• Nenhum resultado encontrado

Cad. Saúde Pública vol.33 suppl.3 csp 33 s3 eCO010317

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2018

Share "Cad. Saúde Pública vol.33 suppl.3 csp 33 s3 eCO010317"

Copied!
3
0
0

Texto

(1)

Um artigo atual que trata de riscos à saúde pública

A pergunta que o artigo lança é instigante e atual. A discussão e a proposta do artigo, da mesma forma, também fazem os leitores pensar sobre a possibilidade de classificar riscos, principalmente quando são riscos à saúde pública. O tema de classificação de risco da forma como é proposto no artigo é inovador na área de saúde, em que é muito mais comum pensar risco como parte da epidemiologia e da vigilância em saúde. Para aqueles que acompanham a discussão sobre a intervenção das “Big Industries” do complexo da saúde, como as indústrias farmacêuticas, de alimentos, de equipamentos, de saneamento básico, e cada vez mais da formação de recursos humanos para a saúde, sabe como esta discussão é importante e como as lições aprendidas do tabaco são fundamentais.

A proposta apresentada para discussão traz os elementos fundamentais para que se possa em um debate ampliar a discussão e verificar detalhes que poderão ser de grande valia no avanço dessa ques-tão, que antes de tudo se refere à boa governança e gestão pública.

Parece-me importante agregar à discussão as vantagens de classificar riscos em saúde pública, já que esta é um bem público nacional e internacional e que, portanto, deve ser defendido e preservado para que as gerações futuras possam usufruir de condições melhores do que as que nos apresentam

hoje e em um passado recente 1. Desde esse ângulo, não resta dúvida de que indústrias como a do

tabaco, que ameaçam “bens públicos nacionais e internacionais” (como a saúde pública e o bem-estar comunitário) devem ser seriamente questionadas e barradas em seus propósitos imediatos e as con-sequências que causam a longo prazo.

A indústria do tabaco, assim como outras, são sabidamente causadoras de problemas de saúde e bem-estar; ela busca justificar sua existência baseada em outras razões, como a econômica. Isso é pos-sível porque ao longo de muitos anos um grande número de agricultores se dedicou a esse cultivo, em parte usufruindo de benefícios públicos oferecidos em uma espécie de parceria público-privada, como foram os empréstimos concedidos por bancos em áreas de interesse da indústria fumageira e de

inte-resses do mercado 2. Isso constituiu em um ciclo em que ao final foram utilizados recursos públicos

para atividades que em última instância põem em risco e podem até destruir um “bem público” como

a saúde 3. Essa realidade é insustentável e não tem lugar em nenhuma racionalidade de governança ou

gestão pública. No entanto, essa situação ainda existe e procura resistir às ações que são tomadas para a interrupção das parcerias público-privada existentes e que, ainda hoje, beneficiam a cultura do fumo de várias formas como o financiamento e a regulamentação. A lentidão no processo de reconversão do plantio de tabaco pode ser tomada como um indicador dessa resistência às medidas que iniciaram há muito tempo, como as restrições impostas pelo Banco Central ao Programa de Agricultura Familiar em 2001, e que hoje, mais de 15 anos depois, ainda são objeto de demanda de produtores de áreas que produzem tabaco no Brasil 4,5,6. Isso de certa forma prova a proposta de que esse tipo de parceria privado-publica não é possível pelos efeitos destrutivos e eventuais altos custos ao setor saúde.

Assim, um critério fundamental para categorizar o risco de parcerias público-privadas, mas tam-bém de parcerias de instituições ou setores públicos, deve levar em conta o grau de risco que estas

1 Luiz Augusto Cassanha Galvão

1 Centro de Relações Internacionais em Saúde, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, Brasil. luiz.galvao@fiocruz.br

Debate sobre o artigo de Costa e Silva et al.

Debate on the paper by Costa e Silva et al.

Debate acerca del artículo de Costa e Silva et al.

doi: 10.1590/0102-311XCO010317

DEBATE

DEBATE

Cad. Saúde Pública 2017; 33 Sup 3:eCO010317

(2)

Galvão LAC S2

Cad. Saúde Pública 2017; 33 Sup 3:eCO010317

parcerias representam para os bens públicos, pelo menos à saúde pública, ao bem-estar, à segurança e à cultura 7,8.

No caso do tabaco são bastante claros os limites e riscos das parcerias público-privadas, e a prática dos profissionais de saúde neste tema tem sido uma espécie de exemplo para várias outras atividades em outros temas que também não têm por motivação a promoção da saúde. No entanto, a classifica-ção de risco começa a ser mais complexa quando um produto não representa um perigo eminente à saúde ou é considerado um elemento essencial para a promoção da saúde, mas o processo pelo qual ele é produzido pode representar riscos à saúde do trabalhador ou ao ambiente comum. Por exemplo, a produção agrícola ou de alimentos em pequena escala inclui um grande número de variáveis que podem representar riscos e fazem com que os limites entre baixo, médio ou alto risco não sejam tão claros. Os programas de agricultura familiar, por exemplo, incluem uma série de parcerias público- privadas na sua execução que são fundamentais para a sua viabilidade. Ainda que em princípio esse tipo de programa tenha motivação compatível com um grau de risco baixo ou possível, o efeito final na saúde vai depender de uma série de fatores intermediários relacionados com práticas de vários setores que nem sempre são favoráveis ou compatíveis com a saúde pública. Muitas vezes a questão regulatória se dá de forma paralela aos mecanismos estabelecidos pela saúde pública e resultam em riscos incontroláveis para o setor saúde 9.

A estrutura de regulação sanitária não tem uma visão e um modelo de análise de riscos que possa levar em conta a miríade de fatores do processo produtivo que pode levar a situações de riscos. Para isso o processo deveria ser analisado de forma integral desde a sua concepção, para que não repre-sentasse alto risco à saúde em suas diferentes etapas como a produção (riscos à saúde do trabalhador), o consumo (riscos de efeitos colaterais ou indesejáveis) e indiretamente por meio da poluição do ambiente comum (semelhante ao caso da fumaça do cigarro ou da poluição química das águas).

Também é importante somar aos critérios uma análise específica de caso a caso, já que ainda que exista declaradamente um intenção de benefício à saúde, efeitos adversos ou mesmo a utilização de insumos nocivos no processo de produção podem também ser um risco indireto à saúde. Dessa forma, torna-se necessário, mas não suficiente, a “motivação” ser considerada saudável para estabelecer uma classificação de baixo risco. A análise de risco final deve ter em conta vários fatores que poderiam representar uma ameaça à saúde durante o processo produtivo (como na produção agrícola) ou de consumo (no caso de medicamentos).

Finalmente, devo mencionar que estando no início da Era do Desenvolvimento Sustentável, esse tipo de preocupação é fundamental. A Agenda 2030 e seus Objetivos de Desenvolvimento Sustentável

(ODS) 10,11 incluem muitos dos fatores mencionados nesse importante artigo, e estamos certos de que

esta discussão e o modelo que fiquem validados dela serão instrumentos fundamentais para orientar as atividades do setor saúde na implantação do ODS sobre saúde, mas também na interação com os

outros objetivos da Agenda 2030 e, por fim, contribuir para o alcance do desenvolvimento sustentável

(3)

comentário sobre o artigo de costa e silva et al. S3

cad. saúde Pública 2017; 33 sup 3:eco010317 1. U.S. Environmental Protection Agency.

Frame-work for human health risk assessment to in-form decision making. https://www.epa.gov/ sites/production/files/2014-12/documents/ hhra-framework-final-2014.pdf (acessado em 10/Jul/2016).

2. World Bank. Objetivos del gobierno: beneficios y riesgos de las asociaciones público privadas. https://ppp.worldbank.org/public-private-part nership/es/asociaciones-publico-privadas/bene ficios-riesgos (acessado em 10/Jul/2016). 3. Finkelman J, Galvão LAC, Henao S.

Environ-mental health governance in Latin America and the Caribbean. In: Pan American Health Organization, editor. Environmental and social determinants of health. Washington DC: Pan American Health Organization; 2016. p. 47-88. 4. Banco Nacional do Desenvolvimento

Econô-mico e Social. BNDES apoia 28 mil produtores rurais com financiamento de R$ 321 milhões. http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/ bndes_pt/Institucional/Sala_de_Imprensa/No ticias/2004/20040609_not823.html (acessado em 10/Jul/2016).

5. Banco Central. Resolução BACEN no 2.833, de

25 de abril de 2001. http://www.normasbrasil. com.br/norma/?id=96796 (acessado em 10/Jul/ 2016).

6. Observatório da Política Nacional de Controle do Tabaco, Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Produção de fumo e seus derivados. http://www2.inca.gov.br/wps/ wcm/connect/observatorio_controle_tabaco/si te/home (acessado em 10/Jul/2016).

7. Federal Highway Administration, U.S. Depart-ment of Transportation. Guidebook for risk as-sessment in public private partnerships. http:// www.fhwa.dot.gov/ipd/pdfs/p3/p3_guidebook_ risk_assessment_030314.pdf (acessado em 10/ Jul/2016).

8. Revista Amanhã. Restrição a financiamen-to preocupa fumiculfinanciamen-tores do Sul. http://www. amanha.com.br/posts/view/2446/restricao-a-financiamento-preocupa-fumicultores-do-sul# sthash.ufxlw0qz.dpuf (acessado em 10/Jul/2016). 9. Duarte V, Araujo PMM. Contribuições das Câ-maras Setoriais e Temáticas à formulação de políticas públicas e privadas para o agronegó-cio. http://www.agricultura.gov.br/arq_editor/ LIVRO_COMPLETO.pdf (acessado em 10/ Jul/2016).

10. Organização das Nações Unidas. Transforman-do nosso munTransforman-do: a Agenda 2030 para o Desen-volvimento Sustentável. https://nacoesunidas. org/pos2015/agenda2030/ (acessado em 10/ Jul/2016).

Referências

Documentos relacionados

Os resultados globais dessa busca na literatura revelaram que os esforços da indústria para demonstrar que os aditivos usados atualmente são “seguros”, tem apoio principalmente

No entanto, os desafios ainda são muitos, em especial os colocados pela cadeia produtiva do tabaco controlada por grandes companhias transnacionais que fizeram do Brasil um

Em 2003, a Assembleia Mundial de Saúde adotou a Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco da Organização Mundial da Saúde (CQCT-OMS), a qual visa a proteger os cidadãos

Os resultados da pesquisa ITC-Brasil mostraram uma redução significativa da percepção de pessoas fumando dentro de restaurantes e bares entre as Ondas 1 e 2, tanto entre fumantes

Foi utilizada a razão de chances ( odds ratio – OR) para estimar a magnitude das associações entre variáveis de exposição (se o participante havia visto ator fumando na mídia,

Tal processo se estendeu entre as negociações diplomáticas para a participação do Brasil nesse Tratado, em 2003, e a sua ratificação pelo Congresso Nacional, em 2005, e foi

No caso dos cigarros eletrônicos, tal discurso corrobora essa estratégia, pois converge para um cenário comercial e de marketing que se fusiona ao mercado dos produtos de

(sim ou não); e percepção do risco à saúde de ENDS comparado a cigarros convencionais: “você acredita que cigarros eletrônicos são mais perigosos, igualmente perigosos ou menos