OS RISCOS DO USO E DO DESCARTE INADEQUADO DE
MEDICAMENTOS VENCIDOS:
método de análise alternativo para
determinação de ácido salicílico em uma amostra de aspirina® vencida.
Adriana Nascimento de Sousa1,2
Eliane do Nascimento2
Fernanda Boroni1,2
Kyrlah Jerônimo1,2
Resumo: Cresce no Brasil a discussão sobre qual destino dar aos medicamentos que não são usados pela população. Os usuários de medicamentos acabam fazendo o descarte destes de forma inadequada, os quais podem ter repercussões na saúde pública e ambiental. Neste trabalho, demonstrou-se que a Es-pectroscopia no ultravioleta-visível por derivadas, pode ser utilizada na determinação de ácido salicílico em comprimidos de ácido acetilsalicílico no produto comercial, Aspirina®. O método demonstrou ser de baixo custo, podendo ser uma alternativa viável em substituição à técnica farmacopéica. Com os resulta-dos obtiresulta-dos demonstrou-se que o medicamento fora do prazo de validade possui alterações na sua composição e para que não haja riscos no seu descarte o correto seria a devolução para o fabricante, através de postos de coleta públicos e particulares.
Palavras- chave: Espectroscopia UV-vis derivativa, ácido acetilsalicílico, medicamentos vencidos.
INTRODUÇÃO
Por desconhecimento ou falta de informação, grande par-te das pessoas acabam fazendo o descarpar-te de medicamen-tosde forma inadequada, e esse despreparo na questão do manejo de resíduos químicos farmacêuticos em muitos lugares do mundo leva a graves danos a natureza, os quais podem ter repercussões à saúde pública e ambiental (GIL, 2005). Um estudo feito pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas e Bio-químicas, Oswaldo Cruz, entrevistou 1.009 pessoas na cidade de São Paulo e mostrou que apenas 2,7% dos entrevistados já haviam recebido alguma orientação sobre descarte de medica-mentos vencidos. O levantamento constatou que 75,32% das pessoas descartam a medicação no lixo doméstico e 6,34% jogam na pia ou no vaso sanitário. E mais, 92,5% nunca
per-tos adversos à saúde, seja humana ou de outros organismos presentes nas águas, como os peixes.
Outro problema relacionado a medicamentos vencidos é o uso destes por parte dos consumidores. Neste caso os danos causados podem ser ainda mais graves com ocorrência de in-toxicações, envenenamentos e até mesmo morte dos usuários (LAPORTE, 1989).
Da “farmácia doméstica” decorrem inúmeros casos de medicamentos vencidos e de intoxicações medicamentosas (LAPORTE, 1989). Segundo os dados publicados pelo Siste-ma Nacional de InforSiste-mações Tóxico-FarSiste-macológicas, os me-dicamentos ocupam a primeira posição entre os três principais agentes causadores de intoxicações em seres humanos desde 1996, sendo que em 2007 foram responsáveis por 30,3% dos
Newton Paiva (FENP) como dispensadora de medicamentos, se preocupa com o impacto social e ambiental que o descarte ina-dequado de medicamentos vencidos ou não, podem ocasionar ao meio ambiente e à sociedade, além dos vários problemas que o uso de medicamentos vencidos pode ocasionar aos usu-ários. Por isto a FENP com o intuito de informar e conscientizar os usuários sobre o problema do descarte inadequado e o uso de medicamentos fora do prazo de validade, propõe à verifica-ção de produto de degradaverifica-ção gerado em uma amostra vencida de Aspirina® comprimidos efervescentes cujo princípio ativo é o
ácido acetilsalicílico (AAS). A escolha deste produto se deve ao fato de que o ácido acetilsalicílico é o analgésico mais consumi-do e vendiconsumi-do no munconsumi-do.
A principal impureza presente no AAS é o ácido salicílico (AS), que é um produto de degradação produzido pela hidróli-se do ácido acetilsalicílico quando as condições de armazena-mento não são adequadas como, por exemplo, em presença de umidade, oxigênio atmosférico e luz, de acordo com o es-quema 1 (ALLINGER, 1978; PAVIA, 1982).
Para avaliar a pureza do AAS, é mais comum determinar a presença de AS do que medir o AAS presente. Isto é recomen-dado na Farmacopéia Brasileira e na Farmacopeia Europeia, a qual estabelece uma tolerância de 0,15% de AS em comprimi-dos de AAS (EUROPEAN, 1997). O baixo limite tolerado deve-se à irritação que o AS causa nas paredes do estomago, muito maior que o AAS (ALLINGER, 1978).
De acordo com a Farmacopeia Brasileira (2010), determi-na-se o teor de AS em comprimidos de AAS por uma análise comparativa da amostra e um padrão contendo o máximo de AS, que é permitido na amostra. Assim, neste trabalho, propõe-se a aplicação de uma técnica de dopropõe-seamento, do AS, alternati-va à técnica farmacopéica, por meio da Espectroscopia UV-vis derivativa. O uso desta técnica se justifica pelo impedimento de aplicação da Espectroscopia direta (ordem zero) devido à presença de grupos cromóforos semelhantes que absorvem no mesmo comprimento de onda e, portanto não mostram
se-letividade na separação do AS e AAS (FERREIRA, 2003). Na Espectroscopia derivativa obtêm-se o espectro funda-mental (de ordem zero) da substância em análise e em segui-da o próprio espectrofotômetro produz o espectro de primeira e de segunda ordem (primeira e segunda derivada). O ponto de anulação da primeira derivada (conhecido como zero
cros-sing) equivale ao comprimento de onda máximo do espectro
de ordem zero (normal). O comprimento de onda máximo no espectro de segunda derivada equivale ao comprimento de onda máximo do espectro de ordem zero. Os 2 pontos de anu-lação do espectro de 2ª derivada equivalem aos comprimentos de absorção máximo e mínimo da 1ª derivada (Figura 1). Assim a quantidade do fármaco em uma amostra pode ser facilmente determinada medindo-se a altura do pico no espectro de pri-meira ou segunda derivada e interpolando-o em uma curva de calibração previamente preparada com o padrão do fármaco (O’HAVER, 1979).
PARTE EXPERIMENTAL
DETERMINAÇÃO DE AS NO AAS DE ACORDO COM A FARMACOPEIA BRASILEIRA 5ª ED.:
Pesou e pulverizou os comprimidos. Transferiu quantidade de pó equivalente a 0,20 g de ácido acetilsalicílico para um balão volumétrico de 100 mL. Adicionou 4 mL de etanol e agitou. Diluiu para 100 mL com água resfriada, mantendo a temperatura infe-rior a 10 °C. Filtrou imediatamente e transferiu 50 mL do filtrado
minou o peso médio. Retirou uma quantidade de pó contendo cerca de 250 mg de Aspirina, transferiu para balão volumétrico de 50 mL e dissolveu em etanol. Filtrou a solução e retirou 1 mL do filtrado, transferiu para balão volumétrico de 25 mL e comple-tou com etanol.
PREPARO DA SOLUÇÃO PADRÃO DE AS
Pesou cerca de 250 mg de AS padrão, diluiu em balão volu-métrico de 50 mL e completou com etanol. A partir da solução
varredura da solução padrão de AAS e obtiveram-se os espec-tros de UV-vis de ordem zero, 1ª derivada e 2ª derivada.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
A técnica farmacopéica para determinação do AS é uma técnica semi-quantitativa onde uma solução padrão de AS
con-tendo o máximo de impureza que é permitido no AAS (cerca de 0,15 %) é comparado com a solução da amostra em análise. Pode-se observar na figura 2, que a amostra de Aspirina ven-cida apresenta quantidade de AS superior ao permitido, pois a coloração desenvolvida na solução amostra foi muito superior à desenvolvida no padrão.
* As soluções foram transferidas do tubo de Nessler para o béquer para melhorar a visualização do resultado na foto.
Das soluções padrões diluídas de AS e AAS, foram obti-dos os espectros de ordem zero, separadamente, e em se-guida eles foram sobrepostos (Figuras 3, 4 e 5) para mostrar
a semelhança de absorção dos dois compostos. O espectro padrão do AAS apresenta picos característicos em 210 nm e em 235 nm. O espectro padrão do AS também apresenta os mesmos picos característicos em 210 nm, 235 nm e ainda um outro em 300 nm.
Além dos espectros apresentados anteriormente, foi tam-bém obtido o espectro da mistura das soluções de AS e AAS (Figura 6), que revelou a presença de picos característicos
aos dois compostos (AS e AAS), confirmando a incapacidade da técnica em analisar as duas substâncias seletivamente.
A figura 5 mostra que existe sobreposição de bandas de ab-sorção do AS e AAS, impedindo que a Espectroscopia comum (ordem zero) seja utilizada para determinação do AS em AAS. A sobreposição das bandas (overlapping) de transição eletrônica ou de transferência de carga em um mesmo solvente é um dos problemas da Espectroscopia nas regiões do UV-vis de misturas de substâncias com cromóforos semelhantes. Uma alternativa eficiente é o uso da Espectroscopia de derivadas ou
Espectros-copia derivativa. A diferenciação do espectro de ordem zero não aumenta as informações do espectro original, mas leva a supressão das bandas largas, realça as bandas estreitas, e au-menta a resolução de “ombro” para banda, etc., obedecendo, ainda, a Lei de Beer-Lambert. Na sobreposição de espectros de derivadas dos componentes de uma mistura, podem-se indivi-dualizar melhor os constituintes e até eliminar a interferência de um componente sobre o outro.
Nos espectros sobrepostos de 1ª e 2ª derivadas (Figuras 7 e 10, respectivamente) pode-se observar que em certos com-primentos de onda, apenas um dos fármacos absorve. Isto nos fornece informações com seletividade e especificidade,
possibi-litando a determinação dos dois fármacos simultaneamente com eficácia pela Espectroscopia derivativa. São também mostrados os espectros individuais de 1ª e 2ª derivadas do AS e AAS nas figuras 8,9 e 11,12, respectivamente.
Observa-se nas figuras 7 e 10 que, em certos comprimentos de onda (λ), ocorre a anulação do espectro de um componen-te enquanto há absorção do outro. Descomponen-te modo, obcomponen-tendo-se os valores das amplitudes nos pontos de anulação (zero crossing), é possível construir-se curvas de calibração, além de se eliminar eletronicamente os erros sistemáticos provenientes de
interferên-cias (overlapping). Os espectrofotômetros que realizam varredura de espectro apresentam no software opções para obtenção da primeira até a quarta ou mais derivadas (SANTORO, 2005).
O espectro de UV-vis da solução amostra, Aspirina compri-midos efervescentes, vencida a cerca de 1 ano, foi obtido nas mesmas condições dos padrões de AS e AAS e é mostrado
na
figura 13. Pode-se observar neste espectro semelhanças com o espectro da mistura dos padrões de AS e AAS (Figura 6), ou
seja, neste espectro observa-se picos referentes ao AAS, mas também revela a presença de picos referentes ao AS.
CONCLUSÃO
Os resultados obtidos mostram que o método de análise por Espectroscopia no UV-vis (ordem zero) não é adequado para diferenciar AS e AAS, pois ocorre sobreposição das ban-das de absorção nos mesmos comprimentos de onda, tornando este método não seletivo para as duas substancias. Já com a Espectroscopia derivativa é possível determinar a impureza AS, no AAS, pois quando se aplicam a 1ª e 2ª derivadas no espectro de ordem zero ocorre diferenciação dos espectros de AS e AAS tornando possível a determinação simultânea das duas substân-cias na mesma análise.
A metodologia proposta neste trabalho configura-se, assim, em alternativa extremamente vantajosa e viável para a solução de problemas espectrais de sobreposição de mais de um com-ponente. A grande vantagem da utilização da Espectroscopia de derivadas está relacionada com a possibilidade de se minimizar os problemas com interferentes, sem complicados procedimen-tos de separação ou extração prévios, bem como não necessitar de padrões ultrapuros exigidos na CLAE, além da grande pos-sibilidade da validação do método no doseamento simultâneo,
REFERÊNCIAS
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Me-dicamentos vencidos devem ser descartados em local correto
.
Disponível emhttp://www.fenafar.org.br/portal/medicamentos/62-
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NOTAS DE RODAPÉ
1 Farmacêuticos da Farmácia Universitária doCentro Universitário
Newton Paiva.