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Breve Comentário bibliográfico para auxiliar o estudo de Freud:

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Academic year: 2021

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Breve Comentário bibliográfico para auxiliar o estudo de Freud:

I - Sobre os problemas encontrados na tradução da edição brasileira Standard das Obras Completas de Freud, pela Imago:

O primeiro passo, crucial para ler os textos de Freud, é o leitor ter consciência dos problemas de tradução encontrados na versão brasileira Standard das Obras Completas de Freud, da Imago (ESB).

A ESB brasileira contém dois problemas:

1 – reproduz, de modo acrítico, a mesma orientação editorial da matriz inglesa. A linha editorial da tradução Standard das Obras Completas de Freud, por James Strachey, corresponde a uma opção atinente à política científica de difusão da Psicanálise da década de 50 levada a cabo por Ernst Jones, primeiro biógrafo oficial de Freud, e avalizada pelo próprio. Seu maior objetivo era o de introduzir a Psicanálise no meio médico, sobretudo o americano, aproximando-a tanto quanto possível a um ramo da medicina. Em razão disso, esta linha editorial encontra-se desatualizada. No entanto, é bom ressaltar que James Strachey foi considerado um bom tradutor do alemão para o inglês, e participava do "Bloomsberry group", o grupo londrino de literatura ligado à Virgínia Woolf. O que teria atrapalhado a tradução seria a política científica, pouco consetânea ao objeto psicanalítico e ao estilo de Freud. Para tal, Strachey teria acatado as sugestões terminológicas de Jones, que modificaram o sentido original alemão de vários conceitos freudianos. Para

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verificar este tópico, pode-se consultar o “Dicionário comentado do alemão de Freud”, por L.A. Hanns (ver este na indicação bibliográfica).

2 – A tradução brasileira tem o agravante de ser uma tradução da tradução. Ou seja, do alemão para o inglês e do inglês para o português. E, ainda assim, a tradução do inglês para o português é reputada como sendo de qualidade inferior. Os maiores problemas concentram-se sobretudo nos volumes da década de 70. Os volumes de anos posteriores, revistos por Vera Ribeiro, estão em melhor condição. Em que pese esses dois problemas, cumpre ressaltar que a edição da Imago das Obras Completas contém notas introdutórias a cada texto de Freud, cuidadosamente elaboradas pelo editor inglês, James Strachey, e que só encontram-se disponíveis nas publicações da Imago, detentora dos direitos autorais. Essas notas, conhecidas como de excelente qualidade, são imprescindíveis para auxiliar a leitura de qualquer texto de Freud.

Para apreciar com o devido valor os problemas da tradução inglesa, recomenda-se ler o comovente testemunho a esse respeito do célebre analista austríaco radicado nos EUA, Bruno Betelheim, que consta no extraordinário livro "Freud e a alma humana" (Ed. Artes Médicas). Bruno, já falecido, era 50 anos mais novo que Freud e teve de exilar-se nos EUA, fugindo do nazismo na Áustria. Ministrou cursos de Freud usando a tradução em inglês, e, como conhecia bem o original alemão, demonstra em seu depoimento a

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diferença do texto nas duas línguas: um frio e abstrato (o inglês) e o outro, coloquial e amistoso, em alemão.

Dispomos de um excelente artigo de Marilene Carone, (publicado no Jornal de Psicanálise, vol. 37, 2004, n.68), intitulado “Freud em português: tradução e tradição”, que avaliza o argumento de Bruno e ainda o situa na versão brasileira das Obras Completas. Marilene, lamentavelmente, veio a falecer antes de iniciar o projeto editorial, da mesma Imago, da versão do original alemão para o português.

Em razão desta problemática, a Imago, na década de 90, encarregou Luiz Alberto Hanns de produzir três pequenos volumes de uma coleção intitulada “Obras psicológicas de Sigmund Freud”, de importantes textos traduzidos diretamente do original alemão. Infelizmente, este projeto de excelente qualidade, por ora permanece sem continuidade.

Essas duas versões de Freud, as Obras Completas e a de Hanns, eram as únicas que dispunhámos no Brasil até 2010. Como a realidade do mercado editorial mudou, em razão da entrada dos direitos autorais de Freud em domínio público, é importante atentar para as novas traduções que estão saindo, feitas a partir do texto original alemão.

Contamos agora com novo projeto editorial para as Obras Completas de Freud, encabeçado pela Companhia das Letras, sob a responsabilidade do germanista e tradutor de Nietzsche Paulo César Souza. Paulo César procura respeitar o argumento de Bruno, ou seja, ser fiel ao tom coloquial, que aproxima a versão do leitor leigo, como desejava Freud. Esta versão da Companhia das Letras já conta com seis volumes da coleção alemã (10, 12,

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14, 15, 16, 18), traduzidos com esmero e qualidade, e que propiciam uma leitura fluida, como deverá ter sido a experiência do leitor de Freud quando da publicação de suas obras. Os demais volumes devem sair em até cinco anos, no frequência de aproximadamente um por ano. Somente ficamos sem as notas de Strachey, nesta versão, pois seus direitos autorais ainda estão sob domínio da Editora Imago. Quem quiser adquirir esta versão não deve deixar de consultar as notas introdutórias de Strachey, que “abrem” cada texto de Freud na versão da Imago.

Dispomos também de excelentes traduções direto do original alemão, do mesmo Paulo César Souza, de alguns textos utilizados na formação na SBPSP, publicados no Jornal de Psicanálise, providenciadas com anuência da Imago, por iniciativa do editor daquele período, Luis Carlos Menezes. Utilizá-los quando for o caso (consultas: biblioteca@sbpsp.org.br).

Em língua espanhola, temos uma tradução de boa qualidade da Standard, efetuada pela "Amorrortu Ed.", direto do original alemão, que contém os indispensáveis comentários iniciais de James Strachey e que usa a mesma divisão de volumes da nossa Obras Completas.

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II- Ferramentas de leitura:

Observar os ítens abaixo é de interesse para fazer uma boa leitura de qualquer texto de Freud, pois situam o leitor em relação ao conjunto de sua obra, aos problemas contidos no texto e a sua importância teórico clínica.

Portanto, antes de qualquer leitura, consultar:

a ⎯ As notas do editor inglês James Strachey – indispensáveis, nunca podem faltar. b ⎯ O período correspondente na biografia de Freud do texto que será lido (Gay, Jones ou Mannoni, indicados mais abaixo), pois auxilia enormemente a compreensão de problemas chave.

Já para a elucidação de problemas conceituais e de tradução mais complexos, consultar:

c ⎯ “Vocabulário...” e “Dicionário...” (indicados mais abaixo) para problemas conceituais mais áridos;

d ⎯ O comentador que melhor aborda o tema em questão, para aumentar o nível da compreensão, particularmente em textos muito difíceis (por ex: “Sobre narcisismo: uma introdução”). São indicados a cada vez, ao longo dos estudos.

III - Sugestão de alguns comentadores que contribuem para esclarecer o pensamento de Freud:

(obs: para a bibliografia que segue há uma indicação breve sobre o teor da mesma,

ou seja, sobre sua tônica).

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⎯ Strachey, J. ⎯ Notas do editor contidas na Edição Standard Brasileira (ESB) das Obras Completas de Freud.

Estas admiráveis notas introduzem cada texto de Freud nas Obras Completas. É um trabalho de muita qualidade, pois situa o leitor no momento da obra em que o texto foi escrito, descrevendo a evolução dos conceitos, problemas do texto, etc. É indispensável sua leitura antes de começar a ler qualquer texto de Freud.

Garcia-Roza, L. A. : — Introdução à metapsicologia freudiana, 3 vols., RJ, Jorge Zahar, 1991-95.

Autor claro e didático, com boa formação filosófica. Seus comentários percorrem a obra freudiana, desde o "As afasias" de 1891, até os artigos metapsicológicos de 1915, com oportunos esclarecimentos. Apesar da influência francesa, ele não se considera lacaniano, embora costure seu comentário a partir do vértice da linguagem.

- Monzani, L. R. — Freud, o movimento de um pensamento, Campinas, Unicamp, 1989.

Belo comentário da obra de Freud, que conclui com as imagens: “a espiral e o pêndulo”. Ambas as imagens, do modo como são associadas em seu acurado trabalho de reflexão, facultam a compreensão dos problemas das idas e vindas no evoluir do pensamento freudiano, as “famigeradas” viradas de Freud.

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Boa biografia, indispensável para começar, com elementos fundamentais de história e da sociedade vienense ao tempo de Freud. Ele é austríaco e historiador, além de analista.

⎯ Hans, L. A. ⎯ Dicionário comentado do alemão de Freud, Imago Ed.: Rio de Janeiro, 1996.

Bom para resolver impasses da tradução brasileira, que contém muitos problemas. É muito sugestivo e esclarecedor ver como ele compara as conotações dos termos em alemão e português. Facilita muito a compreensão do texto.

⎯ Herrmann, F.A. — O que é Psicanálise, HePsichê: São Paulo, 1999.

Bom para situar a importância da questão do método em Psicanálise, do modo como Herrmann o escava do conjunto da obra freudiana. (Solicitá-lo à Bernardete – CETEC, pelo tel:11-30888123, pois está esgotado);

-- Laplanche, J. e Pontalis, J.-B.: — Vocabulário de Psicanálise, SP, Martins Fontes. Indispensável para resolver as questões conceituais mais complexas, já que faz um cuidadoso rastreamento do conceito, revigorando-o a partir de suas fontes. Tem uma parecença com o trabalho que realizou Strachey nas suas notas introdutórias.

Mannoni, O. — Freud: uma biografia ilustrada, RJ, Jorge Zahar, 1994. Uma boa biografia, sintética, de "acento francês", ou seja, usa como eixo a relação entre o desejo e a obra do autor. Excelente trabalho de síntese, é precisa conceitualmente, agradável de ler, mais curta que as tradicionais. No caso do leitor ter pressa ou precisar recordar rapidamente de algum período específico da vida de Freud.

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Mezan, R.: — Freud, pensador da cultura, SP, Brasiliense, 1985.

Um trabalho de fôlego sobre o campo onde se assentam as relações de Freud com a cultura de seu tempo, e como repercutiram na produção conceitual. Para os mais afeitos ao pensamento filosófico e cultural.

... — Freud: a trama dos conceitos, SP, Ed. Perspectiva, 1987. Cuidadoso trabalho que esclarece a evolução e a inter-relação dos conceitos de Freud, rastreando sua trama.

Horstein, L. Introdução á psicanálise, São Paulo: Ed. Escuta, 1991.

Na IIª Parte, esclarece particularmente a questão do narcisismo, principalmente no que diz respeito à confusão entre o eu ideal e os ideais do eu. Comentário muito acertado do ponto de vista clínico.

(Obs: Freud possui uma imensa fortuna crítica. Apenas elenquei os textos mais clássicos que auxiliaram muito durante a minha formação. Outras sugestões são bem-vindas).

IV - Sugestões de textos de Freud (Obras Completas, ESB, Imago ed.), apenas para quem está começando seus estudos:

(Obs: para a bibliografia que segue há uma indicação breve sobre o teor da mesma) .

⎯ Charcot, 1893, vol. 3 (breve comentário sobre seu período seminal com Charcot, muito apropriado para pensar nas dificuldades de transmissão da Psicanálise, no obituário que Freud fez do mesmo);

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⎯ Dois verbetes de enciclopédia: "Psicanálise" e "teoria da libido", vol 18 (escritos por Freud para a enciclopédia britânica, excelente exemplo de concisão ao definir a psicanálise);

⎯ Cinco lições de psicanálise, 1909, vol 11 (as clássicas conferências proferidas por Freud na Clarck University, bom para começar);

⎯ Conferências introdutórias sobre psicanálise— Introdução, 1917, vol. 15 (continuação das conferências na Clark U., agora por escrito);

⎯ Novas conferências introdutórias sobre psicanálise, 1933, vol. 22 (atualização das conferências, após os conceitos de narcisismo, pulsão de morte e 2a. tópica);

⎯ Um estudo autobiográfico, 1925, vol. 20 (boa autobiografia de Freud; de quebra, é uma boa indicação para memoriais);

⎯ História do movimento psicanalítico, 1914, vol. 14 (um bom histórico das cisões e posições de Freud na época, situa bem o leitor nas controvérsias, sobretudo a com Jung);

Cecilia Orsini,

São Paulo, agosto de 2011.

Referências

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