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ENTEROSCOPIA E VIDEOCÁPSULA: ESTADO DA ARTE, INDICAÇÕES E LIMITES

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Academic year: 2021

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ENTEROSCOPIA E VIDEOCÁPSULA: ESTADO DA ARTE, INDICAÇÕES E LIMITES

A investigação endoscópica do intestino delgado foi, até ao início da década anterior, o parente pobre da Gastrenterologia. De facto, e contrariamente ao que acontecia com o tracto digestivo alto e com o cólon, a observação endoscópica deste segmento do tubo digestivo estava longe de ser satisfatória. Tal estava em relação com a localização remota em relação à boca e ao ânus, com o elevado comprimento e com a livre mobilidade na cavidade peritoneal.

O advento da vídeo-cápsula endoscópica (VCE) veio alterar, de forma radical, este panorama. Foi utilizada uma tecnologia revolucionária que, possibilitando a colheita de imagens de boa qualidade com um mínimo desconforto para o paciente, veio determinar modificações importantes no processamento diagnóstico da patologia do intestino delgado (1-3).

O diagnóstico etiológico da hemorragia digestiva de causa obscura, definida como a hemorragia de causa desconhecida que persiste ou recorre após endoscopia digestiva alta e colonoscopia negativas (4), é a mais frequente indicação para o estudo do intestino delgado (5). É hoje consensual que o exame de primeira linha na avaliação dos pacientes com este tipo de sangramento passa pela realização de uma enteroscopia com VCE, metodologia que permite a detecção de lesões no intestino delgado em cerca de 70% dos casos, uma taxa muito superior à relatada para outras metodologias (6). O achado endoscópico mais frequente neste contexto é constituido pelas lesões do tipo angiodisplasia (figura 1).

Relativamente à utilidade da VCE no contexto do estudo dos pacientes com suspeita clínica de Doença Inflamatória do Intestino (DII), o consenso é menor. Tal resulta da inexistência de unanimidade não só quanto ao que deve ser entendido como “suspeita clínica de DII”, o que tem implicações na selecção dos pacientes, mas também quanto aos achados endoscópicos que deverão ser considerados indicativos da existência de DII (figura 2). Naturalmente que a primeira abordagem destes pacientes inclui a realização de uma colonoscopia com ileoscopia e, só quando esta primeira abordagem não revela alterações da mucosa e a suspeita clínica persiste, se justifica a realização de enteroscopia com VCE. Na comparação entre a observação endoscópica com cápsula e exames imagiológicos, designadamente com o trânsito baritado ou com a enteroclise por TC, a vantagem parece estar do lado da endoscopia (8). A superioridade da VCE relativamente a métodos imagiológicos está em relação com a sua superior capacidade para detectar pequenas alterações da mucosa. A utilização da VCE nesta indicação deverá ser ponderada tendo em atenção o risco de retenção em relação com a existência de estenose não diagnosticada previamente. Num estudo realizado no Serviço de Gastrenterologia dos Hospitais da Universidade de Coimbra, envolvendo 78 doentes com suspeita clínica de DII, a sensibilidade, especificidade, valor predictivo positivo e valor predictivo negativo associado à enteroscopia com VCE foi de 93%, 80%, 77% e 94%, respectivamente (7). Ocorreu retenção da cápsula em 4 doentes (5%), tendo dois destes pacientes sido submetidos a ressecção cirúrgica (7).

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A VCE poderá igualmente ser utilizada em pacientes com o diagnóstico prévio de Doença de Crohn, designadamente tendo em vista a avaliação da cicatrização da mucosa em pacientes submetidos a terapêutica imunossupressora (9), no diagnóstico da recorrência após ressecção (10) ou quando existem sintomas inexplicados (11). Deve assinalar-se que, nesta indicação, a taxa de retenção da cápsula é ainda mais elevada do que entre os pacientes com suspeita de DII, podendo atingir 13% (12). As neoplasias do intestino delgado são relativamente raras, constituindo 1-3% dos tumores do tubo digestivo (figura 3). Numa série recentemente publicada, este diagnóstico foi estabelecido em 2,4% dos 5129 pacientes submetidos a VCE, na maioria das vezes manifestando-se por sangramento (13). A complementaridade com a enteroscopia com duplo-balão assume aqui particular relevância, permitindo a colheita de biopsias e/ou a realização de procedimentos terapêuticos (14). Ainda neste contexto, o seguimento de pacientes portadores do Síndroma de Peutz-Jeghers é, hoje em dia, uma indicação clara para a utilização da VCE (15).

O uso de VCE no âmbito da Doença Celíaca é objecto de discussão (figura 4), admitindo-se a sua utlidade no seguimento destes doentes, designadamente no diagnóstico das complicações.

Sendo indiscutíveis os avanços que a utilização da VCE permitiu alcançar no processamento dos pacientes com patologia do intestino delgado, constituindo hoje em dia uma técnica com um lugar incontestável no algoritmo diagnóstico dos doentes com suspeita de patologia enteral, a verdade é que, como todas as técnicas diagnósticas, apresenta limitações, limitações essas que, onze anos volvidos sobre o seu advento, se mantém inalteradas. De facto, a impossibilidade de controlar a progressão da cápsula, de realizar biopsias e de fornecer uma indicação precisa sobre a localização das lesões constituem importantes limitações, a que acresce o ainda hoje elevado preço do dispositivo.

Pedro Narra Figueiredo Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra Serviço de Gastrenterologia dos Hospitais da Universidade de Coimbra

BIBLIOGRAFIA

1. Iddan G, Meron G, Swain P. Wireless capsule endoscopy. Nature 2000; 407: 407. 2. Appleyard M, Fireman Z, Glukhovsky A, Jacob H, Shreiver R, Kadirkamanathan S, et al. A randomised trial comparing wireless capsule endoscopy with push enteroscopy for the detection of small-bowel lesions. Gastroenterology 2000; 119: 1431-38.

3. Appleyard M, Glukhovsky A, Swain P. Wireless-capsule diagnostic endoscopy for recurrent small-bowel bleeding. N Engl J Med 2001; 344: 232-3.

4. American Gastroenterological Association. Medical position statement: evaluation and management of occult and obscure gastrointestinal bleeding. Gastroenterology 2000; 118: 197-200

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5. Chak A, Koehler M, Sundaram S, Cooper G, Canto M, Sivak M. Diagnostic and therapeutic impact of push enteroscopy: analysis of factors associated with positive findings. Gastrointestinal Endoscopy 1998; 47; 1: 18-22.

6. Raju GS, Gerson L, Das A, Lewis B; American Gastroenterological Association. American Gastroenterological Association (AGA) Institute technical review on obscure gastrointestinal bleeding. Gastroenterology. 2007;133:1697-717

7. Figueiredo P, Almeida N, Lopes S, Duque G, Freire P, Lérias C, Gouveia H, Sofia C. Small-bowel capsule endoscopy in patients with suspected Crohn's disease-diagnostic value and complications. Diagn Ther Endosc. 2010;2010. pii:101284. Epub 2010 Aug 5. PubMed PMID: 20811612

8. Triester SL, Leighton JA, Leontiadis GI et al. A meta-analysis of the yield of capsule

endoscopy compared to other diagnostic modalities in patients with non-stricturing small bowel Crohn’s disease. Am J Gastroenterol 2006; 101: 954–964

9. Bourreille A, Ignjatovic A, Aabakken L et al. World Organisation of Digestive Endoscopy (OMED) and the European Crohn’s and Colitis Organisation (ECCO). Role of small-bowel endoscopy in the management of patients with inflammatory bowel disease: an international OMEDECCO consensus. Endoscopy 2009; 41: 618–637

10. Pons Beltrán V, Nos P, Bastida G et al. Evaluation of postsurgical recurrence in Crohn’s disease: a new indication for capsule endoscopy? Gastrointest Endosc 2007; 66: 533–540

11. Barratt HS, Kalantzis C, Polymeros D, Forbes A. Functional symptoms in inflammatory bowel disease and their potential influence in misclassification of clinical status. Aliment Pharmacol Ther 2005; 21: 141–147

12. Cheifetz AS, Kornbluth AA, Legnani P, Schmelkin I, Brown A, Lichtiger S, Lewis BS. The risk of retention of the capsule endoscope in patients with known or suspected Crohn's disease. Am J Gastroenterol. 2006;101:2218-22

13. Rondonotti E, Pennazio M, Toth E, Menchen P, Riccioni ME, De Palma GD, Scotto F, De Looze D, Pachofsky T, Tacheci I, Havelund T, Couto G, Trifan A, Kofokotsios A, Cannizzaro R, Perez-Quadrado E, de Franchis R; European Capsule Endoscopy Group; Italian Club for Capsule Endoscopy (CICE); Iberian Group for Capsule Endoscopy. Small-bowel neoplasms in patients undergoing video capsule endoscopy: a multicenter European study. Endoscopy. 2008;40:488-95

14. Almeida N, Figueiredo P, Lopes S, Gouveia H, Leitão MC. Double-balloon enteroscopy and small bowel tumors: a South-European single-center experience.Dig Dis Sci. 2009;54:1520-4

15. Gupta A, Postgate AJ, Burling D et al. A prospective study of MR enterography

versus capsule endoscopy for the surveillance of adult patients with Peutz-Jeghers syndrome. Am J Roentgenol 2010; 195: 108–116

(4)

a) b)

Figura 1 a) Hemorragia activa no intestino delgado, b) angiodisplasia

a) b)

Figura 2 Imagens sugestivas de enteropatia por Doença de Crohn: a) úlcera, b) estenose ulcerada

(5)

Figura 3 Lesão úlcero-vegetante sugestiva de corresponder a neoplasia ileal

Referências

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