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2 - Saneamento. Nada obsta a que se profira decisão de mérito, conhecendo do recurso interposto.

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Cópia da sentença proferida pelo 9.° Juízo Cível da Comarca de Lisboa no processo de registo de mar- ca nacional n.° 311 838.

1 - Relatório

A Sociedade Quinta do Portal, S. A., com sede na Rua de Guilhermina Suggia, 200, 9.°, Porto, interpôs, nos ter- mos dos artigos 38.° e seguintes do Código da Proprieda- de Industrial, recurso do despacho do director do Serviço de Marcas do Instituto Nacional da Propriedade Industrial de 2 de Janeiro de 1997 que recusou a protecção à marca n.° 311 838, Quinta do Portal, considerando existir - pela semelhança gráfica e fonética e se reportar ao mesmo tipo de produto - possibilidade de confusão com a marca n.° 168 476, Quinta do Porto, e ainda que podia favorecer actos de concorrência desleal.

Alega, em suma, a Sociedade Quinta do Portal, que é titular de uma propriedade com essa .denominação, que «Porto» e «Portal» são substantivos distintos, que nem sequer derivam um do outro, que não existe semelhança fonética capaz de induzir em erro, sendo certo que o vo- cábulo «Porto» pode ser utilizado em todos os «vinhos do Porto», não pertencendo, como tal, a ninguém em exclu- sivo. Mais acrescenta que, em termos de semelhança grá- fica, não pode o Instituto Nacional da Propriedade Indus- trial pronunciar-se, uma vez que não conhece o grafismo nem o rótulo da «Quinta do Portal», estando aqui em causa apenas a marca nominativa.

Comunicada a petição da recorrente à entidade que pro- feriu o despacho, nos termos do artigo 40.°, n.° 1, do Có- digo da Propriedade Industrial (fls. 21 a 23), veio esta referir (fl. 25) que considera as alegações da Sociedade Quinta do Portal «doutas e convincentes», acrescentando que lhe parece que as marcas em causa são diferentes, mas que, sendo difícil evitar alguma subjectividade no julga- mento, há entre elas grandes semelhanças.

Notificada a beneficiária da posição expressa no despa- cho recorrido (A. A. Ferreira, S. A.), nos termos do arti- go 41.°, n.° 3, do Código da Propriedade Industrial (fl. 27), por ela foi apresentada contestação (fls. 33 a 49), na qual refere que não assiste razão à recorrente, uma vez que ser proprietária de uma quinta com um determinado nome não lhe dá o direito ao registo dessa designação toponímica como marca, sendo certo que a imitação gráfica e fonéti- ca de «Portal» e «Porto» é evidente, só não se lhe poden- do chamar de reprodução. Mais acrescenta que a circuns-

tância de ambas as palavras terem significados distintos não afasta a possibilidade de imitação.

Conclui a contestante que o despacho recorrido deve ser mantido.

Face ao preceituado pelo artigo 41.°, n.° 4, do Código da Propriedade Industrial, é este o momento de passar a pro- ferir decisão judicial.

2 - Saneamento O tribunal é competente.

O processo é o próprio e não enferma de nulidades que o invalidem na totalidade.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, assim como legitimidade e estão devidamente representa- das.

Nada obsta a que se profira decisão de mérito, conhe- cendo do recurso interposto.

3 - Questões a decidir

A questão fundamental a decidir neste processo é a de saber se as marcas Quinta do Portal e Quinta do Porto, enquanto aplicáveis a vinho do Porto, são ou não suscep- tíveis de provocar no consumidor erro ou confusão, cons- tituindo a primeira imitação da segunda.

4 - Fundamentos 4.1 - Os factos

4.1.1 - A A. A. Ferreira, S. A., tem a seu favor, desde Julho de 1979, o registo de marca n.° 168 476, Quinta do Porto, para vinho do Porto (documento a fl. 1 do processo apenso).

4.1.2 - Por despacho do Instituto Nacional da Proprie- dade Industrial, publicado a 30 de Abril de 1997 no Bole- tim da Propriedade Industrial, n.° 1/97, foi recusada à aqui recorrente protecção à marca nacional n.° 311 838, Quinta do Portal, para vinho do Porto (fl. 1 do processo apenso). 4.1.3-A Sociedade Quinta do Portal, S. A., é pro- prietária da quinta com o mesmo nome.

4.2 - O direito

Para apreciação da matéria dos presentes autos somos remetidos para uma das mais prementes questões ligadas à propriedade industrial: a imitação das marcas.

A marca é um sinal demarcador e distintivo de produ- tos e ou serviços destinado a identificá-los perante os con- sumidores, «distinguindo-os dos demais seus congéneres. Esta função identificadora e distintiva é extremamente importante, pois é através dela que a marca favorece e protege a empresa no jogo da concorrência. A identifica- ção dos produtos através da marca permite, de forma efi- caz, referenciar os produtos por um índice da qualidade e prestígio e, por isso, ela é um factor de publicidade indis- pensável: retendo na memória a marca dos produtos ou serviços, o consumidor irá ter propensão para preferi-los aos da mesma espécie, desde que tenha ficado satisfeito com eles, ou por ter a marca com referência de renome difundido ou de qualidade consagrada» (Miguel Pupo Correia, Direito Comercial, 4.ª ed., revista e aumentada, Universidade Lusíada, Lisboa, 1996, p. 243).

À marca têm sido pela doutrina atribuídas variadíssimas funções («individualização de bens ou serviços e sua di-

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ferenciação de outros da mesma espécie; indicação de procedência ou proveniência dos bens ou serviços; garan- tia ou indicação de qualidade; fixação de clientela; instru- mento publicitário», Pedro Sousa e Silva, Direito Comu- nitário e Propriedade Industrial, Universidade de Coimbra, Coimbra Editora, 1996, pp. 48-49), mas que podem resu- mir-se, na prática, a três: função distintiva, de sugestão (angariar clientela) e de garantia (na lição de Oliveira Ascensão, Direito Comercial - Direito Industrial, II, Lis- boa, 1988, pp. 141-142).

«A protecção dispensada ao titular de uma marca desti- na-se, pois, a assegurar-lhe o exclusivo de uso de um si- nal que lhe permita distinguir os seus produtos ou servi- ços dos seus concorrentes, por forma a proporcionar ao consumidor uma indicação sobre a proveniência dos mes- mos que o orientará em escolhas futuras» (Pedro Sousa e Silva, ob. cit., p. 55; artigo 167.° do Código da Proprieda- de Industrial actual, Decreto-Lei n.° 16/95, de 24 de Ja- neiro, e artigo 74.° do Código da Propriedade Industrial anterior, aprovado pelo Decreto n.° 30 679, de 24 de Agos- to de 1940). Ou seja, estão aqui presentes dois interesses: «o do empresário, em delimitar a sua posição no mercado frente a outros competidores; e o do consumidor, em não se ver confundido sobre a origem empresarial da presta- ção adquirida» (Pedro Portellano Diez, La Imitación en el Derecho de la Competencia Desleal, Civitas, Madrid,

1995, p. 264).

É nisto que se traduz, ao fim e ao cabo, o princípio da novidade e da especialidade da marca (sem o qual ela deixaria de «desempenhar a sua finalidade distintiva para se transformar em elemento de confusão» (Ferrer Correia, Lições de Direito Comercial, l, 1973, p. 345; Oliveira Ascensão, Direito Comercial - Direito Industrial, II, 1988, pp. 153 a 157), que está claramente consagrado na legis- lação portuguesa.

Sobre a diferenciação que se espera de uma marca como indicador de procedência empresarial, como exigência de notoriedade e de falta de generalização, bem como dos seus limites (idoneidade e razoabilidade) (v. Portellano Diez, ob. cit., pp. 469 a 475 e 491 a 496).

Para exercerem estas funções, as marcas podem assu- mir um aspecto meramente nominativo (integrando «um sinal ou conjunto de sinais nominativos, estando essen- cialmente em causa um determinado fonema» (Carlos Olavo, Propriedade Industrial, Almedina, 1997, p. 38), ou figurativas (integrando «uma dada figura ou emblema, en- contrando-se fundamentalmente em jogo um desenho» (ob. cit. e loc. cit.), assumindo um «carácter plástico», uma «apresentação visual própria», expressões de Oliveira As- censão, Direito Comercial - Direito Industrial, III, Lisboa, 1988, p. 143) ou mistas (que «integram simultaneamente elementos nominativos e figurativos» (Carlos Olavo, ob. cit. e loc. cit.).

Assim, dispõe o artigo 165.°, n.° 1, do Código da Pro- priedade Industrial que a marca «pode ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais susceptíveis de representa- ção gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, a forma do pro- duto ou da embalagem, que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas» (por sinal, mais claro que o anterior artigo 79.° do Código da Propriedade Industrial de 1940, que dispu- nha que a marca «pode ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais nominativos, figurativos ou emblemá- ticos, que, aplicados por qualquer forma num produto ou

no seu invólucro, o façam distinguir de outros idênticos ou semelhantes»).

Vigora aqui o «princípio da liberdade», podendo a mar- ca ser composta com as «expressões nominativas, de lin- guagem comum ou de fantasia, ou a desenhos ou à com- binação desses elementos» (Carlos Olavo, Propriedade Industrial, Almedina, 1997, p. 43), não sendo, portanto, necessário que a marca seja constituída por vocábulo(s) inédito(s), «podendo ser constituída por uma palavra de linguagem corrente, conquanto esta última tenha, no que toca aos produtos a que se destina, eficácia distintiva» (Carlos Olavo, «Propriedade industrial - Noções funda- mentais - Marca», Colectânea de Jurisprudência, 1987, t. 2, p. 24).

Assim, a eficácia da marca como sinal distintivo impli- ca que não exista outra igual e que se impeçam imitações ou usurpações.

Ora, para evitar que uma marca registada se considere «imitada ou usurpada no todo ou em parte por outra» é necessário que, cumulativamente:

a) Aquela beneficie de prioridade registral; b) Que sejam ambas destinadas a assinalar produ-

tos ou serviços idênticos ou de afinidade mani- festa;

c) Que tenham tal semelhança gráfica, figurativa ou fonética, que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda, a segun- da, um risco de associação com a primeira, de forma que o consumidor não possa distinguir as duas senão depois de exame atento ou confronto [artigos 193.°, n.° 1, alíneas a), b) e c), 165.° e 189.°, n.° 1, alínea m), do Código da Propriedade Industrial].

O objectivo destas normas é, pois, o de evitar que no mercado surjam e existam marcas que, pela sua seme- lhança, se possam confundir e confundir os consumidores. Quanto às duas primeiras alíneas, não se levantam, em concreto, quaisquer dúvidas:

O registo da A. A. Ferreira, S. A., é anterior ao re- gisto recusado, e de que se recorre, beneficiando de prioridade registral (artigos 165.° a 171.° e 181.° a 195.° do Código da Propriedade Industrial); E os produtos a que respeitam as marcas são seme-

lhantes: vinho do Porto (n.os 4.1.1 e 4.1.2). Nesta base, e para existir imitação como pretende a re- querente (e aqui entramos a fundo na análise da terceira alínea), exige-se que:

1) Exista uma semelhança gráfica, figurativa ou fo- nética com outra marca já registada (de tal for- ma que a distinção entre elas só possa ser fei- ta - como se disse - depois de realizado um exame atento ou confronto);

2) As marcas tenham como objecto o mesmo tipo de produtos ou produtos semelhantes (que haja identidade/afinidade de produtos, e já se viu que sim);

3) O consumidor seja facilmente induzido em erro ou possa confundir as marcas em causa.

Estão em causa, assim, critérios e elementos de índole objectiva (semelhanças gráfica, figurativa ou fonética e afinidade dos produtos) e subjectiva (susceptibilidade de erro ou confusão).

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Em face deste tipo de factores a considerar, o juízo de confundibilidade entre duas marcas não pode ser formu- lado em abstracto, mas sim verificado em concreto.

Começa por assinalar-se que a experiência ensina «que o risco de confusão entre duas marcas é tanto maior quanto maior for a afinidade dos respectivos produtos, o que sig- nifica que duas marcas, que seriam confundíveis se fos- sem usadas para os mesmos produtos, podem ser incon- fundíveis quando usadas para produtos (apenas) afins» [Nogueira Serens, A «Vulgarização» da Marca na Direc- tiva n.° 89/104/CEE, de 21 de Dezembro de 1988 (i. e., no nosso direito futuro), Coimbra, 1995, p. 10].

Daqui resulta que tenha de se concluir que as marcas não podem ser tratadas todas de forma igual, porque nem todas têm as mesmas características (não se desrespeitan- do assim o princípio da igualdade, pois este permite o tratamento desigual de situações desiguais): «há muito que se entende que as marcas não são todas iguais - umas são (mais) fortes outras são (mais) fracas -, exactamente porque não apresentam todas a mesma capacidade de individua(liza)ção, a qual, se pode estar ligada ao carác- ter intrínseco da marca, é, em última instância, reflexo do uso e ou da publicidade de que essa marca é objecto; na verdade, uma marca conceptualmente forte (marca de fan- tasia ou marca arbitrária) pode apresentar-se comercial- mente fraca, exactamente porque, sendo pouco usada e escassamente publicitada, é pouco conhecida no tráfico; ao invés, uma marca conceptualmente fraca (marca sugesti- va) pode tornar-se comercialmente forte porque muito conhecida no tráfico, em consequência de largo uso e ou abundante publicidade» (Nogueira Serens, ob. cit. e loc. cit.; com referência à importância da publicidade, v. Portellano Diez, ob. cit., pp. 542-562).

Distinguindo marca de nomeada («marca renombrada») de marca notória, considerando que aquela tem um âm- bito mais extenso (por se reportar a todo o tráfico comer- cial e não apenas ao círculo económico interessado; pela exigência de ser percebida como um símbolo de qualida- de - goodwill), e toda a matéria envolvente, v. Portellano Diez, ob. cit., pp. 303 a 330, 330 a 345 e 542 a 579 (don- de se permite concluir que o primeiro conceito terá maior relevância no caso de utilização de uma marca que con- fundiria os consumidores com produtos que nem sequer são afins). Sobre o mesmo assunto e procurando encon- trar o conceito de marcas de «reputação excepcional», na mesma linha e com interesse, já em 1954 se tinha pro- nunciado José Gabriel Pinto Coelho (in «O problema da protecção da marca quando usada por terceiro para pro- dutos não identificados nem similares», Boletim da Facul-' dade de Direito da Universidade de Coimbra, xxx, 1955, pp. 1 a 31 ).

Referindo-se a «sinais distintivos 'fortes' (por exemplo, expressões de fantasia totalmente inéditas)» e «sinais 'fra- cos' (é o caso das expressões que sugerem objectos co- muns ou qualidades dos pródutos)», v. também Carlos Olavo, in Propriedade Industrial, Almedina, 1997, p. 47. Deste modo, «se alguém escolhe um sinal distintivo dotado de fraca eficácia distintiva ou que apresente dife- renças diminutas relativamente a sinais preexistentes, a protecção de que goza será, muito justificadamente, redu- zida» (Carlos Olavo, Propriedade Industrial, Almedina, cit., p. 55).

Assim, «no conflito entre duas marcas, se a pri- meira(mente registada) for uma marca forte (por causa da sua peculiaridade e ou notoriedade no tráfico), enten- de-se - entendimento que, diga-se, é comum à generali-

dade da doutrina norte-americana, italiana, francesa e ale- mã (cf., respectivamente, McCarthy, ob. cit. [Trademarks and Unfair Competition, 1, 3.ª ed., New York, 1992], § 11.24, Di Cataldo, ob. cit. [I Segni Distintivi, 2.a ed., Milano, 1993], p. 75, Chavanne e Burst, Droit de la Proprieté Industrielle, 4.ª ed., Paris, 1993, p. 525, e Baumbach/Hefermhel, ob. cit. [Warenzeichenrecht, 12.ª ed., München, 1985], § 31 WZG, notas 15 e seguintes) - que, para evitar riscos de confusão entre ambas, a segunda há- -de apresentar um grau de dissemelhança, maior que aque- le que seria exigido se a marca anterior fosse fraca» (No- gueira Serens, ob. cit., p. 10).

Sublinhe-se que o recurso a estes conceitos vem já sen- do feito na jurisprudência portuguesa, como ocorreu na sentença do 16.° Juízo da Comarca de Lisboa de 5 de Março de 1981 (Boletim da Propriedade Industrial, n.° 10/ 81, pp. 1980 e segs., citado in Nogueira Serens, ob. cit., p. 21)-onde a propósito de um litígio entre as marcas Marlboro (cigarros) e Marlboro-Scotch Whisky (bebidas), se concluiu que o maior renome da primeira «não deixará de induzir em erro e confusão o consumidor médio, le- vando-o a supor erradamente que as bebidas Marlboro têm a mesma origem dos cigarros Marlboro» -, no Acórdão da Relação de Lisboa de 3 de Julho de 1990 (Sousa Inês, Colectânea de Jurisprudência, n.° 4, p. 119), onde se le- vou em consideração o «nome afamado» e o renome da Coca-Cola, para concluir que «o público consumidor é induzido em erro, é levado a acreditar que» o outro pro- duto «é fabricado pela Coca-Cola, provém desta, oferece o mesmo nível de qualidade, credibilidade, garantia, que se habituou a atribuir aos produtos da Coca-Cola», e ain- da no processo n.° 683/96, deste Juízo e na 1.ª Secção (por nós decidido) - em que estavam em causa a marca Adidas e a J'Hayber, tendo sido relevado o «inegável renome e projecção internacional» da primeira (sendo que, apesar disso, se considerou inexistir possibilidade de confusão das marcas).

Em todo o caso, e neste ponto, importa fazer uma re- serva, definidora de uma fronteira limitativa, a esta forma de abordagem da matéria em causa: objectivamente, a existência de produtos tão distintos - «merceologicamente distantes», para usar a expressão de Nogueira Serens - «que o público não po(ssa)de razoavelmente supor que eles provêm da mesma empresa ou de empresas ligadas, por mais célebre que seja a marca que eles ostentem» - açú- car e ar condicionado, por' exemplo, não podem merecer a mesma protecção (v. ob. cit., pp. 23 a 27).

Como quer que seja, in concretu, nenhuma das marcas em confronto tem características de marca notória ou de especial renome ou prestígio, podendo considerar-se como marcas conceptualmente fracas, o que implica que o grau de dissemelhança entre elas não é afectado por factores como o acabado de analisar.

Por outro lado e no que respeita aos elementos subjec- tivos, há que dar como assente que «é o juízo do consu- midor que é decisivo para se concluir ou não pela confun- dibilidade das marcas» (António Vilar, Revista de Estudos da Propriedade Industrial, n.° 1, Janeiro de 1997, Alme- dina, p. 107), sublinhando-se que o relevante será não propriamente a confusão, mas sim o perigo de confundi- bilidade, configurada esta como um perigo abstracto (Portellano Diez, ob. cit., p. 275).

O referencial subjectivo passa, portanto e antes de mais, pelo círculo económico interessado: quando estejam em causa «mercadorias para a cobertura de necessidades ge- rais, é a generalidade do público que deve ser tida em

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conta. Pelo contrário, quando se trate de especialistas [...] o juízo de confundibilidade tem de operar sobre um cír- culo mais restrito, que normalmente tem em conta as pe- quenas diferenças, ainda que isso não impeça que quando se trate de produtos muito parecidos também o especialis- ta possa enganar-se» (Portellano Diez, ob. cit., p. 276). Ou seja, em face dos artigos 193.° e 189.°, n.° 1, alí- nea m), do Código da Propriedade Industrial, a susceptibi- lidade de erro ou confusão deve aferir-se relativamente ao consumidor e à capacidade de este só poder distinguir os sinais (as marcas) depois de exame atento ou confronto, considerando-se o consumidor como o «consumidor de atenção média, excluindo-se, assim, quer os peritos na especialidade, quer o consumidor particularmente distraí- do ou descuidado» (Carlos Olavo, Propriedade Industrial, Almedina, cit., p. 56).

«O agente do juízo de semelhança é o consumidor» (Oliveira Ascensão, ob. cit., p. 155) e o consumidor nor- mal, não o especialmente atento ou perspicaz (o «consu- midor médio dos produtos em questão», Ferrer Correia, ob. cit., p. 347), levando-se em conta - assim - aquilo a que alguma doutrina e jurisprudência chama de «olhar distraído do público» (Abílio Neto e Pupo Correia, Pro- priedade Industrial, Legislação Anotada, Petrony, 1982, p. 111; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30 de Maio de 1944, in Revista de Legislação de Jurisprudên- cia, ano 77, p. 166, Boletim do Ministério da Justiça, IV, p. 288, e Revista dos Tribunais, ano 62.°, p. 231).

Recorre-se, deste modo, ao padrão de referência do homem médio, colocando-se de lado, «assim, tanto o que não presta nenhuma atenção, como o que leva a cabo um exame extremadamente cuidadoso antes de realizar a tran- sacção., A não se tomar como ponto de referência o ho- mem médio, o juízo daí resultante não seria decisivo para uma parte significativa do tráfico» (Portellano Diez, ob. cit., p. 276).

Ora, se se tem como ponto de partida a percepção do consumidor, quer dizer que a operação que importa reali- zar consiste numa comparação entre «um sinal e a memó- ria que se possa ter doutro» (Carlos Olavo, ob. cit., p. 51) e isto porque raramente o consumidor quando compra um produto determinado, com marca semelhante a outro que já conhecia, tem à vista as duas marcas, para fazer um exame comparativo: «Compra o produto por se ter con- vencido de que a marca que o assinala é aquela que reti- nha na memória» (Ferrer Correia, ob. cit., p. 347). Como refere Portellano Diez, «tem de partir-se do princípio de que o consumidor normalmente não encontrará as merca- dorias uma ao lado da outra e, portanto, não poderá rea- lizar um exame comparativo detalhado. O consumidor operará economicamente guiado pela sua memória, na qual não se reterá uma imagem detalhada e minuciosa, mas sim os elementos ou rasgo mais significativos e, às vezes, mesmo estes, de forma não exacta. Por isso o juízo tem de basear-se mais nas coincidências do que nas diferen- ças. As diferenças na visão de conjunto só influenciam quando sobressaiam de tal modo que impregnem a me- mória do consumidor ou captem a sua atenção» (ob. cit., p. 277): é, portanto, a impressão de conjunto que se torna decisiva na valoração de quando pode confundir-se o con- sumidor médio do círculo interessado.

Refìra-se ainda que a confundibilidade das marcas pode ocorrer com base num risco directo [«quando uma parte não insignificante dos círculos interessados no tráfico, por causa da confundibilidade dos sinais, é levada erradamen- te a supor que os produtos (ou serviços) que ostentam esses

sinais provêm dessa mesma empresa», Nogueira Serens, ob. cit., p. 15] ou num indirecto (quando os círculos inte- ressados, não confundindo os sinais, os entendem como uma simples modificação um do outro e, por isso, impu- tam os respectivos produtos ou serviços à mesma empre- sa», ob. cit. e loc. cit.).

Nesta mesma linha, referindo-se a «confusão directa- -imediata», [«quando o consumidor, devido à identidade ou grande similitude das prestações, considera que se trata do mesmo signo distintivo (v. g., Philips/Philip)», ou quan- do, «devido à identidade ou grande similitude das presta- ções, considera que se trata da mesma mercadoria (v. g., carteira de senhora com forma cónica com um só fecho/ carteira de senhora com forma cónica com dois fechos)»], e a «confusão indirecta-mediata» [«quando o consumidor repara que são dois sinais diferentes, mas a sua parecença o leva a entender que ambas as prestações procedem da mesma empresa, imputando as diferenças a que se trata de uma modernização do antigo produto, a um novo mem- bro da família de produtos ou a que os produtos proce- dem de diferentes sucursais ou estabelecimentos (v. g., Polymeral/Polymerin)»] - ambas como confusão em sen- tido restrito - e a confusão em sentido amplo («o consu- midor não sofre uma confusão acerca da identidade da empresa de procedência, mas, sendo consciente de que as duas mercadorias têm uma procedência empresarial dife- rente, supõe equivocadamente que entre as empresas oferentes de cada uma das prestações existem relações económicas, comerciais ou de organização»), v. Portellano Diez, na obra já por várias vezes citada, p. 268.

Acresce que, tratando-se de uma marca complexa (com elementos nominativos e figurativos), a forma de aborda- gem desta matéria tem também algumas especificidades: «as marcas mistas e as marcas complexas deverão ser consideradas globalmente como sinais distintivos de natu- reza unitária, mas incidindo a averiguação da novidade sobre o elemento ou elementos prevalentes - sobre os elementos que se afigurem mais idóneos a perdurar na memória do público (não deverão tomar-se em linha de conta, portanto, os elementos que desempenhem função acessória, de mero pormenor). Uma marca mista ou com- plexa não será nova quando o seu núcleo se confunda com a marca mais antiga» (Ferrer Correia, ob. cit., p. 348). Ou seja, a marca complexa tem de ser contemplada numa visão de conjunto: «o que conta é a impressão de conjun- to, pois é ela que sensibiliza o público consumidor; rele- vam pouco os pormenores, isoladamente configurados, que diferenciam os sinais» (Carlos Olavo, ob. cit., p. 57).

Neste tipo de marcas, por outro lado, «a experiência demonstra que o elemento nominativo é, em regra, o mais importante para apreciação do risco de confusão» (cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Maio de 1990, Cabral de Andrade, Boletim do Ministério da Justiça, n.° 397, p. 506): «l'element verbal est en règle générale le plus importante pour l' impression globale», Eugen Ulmér, citado por Carlos Olavo, ob. cit., p. 58.

O fundamental será, no entanto, que a existência da referida semelhança gráfica, fonética ou figurativa resulte do conjunto e não apenas de algum dos seus elementos, uma vez que é desse conjunto que pode resultar a confu- são. É, aliás, clássica a frase de Bédarride, segundo a qual «a questão da imitação deve ser apreciada pela semelhan- ça que resulta do conjunto dos elementos que constituem a marca e não pelas dissemelhanças que poderiam ofere- cer os diversos pormenores considerados isolada e sepa- radamente» (in Abílio Neto e Pupo Correia, ob. cit.,

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p. 110). No mesmo sentido, referem estes autores que se deve «olhar à semelhança do conjunto e não à natureza das dissemelhanças ou ao grau das diferenças que as se- param. É preciso considerar que o público geralmente não está a pensar na existência da imitação» (ob. cit., p. 111, Oliveira Ascensão, ob. cit., p. 154, e J. G. Pinto Coelho, Lições de Direito Comercial, 1.°, 1957, p. 426, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Maio de 1960, Boletim da Propriedade Industrial, n.° 10, p. 1610, e de 13 de Fevereiro de 1970, Boletim do Ministério da Justi-

ça, n.° 194, p. 237).

Com estes dados importa passar à verificação concreta da procedência do recurso da Sociedade Quinta do Portal, S. A.

Para isso temos de começar por ter presente que nenhu- ma das marcas assume as características de marca forte, sendo ambas nominativas, pelo que «é o elemento fonéti- co o decisivo para se determinar a semelhança ou disse- melhança [...] O que fica na memória de todas as pes- soas é o som da palavra [...]» (Acórdão da Relação de Lisboa de 26 de Abril de 1974, Boletim da Propriedade Industrial, n.° 1, 1975, p. 5, citado in Abílio Neto e Pupo Correia, Propriedade Industrial, Legislação Anotada, Petrony, 1982, p. 116).

Vejamos então o que aproxima e separa as marcas em confronto.

Como elementos comuns temos os vocábulos «Quinta» e «do», colocados na mesma posição em ambas.

Como elemento distintivo temos numa o vocábulo «Por- to» e na outra «Portal» (sendo certo que, também aqui, são comuns as quatro primeiras letras: p-o-r-t), sendo ape- nas duas as letras que as distinguem («Port-al»-«Port-o»). Mas será isto o suficiente para fazer o juízo que o Ins- tituto Nacional da Propriedade Industrial produziu, para indeferir a concessão da marca Quinta do Portal?

Temos a questão como duvidosa, desde logo porque a análise não pode ser efectuada de forma tão simplista. Certo que, como já referimos, a imitação deve «ser apre- ciada pela semelhança que resulta do conjunto dos elemen- tos que constituem a marca, e não pelas diferenças que poderiam oferecer os diversos pormenores considerados isolados e separadamente» (Carlos Olavo, ob. cit., p. 52, Ferrer Correia, ob. cit., p. 347, e Portellano Diez, ob. cit., p. 277), mas também o é que o produto em causa é «vi- nho do Porto» (do que decorre que a palavra «Porto» tem um fraco sentido distintivo, porque se sabe que está em causa esse tipo de vinho), e que a palavra «Quinta» indicia uma denominação de origem do vinho (daquela Quinta) (repara-se, aliás, que em termos de nome de vinhos é fre- quente a utilização do nome da quinta em que são produ- zidos).

Assim, «Quinta do Portal» e «Quinta do Porto» deixam claro que o vinho do Porto que identificam provém da quinta com o mesmo nome, sendo certo que «Quinta do Porto» induz o consumidor a pensar que se trata de uma garrafa de vinho do Porto e «Quinta do Portal» não faz essa indução à partida, mais deixando vincada a ideia pri- meiramente transmitida.

Recorrendo agora ao elemento fonético, constata-se que entre «Porto» e «Portal» existe uma clara diferenciação, com a acentuação em sílabas distintas, com a última síla- ba desta última caracterizada por uma vogal aberta (a) e um «I» terminante, ao passo que em «Porto» a última sí- laba é «apagada»: «Com efeito, sempre que na dicção de duas palavras a sílaba salientada seja a mesma, torna-se

verosímil que entre ambas, para o auditor menos escla- recido ou menos atento, se estabeleça um maior ou me- nor grau de confusão» (Justino Cruz, Código da Proprie- dade Industrial, 2.ªed., Livraria Amado, 1985, p. 223), o que, neste aspecto, não cremos que ocorra (voltando a su- blinhar-se que, tratando-se de marcas nominativas, «é o elemento fonético o decisivo para se determinar a seme- lhança ou dissemelhança das marcas. O que fica na me- mória de todas as pessoas é o som da palavra [...]»- Acórdão da Relação de Lisboa de 26 de Abril de 1974, Boletim da Propriedade Industrial, n.° 1, 1975, p. 5, cita- do in Abílio Neto e Pupo Correia, ob. cit., p. 116).

Por outro lado, quanto ao elemento ideográfico, é tam- bém fácil concluir pela impossibilidade de confundir «Por- to» e «Portal», a primeira referente a vinho ou local de desembarque, ou a local onde navios podem ancorar, a segunda a porta de entrada.

Neste ponto, refere a A. A. Ferreira, S. A., que não obsta a que se considere imitação a circunstância de as palavras terem significados diversos, o que, em abstracto, corres- ponde à verdade, no sentido de que não se trata de um critério decisivo, mas o que aos autos interessa é a reu- nião de todos os elementos possíveis de modo a permitir daí retirar a já assinalada «impressão global» sobre a confundibilidade.

A pergunta a fazer e a responder é a de se um consu- midor normal e médio de vinho do Porto, que distraida- mente se disponha a adquirir uma garrafa e nele encontre a marca Quinta do Portal, terá dificuldades em não a confundir, em termos de julgar que não está a adquirir uma garrafa Quinta do Porto.

Não cremos que seja possível tirar essa conclusão. A visão de conjunto que se impõe fazer das marcas em confronto faz concluir que existem elementos de aproxi- mação e elementos de afastamento, mas a impressão glo- bal que da Quinta do Portal necessariamente retira o con- sumidor de vinho do Porto (o seu público alvo), não o induz em erro ou confusão (relevando-se aqui, fundamen- talmente, o elemento fonético, o ideográfico e o do tipo de produtos em causa): quem ouve e lê «Porto» não se lembra de «Portal» e vice-versa, quem olha para uma garrafa de vinho do Porto com um ou outro nome não pensa que se trata da outra, tratando-se - portanto - de duas marcas que podem perfeitamente concorrer e subsis- tir no mercado.

Concluímos, pois, por entender que um homem ou mulher médios, consumidores normais e que não utilizem uma qualquer forma de especial atenção na compra do tipo de produtos em causa, ao adquirir(em) uma garrafa de vinho do Porto marca Quinta do Portal não é crível que possam julgar estar a adquirir uma Quinta do Porto, pelo que a característica de novidade daquela não ficou colo- cada em causa, não ficando afectada a sua função iden- tificadora, nem se induzindo em erro ou confusão o con- sumidor [cf. artigos 189.°, n.° 1, alínea m), e 193.° do Código da Propriedade Industrial].

5 - Decisão

Em face da argumentação expendida e das disposições legais citadas, concede-se provimento ao recurso apresen- tado pela Sociedade Quinta do Portal, revogando-se, consequentemente, o despacho recorrido, no sentido de permitir o registo da marca Quinta do Portal para vinho do Porto.

(6)

Custas a cargo da A. A. Ferreira, S. A., face à sua opo- sição.

Registe, notifique e, após trânsito, publique-se, nos ter- mos do artigo 44.° do Código da Propriedade Industrial. Lisboa, 27 de Julho de 1998 (em férias; acumulação de serviço). - Edgar Taborda Lopes.

Referências

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