DISERTORI, Andrea, COZZI, Elisabeth, coord. – Furniture: From Rococo to Art Deco. Colónia: Evergreen, 1998, pp. 584-591.

5 Os interiores da sua residência foram pintados em aguarela pelo pintor italiano Luigi Osipovich Premazzi (1814-1891), de 1869 a 1871.

6 FEVEREIRO, António Cota – A Evolução do Candeeiro no Século XIX, tipologias e usos In PESSOA, Ana, COIMBRA, Artur, coord.

– Actas do V Colóquio Internacional - A Casa Senhorial: Anatomia dos Interiores. Fafe: Câmara Municipal de Fafe, 2019, p. 372.

7 Possivelmente adquiridos em 1867 para os seus aposentos no Palácio da Pena, onde já constavam antes do dia 10 de Junho de 1869, data do casamento com Elisa Frederica Hensler, condessa d’Edla (1836-1929). O segundo candeeiro partiu-se em data incerta, sobre- vivendo o seu pé em metal dourado, que se encontra nas reservas do Palácio Nacional da Pena. O candeeiro existente foi transferido para o Palácio Nacional da Ajuda em meados do século XX.

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Nos meados do século XIX melhorou-se a destila- ção do petróleo para iluminação e rapidamente se tornou popular, devido ao facto de ser mais aces- sível do que usando os óleos vegetais. Na cidade de Berlim, os prussianos Heinrich Otto Emil Wild (1826-1896) e Friedrich Wilhelm Wessel (c.1830- 1898)8 fundaram, em 1855, a fábrica Wild & Wessel9. No ano de 1865 lançaram no mercado o queimador Kosmos10 para petróleo, que veio a ter um sucesso extraordinário. Foi exportado para várias partes do mundo e a fábrica tornou-se numa das maiores em Berlim. Foi o início da fundação de outras fábricas na mesma cidade, que passaram a dominar o mer- cado a nível mundial, situação que se intensificou após a unificação da Alemanha.

No mesmo ano em que foi lançado o Kosmos, a fábrica britânica James Hinks & Son Ltd. de Birmingham patenteou o queimador para petróleo Duplex11. Ambos se tornaram populares e com um enorme sucesso de vendas. Entretanto, as melho- rias nas lâmpadas elétricas a partir de 1879, devidas a Thomas Alva Edison (1847-1931), permitiram que ficassem acesas ininterruptamente durante várias horas, suplantando gradualmente a iluminação a petróleo e a óleo vegetal.

A partir da década de 1870 as fábricas de luminá- ria enveredaram por peças neorromânicas, neo- barrocas, neorrococó e, no final da década de 1880, pela época da Renascença germânica, com caracte- rísticas tardogóticas então em voga na Alemanha.

No mesmo período houve um interesse pelas louças medievais islâmicas, que influenciaram o desenho de peças empregues nesta indústria, assim como outras inspiradas na louça holandesa de Delft.

No entanto, é forçoso mencionarmos a forte ape- tência pelo Neorrococó que marcou o último quar- tel do século XIX. A recriação de espaços nesse período despoletou o uso de boiseries setecentis- tas provenientes de edifícios parisienses demolidos, nomeadamente pelos grandes colecionadores euro- peus, como o banqueiro britânico Ferdinand von Rothschild (1839-1898), em Waddesdon Manor.

O mesmo exemplo foi seguido por Tristão Guedes Correia de Queiroz, 1º Marquês da Foz (1849-1917), no seu palácio na Praça dos Restauradores em Lisboa FIG. 112. Nestes colocaram mobiliário, peças em porcelana, metalística e pinturas, entre outras peças da mesma época, misturadas com outras de fabrico moderno a visar o conforto. Por outro lado, houve a criação de espaços e de mobiliário inspira- dos no período do rei Luís XV, como o seguido no Toilette da rainha D. Maria Pia, de 1887 a 1888, no Paço da Ajuda13.

Contudo, há que realçar uma propensão pela assi- metria na decoração interior que se vinha a manifes- tar desde os meados do século e que é caracterizada pela disposição do mobiliário, pelo uso de teci- dos variados, pela integração de peças de diferen- tes proveniências e estilos, como podemos obser- var no Gabinete da rainha D. Amélia (1865-1951) no Palácio da Pena14, e no Atelier do seu marido, o rei D. Carlos I de Portugal (1863-1908), no Palácio das Necessidades15. Neste último paço há que mencionar a Sala Branca da rainha decorada com peças rococó setecentistas e outras neorrococó16. A forte apetên- cia pelo neorrococó inevitavelmente influenciou, entre outras fontes de inspiração, o desenvolvi- mento da corrente estilística Arte Nova17.

Todos os meios de luz artificial aqui menciona- dos foram aplicados em candeeiros utilizados em mesas, secretárias, apliques, candelabros, fogões de sala e em lustres, intensificando assim a luminosi- dade do espaço interior ou exterior, integrado com a arquitetura e a decoração. Foram criadas novas tipologias, como os candeeiros para bilhar e para as salas de jantar; a Gagneau inventou um lustre de suspensão, com um candeeiro central e abat-jour de vidro e com ou sem braços laterais para velas18. Na década de 80 apareceram no mercado novas tipologias de luminária. A primeira foram os can- deeiros de pé alto inventados nos Estados Unidos da América para serem colocados ao lado de pianos e mobiliário de assento. A segunda é a Lampe Bijou, um candeeiro de pequenas dimensões lançado em França. A terceira são os candeeiros de coluna inventados no Reino Unido, inspirados na cultura clássica e nos motivos arquitetónicos. No final da década de 1880 os castiçais (flambeaux), as serpen- tinas, as palmatórias e as bouillottes19, entre outras tipologias, setecentistas e da primeira metade do século XIX para velas foram copiadas para a electri- cidade20. As últimas tipologias são os candeeiros de noite, com luz bruxuleante para presença, e os ditos de boudoir, com ou sem pega. Nestes candeeiros foi geralmente utilizado um novo tipo de quebra-luz feito a partir de uma armação metálica revestida a seda ou a papel21.

Após a guerra franco-prussiana, a cidade de Paris perdeu parte da sua relevância, embora mantivesse o prestígio no fabrico de bronzes e outras peças metálicas para a luminária. Muitas das fábricas foram encerrando e outras enveredaram pelo mer- cado de luxo, como a Gagneau.

No final do século XIX os centros produtores de luminária europeus encontravam-se nas cidades de Berlim, Viena, Birmingham e Paris. Todavia, foi nas capitais alemã e francesa que mais se desenvolve- ram peças para iluminação neorrococó, como ire- mos explanar.

8 Nasceram em Schweidnitz, na Silésia Prussiana. A loca- lidade chama-se hoje Świdnica, após ter passado de novo para a Polónia no seguimento da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Queremos agradecer ao historiador arménio Ara Kebapcioglu pelos dados biográficos dos fundadores da Wild

& Wessel.

9 Fundada no dia 1 de Julho, no número 37 da Alexandrinenstrasse. No ano de 1858 mudaram-se para o nº 26 da Prinzessinnenstrasse, na mesma cidade, onde perma- neceram até ao seu encerramento em 1903. Wild & Wessel – Fünfzig Jahre in der Lampen Industrie Ein Rückblick. Berlim: G.

Schade, 1894, pp. 6-7.

10 Foi lançado no dia 22 de Junho em França e designado como Le Bec Prussien. O queimador foi também copiado pelas fábricas alemãs Köppen & Wenke, Stobwasser, Ehrich &

Graet, Max Kray & C.º, Schwintzer & Gräff (todas em Berlim), Hugo Schneider (em Leipzig), Wetzchewald & Wilmes (em Neheim) e Kaestner & Toebelmann (em Erfurt). O mesmo foi também fabricado pela americana Edward Miller &

C.º [FEVEREIRO, António Cota – Iluminação da Casa Real Portuguesa: Os Candeeiros do Palácio Nacional da Ajuda. Oeiras:

Mazu Press, 2018, pp. 51-54].

11 O queimador foi copiado pela Messengers & Son e Evered &

C.º, também sedeadas na mesma cidade.

12 QUEIRÓS, Tristão Guedes Correia de – Catalogo do lei- lão dos objectos d’arte e mobiliario antigo, Palacio Foz na Praça dos Restauradores, nos. 28 a 32. Lisboa: Companhia Nacional Editora, 1901, p. 46.

13 FEVEREIRO, António Cota – A inovação arquitetónica nos Ateliers de Lisboa e Oeiras, entre 1867 a 1912. Herança - Revista de História, Património e Cultura. 2: 2 (2020), pp.

102-103.

14 O mesmo espaço era a Sala da Senhora Condessa d’Edla, decorado entre 1866 a 1868, tendo sido revestido a tecido e o mobiliário colocado de forma simétrica – como pode- mos constatar numa fotografia estereoscópica do fotógrafo Carlos Relvas (1838-1894) existente no seu espólio. A rai- nha D. Amélia remodelou o Gabinete e forrou-o com outro tecido, dispondo mobiliário de assento com estofos diferentes e mandando colocar o restante mobiliário de forma assimé- trica. O Arquivo Fotográfico da Câmara Municipal de Lisboa detém um negativo deste Gabinete ao tempo da rainha, com a cota: NEG000238.

15 O Atelier do rei D. Carlos era o Gabinete de Trabalho do seu avô, o rei D. Fernando II. Ver as fotografias no Arquivo Fotográfico da Câmara Municipal de Lisboa com as cotas:

NEG000329 e NEG000330. O arquivo e biblioteca do Paço Ducal de Vila Viçosa detêm pelo menos três fotografias do Gabinete de Trabalho do rei D. Fernando II antes da sua remodelação por D. Carlos.

16 Foi fotografada e publicada nos seguintes periódicos: Brasil- Portugal, 13 (1899) e Illustração Portugueza, 48 (1904). O lus- tre e apliques de parede rococó, em porcelana e metal dou- rado setecentista, pertenceram ao rei D. Fernando II e estão

hoje no Palácio Nacional da Pena (PNP, inv. PNP1141/1 a 8).

Estiveram colocados no seu Gabinete de Saxe, no Palácio das Necessidades, conforme podemos observar em duas fotogra- fias existentes no arquivo e biblioteca do Paço Ducal de Vila Viçosa. As peças em porcelana são provavelmente da manu- fatura francesa Saint-Cloud, fundada em 1693 perto de Paris e que encerrou em 1766.

17 Sobre a evolução do Rococó, do Neorrococó e a influên- cia que este último teve na Arte Nova, ver: COFFIN, Sarah D. ,DAVIDSON, Gail, LUPTON, Ellen, HUNTER-STIEBEL, Penelope – Rococo: The continuing curve, 1730-2008. Nova Iorque: Cooper-Hewitt, National Design Museum, 2008.

18 DEITZ, Philippe – Histoire des luminaires. Liège: Editions du Perron, 2009, p. 134.

19 Trata-se de um candeeiro composto a partir de um candela- bro para vários lumes e com um abat-jour central comum.

20 Temos vindo a verificar que as instituições museológicas e o antiquariato nacional e internacional classificam este tipo de peças como sendo do século XVIII, quando são cópias da segunda metade do século XIX e início do XX adaptadas para a eletricidade.

21 Sobre a evolução técnica, estilística e tipológica da ilumina- ção artificial e dos quebra-luzes, ver: FEVEREIRO, António

Cota – A Evolução do Candeeiro no Século XIX, tipolo- gias e usos In PESSOA, Ana, COIMBRA, Artur, coord. – Actas do V Colóquio Internacional - A Casa Senhorial: Anatomia dos Interiores. Fafe: Câmara Municipal de Fafe, 2019, pp. 363-388;

FEVEREIRO, António Cota – Os Candeeiros e a sua repre- sentação gráfica no período de 1850 a 1914 In QUEIROZ, Francisco, coord. – Arte, Cultura e Património do Romantismo:

Actas do 2.º Colóquio “Saudade Perpétua”. Porto: CEPESE - Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade, 2020, pp. 426-485.

191

(12)

A PRODUÇÃO DE LUMINÁRIA PARISIENSE NO ÚLTIMO QUARTEL DO SÉCULO XIX

A produção parisiense gradualmente caminhou para o gosto pela época Gótica, da Renascença e dos monarcas Luís XV e Luís XVI, vincando assim o seu passado prestigiante e cultural após a derrota con- tra a Prússia. Esta tendência comprova-se nas aqui- sições que a rainha D. Maria Pia fez na Gagneau, conforme o recibo datado do dia 16 de dezembro de 1887, que mostram a aquisição dos seguintes can- deeiros: 1 Grecque argenté; 1 Renaissance argenté; 1 Louis XV com asa e pé; 1 dito com pé; 1 dito grande;

1 dito riche e 1 dito para oferecer a D. Maria Luísa de Sousa Holstein, 3ª duquesa de Palmela (1841- 1909)22. Os candeeiros designados como Grecque e Renaissance aparentemente não foram descri- tos nos arrolamentos judiciais republicanos, con- forme demonstra a investigação em curso. Os res- tantes têm descrições tão vagas que é prematuro afirmar serem os descritos nos referidos inventá- rios. Contudo, a monarca e a aristocrata tiveram em comum um modelo criado pela Gagneau com as suas armas coroadas em relevo FIG. 223.

Trata-se de um modérateur em bronze revestido a prata neorrococó. Tem formato piriforme, duas pegas laterais e superfície espiralada assimétrica, que permitiu a criação de uma superficie lisa com rocagem para colocação de gravações, brasões de armas ou outras recordações consoante o desejo prévio do cliente24. A sua proporção equilibrada confere dinamismo, mas é sobretudo notável pela difícil confluência entre a simetria/funcionalidade e a assimetria/desenho.

Além, deste modelo, a Gagneau lançou no mercado outro modérateur de tamanho inferior, no mesmo gosto e com pegas laterais. O corpo principal tem o mesmo formato que o anterior, e na sua superfície há caneluras espiraladas colocadas de forma regu- lar, mas quebrada pela colocação de cartelas assi- métricas, cuja moldura central é simétrica. Nesta última passou a ser possível gravar ou colocar em relevo gravações ou brasões de armas. O infante D. Afonso (1865-1920) teve um exemplar com o seu monograma coroado (PNA, inv. 42049)25; o Marquês da Foz, já referido, deteve um par26; Jorge Torlades O’ Neill (1849-1925) teve, pelo menos, um candeeiro27, e há registo de um par numa sala em Lisboa28. Deste modelo, mas com pegas diferentes, a rainha D. Maria Pia teve um exemplar com o seu monograma coroado29.

O último modelo para modérateur, neorrococó, tem o mesmo corpo principal que os anteriores, espira- lado com contracurvas. Neste prevaleceu a sime- tria, embora acentuada pelos motivos vegetalistas assimétricos, E foi produzido em metal prateado e em bronze. A rainha D. Maria Pia teve um par deste modelo (PNP, inv. PNP1120/1 e 2)30 e um candeeiro31; o Dr. António Cândido Ribeiro da Costa (1850- 1922)32 teve também um exemplar; e os Marqueses de Vistabella, em Madrid, possuíam igualmente um par33. No Palácio das Necessidades haveriam pelo menos dez candeeiros e um da Gagneau, posterior- mente entregues à Família Real, no exílio34. Constatamos que estes três modelos têm em comum o mesmo formato, e não podemos deixar de aludir às cafeteiras, bules e chaleiras rococó como possível fonte de inspiração para o seu desenho. Com efeito, a Gagneau impôs-se como uma das mais selectas do seu género e uma das preferidas da elite europeia.

22 Arquivo do Palácio Nacional da Ajuda (APNA), Cx. 10.2.1., doc. 365.

23 O candeeiro da rainha D. Maria Pia (PNA, inv. 853) esteve no Chalet do Estoril e foi depois arrolado no Paço da Ajuda [APNA, Inventário Judicial do Paço da Ajuda, 1911, Vol. 3, X N.º 117, fl. 805v]. A Duquesa de Palmela tinha um par que foi leiloado com o nº 594 do leilão 5962 da leiloeira Christie’s em Londres, de 27 a 28 de Novembro de 2012.

24 Onde foram colocadas as armas atrás mencionadas.

25 APNA, Inventário Paço da Ajuda, 1912, Vol. 8, Y’’ N.º 44, fl. 2736 a 2737.

26 O par ladeou uma poncheira em porcelana oriental sobre uma mesa no Hall do Palácio Foz em Lisboa, que hoje per- tence ao acervo do Palácio Nacional da Ajuda (PNA, inv.

4171). Ver as duas fotografias deste espaço no álbum perten- cente à Biblioteca de Arte da Fundação Calouste Gulbenkian.

27 O candeeiro esteve sobre um bufete numa das salas da residência em Cascais, hoje Museu-Biblioteca Condes de Castro Guimarães [DIAS Carlos Malheiro – A Casa O’Neill em Cascaes. Illustração Portugueza. 30: II (1906) 2ª série, pp. 201- 202]. O Arquivo Fotográfico da Câmara Municipal de Lisboa detém parte dos negativos originais das fotografias que foram publicadas, nomeadamente uma da Sala de Jantar com o candeeiro fotografado ao fundo (cota: PEX001423).

28 Como podemos observar nas fotografias pertencentes ao Arquivo Fotográfico da Câmara Municipal de Lisboa, cujas cotas são: NEG000682, NEG000684 e NEG000685. A sala tem mobiliário de assento maioritariamente Luís XVI, e o restante Luís XV.

29 O candeeiro não foi arrolado no Paço da Ajuda, mas foi dado como desaparecido e seguido de um inquérito sobre o seu paradeiro aos empregados do Chalet do Estoril [APNA, Inventário Paço da Ajuda, 1912, Vol. 12, fl. 4085 a 4089v].

Poderá ser o mesmo que apareceu no mercado leiloeiro, na parisiense Coutau-Bégarie, sendo o lote 229 do lei- lão Noblesse & Royauté do dia 15 de Novembro de 2019.

Queremos agradecer a Eduardo Alves Marques por nos ter chamado a atenção para este lote.

30 APNA, Inventário Paço da Ajuda, 1911, Vol. 3, X N.º 118, fl. 805v. a 806. Os candeeiros estavam no Palácio da Ajuda e foram transferidos, em 1949, para o Palácio Nacional da Pena [FEVEREIRO, António Cota – Iluminação da Casa Real Portuguesa: Os Candeeiros do Palácio Nacional da Ajuda. Oeiras:

Mazu Press, 2018, p. 160].

31 O candeeiro poderá ter sido o mesmo representado numa aguarela do Gabinete de Trabalho do rei D. Luís, em Sintra, pelo pintor espanhol Enrique Casanova (1850-1913). Ver a aguarela PNA, inv. 55450/18. APNA, Inventário Paço da Ajuda, 1911, Vol. 3, X N.º 119, fl. 806. Havia ainda outro can- deeiro espiralado da Gagneau nos aposentos de D. Afonso,

mas em metal amarelo. APNA, Inventário Paço da Ajuda, 1912, Vol. 8, Y’’ N.º 44, fl. 2736 a 2737. Estes candeeiros não foram identificados na presente investigação.

32 O candeeiro esteve sobre um bufete na sala de estar da sua residência em Lisboa. Ver: O’NEILL, Maria – Os nos- sos artistas, O sr. dr. Antonio Candido. Brasil-Portugal. 350 (16 de agosto de 1913), pp. 216-218. O Arquivo Fotográfico da Câmara Municipal de Lisboa detém os negativos das foto- grafias da autoria de Alberto Carlos Lima que foram publi- cadas, como vem escrito no artigo, mas há uma atribuída pelo arquivo ao fotógrafo Eduardo Alexandre Cunha. As cotas são as seguintes: ACU002438, LIM002503, LIM002537 e LIM002694.

33 Estavam sobre o fogão da Sala de Confianza do seu Hotel.

Ver: MONTE-CRISTO, Eugenio de la Escalera, NISSER, Christian Franzen y – Los Salones de Madrid. Madrid: El Álbum Nacional, 1898, p. 60.

34 No mercado leiloeiro têm aparecido, pelo menos, dois modelos espiralados de candeeiros em metal prateado da Gagneau, que pertenceram à rainha D. Amélia e a seu filho o rei D. Manuel II (1889-1932). APNA, Inventário Judicial do Paço das Necessidades, 1911-1913, Vol. 2, N.º 5225 e 5229, fl. 727v.

FIG. 2 \ Candeeiro modérateur da Gagneau com as armas dos reis de Portugal, 1880-1900. Dimensões: 66x24Ø cm (PNA, inv. 853); bronze revestido a prata, latão revestido a prata, folha-de-flandres e couro (fotografia: Luísa Oliveira [PNA 47894 DIG], 2012 / Direção-Geral do Património Cultural / Arquivo de Documentação Fotográfica) 192

(13)

Efetivamente, o gosto pelo Neorrococó intensificou-se na última década do séc. XIX, como podemos constatar nas aquisições de luminária, em 1893, pela rainha D. Maria Pia, na cidade de Paris.

Esta consecução foi realizada nas lojas coevas mais selectas, como na Maison Boudet, conforme um recibo datado de 9 de Novembro.

Neste consta um candeeiro para petróleo (PNA, inv. 42640)35 em prata, com relógio incorporado da autoria do ourives francês Lucien Gaillard (1861-1942), conjuntamente com 3 quebra-luzes e material para escritório. O desenho do candeeiro acompanha o encarceramento do mecanismo do relógio e a disposição do mos- trador na base, sendo estes da americana The Parker & Whipple C.º de Meriden. O relógio é encimado pelo reservatório e que se eleva piramidalmente para o queimador, Kosmos 10’’’, da Wild &

Wessel. Desta forma, a luz proveniente incide sobre o mostrador e era também refletida pelos abat-jours. A simetria é quebrada pela disposição das folhagens e das fitas. Este candeeiro é uma peça de exceção, não só pela qualidade estética e técnica, mas, sobretudo, pela originalidade e raridade FIG. 3.

Segundo o recibo datado de 30 de Junho, adquiriu na mesma cidade, na F. Barbedienne, um relógio e duas serpentinas, 4 casti- çais com console e 4 com coquelle tudo em bronze dourado (PNA, inv. 2386 a 2389 e 4093 a 4096)36. No dia 7 de Julho comprou, na Leuchars & Son, 1 flambeau elétrico com abat-jour de seda verde37. Na Gagneau, conforme o recibo datado de 8 de Setembro, adquiriu as seguintes peças:

– um lustre de suspensão elétrico para sala de jantar;

– quatro apliques de paredes elétricos;

– três lustres elétricos;

– dois oeufs em cristal lapidado elétricos;

– um flambeau elétrico com escultura de criança e abat-jour de seda rosa;

– uma bouillotte elétrica;

– um tocheiro elétrico com globo;

– dois candeeiros para petróleo com peças em faiança fundo creme e flores polícromas, queimadores Duplex da Evered e globos Baccarat38.

A maior parte desta luminária foi deliberadamente escolhida, de acordo com a sua função e escala no espaço, para ser utili- zada no Chalet do Estoril, que a rainha tinha adquirido nesse ano. O gosto Luís XV ficou circunscrito às salas de estar e à Casa de Jantar no 1º pavimento e aos aposentos da monarca no andar nobre. Contudo, convém salientar a presença de um dos casti- çais da Baixela Germain (PNA, inv. 5326 a 5342; MNAA, inv. 1928 a 1931 e 1934 a 1935)39, com abat-jour de papel cor-de-rosa, no Gabinete do Andar Nobre, conjuntamente com mobiliário de fabrico moderno40 e outras peças decorativas inspiradas nessa época, enfatizando assim o ambiente histórico41.

De toda a luminária adquirida na Gagneau conseguimos identifi- car um dos candeeiros para petróleo (PNA, inv. 2070). O formato é inspirado no de um balaústre composto por peças em faiança e em metal dourado. As primeiras têm ornatos em alto-relevo e fundo creme, dando assim um certo ar de antiguidade, além de uma certa maviosidade base para realçar os motivos florais polícromos. Estes são claramente inspirados nos congéneres setecentistas, como por exemplo os realizados na faiança desenvolvida em Marselha e na produção inicial da manufatura de porcelana de Sèvres (fundada em 1740). No recibo, a decoração foi descrita como Marseille, e a do segundo candeeiro como de Saxe42. O segundo exemplar iden- tificado é um candeeiro de teto (PNP, inv. PNP1125) e assume-se já como uma tipologia completamente nova para eletricidade, pro- jetando assim mais difusamente a luz ao redor. Tem uma base em metal dourado, que fica presa ao teto, onde é aparafusado um que- bra-luz espiralado em vidro43.

O primeiro lustre foi colocado na Casa de Jantar do chalet, mas só conseguimos identificar outro exemplar (PNM, inv. PNM 2017).

O formato e a disposição dos pontos de luz é claramente oito- centista, estilizada ao gosto neorrococó44. Da restante luminá- ria não identificada merecem especial menção os flambeaux e as bouillottes como exemplos da persistência de tipologias anti- gas, adaptadas para a eletricidade e com os novos quebra-luzes.

Curiosamente, os apliques de parede foram os que se mantiveram mais fiéis no seu desenho aos congéneres setecentistas.

O uso dos metais foi amplamente empregue pela indústria de luminária francesa, evidenciando assim a elevada qualidade do produto pelo qual granjearam fama45. A prestigiante Maison Christofle fez dois modelos de candeeiros para petróleo em metal prateado a partir de castiçais Luís XV e XVI, mas com reserva- tórios em vidro no lugar das velas. Outra característica é o con- traste entre o metal prateado e o dourado, técnica difícil e que deu origem a candeeiros de mesa, nomeadamente um candeeiro para petróleo que nos pertence FIG. 4. A base é triangular, de onde se elevam três hastes vazadas e que se unem ao centro para servir de base ao reservatório amovível.

35 FEVEREIRO, António Cota – Iluminação da Casa Real Portuguesa: Os Candeeiros do Palácio Nacional da Ajuda.

Oeiras: Mazu Press, 2018, p. 62.

36 O relógio e as duas serpen- tinas não foram identificadas.

Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT), Casa Real, Cx.

7008. APNA, Inventário Paço da Ajuda, 1911, Vol. 4, N’ N.º 835, fl. 1326v.

37 O flambeau não foi ainda identificado na investigação em curso. ANTT, Casa Real, Cx.

7008. APNA, Inventário Paço da Ajuda, 1912, Vol. 9, K’’’ N.º 825, fl. 3100v-3101.

38 Na Gagneau escolheu tam- bém uma lanterna com coroa Luís XIV, um lustre Luís XVI e um braço elétrico com cris- tais de Veneza, tudo para ele- tricidade, e dois modérateurs em faiança decorada à maneira de Delft [FEVEREIRO, António Cota – Iluminação da Casa Real Portuguesa: Os Candeeiros do Palácio Nacional da Ajuda.

Oeiras: Mazu Press, 2018, pp.

160 e 183-185].

39 APNA, Inventário Paço das Necessidades, 1911-1913, Vol. 7, N.º 16878 e 16879, fl. 2492v.

40 Sobre o mobiliário Luís XV, nomeadamente o adquirido pela rainha a Sormani, ver:

ANDRADE, Maria do Carmo Rebello de – Paul Sormani e o estilo Luís XV: Os móveis pre- feridos da rainha D. Maria Pia.

Revista de Artes Decorativas. 3 (2009), pp. 193-230.

41 APNA, Inventário do Real Chalet Estoril, sem data, p.

2-29, 32-35, 56-61 e 84-119.

42 Este tinha um pássaro e flo- res polícromos sobre fundo creme. ANTT, Casa Real, Cx.

7008. APNA, Inventário Paço da Ajuda, 1911, Vol. 3, X N.º 115 e 126, fl. 805 e 808v.

43 APNA, Inventário Paço da Ajuda, 1912, Vol. 10, K’’’ N.º 2272 e 2273, fl. 3398-3398v.

44 Na investigação sobre os can- deeiros da Casa Real, tivemos acesso a um conjunto de foto- grafias publicadas em 1896, no nº 31 do periódico Branco e Negro: Semanario Illustrado.

Há uma da Casa de Jantar que nos permitiu identificar este modelo e um exemplar que se encontra no Palácio Nacional de Mafra. Recentemente conse- guimos localizar o negativo ori- ginal no Arquivo Fotográfico da Câmara Municipal de Lisboa, com a cota NEG001071; o arquivo desconhece qual o interior fotografado. Nesta fotografia constatamos que é o mesmo modelo que está no Palácio de Mafra, mas as qua- tro correntes de suspensão são diferentes. Um lustre com todas as características do mesmo que esteve na Casa de Jantar foi lei- loado com o nº 213 do leilão 115, que ocorreu de 13 a 14 de Dezembro de 2017, da leiloeira Renascimento em Lisboa.

45 Wild & Wessel – Fünfzig Jahre in der Lampen Industrie Ein Rückblick. Berlim: G. Schade, 1894, pp. 8-9.

FIG. 3 \ Candeeiro para petróleo, com relógio incorporado, da autoria de Lucien Gaillard, 1886-1893. Dimensões:

23,2x10x10,2 cm (PNA, inv. 42640); prata, latão revestido a prata, metal ferroso, esmalte e vidro (fotografia: José Pessoa [PNA 16145 TC], 1996 / Direção-Geral do Património Cultural / Arquivo de Documentação Fotográfica)

FIG. 4 \ Candeeiro para petróleo em bronze e queimador Duplex da Evered & C.º de Birmingham, 1880-1900. Dimensões: 46x20Ø cm; bronze, latão revestido a prata, cortiça e metal ferroso; coleção de António Cota Fevereiro (fotografia: António Cota Fevereiro)

193

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O recurso a três hastes vazadas, no sentido vertical, foi recorrentemente utilizado na nova tipologia do candeeiro de pé alto. Estes tiveram um tão grande sucesso comercial que eram vendidos em quase todos os grandes armazéns parisienses, como temos constatado nos catálogos do Au Bon Marché, Allez Frères e À la Ménagère FIG. 5. As hastes com desenho ascendente e piramidal são unidas a um tubo cen- tral, e este truque dá a ilusão de que o tampo da mesa concêntrica fica como que suspensa no ar, propor- cionando leveza ao conjunto. Todas as peças são em metal dourado ao gosto Luís XV e XVI, mas temos vindo a verificar que há peças repetidas entre vários modelos. Tal facto deve-se à compatibilidade destas e as suas medidas durante o processo de montagem, recurso vantajoso e económico, como constatámos num exemplar que pertenceu à rainha D. Maria Pia (PNA, inv. 2082)46 e noutro que nos pertence Luís XV, ambos com queimadores alemães.

Estas são as tipologias e as características mais rele- vantes da produção de luminária francesa, que diferem em vários aspectos da alemã e do mesmo período cronológico, como iremos abordar em seguida.

A PRODUÇÃO DE LUMINÁRIA ALEMÃ NO ÚLTIMO QUARTEL DO SÉCULO XIX

O único testemunho conhecido sobre uma fábrica de luminária oitocentista é a obra Wild &

Wessel Fünfzig Jahre in der Lampen Industrie Ein Rückblick47, publicada em 1894, em que Emil Wild e Wilhelm Wessel nos relatam a sua parceria, a fun- dação da fábrica, a evolução da luminária e dados sobre a indústria coeva, entre outras informações relevantes. Este foi um dos alicerces para o sucesso comercial que a Wild & Wessel alcançou. Para esse fim contratou proeminentes escultores, arquite- tos e modeladores alemães, para desenvolverem os projetos de luminária48. Os escultores foram:

– Hugo Zacharias49;

– Carl Silbernagel (1837-1889);

– J. Loewel;

– Albert Wolff (1814-1892);

– Max Wiese (1846-1925), foi depois director da Kunstschule50 em Hanau;

– G. Canisius;

– Otto Lessing (1846-1912);

– F. Behrendt (professor na Königl.

Kunstgewerbemuseum51);

– R. Meyerheim e professor P. Schley, foi depois para a Königliche Porzellan-Manufaktur - KPM52.

Os arquitetos a quem encomendaram projec- tos foram Paul Fingerling e Alexander Schütz (1847-1892) – que também lecionou na Königl.

Kunstgewerbemuseum53. Os modeladores de mui- tos dos projetos foram W. Quehl, N. Koenig, E.

Greier e B. Pape.

46 FEVEREIRO, António Cota – Iluminação da Casa Real Portuguesa: Os Candeeiros do Palácio Nacional da Ajuda.

Oeiras: Mazu Press, 2018, pp. 73-75.

47 Wild & Wessel – Fünfzig Jahre in der Lampen Industrie Ein Rückblick. Berlim: G. Schade, 1894.

48 No texto consultado só são referidos os modelos mais sig- nificativos. Dos restantes não se conhecem os autores.

49 Foi co-proprietário da Sy & Wagner, ourivesaria berlinense que se dedicou à produção de peças decorativas e utilitárias em prata e em ouro.

50 Escola de Arte.

51 Museu de Artes Decorativas de Berlim.

52 Manufatura de porcelana fundada em 1763 pelo rei Frederico II.

53 O arquiteto Alexander Schütz foi o autor do primeiro atlas fotográfico da arquitetura renascentista italiana: Die Renaissance in Italien. Foi publicado entre 1878 a 1882 em Hamburgo, pela editora Strumper.

FIG. 5 \ Contracapa do catálogo dos grandes armazéns parisienses A La Menagère, com um candeeiro de pé alto e a um candeeiro de suspensão Luís XV. O candeeiro de suspensão do lado direito é já ao gosto Arte Nova (fonte: A La Menagère s.d.)

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Fizeram com o arquiteto Schütz várias visitas à Kunstgewerbemuseum, e com o escultor Zacharias à Museumsinsel54 em Berlim, inspirando-se nas peças dos respetivos acervos para os novos dese- nhos de candeeiros55. No entanto, referiram ser bas- tante difícil conciliar a pureza original do desenho com a nova função; mas é precisamente neste ponto que sobressai a genialidade dos artistas que traba- lharam com a Wild & Wessel em muitas soluções inovadoras, Tendo sabido conciliar as formas anti- gas com o reservatório para petróleo, que fica ime- diatamente abaixo do queimador.

No início, a produção foi claramente dominada pela estética francesa. Todavia, o crescente domí- nio da Prússia sobre outros estados alemães ori- ginou a guerra franco-prussiana e a elevação do rei Guilherme I (1797-1888) como imperador da Alemanha. A cidade de Berlim tornou-se num dos maiores centros produtores de luminária e houve um crescente gosto pela época barroca, provavel- mente enfatizado por estar relacionado com a fun- dação do reino da Prússia em 1701, pelo rei Frederico I (1657-1713), prestando-se assim homenagem à dinastia Hohenzollern.

Auspiciosamente, coincidiram desenvolvimen- tos em torno do aperfeiçoamento dos moldes e dos revestimentos das peças metálicas, o que possibili- tou a produção em massa de candeeiros. A grande maioria foi realizada em zinco: metal de fácil mode- lação e acessível, que possibilitou à maioria da população ter a reprodução de uma peça antiga para uso moderno, democratizando assim a oferta.

Estas eram depois revestidas com uma camada aco- breada. Outros candeeiros foram realizados em latão polido ou em bronze, mas com custos onero- sos durante o processo de fabrico.

A ideia subjacente a este tipo de produção é baseada na aliança entre a Kunstgewerbe (Artes Aplicadas) e a Kunstindustrie (Arte e Indústria), enfatizando assim a qualidade artística dos seus candeeiros.

Nestes, mesclaram-se estilizações classicistas, românicas, góticas, renascentistas, maneiristas e barrocas, inspiradas em peças de ourivesaria ger- mânica e italiana56. Efetivamente, a Wild & Wessel definiu um carácter germânico a este tipo de can- deeiros, que cativaram a atenção do rei Luís II da Baviera (1845-1886) quando foram expostos, em 1876, numa exposição em Munique57.

Um dos modelos que reflete este ecletismo é o 1849, em zinco, de que há dois exemplares nos palácios nacionais portugueses (PNP, inv. PNP662 e PNS, inv. PNS3467)58. Assenta em quatro esferas enci- madas por esfinges aladas, de onde emerge uma pirâmide com ornatos greco-romanos; o nó tem gomos salientes de desenho neorrenascentista, e a copa tem cabeças femininas emolduradas e altos- -relevos em strapwork ao gosto maneirista. Deverá ter sido criado entre 1880 a 1890 como o modelo 1850 e também em zinco. O seu formato exterior, a decoração e as pegas são inpirados em peças bar- rocas, mas apresenta já características neorrococó que quebram a simetria, como o medalhão na base

e a moldura central assimétricos. A mesma duali- dade entre o formato barroco e a decoração rococó foi seguida no modelo 2007 FIG. 6 E 7, também criado no mesmo período e em zinco. A base apresenta volu- tas e concheados simétricos, mas o nó, encimado por gomos, tem características renascentistas.

Este conjunto como que eleva a copa ornamentada com motivos assimétricos compostos por volutas e concheados59.

Esta transição para o neorrococó coincide com a subida ao trono, em 1888, do imperador Guilherme II (1859-1941). O Neorrococó desenvolvido no seu reinado foi inspirado no Friedrichian Rokoko, flo- rescido no reinado de seu tio, o rei Frederico II, o Grande (1712-1786), e que reúne características tardo-barrocas, mesclado com outras de influên- cia francesa e bávara. Os ornatos naturalistas são em tom dourado ou polícromos, sobre fundo em tons pastel e cores claras. No entanto, convém lem- brar que o imperador Guilherme II veraneou desde criança com os pais, o imperador Frederico III (1831-1888) e a imperatriz Vitória (1840-1901), no Neues Palais (Palácio Novo) no parque de Sanssouci, em Potsdam. Trata-se de um edifício construído entre 1763 a 1769 pelo rei Frederico o Grande, para comemorar a vitória da aliança prussiana, britânica, portuguesa e hanoveriana da Guerra dos Sete Anos (1756-1763). O palácio foi erigido ao gosto barroco e rococó, tendo sido depois modernizado pelo impe- rador a partir de 1888, com peças neorrococó60.

54 Ilha dos Museus.

55 Wild & Wessel – Fünfzig Jahre in der Lampen Industrie Ein Rückblick. Berlim: G. Schade, 1894, pp. 28-29.

56 BIMBENET-PRIVAT, Michèle, KUGEL, Alexis – Chefs d’oeuvre d’orfèvrerie allemande, Renaissance et baroque. Quetigny: Faton, 2017.

57 O monarca ficou tão entusiasmado que adqui- riu vários candeeiros para os seus palácios e outros para oferecer. A fábrica tinha feito um conside- rável investimento monetário na comissão e no fabrico das peças que levou, o qual foi compen- sado pelas vendas realizadas [Wild & Wessel – Fünfzig Jahre in der Lampen Industrie Ein Rückblick.

Berlim: G. Schade, 1894, p. 28].

58 FEVEREIRO, António Cota – Iluminação da Casa Real Portuguesa: Os Candeeiros do Palácio Nacional da Ajuda. Oeiras: Mazu Press, 2018, pp. 68-71.

59 Estes motivos neorrococó e os do modelo 1850 têm semelhanças com os desenvolvidos na cidade alemã de Augsburgo, nomeadamente na produção de ourivesaria e de motivos decorativos.

60 O edifício e parte do seu conteúdo sobrevive- ram aos bombardeamentos da Segunda Guerra

Mundial.

FIG. 6 \ Candeeiros para petróleo da Wild & Wessel, criados de 1880 a 1890, em zinco. Modelos N.º 2007, 1824, 1921, 1453, 1850 e 1634 (fonte: Wild & Wessel 1894, Tafel 32) FIG. 7 \ Candeeiro para petróleo modelo 2007 com queimador Kosmos 14’’’ da Wild & Wessel, 1870-1903. Dimensões: 31x15,5Ø cm;

zinco, cobre, vidro, gesso e latão; coleção de António Cota Fevereiro (fotografia: António Cota Fevereiro)

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