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Violência obstétrica: a responsabilidade civil do médico obstetra e os atos atentatórios a integridade física e psíquica Da mulher

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GRANDE DO SUL

EDUARDA DE OLIVEIRA

VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA: A RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO OBSTETRA E OS ATOS ATENTATÓRIOS A INTEGRIDADE FÍSICA E PSÍQUICA

DA MULHER

Ijuí (RS) 2018

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EDUARDA DE OLIVEIRA

VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA: A RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO OBSTETRA E OS ATOS ATENTATÓRIOS A INTEGRIDADE FÍSICA E PSÍQUICA

DA MULHER

Monografia final do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Monografia.

UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS – Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais

Orientadora: MSc. Etiane da Silva Barbi Kohler

Ijuí (RS) 2018

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Dedico à minha família esse trabalho, pelo apoio, incentivo e paciência durante essa jornada acadêmica.

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AGRADECIMENTOS

Aos meus pais e irmã, que sempre estiveram presente na minha jornada acadêmica, que me apoiaram nas decisões mais difíceis e que me incentivaram a nunca desistir dos meus sonhos, a quem eu devo toda essa felicidade.

Ao meu namorado, que pelas inúmeras vezes me ajudou durante o curso, com muita paciência, incentivando para que confiasse no meu potencial na busca dos meus objetivos.

A minha tia Luciane e ao meu tio Luiz, que participaram da minha caminhada ao longo desses anos, fazendo ser possível essa realização e que sempre estiveram do meu lado me apoiando e torcendo pela minha felicidade.

À minha orientadora Etiane da Silva Barbi Kohler, com quem eu tive a oportunidade de conviver e contar com sua dedicação e disponibilidade, sempre me guiando no caminho correto.

Aos meus colegas de trabalho da Procuradoria do Estado de Ijuí, que colaboraram com boa vontade e generosidade para o meu aprendizado e crescimento na vida acadêmica.

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“A injustiça em qualquer lugar é uma ameaça à justiça por toda parte.” Martin Luther King Jr.

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O presente trabalho de conclusão do curso tem como enfoque principal a violência obstétrica, uma forma de infração praticada contra gestantes e parturientes, que se caracteriza pela lesão física e ou psicológica incutida a estas no decorrer da gestação e no parto, quando elas se encontram num momento de maior vulnerabilidade. O objeto desse estudo está voltado também para a pesquisa normativa atualizada acerca da responsabilidade civil do profissional médico, considerada sua atuação no momento do parto, enfocando as práticas hospitalares que atentam contra a dignidade e a integridade física e psíquica da mulher.

Palavras-Chave: Violência obstétrica. Prevenção da violência obstétrica. Responsabilidade Civil. Médico obstetra.

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The main objective of this study is the obstetric violence, a form of infraction practiced against pregnant women and parturients, characterized by the physical and / or psychological injury inflicted on them during pregnancy and childbirth when they are at the moment of greatest vulnerability and that occurs mainly in public health. The purpose of this study is also focused on normative research on the civil responsibility of the medical professional, considering their performance at the time of delivery, focusing on hospital practices that violate the dignity, physical and psychological integrity of the woman.

Keywords: Obstetric violence. Prevention of obstetric violence. Civil responsability. Obstetrician.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 9

1 DA VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA 1.1 Definição ... 11

1.2 Reconhecendo a violência obstétrica ... 14

1.2.1 Das principais práticas obstétricas ... 15

1.2.2 Os principais protagonistas ... 20

1.3 Da prevenção da violência obstétrica ... 21

1.4 Do amparo legal provindo da legislação brasileira ... 23

2 DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO PROFISSIONAL MÉDICO DIANTE DA VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA E A REPARAÇÃO DOS DANOS 2.1 Responsabilidade civil: noções gerais... 28

2.2 Da conduta humana e o nexo de causalidade ... 30

2.2.1 Da culpa ... 32

2.2.2 Do dano ... 33

2.3 Da responsabilidade civil do profissional médico obstetra ... 35

CONCLUSÃO ... 41

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho abordará sobre a violência obstétrica, assunto de extrema importância, que diz respeito a milhares de mulheres, que passam por tal situação.

O estudo tem como objetivo geral passar para os leitores informações acerca da violência obstétrica, sobre os procedimentos, atendimentos de saúde, os direitos da gestante, chamando a atenção para a necessidade de conhecê-los e denunciar quando houver prática de agressões do estilo. Pretende analisar também a responsabilidade civil do profissional médico obstetra, principalmente porque a obrigação deste é de empregar com zelo e prudência todos os meios necessários de melhor atendimento para seus pacientes.

O trabalho foi dividido em dois capítulos, o primeiro versará sobre a violência obstétrica em si, sua definição, depoimentos de vítimas, a fim de apresentar todos os tipos de violência obstétrica, suas práticas de caráter físico, psicológico e sexual. Também abordará sobre o reconhecimento dos principais protagonistas que causam esse tipo de agressão e como a prevenção é importante para evitar casos com mais vítimas. Ainda, estuda o amparo legal existente e quais são os direitos das gestantes.

Já no segundo capítulo, se apresentará a responsabilidade civil do profissional médico obstetra, abordando o conceito da responsabilidade civil e suas peculiaridades, sistematizando os temas sobre conduta humana, culpa, dolo e o nexo causal, voltados para reparação dos danos na prática profissional obstétrica.

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No mais, o presente trabalho visa buscar um melhor entendimento acerca dos direitos das mulheres vítimas da violência obstétrica, um assunto muito delicado envolvendo relatos reais, para um melhor entendimento da matéria. Também como a importância dos elementos postos para análise nessa pesquisa, quais sejam: a relação entre o profissional da saúde e sua equipe com as gestantes/parturientes e as práticas envolvidas.

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1 DA VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA

Nesse primeiro momento, aborda-se a violência obstétrica em si, perpassando considerações acerca dos direitos desrespeitados das vítimas, os maus-tratos durante o parto nas instituições de saúde, os constrangimentos, assédios, discriminação, humilhação, os atos atentatórios, à ameaça contra a vida e à saúde da mulher e do nascituro, a naturalização da violência obstétrica, o abuso, desprezo ao corpo da mulher, as agressões físicas, as práticas violentas, bem como, o reconhecimento desses atos, amparo legal e sua prevenção.

1.1 Definição

A violência caracteriza-se como um grave fenômeno social que está crescendo cada vez mais, de várias formas e, principalmente contra a mulher. Ao longo da história e nos dias atuais a violência ganhou caráter próprio, fazendo-se presente no nosso cotidiano e em comunidades e países de todo o mundo, sem discriminação social, racial, etária ou religiosa.

Nesse sentido, destaca-se a violência obstétrica como um fenômeno que já vem acontecendo há algumas décadas e se caracteriza pela dor, sofrimento, descaso e desrespeito às vítimas, ou seja, é uma prática que atenta contra a integridade física e psíquica das mulheres gestantes no período de atendimento à parturiente no trabalho de parto ou no parto em si, mediante agressões praticadas por alguns médicos obstetras e suas equipes, como por exemplo, os xingamentos, violação dos seus direitos, atos extremamente abusivos.

Entende-se por violência obstétrica qualquer ato exercido por profissionais da saúde no que cerne ao corpo e aos processos reprodutivos das mulheres, exprimido através de uma atenção desumanizada, abuso de ações intervencionistas, medicalização e a transformação patológica dos processos de parturição fisiológicos. (JUAREZ, 2012 apud ANDRADE, AGGIO, 2014).

A violência contra a mulher é muito ampla e muito presente na atualidade, abrange diversos meios e a violência obstétrica é um desses. Cometida por profissionais da saúde em um processo insensível, desumano, a violência obstétrica

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acaba por envolver abuso da autoridade médica que comete atos contra a vontade da parturiente.

A mulher e seu corpo têm sido vistos como máquina, onde o engenheiro é o profissional médico que detém todo o saber sobre ela, negligenciando informações, emoções, sentimentos, percepções e direitos da mesma no gestar e parir, sendo impedidas de ter a presença de acompanhante, de decidir a posição que querem ter seus bebês e de expressar suas emoções e sentimentos, contrariando a Política Nacional de Humanização e mudando o foco da mulher para o procedimento, deixando-as mais vulneráveis à violência, silenciada pelos profissionais e pela própria parturiente. Porém, a amarga vivência e o trauma acompanham a mulher porta a fora da instituição. (ANDRADE, AGGIO, 2014 p. 3).

Conforme pesquisas e relatos de parturientes, na maioria das vezes quem decide o que deve ou não ser feito no momento do parto é o profissional obstetra, sem consultar a vontade e as escolhas dessas mulheres, agindo de forma que beneficie somente o médico e a sua equipe médica, sem que a mulher possa opinar sobre os procedimentos a serem adotados e as escolhas sobre o seu próprio corpo.

Nesse sentido, a revista época (2015), relata à violência obstétrica sofrida pela vítima Eva Maria Cordeiro, em um depoimento, o qual retrata precisamente tal brutalidade:

Ela lembra que, ao voltar ao hospital, conforme a orientação que havia recebido, ouviu reprimendas em tom inquisidor: „Por que não veio mais cedo?‟, „Queria forçar um parto normal?‟, „Quem manda no procedimento sou eu‟. Sozinha, foi encaminhada à sala de cirurgia para, segundo um dos profissionais que a receberam, „arcar com as consequências‟ de suas escolhas. A equipe médica tentou empurrar a barriga de Eva, com a manobra de Kristeller. A manobra, tradicional, mas hoje muito questionada, consiste em dar empurrões para ajudar na saída do bebê. Sem explicar nada, uma enfermeira deitou sobre a barriga de Eva. Como a paciente reagiu, amarraram suas mãos. O bebê não sobreviveu. Disseram que a morte ocorreu por a mãe ter „forçado‟ o parto.

Muitas parturientes se sentem culpadas com a situação em que se encontram, a pressão psicológica é uma tortura emocional que ocasiona consequências para o resto da vida dessas vítimas, o período vulnerável e a fraqueza tornam esses resultados insuportáveis e irreparáveis, assim relata a vítima Eva Maria Cordeiro (2015):

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“Assumi a culpa pela morte do meu filho. Meu casamento quase acabou. Parei de trabalhar e abandonei o mestrado. Uma lembrança especialmente amarga é a do marido carregando o caixão do filho morto, como quem embala um bebê. Tem gente que acha que venci por ter outros filhos. Quem disse? Nunca fui ao cemitério onde meu filho está enterrado. Tenho medo de não sair viva de lá.”

Relata também, que não recebeu o prontuário médico, conduta que segundo o Código de Ética Médica, Resolução CFM nº 1.931, de 17 de setembro de 2009, artigo 88, é expressamente vedada ao médico:

Art. 88. Negar, ao paciente, acesso a seu prontuário, deixar de lhe fornecer cópia quando solicitada, bem como deixar de lhe dar explicações necessárias à sua compreensão, salvo quando ocasionarem riscos ao próprio paciente ou a terceiros.

Desta forma, o profissional obstetra, tem o dever de fornecer a seus pacientes, sejam parturientes ou não, a cópia do prontuário médico quando solicitado, dever este somente ressalvado no caso de a informação implicar em risco aos próprios pacientes ou a terceiros.

A violência obstétrica ainda se dá quando se impede que a mãe, assistida pelo médico, possa decidir sobre os procedimentos que serão tomados sobre seu próprio corpo, como enfatizado anteriormente, bem como no decorrer do parto, quando, desnecessariamente, se impede ou se retarda o contato da mãe com o nascituro logo após o nascimento, até mesmo quando se impede ou se dificulta a amamentação logo na primeira hora de vida ou, ainda, quando, por conveniência do hospital, impede-se a internação em conjunto da mãe e do seu filho levando o mesmo para o berçário sem ter plena necessidade médica.

Não só no Brasil, mas no mundo inteiro, muitas mulheres sofrem abusos, maus-tratos e desrespeito durante o parto nas instituições de saúde, tal tratamento viola os direitos das mulheres ao cuidado respeitoso e digno. Nesse contexto, podemos ressaltar que há uma violação ao direito à vida, à saúde e à integridade, tendo consequências adversas diretas para mãe e a crianças que são submetidas a todas as práticas de violência obstétricas.

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1.2 Reconhecendo a violência obstétrica

No cotidiano da violência no atendimento à parturiente, seja no trabalho de parto ou no parto em si, podemos destacar o caráter de cada ato dessas práticas abusivas, sendo os principais: o caráter físico, psicológico, sexual. O contexto dessa pesquisa nos mostra que a classificação desses procedimentos não é taxativa, podendo apenas um ato encaixar-se na moldura mais adequada de uma categoria.

O procedimento de caráter físico é aquele em que os atos são praticados sobre o corpo da parturiente, causando dor e/ou dano físico, sem nenhuma recomendação ou necessidade, apenas baseados em evidencias cientificas. Temos como exemplo a manobra de Kristeller, que pode ser considerado um dos procedimentos mais ofensivos e danosos para o corpo da mulher. Segundo Reis, citado por Parto do Princípio:

A manobra de Kristeller é reconhecidamente danosa à saúde e, ao mesmo tempo, ineficaz, causando à parturiente o desconforto da dor provocada e também o trauma que se seguirá indefinidamente (REIS, apud PARTO DO PRINCÍPIO, 2012, p. 105).

Essa manobra, que pode prejudicar tanto a mãe quanto ao bebê, ocorre quando o médico ou enfermeiro pressiona seus braços e cotovelos sobre a mulher, forçando a barriga para acelerar a saída do nascituro. Em uma pesquisa intitulada “Nascer no Brasil”, feita pela Fiocruz, ficou constatada que em aproximadamente 36% dos partos vaginais que foram analisados, foi praticada a Manobra de Kristeller (SOUSA, 2015, p. 19), assim demonstrando um grande desacordo entre as recomendações voltadas à proteção à saúde da parturiente e as técnicas adotadas.

O procedimento de caráter sexual, por sua vez, é aquele que invade o espaço da mulher, um assedio, o que acaba acontecendo quando o médico obstetra abusa do seu poder profissional, para poder se aproveitar do corpo da paciente sem a sua permissão. Esse procedimento além de ser uma agressão física, afeta o psicológico desta, o que gera sentimento de culpa e vergonha por ter seu corpo violado.

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Toda ação imposta à mulher que viole sua intimidade ou pudor, incidindo sobre seu senso de integridade sexual e reprodutiva, podendo ter acesso ou não aos órgãos sexuais e partes íntimas do seu corpo. São exemplos a episiotomia, assédio, exames de toque invasivos constantes ou agressivos, lavagem intestinal, cesariana sem consentimento informado, ruptura ou descolamento de membranas sem consentimento informado (PARTO DO PRINCÍPIO, 2012, p. 60).

Essa prática desumana leva a mulher a sentir-se usada como se fosse um objeto, sendo manipulada e tendo seu corpo desrespeitado, acarretando em traumas psicológicos e problemas de saúde mental do bebê, até mesmo em risco de vida. São muitos os procedimentos que atentam contra a integridade dessas vítimas, como vamos mostrar no próximo tópico, mais especificadamente, ao tratar das principais práticas obstétricas.

Lado outro, o procedimento de caráter psicológico acontece quando o médico obstetra deixa a paciente com sentimento de inferioridade, causando-lhe insegurança no momento da escolha do método do parto, podemos caracterizar como uma pressão psicológica que não só atinge a parturiente, mas também seus familiares, que a acompanham nesse período. Nesse sentido, a Rede Parto do Princípio traz o que é o procedimento de caráter psicológico:

Toda ação verbal ou comportamental que cause na mulher

sentimentos de inferioridade, vulnerabilidade, abandono,

instabilidade emocional, medo, acuação, insegurança, dissuasão, 40 ludibriamento, alienação, perda de integridade, dignidade e prestígio (PARTO DO PRINCÍPIO, 2012, p. 60).

Nesse tópico também se enquadra o procedimento de caráter verbal, caracterizado como constrangimentos que ofendem à gestante, seja de forma preconceituosa, menosprezando sua raça, opção sexual, idade, escolaridade, religião, sua renda, entre milhares de formas insensíveis, humilhantes que ridicularizam as escolhas da paciente, desde a sua opção sobre os procedimentos a serem tomados no momento do parto.

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Segundo a pesquisa Nascer no Brasil, coordenada pela Fiocruz, uma em cada quatro brasileiras que deram à luz foram vítimas de violência. Os fatos envolvem atos de desrespeito, assédio moral e físico, abuso e negligência, que vão desde o período pré-natal até durante o parto, e apenas nos últimos anos esse tema está sendo debatido pela comunidade científica juntamente com os profissionais de saúde e sociedade civil (Fiocruz, 2014).

São procedimentos desnecessários e invasivos, e podemos caracterizar os tipos de violência obstétrica, como por exemplo, na gestação, as mulheres passam por constrangimentos verbais, que propagem preconceitos sociais, raciais, sua orientação sexual e ainda humilhação e negligência no tratamento e agendamento para cesárea, muitas vezes sem o consentimento da parturiente, de forma mais conveniente exclusivamente ao interesse médico.

A violência institucional obstétrica no Pré-Natal ou Pré-Parto é entendido como negligenciar atendimento de qualidade à mulher, omitir informações suficientes para que a mesma tome suas decisões, agendamento de cesariana sem indicação clínica e peregrinação no período reprodutivo (PEREZ, 2015).

Nesse sentido, relata Joyce Guerra, deficiente visual, em depoimento à revista Época (2015), que:

“O bebê estava para nascer, por parto normal. A equipe optou pela cesárea e se recusou a chamar a médica que me atendia. Não me deram explicações. Avisei que a anestesia não pegou. Mesmo assim, fizeram a cesárea. O anestesista puxava meu cabelo para eu não desmaiar de dor.”

O desrespeito, exemplo de violência verbal e a “menos” agressiva delas, atenta contra a integridade psíquica da mulher, principalmente na hora do parto, momento em que essa se encontra em um período de maior vulnerabilidade, estado em que se encontra mais suscetível.

A insolência é quando o profissional usa da sua autoridade para impor, forçar a vítima, a procedimentos médicos coercivos ou não consentidos, privando ela de seus direitos, como por exemplo, a rejeição do médico a entrada de um

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acompanhante na sala de parto e também a negativa de prestar informações ou esclarecimentos de dúvidas sem que haja alguma emergência.

É muito comum essas ações em hospitais, quando privam a mulher da presença do acompanhante nesse período delicado que é o momento do parto, sendo tal direito regulado por lei, justamente como uma forma de prevenção contra essas práticas abusivas. Estabelece a Lei nº 11.108, de 07 de abril de 2005:

Art. 19-J. Os serviços de saúde do Sistema Único de Saúde - SUS, da rede própria ou conveniada, ficam obrigados a permitir a presença, junto à parturiente, de 1 (um) acompanhante durante todo o período de trabalho de parto, parto e pós-parto imediato.

§ 1o. O acompanhante de que trata o caput deste artigo será indicado pela parturiente.

§ 2o. As ações destinadas a viabilizar o pleno exercício dos direitos de que trata este artigo constarão do regulamento da lei, a ser elaborado pelo órgão competente do Poder Executivo.

Em se tratando de negligência, a falta de cuidados, desleixo, erros e falta de responsabilidade por parte do profissional da saúde, procedimentos sem o mínimo de prudência que prejudicam e colocam em risco a saúde da parturiente e do nascituro, também acarretam na agressão física, onde as vítimas sofrem com dores e desconforto.

A negligência médica caracteriza-se, segundo Genival Veloso de França (1997):

Pela inação, indolência, inércia, passividade. É um ato omissivo. O abandono ao doente, a omissão de tratamento, a negligência de um médico pela omissão de outro (um médico, confiando na pontualidade do colega, deixa plantão, mas o substituto não chega e o doente, pela falta de profissional, vem a sofrer graves danos. É a negligência vicariante).

O termo violência remete a qualquer ato agressivo que pode se manifestar de forma física, sexual, psicológica, por negligência e/ou privação (SILVA, 2007). Como trata Diniz e Chacham sobre o reconhecimento das práticas da violência obstétrica:

Reconhecendo e caracterizando a violência obstétrica. É chegado o momento de reconhecer as práticas dolorosas, perniciosas e

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não-científicas adotadas nas maternidades como problemas de saúde pública e direitos humanos (DINIZ; CHACHAM, 2006, p. 84).

O abuso físico é o que retrata os maus tratos com a paciente, que podem ocorrer em situações como, cesáreas e episiotomias (incisão efetuada na região do períneo para ampliar o canal do parto) desnecessárias, toques vaginais dolorosos, imobilização física em posições desconfortável, fazendo com que a vítima sofra traumas prejudiciais a sua saúde e a do bebê.

Por outro lado, o abuso verbal pode ser apontado na comunicação desrespeitosa, em que se ridiculariza a dor da parturiente, com deboches insensíveis como humilhação de caráter sexual, e também quando é desmoralizada e negado os pedidos de ajuda das parturientes na hora do parto.

No depoimento da vítima Kelly de Oliveira Mafra à revista Época (2015), encontramos exemplo fiel de tal abuso:

“Não permitiram a entrada do meu marido na sala de parto. Quando as dores e contrações começaram ouvi: ... „na hora de fazer, não gostou‟? e „não grita, vai assustar as outras mães‟.”

É muito importante frisar que a discriminação baseada em atributos como, racial, social e sexual, é muito comum nesses casos, quando a paciente recebe um tratamento diferenciado com base nos seus atributos, como, por exemplo: pessoas negras, pobres, sem escolarização, e as mais jovens, e é muito comum no nosso cotidiano presenciar esse tipo de preconceito.

Neste sentido, calha lembrar que a Constituição Federal de 1988 dispõe em seu artigo 5º, caput, sobre o princípio constitucional da igualdade, perante a lei, nos seguintes termos:

Art.5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes.

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Outro fator existente e que se enquadra nessas práticas é o abandono ou a recusa de atendimento e assistência às mulheres ou impor dificuldades a esse auxilio negligenciando o atendimento de qualidade em postos de saúde onde é realizado o acompanhamento pré-natal. Como já enfatizado anteriormente, se enquadra nesses casos também o agendamento das cesáreas sem recomendação, baseada somente em evidências, atendendo aos interesses e conveniência apenas do médico obstetra e de sua equipe.

Negar assistência adequada e um tratamento humano a essas mulheres é uma violência tamanha absurda, todas possuem o direito ao cuidado à saúde em tempo oportuno, proteção e a precaução necessária para prevenir danos e risco à vida destas e dos seus filhos. É muito comum, a falta desse assessoramento na hora do parto, e a falta de responsabilidade e cuidados.

Dessa forma, a vítima Marcela Aureliano, em depoimento ao jornal A Crítica de Manaus, citada por Maria Bueno em seu artigo (2016), descreve sua história:

“Eu e meu bebê estávamos bem de saúde. Eu havia me preparado para ter meu filho em casa, mas aconteceram alguns imprevistos e meu „plano B‟ era ir para uma maternidade pública. Já na triagem fui super mal tratada pelas enfermeiras que não sabem lidar com mulheres em trabalho de parto. A primeira coisa que o médico fez foi perguntar „o que eu estava fazendo ali‟, argumentando que „mulher que tem mais de 30 anos não pode ter parto normal‟. Me deixaram em uma maca desconfortável, sem comida e sem água. A dor era muita e lembro que eu chorava bastante. Ninguém respeitava o que eu queria e eu comecei a passar mal. Me deram soro com remédio para dor. As enfermeiras falavam que eu tinha que fazer a cesárea. Na sala de cirurgia não permitiram que meu marido entrasse e ainda me mandaram calar a boca várias vezes.”

É muito mais comum do que imaginamos esse tipo de violência à saúde materna. Em uma pesquisa realizada pela Revista Época (2015), os dados mostram uma realidade deprimente, qual consta que 75% das mulheres em todo o Brasil não receberam alimentação durante o trabalho de parto, 73% não tiveram acesso a procedimentos não medicamentosos para o alívio da dor, como banho quente, 71% não tiveram direito a acompanhante, o que é assegurado por lei desde 2005, e 25% afirmam ter sido desrespeitadas na gestação ou parto.

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Sendo assim, todos os procedimentos que atentam contra os direitos da mulher, a saúde e o psicológico, não interessando o grau ou o caráter em que se enquadram, são caracterizados como violência obstétrica, em diversas formas e meios diferentes, sofrida pela mulher nas mãos de médicos obstetras e suas equipes, da gestação ao puerpério.

1.2.2 Os principais protagonistas

Rotineiramente, os principais protagonistas dessas práticas abusivas são os profissionais da saúde, médicos, enfermeiros, técnicos em enfermagem, psicólogos, equipes que atuam nesse campo, entre outros inúmeros profissionais os quais já foram relatos de pacientes vulneráveis e sem conhecimento de seus direitos como gestante e principalmente como pessoa.

Essa realidade vem aumentando assustadoramente cada vez mais, tanto no sistema público quanto no privado de saúde. A violência ocorre antes durante e depois do parto, e são agressões praticadas de várias formas como vimos anteriormente às práticas causas verbalmente, fisicamente e as que atingem a saúde mental das vítimas.

Os médicos obstetras possuem o dever de agir com responsabilidade em suas práticas, respeitando as escolhas das pacientes, tomando as medidas necessárias para um bom procedimento e resultado, sem ofensa, sem agressões, cumprindo com o seu papel de profissional.

Nos dias atuais, é de suma importância também o papel médicos anestesistas, não só apenas o acompanhamento da sala de operação, mas também no período pré e pós-operatório. Assim, não pode mais o médico chefe ser o único responsável por tudo o que aconteça antes, durante e após uma intervenção cirúrgica. (GONÇALVES, 2017, p. 309).

Desta vênia, o profissional anestesista tem a obrigação e a responsabilidade de respeitar as parturientes não só no período pré e pós-operatório com destaca o

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autor no parágrafo acima, cuidando das necessidades das gestantes e principalmente não ignorado suas dores.

Também vale frisar que, são figuras protagonistas desse cenário os enfermeiros (as), e auxiliares em enfermagem, os quais deveram prestar um serviço digno de cuidado e respeito às pacientes nesse período de grande vulnerabilidade. É muito comum as atitudes desumanas praticadas por esses profissionais, as quais sejam: as agressões verbais, xingamentos, ofensas e intervenções desnecessárias, que resultam em danos psíquicos, como vimos em relatos anteriores.

No entanto, não podemos deixar de fora desse tópico os recepcionistas, é comum as pacientes passarem por alguma forma de violência praticada por esses profissionais no exercício do seu trabalho nos hospitais ou clínicas particulares, quando mal atendidas, sendo negado o atendimento a gestante e vedado a entrada do seu acompanhante na realização do parto.

É preciso mudança dos profissionais, começando desde o início, durante a formação e principalmente no modelo assistencial, pois essas práticas já estão sendo “taxadas” como comuns e sendo utilizadas de forma corriqueira, e precisam ser urgentemente prevenidas de forma que não aconteça jamais, a fim de garantir os direitos básicos das vítimas.

1.3 Da prevenção da violência obstétrica

É muito importante a prevenção da violência obstétrica para que a vontade das gestantes seja respeitada e que não ocorra procedimentos invasivos e inadequados. A prevenção, todavia, perpassa a necessidade de informação, uma vez que a maioria das vítimas não têm informações acerca dos seus direitos.

O parto é um dos momentos mais difíceis na vida de uma mulher, surgem vários desconfortos e se trata de um período de maior vulnerabilidade, em face disso, a Lei nº 11.108/2005, permite a presença um acompanhante de sua confiança durante o período de trabalho de parto, o que é de suma importância e um direito de todas as parturientes.

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É necessário que as mulheres compreendam o sentido de certas práticas, o que é normal e do que não faz parte na hora do parto e representa abuso e violência contra elas e o feto, saber identificar quando estão passando por essa situação, saber reconhecer seus direitos e ter coragem para enfrentar essa violência.

A violência obstétrica, ainda é um tema muito pouco debatido, e infelizmente é uma realidade em que vivemos, é relevante que cada vez mais toquemos nesse assunto, debater e fazer com que os direitos sejam conhecidos e cada vez mais possa chegar às mulheres que sofreram com essas práticas, fazendo com que estas possam identificar a ocorrência da violência obstétrica e encoraja-las a denunciar, com isso evitando que as mesmas agressões, tanto física, quanto psíquicas ocorram com outras parturientes usuárias do sistema hospitalar.

É muito amplo os espectros dos casos de violência obstétrica, e muitas mulheres não sabem reconhecer, pois é um momento de total vulnerabilidade, onde se encontram com muita dificuldade e precisam de ajuda, passam a confiar no médico e na sua equipe, estes que deixam a desejar, não exercendo a sua atividade profissional com comprometimento, dedicação, responsabilidade e principalmente profissionalismo.

A escolha dos procedimentos deverá ser feita exclusivamente pelas gestantes, sem dor ou sofrimento, pois esse momento da vida é único e muito esperado por essas mulheres, não se pode admitir nem aceitar como se fosse “normal” essas práticas agressivas e maus tratos, tanto no atendimento, quanto na cena do parto. Essas condutas consideradas violentas são passiveis de indenização e a denúncia é o meio mais eficaz para que se evite acontecer com mais vítimas. É preciso que todas as mulheres procurem conhecer seus direitos para que essas práticas rotineiras deixem de existir.

Assim, a Constituição Federal de 1988 dispõe em seu artigo 5º, inciso X, que:

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São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

Deste modo, quando a mulher sentir-se lesada, em relação à intimidade, a vida privada, honra e a sua imagem, é garantido por lei o direito de pleitear a devida indenização, mediante ação judicial e garantir seu direito.

Para prevenção da violência obstétrica, o passo mais importante é a denúncia quando a identificada, devendo as vítimas procurar assistência adequada urgentemente, para que se possa ser tomada as devidas providencias, evitando assim novas agressões.

É recomendado que as vítimas compareçam na ouvidoria do hospital ou da unidade de saúde que ocorreu a violência, detalhando o que sofreu e o que esses atos causaram na saúde da gestante e do seu bebê, levando consigo documentos importantes (planos de partos, prontuário médico, exames, etc.), para ajudar no processo de reconhecimento da prática.

A denúncia é o fator mais relevante e preciso nesses momentos de angustia e necessidade, é importante não se calar frente esses absurdos cometidos, é preciso ir à busca dos direitos e da dignidade que lhe são devidos, e ajudando assim mesmo que de forma indiretamente a prevenção de novos atos contra novas vítimas.

1.4 Do amparo legal provindo da legislação brasileira

As parturientes, gestantes, vítimas da violência obstétrica são titulares de direitos amparados no sistema legal brasileiro, os quais atualmente vêm sendo ignorados por aqueles que prestam atendimento ao parto. Desse modo, neste item vamos apresentar as garantias previstas na legislação brasileira quanto a proteção às mulheres nessas circunstancias.

No âmbito constitucional, artigo 5º da Constituição Federal, temos regulada a garantia à igualdade e inviolabilidade do direito à vida e à liberdade, bem como a

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não obrigatoriedade de fazer alguma coisa caso não previsto em lei e de que ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante.

Já no artigo 196 da Constituição, são estabelecidas medidas sociais e econômicas que devem ser empreendidas pelo Estado a fim de reduzir o risco de doença e de outros agravos no acesso à saúde, assim incluindo a parturiente perante o atendimento público, para que possa ser bem atendida, sem ocorrer em violência obstétrica.

A Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos (2005), apresenta o direito à informação e à tomada de decisões livre, ou seja, o consentimento do indivíduo envolvido, baseado em informação adequada. É o que esclarece o artigo 6 º, assim redigido:

Qualquer intervenção médica preventiva, diagnóstica e terapêutica só deve ser realizada com o consentimento prévio, livre e esclarecido do indivíduo envolvido, baseado em informação adequada. O consentimento deve, quando apropriado, ser manifesto e poder ser retirado pelo indivíduo envolvido a qualquer momento e por qualquer razão, sem acarretar desvantagem ou preconceito.

Também, no artigo 5º da Declaração Universal sobre a Bioética e Direitos Humanos é regulado o respeito à autonomia e responsabilidade individual, assim, ele determina que:

Deve ser respeitada a autonomia dos indivíduos para tomar decisões, quando possam ser responsáveis por essas decisões e respeitem a autonomia dos demais. Devem ser tomadas medidas especiais para proteger direitos e interesses dos indivíduos não capazes de exercer autonomia.

Outrossim, no que diz respeito ao direito à integridade pessoal o artigo 5º da Convenção Interamericana de Direitos Humanos, dispõe que é direito de todos a proteção e respeito a integridade física, psíquica e moral. Nesse viés, esse direito resta agredido a partir de práticas desnecessárias e que invadem a privacidade da mulher como ocorre no caso de fazer uma episiotomia e cesáreas sem a devida indicação de necessidade quanto ao estado de saúde da mãe e do nascituro.

(25)

Ainda, em 2000 o Ministério da Saúde editou a Portaria nº 569, que regula o acesso e garantia à saúde tanto para a parturiente como para o bebê. Nesse sentido, os artigos 1º e 2º da Portaria:

Art. 1º. Instituir o Programa de Humanização no Pré-natal e Nascimento, no âmbito do Sistema Único de Saúde.

Art. 2º. Estabelecer os seguintes princípios e diretrizes para a estruturação do Programa de Humanização no Pré-natal e Nascimento:

a - toda parturiente tem direito ao acesso a atendimento digno e de qualidade no decorrer da gestação, parto e puerpério;

b - toda parturiente tem direito ao acompanhamento pré-natal adequado de acordo com os princípios gerais e condições estabelecidas no Anexo I desta Portaria;

c - toda parturiente tem direito de saber e ter assegurado o acesso à maternidade em que será atendida no momento do parto;

d - toda parturiente tem direito à assistência ao parto e ao puerpério e que esta seja realizada de forma humanizada e segura, de acordo com os princípios gerais e condições estabelecidas no Anexo II desta Portaria;

e - todo recém-nascido tem direito à assistência neonatal de forma humanizada e segura;

f - as autoridades sanitárias dos âmbitos federal, estadual e municipal são responsáveis pela garantia dos direitos enunciados nas alíneas acima.

De modo que seja aprimorado o tratamento da saúde das mulheres, voltado para o período gestacional, e reconhecendo obrigações de entidades em garantir um atendimento melhor e humanizado para parturiente e o recém-nascido.

Em combate a violência obstétrica o estado de Santa Catarina é um grande exemplo, tendo em janeiro de 2017, editado a Lei nº 17.097, que trata especificamente do tema em questão, servindo como modelo para o Brasil no sentido de sua adoção em âmbito nacional. O seu artigo 3º, especifica os tipos de violência obstétrica que devem ser coibidos:

Art. 3º Para efeitos da presente Lei considerar-se-á ofensa verbal ou física, dente outras, as seguintes condutas:

I – tratar a parturiente ou parturiente de forma agressiva, não empática, grosseira, zombeteira, ou de qualquer outra forma que a faça se sentir mal pelo tratamento recebido;

II – fazer graça ou recriminar a parturiente por qualquer comportamento como gritar, chorar, ter medo, vergonha ou dúvidas;

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III – fazer graça ou recriminar a mulher por qualquer característica ou ato físico como, por exemplo, obesidade, pelos, estrias, evacuação e outros;

IV – não ouvir as queixas e dúvidas da mulher internada e em trabalho de parto;

V – tratar a mulher de forma inferior, dando-lhe comandos e nomes infantilizados e diminutivos, tratando-a como incapaz;

VI – fazer a parturiente ou parturiente acreditar que precisa de uma cesariana quando esta não se faz necessária, utilizando de riscos imaginários ou hipotéticos não comprovados e sem a devida explicação dos riscos que alcançam ela e o bebê;

VII – recusar atendimento de parto, haja vista este ser uma emergência médica;

VIII – promover a transferência da internação da parturiente ou parturiente sem a análise e a confirmação prévia de haver vaga e garantia de atendimento, bem como tempo suficiente para que esta chegue ao local;

IX – impedir que a mulher seja acompanhada por alguém de sua preferência durante todo o trabalho de parto;

X – impedir a mulher de se comunicar com o “mundo exterior”, tirando-lhe a liberdade de telefonar, fazer uso de aparelho celular, caminhar até a sala de espera, conversar com familiares e com seu acompanhante;

XI – submeter a mulher a procedimentos dolorosos, desnecessários

ou humilhantes, como lavagem intestinal, raspagem de pelos pubianos, posição ginecológica com portas abertas, exame de toque por mais de um profissional;

XII – deixar de aplicar anestesia na parturiente quando está assim o requerer;

XIII – proceder a episiotomia quando esta não é realmente imprescindível;

XIV – manter algemadas as detentas em trabalho de parto;

XV – fazer qualquer procedimento sem, previamente, pedir

permissão ou explicar, com palavras simples, a necessidade do que está sendo oferecido ou recomendado;

XVI – após o trabalho de parto, demorar injustificadamente para acomodar a mulher no quarto;

XVII – submeter a mulher e/ou bebê a procedimentos feitos exclusivamente para treinar estudantes;

XVIII – submeter o bebê saudável a aspiração de rotina, injeções ou procedimentos na primeira hora de vida, sem que antes tenha sido colocado em contato pele a pele com a mãe e de ter tido a chance de mamar;

XIX – retirar da mulher, depois do parto, o direito de ter o bebê ao seu lado no Alojamento Conjunto e de amamentar em livre demanda, salvo se um deles, ou ambos necessitarem de cuidados especiais; XX – não informar a mulher, com mais de 25 (vinte e cinco) anos ou com mais de 2 (dois) filhos sobre seu direito à realização de ligadura nas trompas gratuitamente nos hospitais públicos e conveniados ao Sistema Único de Saúde (SUS);

XXI – tratar o pai do bebê como visita e obstar seu livre acesso para acompanhar a parturiente e o bebê a qualquer hora do dia.

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Por fim, podemos concluir que as mulheres vítimas da violência obstétrica possuem garantias que pouco são conhecidas, o Brasil ainda é muito atrasado perante outros países e o estado de Santa Catarina é o mais perto do que deveria ser a realidade nos tempos em que vivemos, onde a proteção e o respeito a vida deveriam estar em primeiro lugar.

(28)

2 DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO PROFISSIONAL MÉDICO DIANTE DA VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA E A REPARAÇÃO DOS DANOS

2.1 Responsabilidade Civil: Noções Gerais

Para tratar da questão relativa à responsabilidade civil do profissional médico em face da violência obstétrica, faz-se necessário entender à construção do instituto da responsabilidade civil no direito. Sendo assim, é de suma importância a apresentação de um breve relato conceituando a responsabilidade civil na presente pesquisa.

A responsabilidade surgiu no ordenamento jurídico enquanto uma obrigação de reparar os danos provocados por uma pessoa à outra, ou seja, consequência de atos ilícitos que geram prejuízos a determinadas pessoas.

De acordo com Rui Stoco (2007, p.114)

A noção da responsabilidade pode ser haurida da própria origem da palavra, que vem do latim respondere, responder a alguma coisa, ou seja, a necessidade que existe de responsabilizar alguém pelos seus atos danosos. Essa imposição estabelecida pelo meio social regrado, através dos integrantes da sociedade humana, de impor a todos o dever de responder por seus atos, traduz a própria noção de justiça existente no grupo social estratificado. Revela-se, pois, como algo inarredável da natureza humana.

Também a autora Maria Helena Diniz (2003, p.308) elabora um conceito de responsabilidade, alargando, todavia, a definição de responsável bem como apresentando as modalidades de responsabilidade, subjetiva e objetiva:

A aplicação de medidas que obriguem a reparar o dano moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato ou de coisa de animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva), ou ainda, de simples imposição legal (responsabilidade objetiva). Definição esta que guarda, em sua estrutura, a ideia de culpa quando se cogita da existência de ato ilícito e a do risco, ou seja, da responsabilidade sem culpa.

(29)

Desse modo, é correto afirmar que no campo doutrinário o conceito de responsabilidade civil é muito amplo, e essa matéria vem se desenvolvendo e se aperfeiçoando cada vez mais com o surgimento de novas teses jurídicas, a fim de garantir o devido atendimento às necessidades da sociedade como um todo.

Ainda, o autor Silvio Rodrigues (2003, p. 6) ressalta que:

A responsabilidade civil é a obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que dela dependam.

O autor descreve que não é somente por fato próprio que a responsabilidade civil é imputada e sim também por fato de pessoas ou coisas que dela dependem, ou seja, a responsabilidade civil abrange a todos, pois é um instituto diverso e dinâmico, que muda constantemente, buscando a reparação do dano causado mesmo quando o sujeito agir sem a intenção de causá-lo, tanto que o sujeito assume o risco, assim devendo arcar com as consequências de seus atos.

Destarte, resta claro que a responsabilidade civil pode ser classificada em duas formas, a objetiva e a subjetiva, a primeira caracteriza-se pela objetividade, quando o sujeito responde pelos seus atos independentemente de culpa, e a segunda prescinde da conduta culposa, quando o agente pratica o dano com negligência ou imprudência.

Nesse contexto, estabelece o Código Civil de 2002, o seguinte:

Art.927. Haverá obrigação de reparar o dano, independente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

É evidente que a lei busca a reparação dos danos, para que todos os direitos das pessoas sejam devidamente respeitados, de forma justa, fazendo com que as pessoas que praticam atos danosos paguem pelos seus atos, criando responsabilidade aos indivíduos no sentido de arcar com as consequências de suas práticas.

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Gonçalves, em sua doutrina, traz a classificação tradicional denominando como objetiva a responsabilidade que independe de culpa, ou seja, que pode ou não existir, sendo irrelevante a mesma para a configuração do dever de indenizar. Assim, resta claro que é indispensável a relação de causalidade entre a ação e o dano, uma vez que, mesmo no caso de responsabilidade objetiva, não se pode acusar quem não tenha dado causa ao evento. Deste modo o autor esclarece que, os casos de culpa presumida são considerados hipóteses de responsabilidade subjetiva, pois se fundam ainda na culpa, mesmo que presumida. (GONÇALVES, 2017, p.47).

Desse modo, ao longo do trabalho vamos analisar os quatros elementos essenciais da responsabilidade civil, quais sejam, a conduta humana que é a ação ou omissão que leva a causar o dano em decorrência dos atos do sujeito, o nexo de causalidade, também caracterizado como o vínculo entre o fato ilícito e o dano praticado, a culpa que deverá ser analisada através de duas formas a lato sensu e a

stricto sensu, e por fim o dano que se trata do próprio prejuízo causado em outrem.

2.2 Da conduta humana e o nexo de causalidade

Para que haja responsabilidade civil, é preciso que o ato seja realizado ou pelo próprio agente ou por terceiros, como já demonstrado no tópico anterior. Essa conduta humana que faz gerar a prática do ato danoso a outrem, ou seja, a causadora do dano faz surgir o dever de reparar.

A conduta humana em si, independente de culpa ou dolo, se caracteriza pela necessidade do agente estar consciente do que está praticando. O agente age voluntariamente, o que se chama de capacidade de autodeterminação, tendo autonomia nas suas decisões, levando em conta a sua forma de agir.

O artigo 927, caput, e parágrafo único, do Código Civil brasileiro de 2002 aporta a fundamentação da Responsabilidade Civil:

Art.927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

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Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Assim, para que configure um dever de indenizar (reparar), resultando da responsabilidade civil, é preciso que haja um nexo de causalidade entre o dano sofrido pela vítima e a conduta do agente ou terceiro.

O nexo causal, também chamado de relação causal, é o vínculo que une a conduta do agente ao dano, sendo assim, um dos principais elementos para que se constitua a responsabilidade civil, seja qual for a espécie de responsabilidade civil. Sergio Cavalieri Filho (2012. p. 67) define o nexo causal como “elemento referencial entre a conduta e o resultado. É através dele que poderemos concluir quem foi o causador do dano”.

O autor deixa visível que, entre a conduta e o resultado produzido, o nexo causal é o principal elemento, pois ao analisar o mesmo descobrimos quais condutas positivas ou negativas foram praticadas, dando causa a um resultado. Então para que seja compreendido, provado que alguém de fato cometeu um ato danoso, faz-se necessário essa ligação.

Também nessa perspectiva, Sílvio de Salvo Venosa (2003, p.39) define o nexo de causalidade como:

O conceito de nexo causal, nexo etimológico ou relação de causalidade deriva das leis naturais. É o liame que une a conduta do agente ao dano. É por meio do exame da relação causal que concluímos quem foi o causador do dano. Trata-se de elemento indispensável. A responsabilidade objetiva dispensa a culpa, mas nunca dispensará o nexo causal. Se a vítima, que experimentou um dano, não identificar o nexo causal que leva o ato danoso ao responsável, não há como ser ressarcida.

Desta feita, independentemente da teoria que se adote, objetiva ou subjetiva, caberá ao juiz à análise do caso concreto, estudar as provas e interpretá-las como conjunto e estabelecer claramente se houve violação do direito alheio, cujo resultado

(32)

seja danoso, e se existe um nexo causal entre esse comportamento do agente e o dano verificado (STOCO, 2007, p. 152).

Prevê nosso ordenamento jurídico, no artigo 186 do Código Civil, o seguinte:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Assim, mesmo no tocante às condutas omissivas, quando há um dever de agir do agente e esse deixa de realizar a conduta a que estava obrigado, resta claro que a causa se constitui.

Para um melhor entendimento da conduta omissiva, de exemplificar o caso em que uma enfermeira que, tendo que medicar paciente em coma de hora em hora, permanece dormindo ou inerte, o que acaba de ocasionar a morte deste.

Verifica-se, pois, que por meio do nexo de causalidade, delimita-se a extensão do dano a indenizar em todas as espécies de responsabilidade civil, sendo assim, o nexo causal é indispensável até mesmo na responsabilidade civil por omissão. (CRUZ, 2005, p. 24-25).

2.2.1 Da Culpa

Dentro da responsabilidade civil a culpa é um dos principais pressupostos, nesse sentido, preceitua o artigo 186 do Código Civil de 2002, que a ação ou omissão do agente seja “voluntária” ou que haja, pelo menos, “negligência” ou “imprudência” (GONÇALVES, 2017, p. 372).

O autor deixa evidente que, para uma obrigação de indenizar é preciso que o agente do fato que gerou o dano tenha agido de forma ilícita, violado direitos de outra pessoa, ou desrespeitando uma lei de interesses particulares, assim, para que haja essa obrigação de indenizar é imprescindível que o sujeito tenha agido com culpa, o que remete ao artigo acima referido.

(33)

A culpa assume duas concepções, a lato sensu e a stricto sensu, a primeira que abrange tanto a atuação desastrosa do agente que é procurada, querida, almejada e diz-se, assim, dolosa, como aquela que embora não querida, não procurada, resulta da falta de diligência do agente. A segunda concepção, de outra feita, abarca somente esta última situação e se caracteriza, assim, pelo prejuízo da vítima decorrente de um comportamento negligente, imprudente do agente (GONÇALVES, 2017, p. 373).

Nesse sentido reforça o autor Rizzardo, que o dolo corresponde a “conduta voluntária de um dever legal, onde o agente atua deliberadamente no equilíbrio e ordem natural das coisas, de tal forma que a infração é pretendida e repercute em maior gravidade nas suas consequências” (RIZZARDO, 2009).

Assim, a culpa em sentido amplo, como uma violação de um dever jurídico, atribuído a alguém e em decorrência de fatos intencionais ou mesmo de omissão, negligencia e imperícia, o que caracteriza o dolo violando o dever jurídico, e a culpa em sentido estrito (GONÇALVES, p.373).

Podemos notar que há uma grande diferença entre o dolo e a culpa, é de forma explicita que o dolo é mais grave que a culpa, porque se define como uma infração voluntária, consciente e intencional, com o propósito de causar dano a outrem o que abrange a conduta e o efeito lesivo. A culpa em sentindo estrito refere-se à vontade do agente, ao fato causador da lesão, onde refere-se obrefere-serva que o mesmo não queria o resultado, mas assumiu o risco mesmo assim.

Pelo exposto, é nítido que a culpa e o dolo nascem da conduta voluntária do agente, o que os diferenciam é a intenção do agente, quando o fato ilícito ocorre, mas o causador esperava que fosse ocorrer de outra forma (culpa), e quando a intenção é realmente praticar o ato e obter o resultado, ele age de forma ilícita esperando que o resultado final se concretize (dolo).

(34)

Para a responsabilidade civil é necessário que haja um fator chamado dano, que é o prejuízo causado a outrem, lesando um bem jurídico protegido.

Maria Helena Diniz destaca em sua obra que não pode haver responsabilidade civil sem a existência de um dano a um bem jurídico, “sendo imprescindível a prova real e concreta dessa lesão”. Ou seja, deverá ser comprovado a existência de um dano, seja patrimonial ou moral, para que a indenização pleiteada seja devidamente restituída. (DINIZ, 2004, p.64).

Agostinho Alvim, citado por Gonçalves, define o dano como:

Dano, em sentido amplo, vem a ser a lesão de qualquer bem jurídico, e aí se inclui o dano moral. Mas, em sentido estrito, dano é, para nós, a lesão do patrimônio; e patrimônio é o conjunto das relações jurídicas de uma pessoa, apreciáveis em dinheiro. Aprecia-se o dano tendo em vista a diminuição sofrida no patrimônio. Logo, a matéria do dano prende-se á indenização, de modo que só interessa o estudo do dano indenizável (ALVIM, p. 171-172 apud GONÇALVES, 2017 p. 421).

Nesse contexto, Gonçalves afirma que indenizar a vítima significa reparar o dano sofrido na sua integralidade. Se possível restaurando o status quo ante, que significa devolver a vítima ao estado em que se encontrava antes da ocorrência do ato ilícito. Como, todavia, na maioria dos casos isto não se mostra possível, uma forma de buscar a compensação é o pagamento de uma indenização monetária (GONÇALVES, 2017, p. 422).

Assim, para que haja a responsabilização do agente é necessário que se comprove o dano, podendo ser ele patrimonial ou moral, um ato ilícito que lesou um patrimônio, fazendo com que haja o dever de indenizar e reparar as vítimas.

Dessa forma, para um melhor entendimento, o autor Carlos Roberto Gonçalves (2017, p.422-423) apresenta em sua doutrina, um claro exemplo de dano indenizável:

Embora possa haver responsabilidade sem culpa, não se pode falar em responsabilidade civil ou em dever de indenizar se não houve dano. Ação de indenização sem dano é pretensão sem objeto, ainda

(35)

que haja violação de um dever jurídico e que tenha existido culpa e até mesmo dolo por parte do infrator. Se, por exemplo, o motorista comete várias infrações de trânsito, mas não atropela nenhuma pessoa nem colide com outro veículo, nenhuma indenização será devida,malgrado a ilicitude de sua conduta.

Nessa linha de pensamento, Cavalhieri Filho conceitua o dano moral como a dor, o vexame e a humilhação, algo que foge da normalidade e que interfere diretamente no comportamento psicológico da vítima, o que vem a causar angustia, aflição e desiquilíbrio em seu bem-estar. Nada mais é do que ferir a dignidade humana, ou seja, a agressão e o desrespeito que geram a violência e a prática do ato danoso (CAVALHIERI FILHO, 2008).

Já o dano patrimonial, para Cavalhieri Filho, é caracterizado pelo dano que atinge os bens do patrimônio do indivíduo, um conjunto de relações jurídicas de uma pessoa apreciáveis em um montante. Também, nesse contexto, entra a violação de bens personalíssimos como a reputação, o nome, a saúde, a imagem e a honra que também poderá repercutir no patrimônio da vítima, gerando despesas ou perdas de receitas (CAVALHIERI FILHO, 2008).

Levando-se em consideração esses aspectos, conclui-se que o dano é um elemento essencial para a configuração da responsabilidade civil, onde enseja à reparação deste e consequentemente a indenização a vítima, referente à ofensa moral ou patrimonial, ou seja, independe de sua natureza.

2.3 Da responsabilidade civil do profissional médico obstetra

A responsabilidade civil do profissional médico obstetra e dos médicos em geral, ainda carece de uma regulamentação específica, encontrando-se principalmente amparada na legislação civil e no Código de Defesa do Consumidor. Assim, resta claro que seria necessária uma grande evolução nesse ponto, para melhor assegurar os direitos das pacientes.

Nesse contexto, em relação à responsabilidade médica, Maria Helena Diniz (2003, p. 271) afirma que:

(36)

A responsabilidade do médico é contratual, por haver entre o médico e seu cliente um contrato, que se apresenta como uma obrigação de meio, pôr não comportar o dever de curar o paciente, mas de prestar-lhe cuidados conscienciosos e atentos conforme os progressos da medicina. Todavia, há casos em que se supõe a obrigação de resultado, com sentido de cláusula de incolumidade, nas cirurgias estéticas e nos contratos de acidentes.

Complementada por Delton Croce (2002, p. 3):

Se denomina responsabilidade médica situação jurídica que, de acordo com o Código Civil, gira tanto na orbita contratual como na extracontratual estabelecida entre o facultativo e o cliente, no qual o esculápio assume uma obrigação de meio e não de resultado, compromissando-se a tratar do enfermo com desvelo ardente, atenção e diligência adequadas, a adverti-lo ou esclarecê-lo dos riscos da terapia ou da intervenção cirúrgica propostas e sobre a natureza de certos exames prescritos, pelo que se não conseguir curá-lo ou ele veio a falecer, isso não significa que deixou de cumprir o contrato.

As manifestações dos autores sobre o tema da responsabilidade médica em um âmbito geral, relacionando-a com um contrato, mas também com uma relação extra contrato, demonstra que o médico tem uma obrigação e essa obrigação tem uma carga de dever, de prestar cuidados, com a ajuda da medicina avançada que a cada dia progride nas mais variadas áreas. No entanto, essa evolução deveria ser mais humanizada e não tão somente uma forma de mecanismo.

Assim, os médicos se comprometem a tratar os pacientes com zelo e dedicação, utilizando-se dos melhores recursos, e claro, não se obrigando a curar o paciente. Agindo assim, tais profissionais possivelmente somente serão responsabilizados quando ficar provada atuação culposa, em qualquer de suas modalidades, seja a imprudência, negligência ou imperícia (GONÇALVES, 2017, p. 298-299).

Neste sentido, segundo o Código de Ética Médico (2009):

É vedado ao médico:

Art. 1º. Causar dano ao paciente, por ação ou omissão, caracterizável como imperícia, imprudência ou negligência.

Parágrafo único. A responsabilidade médica é sempre pessoal e não pode ser presumida.

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Art. 2º. Delegar a outros profissionais atos ou atribuições exclusivos da profissão médica.

Art. 3º. Deixar de assumir responsabilidade sobre procedimento médico que indicou ou do qual participou, mesmo quando vários médicos tenham assistido o paciente.

Art. 4º. Deixar de assumir a responsabilidade de qualquer ato profissional que tenha praticado ou indicado, ainda que solicitado ou consentido pelo paciente ou por seu representante legal.

Como vimos anteriormente, a responsabilidade civil pode ser objetiva e subjetiva, sendo que o profissional médico se enquadra geralmente na segunda, a qual é chamada por alguns doutrinadores de obrigação de meio entre o médico e o paciente, já na forma objetiva se adota a chamada obrigação de resultado.

Para melhor esclarecimento, Gagliano e Pamplona Filho (2009, p. 206) elucidam a distinção entre obrigação de meio e de resultado. A primeira é descrita como:

A obrigação de meio é aquela em que o devedor se obriga a empreender sua atividade, sem garantir, todavia, o resultado esperado.

[...] As obrigações do médico, em geral, assim como as do advogado, são fundamentalmente, de meio, uma vez que esses profissionais, a despeito de deverem atuar segundo as mais adequadas regras técnicas e cientificas disponíveis naquele momento, não podem garantir o resultado de sua atuação (a cura dos pacientes, êxito no processo).

Já na obrigação de resultado os autores deixam claro uma grande distinção, pois nesse momento é possível perceber que esse profissional se obriga a produzir o resultado, vejamos:

Já na obrigação de resultado, o devedor se obriga não apenas a empreender a sua atividade, mas principalmente, a produzir o resultado esperado pelo credor.

É o que ocorre na obrigação decorrente de um contrato de transporte, em que o devedor se obriga a levar o passageiro, com segurança, até o seu destino. Se não cumprir a obrigação, ressalvadas hipóteses de quebra do nexo causal por eventos fortuitos (um terremoto), será considerado inadimplente, devendo indenizar o outro contratante. (Ibidem, 206).

O que liga essas duas responsabilidades é a obrigação de empreender a sua atividade, ou seja, saber ministrar essa atividade, como profissional, com seus

(38)

deveres para obter o melhor resultado a saúde dos pacientes, independentemente das circunstancias que se apresentam.

Assim, o médico responderá somente quando seu agir se der de forma imprudente, negligente ou imperita.

O médico, quando atua como profissional liberal sem vínculo, presta serviço por ato próprio, sendo autônomo, sem subordinação, dessa forma a responsabilidade civil desse profissional será subjetiva, apurada mediante a culpa e não objetiva que independe de culpa.

No nosso Código do Consumidor está presente no artigo 14, § 4 º, que:

Art.14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§ 4º A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.

Desta maneira, está previsto que a responsabilidade do profissional liberal, ou seja, a responsabilidade do médico como autônomo e fornecedor de serviços, é aplicada dentro das regras da responsabilidade civil subjetiva. Contudo, cumpre salientar que, mesmo o médico como profissional liberal, não deixará de responder por seus atos e os danos caudados às vítimas.

Nesse sentido, podemos afirmar que, a relação do médico como fornecedor de serviços gera uma relação de consumo com o paciente, pois esse ao fornecer os seus serviços particulares ao público, recebe uma prestação pecuniária pelo seu trabalho prestado.

O Código de Defesa do Consumidor diferencia o fornecedor do consumidor e resguarda os direitos básicos provenientes de uma relação consumerista.

Art. 3°. Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou

privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes

(39)

montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial. § 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista

Art. 6º. São direitos básicos do consumidor:

I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos.

Também, é de suma importância ressaltar que é responsabilidade do médico prestar informação ao paciente sobre a necessidade de tratamentos, possíveis riscos e efeitos da medicação prescrita, intervenções, bem como, consequências que poderão advir durante alguns procedimentos. Esse dever de informar é um dos principais pré-requisitos para o consentimento do paciente, sendo vedado ao profissional, conforme o Código de Ética Médico (2009):

Art. 34. Deixar de informar ao paciente o diagnóstico, o prognóstico, os riscos e os objetivos do tratamento, salvo quando a comunicação direta possa lhe provocar dano, devendo, nesse caso, fazer a comunicação a seu representante legal.

Assim, resta comprovado que é direito dos pacientes ter acesso à informação que lhe é devida acerca dos tratamentos necessários e seus possíveis riscos, salvo quando a comunicação possa provocar algum dano a estes, como descrito na regulamentação acima referida, o que poderá ser comunicado ao seu representante legal.

O artigo 5º da Constituição Federal, no seu inciso II expressa que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”, ou seja, sem o consentimento do paciente o médico não poderá realizar intervenções de risco, tendo em vista que é uma garantia fundamental resguardada na carta magna.

No que diz respeito ao erro médico, podemos analisar algumas situações para uma melhor compreensão no presente estudo, o erro profissional, o erro de diagnóstico e a “iatrogenia”.

(40)

Para Gonçalves, não se tem considerado como culpável o erro profissional que advém da incerteza da arte médica, mas que ainda é objeto de controvérsias científicas. Também, nas palavras de Gonçalves:

[...] não acarreta a responsabilidade civil do médico a “iatrogenia”, expressão usada para indicar o dano que é causado pelo médico, ou seja, o prejuízo provocado por ato médico em pessoas sadias ou doentes, cujos transtornos são imprevisíveis e inesperados. Aproxima-se de uma simples imperfeição de conhecimentos científicos, escudada na chamada falibilidade médica, sendo por isso escusável”. (GONÇALVES, 2017, p.304).

Outrossim, o erro de diagnóstico, caracterizado como o erro na determinação da doença do paciente e de suas causas, só não vai gerar uma responsabilidade quando não provocar danos ao paciente, em face do estado atual da ciência médica. (GONÇALVES, 2017, p.305).

Demonstrado essas situações, resta claro a diferença de quando o profissional erra e de quando este se mostra imperito, negligente ou imprudente, causando danos irreparáveis aos pacientes, por falta de cuidados e não observância dos seus deveres e obrigações frente às vidas que estão sob seus cuidados.

Nesse caso, o profissional não se exime da responsabilidade civil, pois demonstrado os fatores que violam os direitos dos pacientes, este deverá arcar com as consequências, reparando os danos causados e cumprindo com as obrigações previstas na nossa legislação.

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