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INSETOS HERBÍVOROS E. de inimigos a

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Academic year: 2021

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Acreditava-se, até algum tempo atrás,

que uma planta atacada por herbívoros seria

sempre prejudicada. Entretanto, estudos científicos

vêm mudando essa idéia nas últimas décadas.

Eles revelam que a herbivoria,

em muitos casos, pode trazer benefícios

para as supostas 'vítimas', como maiores

defesas contra futuros ataques e até crescimento

mais rápido. Assim, sabe-se hoje que certos

insetos herbívoros e suas plantas hospedeiras,

antes considerados inimigos, podem às vezes

ser bons parceiros.

Tatiana G. Cornelissen e G. Wilson Fernandes Laboratório de Ecologia

Evolutiva de Herbívoros Tropicais, Departamento de Biologia Geral (Instituto de Ciências Biológicas), Universidade Federal de Minas Gerais

INSETOS HERBÍVOROS E

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As estimativas do número de espécies giravam, até 1999, em tor-no de 1,5 milhão, incluindo apenas as oficialmen-te reconhecidas e classificadas. Esse total, no entan-to, não corresponde ao número real de espécies existentes na biosfera e certamente está sujeito a mudanças, porque, segundo o biólogo norte-ame-ricano Edward O. Wilson (1929-), “os organismos pequenos ditam as regras” – seres diminutos, como insetos, fungos e algas, representam a grande maioria da diversidade descrita hoje.

Onde quer que existam plantas, há também in-setos herbívoros. Esses dois grandes grupos consti-tuem cerca de 80% da diversidade em espécies conhecida hoje pela ciência (figura 1). Essa imensa e coincidente diversidade não é acidental. Os dois grupos estão ligados por inúmeras e complexas rela-ções, que podem ser benéficas ou prejudiciais para algumas das espécies envolvidas. Os insetos herbívo-ros podem consumir virtualmente todas as partes de uma planta (de botões florais a raízes), enquan-to grande parte das plantas depende de inseenquan-tos polinizadores para sua reprodução.

Interações benéficas

e prejudiciais

O processo de interação entre espécies pode ocorrer de variadas maneiras, mas há basicamente três efei-tos nas populações envolvidas: 1) aumento na sobre-vivência, no crescimento e/ou na fecundidade; 2) decréscimo, nos mesmos fenômenos; e 3) nenhum efeito. Associando símbolos matemáticos a tais pos-sibilidades (‘+’ para interação positiva, ‘-’ para nega-

PLANTAS

parceiros?

Figura 1. Número de espécies descritas nos principais grupos (o item ‘vertebrados’ inclui pássaros, mamíferos, peixes, anfíbios e répteis, e o item ‘outros’ inclui moluscos, crustáceos, nematódeos, equinodermas, anelídeos e cnidários), somando 1,5 milhão de organismos diferentes

ADAPTADO DE E.O. WILSON, 1999

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tiva e '0' para neutra), pode-se classificar a interação entre duas espécies por combinações par a par dos efeitos dessas interações (figura 2).

As relações entre insetos e plantas podem passar por todas as oito categorias de interações entre espé-cies listadas na figura, e as chamadas interações pre-judiciais são observadas e estudadas com maior fre-qüência. Interações positivas envolvendo insetos e plantas também são bastante comuns na natureza, mas há menos estudos sobre estas do que sobre as interações que incluem pelo menos um componente negativo.

A herbivoria (quando uma espécie alimenta-se dos tecidos da planta) é definida como uma intera-ção do tipo benéfica/prejudicial, ou seja, benéfica para o consumidor herbívoro e prejudicial para a planta hospedeira. A herbivoria pode ser consi-derada parasitismo, se o herbívoro ingere partes de suas plantas hospedeiras, sem destruí-las por completo, mas causando algum impacto negati-vo. Outros autores a incluem como predação, no ca-so de herbívoros que ingerem suas presas (plantas) inteiras, destruindo-as.

As plantas, no entanto, exibem muitos tipos de defesa contra o ataque de insetos, enquanto estes têm muitos tipos de táticas para superar esses mecanis-mos de proteção.

Defesas de plantas

e contra-ataques

de insetos

Pode-se dizer que todas as plantas são, em alguma fase de seu ciclo, atacadas por herbívoros, que re-movem às vezes pequenos fragmentos e às vezes partes inteiras, ou destroem todo o vegetal.

Em geral, as plantas podem ser divididas em suscetíveis (as mais intensamente atacadas por

her-Figura 2. Tipos de interações entre populações de espécies diferentes (‘+’ significa efeito positivo, ‘-’ significa efeito negativo e ‘0’ significa sem efeito)

ataques menos intensos). A re-sistência contra a herbivoria decorre de várias estratégias que as plantas usam para esca-par, enfrentar e sobreviver ao ataque de insetos herbívoros (figura 3). Elas podem escapar tornando-se menos ‘aparentes’, ou seja, dificultando sua loca-lização pelos insetos (desenvol-vendo-se, por exemplo, antes que o número de insetos au-mente); podem defender-se ativamente tornando-se um alimento inadequa-do para os herbívoros que a atacam; e podem so-breviver à herbivoria através de mecanismos deno-minados ‘tolerância’ e ‘sobrecompensação’.

Apesar da aparente vulnerabilidade das plantas ao ataque de herbívoros, a flora terrestre tem evo-luído como uma cobertura altamente diversa. Isso ocorre porque muitas características dos vegetais podem tornar mais difícil a vida dos herbívoros, como a presença de pêlos e tricomas (obstáculos estruturais), a baixa quantidade e/ou qualidade de nutrientes nos tecidos (defesa nutricional/bioquí-mica) e o emprego de inúmeros compostos com ação tóxica ou repelente para os atacantes (defesas químicas).

Existe um acúmulo de evidências de que as plan-tas têm um sistema de resistência eficiente, baseado em uma combinação de características físicas e quí-micas, que evitam sua exploração total pelos herbí-voros. Por isso, os cientistas propõem que as nume-rosas características químicas e mecânicas das plan-tas que ajudam a reduzir o forrageamento de herbí-voros, o seu crescimento e a sua sobrevivência evo-luem por influência de uma seleção direta imposta pela pressão de herbivoria.

Os herbívoros, porém, não ficam inertes ao en-frentar problemas como a qualidade nutricional e a defesa das plantas. Muitos deles localizam suas plan-tas hospedeiras por meio da chamada 'imagem de procura', ou seja, a capacidade de encontrar seletiva-mente uma forma particular ou um item com expe-riência (já que estão acostumados a fazê-lo). Essa estratégia é amplamente conhecida em alguns ver-tebrados, como pássaros e mamíferos.

Adaptações à resistência física das plantas tam-bém foram desenvolvidas. Algumas espécies de lar-vas de borboletas exibem um comportamento (ali-mentam-se em grandes grupos em apenas uma fo-lha) que pode facilitar a exploração do recurso e burlar alguns tipos de defesa da planta, como a li-beração de látex e de compostos de defesa. Outros insetos, como besouros, têm adaptações

morfoló-INTERAÇÃO EFEITOS DESCRIÇÃO DA INTERAÇÃO

A B

Neutralismo 0 0 Sem efeitos

Comensalismo + 0 Hospedeiro não afetado

Amensalismo - 0 População A é inibida, B não é afetada

Mutualismo + + É obrigatória

Protcooperação + + É facultativa

Predação + - B é destruído por A

Parasitismo + - B é explorado por A

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1. Defender: qualquer característica que aumenta a aptidão de um indivíduo por reduzir a herbivoria. As defesas de plantas envolvem o escape, a resistência e a tolerância.

2. Escapar: esse tipo de defesa, também chamada de ‘escape fe-nológico’, significa que as plantas estão ausentes (indisponíveis) quando os herbívoros estão abundantes.

3. Resistir: qualquer característica das plantas (pêlos, compostos quí-micos) que reduz a preferência ou a performance de herbívoros. 4. Tolerar: qualquer característica que reduz o efeito negativo da

herbivoria na aptidão dos indivíduos, mesmo após o ataque.

plantas sem tocar as patas em cápsulas que pos-suem toxinas – por exemplo, três espécies de bery-tídeos sugadores (percevejos) andam livremente so-bre as galhas cobertas com pêlos tóxicos longos e grandulares induzidas por uma mosca da família Cecydomyiidae (Diptera) no jacarandá hospedeiro Machaerium hirtum (Leguminosae) (ver ‘As galhas, tumores de plantas’, em CH nº 19).

Já as adaptações dos insetos à ampla gama de compostos químicos das plantas são bastante diver-sificadas e envolvem processos como a desintoxica-ção (capacidade de não se intoxicar com compostos químicos alterando-os por processos enzimáticos), alguns aspectos de comportamento e mesmo o se-qüestro de compostos de plantas para uso em próprio benefício. Isso é observado em herbívoros que incor-poram substâncias tóxicas de suas plantas hospe-deiras e assim tornam-se protegidos contra certos inimigos naturais. As toxinas que lagartas de uma espécie de borboleta (monarca) seqüestram de suas plantas hospedeiras são indutoras de vômito em cer-tos pássaros predadores, que passam a evitar bor-boletas de cores similares por associar a coloração com a sensação desagradável de vômito.

Assim, a interação entre insetos e plantas resul-ta em adapresul-tações (nos dois grupos) que reduzem os efeitos negativos da interação e aumentam os positivos. Cada grupo disputa para tirar ‘vantagem’ do outro, e novas adaptações surgem continuamente para inclinar a ba-lança em favor de um ou de outro. Essa ‘gan-gorra’ evolutiva tem gerado um conjunto de mecanismos fascinantes que visam ‘comer’ ou ‘evitar ser comido’.

Inimigos

ou parceiros?

As interações negativas entre duas espécies são facilmente reconhecidas, como a herbi-voria, a predação e o parasitismo. Entretan-to, alguns pesquisadores acreditam que a herbivoria possa ser considerada como uma relação do tipo +/+, ou seja, benéfica para ambas as espécies envolvidas. Isso acontece quando o ataque de um inseto herbívoro desencadeia uma série de reações, como au-mento do cresciau-mento e da floração de plan-tas, que acabam beneficiando a elas.

Até recentemente, acreditava-se que as defesas de plantas contra a herbivoria eram em geral defesas constitutivas, ou seja, aque-las sempre expressas em certas espécies de

plantas, como a presença de certa quantidade de espinhos, de pêlos e/ou de compostos químicos. Na última década, alguns pesquisadores têm des-coberto formas alternativas de defesas de plantas que não as defesas constitutivas. Uma das princi-pais explicações para a existência de outros tipos de defesa está ligada ao custo metabólico para a pro-dução das características que conferem defesa às plantas, já que é limitada a quantidade de recursos para o exercício de todas as suas atividades meta-bólicas, como o crescimento, a reprodução e a subs-tituição de tecidos perdidos.

Assim, acredita-se hoje que as plantas podem usar o dano sofrido por herbivoria como pista para indu-zir respostas que aumentam sua resistência contra futuros ataques, atuando, portanto, como uma for-ma alternativa de defesa. Tais respostas induzidas contra a herbivoria são mudanças em caracterís-ticas físicas, nutricionais e químicas das plantas após herbivoria ou estresse, que podem incluir, en-tre outras, alterações no conteúdo de água ou nitro-gênio, na dureza foliar, na química secundária e na densidade de tricomas. Essas respostas parecem ser comuns em grande número de plantas de diferen-tes grupos e têm sido demonstradas em mais de 100 pares de planta-herbívoro. Figura 3. As respostas das plantas à herbivoria baseiam-se em diferentes estratégias 

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Quando as respostas induzidas reduzem a pre-ferência ou performance de insetos herbívoros elas são classificadas como ‘resistência induzida’. E são consideradas ‘defesas induzidas’ quando benefici-am de alguma forma as espécies de plantas que expressam tais características.

Um estudo com Raphanus sativus (rabanete) da família Brassicaceae, na Califórnia (Estados Unidos) demonstrou que a herbivoria por lagartas e também a simulação desta através da remoção de tecidos foliares levou a mudanças químicas nessa planta, como o aumento da concentração de glucosinolatos (compostos de defesa), alterando os padrões de con-sumo dos insetos na estação de ataque seguinte. Houve redução tanto no número de insetos mastiga-ores quanto na colonização por pulgões em plantas já atacadas (por lagartas ou simulações), comparadas a indivíduos-controle, que não sofreram herbivo-ria. As respostas induzidas também afetaram nega-tivamente gafanhotos, besouros e lagartas de borbo-letas que atacam R. sativus em condições naturais. A redução de impactos negativos nas plantas onde havia ocorrido herbivoria levou a aumentos de 60% na produção de frutos (em indivíduos femininos) e de 48% no número de flores produzidas (em indiví-duos masculinos). Tais resultados demonstraram que a herbivoria provocou mudanças nas plantas (respostas induzidas) que, por sua vez, aumentaram a aptidão dos indivíduos dessa espécie (defesas in-duzidas). Resultados semelhantes têm sido consta-tados por pesquisadores em outros sistemas de plan-tas (como carvalhos, eucaliptos, algodão e tabaco) e herbívoros.

No primeiro estudo sobre defesas induzidas fei-to em sistemas tropicais, envolvendo a legumino-sa mororó (Bauhinia brevipes), a simulação mecâ-nica da herbivoria (remoção de tecidos foliares com tesouras e furadores de papel) levou a mudanças químicas nas folhas ‘atacadas’ e à posterior redu-ção do ataque de insetos herbívoros, trazendo bene-fícios aos indivíduos que tiveram tecidos removi-dos. Após um mês de experimento, indivíduos de mororó mecanicamente atacados apresentaram maior concentração de compostos de defesa em seus tecidos e menor quantidade de nutrientes e água, o que levou à redução do ataque de besouros e larvas de borboletas.

Além disso, em indivíduos nos quais a herbivo-ria foi simulada, observou-se um crescimento de ra-mos quatro vezes maior que em plantas cujos rara-mos foram envolvidos por sacos de filó para impedir o ataque dos insetos. Assim, nessa espécie, as respos-tas induzidas contra a herbivoria funcionaram como defesas induzidas. Entretanto, o ataque por insetos herbívoros só pode ser benéfico para as plantas que expressam respostas induzidas quando estas acon-tecem de forma rápida e eficiente, reduzindo o nú-mero de insetos, ou os danos por eles causados, an-tes do período de floração e frutificação.

A resistência ao ataque de herbívoros toma ba-sicamente duas formas. As plantas podem evitar os danos através de mecanismos de defesa ou escape, ou podem tolerar a herbivoria. Embora o termo ‘so-brecompensação’ seja muitas vezes usado como si-nônimo de tolerância à herbivoria, existe uma di-ferença entre os dois, relacionada à resposta das plantas após o ataque dos herbívoros. Tolerância é a capacidade de uma planta manter a aptidão – em termos de crescimento ou produção de flores e fru-tos – mesmo após intensa herbivoria. Já sobrecom-pensação é a capacidade de uma planta atacada de aumentar sua aptidão, em comparação com indi-víduos que não sofreram herbivoria.

Estudos sobre a tolerância têm recebido propor-cionalmente menos atenção que os relacionados à genética e à defesa de plantas. Entretanto, reconhe-ceu-se recentemente que a tolerância e a defesa podem ser respostas alternativas – e não necessaria-mente exclusivas – contra a herbivoria. As duas respostas podem ser favorecidas ou não, de acordo com as circunstâncias.

Em um ambiente dominado por insetos herbívo-ros generalistas (que se alimentam de diversas espé-cies de plantas), o ataque pode ser tão intenso que mesmo uma planta de baixa qualidade nutricional (com poucos nutrientes e várias características de defesa, como pêlos, dureza e muitos compostos quí-micos) não escaparia de danos significativos. Nesse caso, a tolerância à herbivoria pode ser uma estraté-gia de sobrevivência, enquanto o investimento em defesas não. Ambientes onde os recursos são mais abundantes e onde há menor competição favorecem maior tolerância à herbivoria e mesmo o aumento de aptidão após o ataque (sobrecompensação), já que tecidos destruídos podem ser repostos mais rapida-mente e com menor custo energético.

Levando em consideração a grande diversidade de herbívoros, insetos ou não, e a improbabilidade (no tempo e no espaço) de que as plantas escapem totalmente a eles, a tolerância à herbivoria desem-penha grande papel na ecologia e evolução das in-terações entre plantas e herbívoros. A evolução

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des-temente mutualística entre herbívoros e suas plan-tas hospedeiras.

O debate sobre a possibilidade de a herbivoria afetar positivamente algumas espécies de plantas começou nas décadas de 40 e 50. Nessa época, vá-rios estudos demonstraram que as plantas poderiam se beneficiar da interação com insetos e mamífe-ros herbívomamífe-ros, idéia que continua a inspirar gran-de número gran-de pesquisas.

Um dos primeiros detalhados estudos realizados em relação à sobrecompensação de plantas à herbi-voria, realizado em 1997 no Arizona (Estados Uni-dos), demonstrou experimentalmente que as plan-tas podem se beneficiar por serem comidas. Após a remoção de 95% ou mais da biomassa aérea da planta herbácea pincel-de-índio (Ipomopsis aggre-gata), a produção de sementes e sobrevivência das plântulas foi quase três vezes maior que em plan-tas-controle que não sofreram ataque de herbívo-ros. Indivíduos não atacados produziram apenas uma inflorescência, enquanto nos atacados surgi-ram muitas. A produção de flores, nesse caso, pare-ce estar diretamente relacionada ao supare-cesso redutivo (indivíduos com mais flores têm maior pro-babilidade de gerar descendentes que aqueles com menos flores).

Estudo semelhante, realizado na Serra do Cipó (MG) pelo Laboratório de Ecologia Evolutiva da Universidade Federal de Minas Gerais, constatou que indivíduos de uma espécie de sempre-viva (Paepalanthus speciosus) atacados por um besou-ro herbívobesou-ro pbesou-roduziram seis vezes mais umbelas (inflorescências em que as flores pedunculadas par-tem todas de um mesmo ponto e têm a mesma altu-ra, dando a aparência de uma sombrinha) que os não atacados, nos quais surgiu apenas uma em ca-da planta. Além disso, plantas atacaca-das produzi-ram 35% inflorescências a mais que as que não so-freram danos.

Esse trabalho, no entanto, confirmou parcialmen-te a idéia da relação benéfica entre plantas e seus insetos associados, já que o desenvolvimento das flores até o estágio de fruto foi menor (85% de fruti-ficação) nos indivíduos de sempre-viva atacados do que nos que não sofreram herbivoria (97% de fruti-ficação). Uma explicação possível para a menor produção de frutos em plantas atacadas pode estar ligada ao tamanho das inflorescências nesses indi-víduos: embora apresentassem umbelas e inflores-cências em maior número, estas eram menores que as de indivíduos não atacados, o que poderia dificul-tar a atração ou mesmo a sua localização pelos poli-nizadores.

Outros estudos, do sueco Tommy Lennartsson e colaboradores, demonstraram que os indivíduos da gramínea Gentianella campestris atacados por

herbívoros tiveram maior aptidão (expressa no au-mento do cresciau-mento, produção de flores e frutos) que aqueles protegidos contra o ataque de insetos. Os mecanismos responsáveis por esse aumento de aptidão não são totalmente conhecidos, mas os es-tudos já realizados permitem indicar alguns can-didatos (figura 4).

A remoção de tecidos foliares por insetos herbí-voros, por exemplo, reduz a quantidade de tecido foliar fotossintético, mas pode também aumentar a quantidade de luz que chega a porções da planta antes sombreadas, aumentando assim a capacidade fotossintética. É possível ainda verificar maior cres-cimento e ramificação das plantas quando os her-bívoros promovem a quebra da chamada dominân-cia apical, ao cortar as pontas dos ramos principais. Assim, o ataque de insetos herbívoros pode aumen-tar a aptidão e a performance de plantas. Nessa as-sociação mutualista, os herbívoros se beneficiam através da alimentação de plantas ou parte delas, enquanto as plantas também se beneficiam.

Entretanto, sabe-se também que diferentes es-pécies respondem de forma distinta à herbivoria. Para a espécie Piper arieianum (uma pimenteira silvestre) na Costa Rica, uma perda foliar de ape-nas 10% diminui significativamente sua aptidão, enquanto a espécie Raphanus raphanistrum (raba-

Figura 4. O estudo das conseqüências das interações insetos-plantas revela que o ataque por herbívoros pode ser benéfico para os vegetais

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Sugestões para leitura

MCNAUGHTON, S. J. 'On plants and herbivores', in American Naturalist, 128 (5), p. 765, 1986. FERNANDES, G. W. 'Plant mechanical defenses against insect herbivory', in Revista Brasileira de Entomologia, 38, p. 421, 1994. KARBAN, R. & BALDWIN, I. T. Induced responses to herbivory. Chicago, The University of Chicago Press, 1997. CORNELISSEN, T. G. & FERNANDES, G. W. 'Induced defenses in the neotropical tree Bauhinia brevipes to herbivory: effects of damage-induced changes on leaf quality and insect herbivore attack', in Trees, 15, p. 236, 2001. FRITZ, R. S. & SIMMS,

E. L. (eds.). Plant resistance to herbivores and pathogens. Ecology, evolution and genetics, Chicago, The University of Chicago Press, 1992.

nete-silvestre) pode suportar até 25% de perda de área foliar sem nenhum prejuízo para a produção de flores e frutos.

Durante muito tempo a sobrecompensação não foi aceita pelos cientistas, mas estudos recentes têm confirmado a influência positiva de insetos herbí-voros para suas plantas hospedeiras como um fe-nômeno comum.

Inimigos dos

inimigos são aliados

Quando atacadas, certas plantas podem liberar in-formação química no ar, na forma de 'compostos orgânicos voláteis'. Considerando a teia alimentar formada por plantas, herbívoros e predadores e/ou parasitas destes, estudos recentes de pesquisadores norte-americanos, publicados na revista Science, demonstraram que tais compostos podem bene-ficiar as plantas atuando como sinais, de quatro maneiras distintas (figura 5): 1) avisam a outros herbívoros que os sistemas de defesa das plantas já foram ativados; 2) avisam a outros herbívoros que, como as plantas já estão sendo atacadas, po-dem evitar a competição alimentando-se em outro local; 3) avisam aos predadores dos herbívoros que suas presas estão nas proximidades; e 4) avisam aos herbívoros 'famintos' que já estão atraindo seus predadores e são, portanto, fortalezas bem protegidas.

Alguns estudos de campo e de laboratório, nos Estados Unidos, têm comprovado as respostas de insetos herbívoros e dos predadores destes à libe-ração (induzida pela herbivoria) de compostos vo-láteis induzida pela herbivoria. Esses compostos podem atuar como defesas de plantas, tanto direta

novos herbívoros quanto atrai insetos predado-res, diminuindo assim danos futuros para as plantas que apresentam esse tipo de reação ao ataque.

Uma série de experimentos desenvolvidos em um deserto norte-americano, em 2001, demonstrou que plantas de tabaco liberam substâncias voláteis (jasmonatos de metila) quando suas folhas são ata-cadas pelas lagartas de uma determinada maripo-sa. Esses compostos atraem inimigos naturais das lagartas, como os barbeiros-de-olhos-grandes (Geo-coris pallens). Além disso, os compostos impedem que mariposas adultas depositem seus ovos nas fo-lhas de tabaco: a atração de predadores e a repul-são aos atacantes diminuíram em até 90% o núme-ro de ovos depositados. Assim, os compostos libe-rados após a herbivoria não só detêm ataques futu-ros, mas também atraem predadores que funcio-nam como guarda-costas das plantas.

Além disso, como os compostos voláteis espa-lham-se no ar com facilidade, sua liberação por uma espécie, ao atrair predadores de herbívoros, pode beneficiar plantas competidoras próximas, que as-sim economizam energia para outras finalidades, como o crescimento e a reprodução. Entretanto, apesar da redução da herbivoria futura pela redu-ção do número de 'inimigos', não se sabe ainda se a liberação de compostos voláteis aumenta o sucesso reprodutivo das plantas que os produzem, de forma a tornar a relação inseto-planta benéfica para ambas as partes.

À luz dessas e de outras descobertas, a idéia de que herbívoros são parasitas de plantas, que têm apenas um impacto negativo sobre seus hospedei-ros, continua a ser revista. Colocar a herbivoria no contexto do mutualismo ajuda a entender porque tal relação existe e, principalmente, porque ela per-siste. Tais interações – aparentemente antagôni-cas, mas que podem ser mutuamente benéficas – parecem ser comuns nas interações entre plantas

Figura 5. A liberação de compostos voláteis, entre outros benefícios, atrai predadores dos herbívoros, transformando em aliados os inimigos de um inimigo

Referências

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