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Teodoro Waty-Manual de Financas Publicas e Direito Financeiro2

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Academic year: 2021

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Nota Prévia

No ano lectivo 2003/2004, a Faculdade de Direito da Universidade Eduardo Mondlane conta com três turmas de Finanças Públicas e Direito Financeiro, sendo duas em Maputo e outra na sua Delegação da Beira.

Cometido no encargo de regência da cadeira de Finanças Públicas e Direito Financeiro, para facilidade de coordenação e maior uniformidade do seu conteúdo, produzi estas lições baseadas essencialmente nos apontamentos que usava há mais de quatro anos, como assistente.

Dou assim público testemunho do meu magistério.

Espero que esta obra de carácter didáctico se ajuste às exigências dos meus colegas juristas formados e em formação e que com ela lhes facilite situar-se e dominar os principais problemas das Finanças Públicas que apesar de sua interdisciplinaridade, que abre coutadas, não pretende ver nas Faculdades de Direito formados economistas.

Procuramos, na simplicidade de exposição, não enjeitar a clareza e o carácter científico, aqui e acolá, talvez prejudicado pela falta de obras nacionais de referência e recusar o malthusianismo escolar.

Combina-se um ensino aberto e rigoroso, teórico e prático e massificado, mas sem facilidades aviltantes.

Sofremos forte influência dos Professores Doutores António Sousa Franco e Eduardo Paz Ferreira que leccionam esta Disciplina na Universidade de Lisboa sem que amiúde nos socorramos de outros autores e ajustemos forte condimento do nosso contributo pessoal.

(2)

Os que possam apodá-lo de insuficiente têm o meu pleno acordo e a promessa de melhorá-lo em breve oportunidade.

Afinal, já dizia BOCCACIO (Dacameron), mais vale agir na disposição de nos arrependermos do que arrependermo-nos de nada ter feito.

Não estamos nem satisfeitos, nem resignados, mas dispostos a não desistir e a insistir.

Catembe, 25 de Abril de 2004

Agradecimentos

À Tânia, minha filha,

que aceitou pôr-se na qualidade dos principais destinatários.

À Dra. Mónica Waty, minha mulher, para além do mais,

pela paciente revisão e crítica do texto.

(3)

NOÇÕES FUNDAMENTAIS DO DIREITO FINANCEIRO Capitulo I

Conceito de Finanças Públicas

1. Aspectos preliminares noção de finanças está intimamente ligada à ideia de dinheiro.

Com o desenvolvimento da humanidade a questão das finanças ganhou força tal que hoje discute-se finanças como uma ciência que visa estudar os aspectos da economia, onde o processo económico se caracteriza por quatro estágios a saber:

a) Produção,

b) Distribuição, c) Troca; e

d) Consumo.

O desenvolvimento das sociedades implicou a variação de meios e tipos de produção. O excedente da produção começou a ser vendido ou trocado. O escambo (troca directa), nas comunidades primitivas, funcionou como meio regular de troca de produtos que as diversas comunidades faziam.

Este foi o meio usado para a auto-suficiência e atendimento das necessidades. Esta situação criou novos meios de produção e criou também o acréscimo da produtividade na base da divisão social do trabalho.

Usando a força produtiva o homem começou a produzir em grande escala, resultando, daí, muita produção. Criavam, assim, excedentes de produção.

As trocas eram difíceis devido ao facto de haver variedade de produtos. Entretanto, outro fenómeno está ligado à questão do surgimento de um produto que era mais procurado e, daí, toda a comunidade usava este produto como “meio padrão”de troca, ou seja, a base frequente de troca.

(4)

Com a descoberta de metais preciosos o homem evoluiu na definição e no reconhecimento do “valor”. O ouro, a prata, foram os metais fundamentais usados na troca.

A necessidade de identificação dos valores nas moedas de troca, iniciava o processo de cunhagem da moeda preciosa.

O dinheiro passa a ser uma unidade de valor, um meio de transacção e de pagamento que, como princípio, não perde o seu valor no tempo.

O dinheiro, que resulta do processo de trabalho, desenvolve a noção de mercadoria e de troca, pois sem esta não há dinheiro.

O conceito de dinheiro é abstracto, não sendo já a unidade monetária representativa que, no caso de Moçambique, é o METICAL.

Estas bases são melhor tratadas na cadeira de Economia Política.

2. Finanças e Estado

As finanças públicas são contemporâneas do Estado e pretendem abranger a problemática de gestão da coisa pública.

Sabe-se que o Estado, para realizar a sua actividade, carece de dinheiro para pagamento de despesas nas áreas entre outras, de Saúde, Educação, Segurança, Justiça.

(5)

A palavra latina finis1 é apontada como sendo a raiz etimológica do termo finanças através duma evolução pela qual, nos séculos XII e XIV, surgiram as expressões finatio e financia que exprimiam as ideias de débito e de prestação.

Entende-se também que da França, onde designava, no século XV, o conjunto dos meios económicos postos à disposição de uma organização política para a realização dos seus fins próprios, terá vindo a generalização do vocábulo2.

4. Conceito de Finanças Públicas

Por finanças públicas designa-se a realidade económica de um ente público, ou com funções públicas, tendente a afectar bens à satisfação de necessidades que lhe estão confiadas3 ou, dito doutro modo, e aproximadamente, as finanças públicas referem-se à aquisição e utilização de meios financeiros pelas entidades públicas que incluem o Estado, as autarquias e entidades paraestaduais.

Sob a designação de Finanças Públicas pretende-se, genericamente, abranger a disciplina que estuda o conjunto de problemas de política económica que envolvem o uso de medidas fiscais e de despesas públicas.

É uma clara sobrevalorização da actividade financeira do Estado, ou seja, dos aspectos ligados à manipulação dos meios necessários, em detrimento das demais actividades que o sector público é susceptível de desenvolver; esta concepção caracterizou a vertente dominante do pensamento económico e da actuação do Estado, na fase inicial de autonomização desta disciplina.

1 Com o significado de fim, termo, prazo e vencimento de dívida.

2 SOARES MARTINEZ, Introdução ao Estudo das Finanças, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, Lisboa, 1967, pp. 19 e ss.

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O objecto das Finanças Públicas foi alargando sucessivamente o seu âmbito à medida que o sector público se envolvia num conjunto cada vez mais amplo de actividades, ultrapassando a estrita intervenção nos domínios reconduzíveis às necessidades de segurança, cultura e bem-estar4.

Pode afirmar-se que, modernamente, o objectivo das Finanças Públicas abrange o estudo de todos os aspectos que envolvem a utilização, pelo sector público, de recursos económicos, tendo em vista alcançar adequados níveis de emprego, crescimento, desenvolvimento e de distribuição do rendimento, através de bens ou da prestação de serviços.

3. Acepções de Finanças Públicas

A expressão Finanças Públicas envolve três sentidos, designadamente:

a) Sentido Orgânico

Neste sentido orgânico, Finanças Públicas designa Órgãos do Estado ou de outro ente público competentes para gerir os recursos económicos com vista à satisfação de certas necessidades sociais (ex.: Ministério do Plano e Finanças, Conselho Municipal).

a) Sentido objectivo

Objectivamente, Finanças Públicas significa a actividade através da qual o Estado ou outro ente público afecta bens económicos à satisfação de certas necessidades sociais.

b) Sentido subjectivo

4 Considerados por FREITAS DO AMARAL, Diogo, Curso de Direito Administrativo, Vol. 1, Almedina, 1992, p. 32, como as três espécies fundamentais de necessidades colectivas.

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Neste sentido a expressão Finanças Públicas é usada para identificar a Disciplina Científica que estuda os princípios e leis que regem a actividade do Estado com o fim de satisfazer necessidades sociais.

Capitulo II

Actividade financeira do Estado

1. Generalidades

A apresentação da disciplina implicou uma abordagem sintética do objecto das Finanças Públicas enquanto ramo do conhecimento científico, integrando uma perspectiva dinâmica, o seu enquadramento nas diversas escolas do pensamento económico, determinadas pelas correspondentes concepções da natureza e papel do Estado.

Independentemente dos diferentes fundamentos que, de acordo com as diversas escolas, justificam a intervenção do Estado na economia, existe um consenso acerca dos objectivos que devem pautar a actividade financeira (em sentido lato) do Estado e, bem assim, das características que essa intervenção deve revestir.

2. Definição

A actividade financeira do Estado é aquela que visa satisfazer as necessidades colectivas ou alcançar outro tipo de objectivos económicos, políticos e sociais e se concretiza na arrecadação de receitas e na realização de despesas.

Portanto, onde há utilização de meios económicos por entidades públicas, há actividade financeira.

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3. Principais objectivos

À imagem e semelhança de outros agentes económicos, a intervenção do Estado está sujeita a riscos. Dito doutro modo, a actividade financeira do Estado pode conduzir a perdas de eficiência devendo, por isso, ser objecto de criteriosa e rigorosa avaliação e controle.

Não é excessivo salientar que a obtenção de crescentes níveis de eficiência (em termos globais), deve ser a principal e a mais constante característica da actividade financeira do Estado, sendo o seu objectivo último alcançar níveis crescentes de bem-estar social.

Para tanto, o Estado pode utilizar instrumentos de incentivo ou de penalização que podem alterar o comportamento dos agentes económicos.

A actividade financeira do Estado consubstanciada, regra geral, através da política orçamental pretende atingir objectivos que podem ser assim sumariados:

a) Eficiência na afectação de recursos, b) Distribuição adequada de rendimentos, c) Estabilidade económica,

d) Crescimento e desenvolvimento económicos.

Compreendamos cada um dos objectivos.

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Um dos vectores da actividade financeira do Estado é a execução de programas de despesas que constituem a aplicação de recursos a determinados sectores e agentes económicos com vista a alcançar objectivos pré-determinados.

Como isto é possível?

Consideremos os seguintes exemplos:

(i) Admita-se que uma parcela das receitas públicas aplicada num programa nacional de reabilitação de estradas rurais. A manutenção da utilidade deste património serve um conjunto vasto de agentes económicos: o “consumo” deste serviço pelo utente “A” não reduz nem inviabiliza o “consumo” do utente “B”. Por outro lado, tanto a construção de estradas como a sua manutenção, foi e é paga com fundos estatais, podendo, eventualmente, ser construída e reabilitada por uma empresa privada estatal ou pública.

(ii) Agora, o caso da instalação de uma unidade industrial produtora de embalagens de cartão. O Estado pode decidir afectar parte das suas receitas, à realização do fundo de constituição desta empresa, sendo os bens produzidos adquiridos pelos mais variados sectores de actividade económica (tanto públicos como privados). Contudo, o consumo de embalagens pelo cliente “A”impede que o cliente “B” adquira as mesmas embalagens.

Mas uma fábrica idêntica poderia ser instalada, a partir da aplicação de poupança privada.

(iii) Considere-se ainda uma hipotética produção de material escolar por uma empresa. Esta empresa pratica um determinado nível de preços, traduzindo as condições de produção e os custos dos diferentes factores de produção. O Estado, verificando que, aos preços praticados, 90% dos alunos - correspondendo a famílias de baixos rendimentos – não tem acesso àquele material escolar, e face ao interesse de que se reveste a utilização daquele produto para os seus objectivos na área da educação, o Estado decide adquirir o material escolar à empresa e proceder à sua posterior venda aos alunos a preços diferenciados, quiçá bonificados, consoante o rendimento do respectivo agregado familiar. O Estado afectou, assim, parte das suas receitas à subvenção de material escolar que colocou à disposição de um grupo – alvo pré-estabelecido.

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(iv) Um último exemplo: face ao interesse que representa a cultura de algodão para exportação e as dificuldades financeiras dos agricultores, o sistema bancário está disposto a lançar uma linha de crédito específica para a respectiva campanha agrícola com uma taxa de juro mais baixa que a praticada correntemente. Neste caso o instrumento que incentivará a produção é a taxa de juro (política de crédito) mas a sua utilização só é possível porque o Estado irá afectar parte dos seus fundos à bonificação da taxa de juro do sistema bancário para alcançar um objectivo específico.

Dos exemplos supra, sem ser necessariamente pela ordem da sua apresentação, podemos concluir que a eficiência na afectação de recursos deve considerar:

1.o A existência de bens cujo consumo é irrival;

2.o A provisão de bens não implica que o Estado detenha a propriedade dos meios de produção;

3.o A apropriação dos meios de produção pelo Estado pode ser estimulada pelo desinteresse dos agentes económicos na produção desses bens e por razões estratégicas;

4.o A provisão pública de certos bens e serviços só se realiza com a interposição do Estado entre os produtores e consumidores, afectando uma parcela dos seus recursos financeiros.

5.o A decisão do Estado garantir um conjunto de bens e serviços, a definição das suas características e das modalidades e processo da sua disponibilização à comunidade é resultante de um consenso social, mediado pelos diferentes órgãos e instituições representativas;

6.o A provisão de bens e serviços pelo Estado abrange os chamados bens públicos e bens privados, por a garantia da sua disponibilização reflectir o interesse da colectividade.

Como se vê, para uma eficiente afectação de recursos o Estado não deve subtrair-se à rede de critérios de avaliação económica e financeira, para o que torna-se necessário medir os efeitos directos e indirectos da sua intervenção nas principais grandezas macroeconómicas, garantindo que (1,o) os objectivos são alcançáveis e (2.o) os efeitos colaterais não actuam em sentido contrário aos objectivos definidos.

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A distribuição primária5 do Rendimento Nacional entre os agentes económicos é condicionada por um complexo conjunto de factores, a saber:

1. Diferente grau de apropriação ou controle dos meios de produção e das forças produtivas; 2. Níveis desiguais no desenvolvimento das forças produtivas (agricultura, indústria, indústria/serviços);

3. Desigualdade de acesso a serviços básicos (saúde, educação, etc.); 4. Perfis de formação e especialização profissional diferenciados; 5. Aptidões próprias e diferentes capacidades individuais de trabalho; 6. Diferentes oportunidades de emprego;

7. Nível geral de preços e salários;

8. Diferente contribuição das várias regiões para a formação do Rendimento Nacional, resultante não só da aptidão natural das respectivas condições geográficas, como das alterações resultantes da intervenção dos agentes económicos, quer no sentido da sua valorização, quer na sua provável degradação.

Através das Finanças Públicas, o Estado intervém em dois sentidos contrários:

c) Primeiro, subtraindo parte dos rendimentos individuais e empresariais, através do sistema de tributação;

d) Segundo, aplicando as receitas obtidas em programas de despesas que beneficiem, directa ou indirectamente, a população e a empresa.

A aplicação das receitas obtidas pelo Estado organiza fluxos para as famílias e para as empresas, determinando a redistribuição do Rendimento Nacional.

5 Entende-se por distribuição primária do Rendimento Nacional a participação dos diferentes grupos homogéneos de agentes económicos (camponeses, pequenos proprietários rurais, operários, funcionários públicos, sector empresarial privado, sector público produtivo, etc.) na formação do Rendimento Nacional, participação esta que decorre das condições estruturais prevalecentes numa determinada formação social, num “momento” anterior à intervenção do Estado.

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A intervenção do Estado visando atingir uma adequada distribuição do rendimento não é pacífica e dela despontam várias correntes doutrinárias que, sem pretender ser exaustivo, podem assim resumir-se:

▪ A primeira posição assumia o mercado como único e mais eficiente instrumento de distribuição do rendimento e que qualquer intervenção do Estado determinaria, necessariamente, o funcionamento ineficiente do sistema económico.

Para esta escola a função distributiva das Finanças Públicas deveria cingir-se apenas à obtenção de receitas necessárias ao funcionamento do aparelho administrativo.

A chamada escola da economia do bem-estar apontava a necessidade de intervenção do Estado de forma a corrigir os desequilíbrios inerentes ao funcionamento do mercado, salvaguardando, contudo, a aplicação de rigorosos critérios de eficiência económica.

Assiste-se actualmente à alteração destas duas correntes mas não estão encerradas as polémicas em torno dos princípios de tributação e de programação das despesas públicas, seu impacto na actividade económica global, em consequência das diferentes interpretações do qualificativo adequado.

Voltar-se-á, adiante, a este tema.

▪ A escola materialista, na função distributiva das Finanças, que tem subjacente a natureza do Estado numa sociedade capitalista (independentemente do estágio do capitalismo) admite que as distorções são produto do próprio sistema (políticas objectivas das empresas e grandes sindicatos) e não das forças impessoais do mercado e, por isso, aceita a intervenção do Estado no sentido de atenuar as disparidades, e como condição necessária à manutenção e reprodução do próprio sistema.

Nas economias centralmente planificadas a função distributiva das finanças foi, apesar de presente, subalternizada comparada à de outros instrumentos de política económica.

(13)

O Estado está privilegiadamente colocado para regular o fluxo circular do produto nacional e do rendimento nacional, e neste contexto adoptar os meios para anular possíveis e indesejadas flutuações.

A actividade financeira do Estado deveria, assim, desenvolver-se no sentido de promover a máxima utilização das capacidades produtivas instaladas com um razoável nível de emprego, de preços e de endividamento externo.

Este é o conceito de estabilidade económica, estritamente associado à análise de conjuntura e não tanto à análise referente às características estruturais do sistema económico6.

Num contexto inflacionista o Estado deve intervir, retirando poder de compra, reduzindo as pressões sobre a procura e o nível geral dos preços. O Estado actuaria no sentido inverso perante expectativa de uma redução significativa da procura, evitando crises de sobreprodução e de capacidade produtiva ociosa.

A actividade financeira do Estado, com vista a alcançar a estabilidade económica, está condicionada por elementos de natureza diversa consoante as características do sistema económico em que se insere. Numa sociedade subdesenvolvida, por exemplo, a função estabilizadora da actividade financeira do Estado deve ser entendida como a necessidade de evitar (ou reduzir) as tensões persistentes nos principais agregados macroeconómicos, de forma a não comprometer a realização de actividades vitais para o crescimento e desenvolvimento económico.

3.4. Crescimento e desenvolvimento económico

O crescimento económico, que em termos reais é avaliado pelo crescimento real do produto interno a um ritmo maior que o crescimento populacional, deverá ser um dos objectivos da política económica dos governos e da actividade financeira do Estado.

6 Numa sociedade estruturalmente distorcida, como a nossa, por exemplo, deve entender-se como sendo de elevados níveis de desemprego e subemprego, atraso técnico e tecnológico, desequilíbrios sectoriais regionais, profunda desigualdade na distribuição dos rendimentos, e de alta dependência do comportamento dos mercados internacionais relativamente às suas receitas de exportação e de importação de bens de equipamento.

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O crescimento económico pode, no entanto, realizar-se sem que inicie um processo de desenvolvimento económico.

O desenvolvimento económico é, no essencial, um processo dinâmico visando alcançar a progressiva redução dos desequilíbrios entre regiões e na distribuição do rendimento nacional.

A afectação de parte das receitas do Estado a programas de investimento que aumentam a capacidade produtiva instalada e utilizada é um dos instrumentos mais poderosos que o Estado detém para quebrar o círculo vicioso do subdesenvolvimento.

Outros instrumentos são, no entanto, imprescindíveis para criar um clima em que se obtenham adequados níveis de poupança e aplicações eficientes.

A correcta inserção da actividade financeira do Estado como componente do sistema de direcção económica, e a sua articulação com as actividades de planeamento económico, constituem factores relevantes para que o crescimento e o desenvolvimento sejam alcançáveis.

4. Necessidades Públicas

A actividade financeira do Estado, é o objecto das Finanças Públicas, e justifica-se pela obrigação que o Estado tem de satisfazer necessidades públicas ou colectivas não satisfeitas através da actividade económica privada, por para elas se exigirem bens de consumo passivo, isto é, que não exigem nenhuma actividade do consumidor, bastando, para a sua utilização, que existam.

Exactamente porque as necessidades públicas são de satisfação passiva, não exigindo nenhuma actividade do consumidor, os bens aptos a satisfazê-las são de consumo inexcluível, irrival e indivisível7.

7 Para maior desenvolvimento, veja-se o nosso Introdução ao Direito Fiscal, W&W – Editora, Maputo, 2002, pp. 9 e ss.

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São estas características de certos bens de consumo passivo que levam o Estado a produzir esses determinados bens que podem ser públicos8, ou puramente públicos ou públicos por natureza9.

A produção destes bens implica despesas cuja cobertura exige financiamento através de receitas que podem decorrer de preços10, de contraimento de empréstimos ou de impostos, seguramente o principal, o mais definitivo meio de financiamento e a receita coactiva por excelência.

A referência a estas receitas não teve objectivos enunciativos, mas tem apenas um carácter exemplificativo.

A actividade financeira do Estado decorre da existência das necessidades colectivas resultam da organização e das exigências das colectividades em que o homem está inserido; diferentemente das necessidades individuais ou puramente privadas11, o homem não as sentiria se não vivesse em sociedade.

Insiste-se, é esta actividade de sentidos distintos mas complementares de realização de despesas e de arrecadação de receitas com o fim de satisfazer necessidades públicas que se entende por actividade financeira.

A actividade financeira do Estado corresponde à utilização de meios económicos para satisfação de necessidades que o mercado é incapaz.

4.1. Causas de incapacidade do mercado

O Professor Sousa Franco12 ensina: “A afectação de recursos neste sistema [de economia de mercado13] é dominada pelo princípio de que os sujeitos não produzem nem obtêm por troca bens cujo

8 Bens que só satisfazem necessidades colectivas.

9 SOUSA FRANCO, A., ob. cit., p. 26.

10 Pela venda de bens que produz. de seu património, ou de serviços cujos rendimentos líquidos destina à cobertura das despesas públicas para a satisfação de necessidades colectivas.

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custo de produção (desutilidade da sua obtenção) seja superior à utilidade que auferem. É possível demonstrar que a mais eficiente afectação de recursos e, como regra, a que tendencialmente se situa no ponto de igualdade entre o preço de cada bem e o seu custo marginal. A fixação de preços afastados deste nível terá como consequência que, se o preço for inferior ao custo marginal, isso maximizará o benefício do consumidor – mas a consequência é que a procura aumentará e fará subir os preços. Ao invés, se o preço for superior ao custo marginal, isso tenderá a maximizar o benefício do produtor mas a procura diminuirá, sendo a oferta excessiva, o preço tenderá a crescer. É esta simples regra que explica o ajustamento das quantidades e dos valores, definindo o equilíbrio do produtor, o do consumidor e os dos mercados dos vários bens: e daí até ao equilíbrio económico geral”.

Mas não é apenas a afectação dos bens que interessa mas a sua distribuição eficiente14. Para esta distribuição eficiente ou óptima15 nem sempre o mercado se mostra apto. A primeira causa seria a incapacidade de criar a optimização em certas áreas, optando-se ou por delas prescindir, o que tornaria impossível em sociedade, ou pela sua produção alternativa, uma solução racional.

A segunda causa seriam as características dos bens colectivos tipicamente16de satisfação passiva, não exclusivos (de consumo inexcluível) e não cumulativos no sentido de serem de consumo irrival na medida em que os utilizadores no seu consumo não entram em concorrência.

Quando os preços de produção baixam, por efeito do monopólio, a renda monopolista situa-se acima do preço normal causando prejuízos aos consumidores.

O Estado é chamado a intervir directamente ou por acção regulativa de modo a caminhar no sentido do restabelecimento das regras do óptimo no mercado17 de que o mercado foi incapaz.

12 Ob. cit., p. 19.

13 Não qualquer sistema livre em que o Estado apenas garante a ordem social.

14 Aquela permite um bem-estar melhor sem afectar a situação dos restantes cidadãos , o mesmo que dizer, (segundo SOUSA FRANCO, António, ob, cit., p. 23), “quando não for possível nenhuma melhoria na situação de qualquer dos membros sem prejudicar os restantes”.

15 SOUSA FRANCO, António, ob. cit., p. 25.

16 SOUSA FRANCO, António, ob. cit., pp. 26 e 27.

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Está também claro que o mercado seria incapaz da socialização da exterioridade através da imposição de custos compensadores do benefício apropriado ou da apropriação dos proveitos gerados18. Com efeito, por exemplo a negociação e cobrança ao poluidor por cada particular prejudicado é difícil senão mesmo impossível.

A incerteza e o elevado risco de certas actividades económicas ou sociais afasta os operadores sendo o Estado a ter de ocupar o seu espaço por clara incapacidade do Estado.

A recriação das condições de mercado, a defesa do consumidor, a defesa da concorrência e a redistribuição da riqueza não são objectivos possíveis através do mercado.

Como se vê, o Estado aparece a actuar para criar níveis aceitáveis de bem-estar, para introduzir correcções de funcionamento do mercado e supletivamente às actuações dos sujeitos económicos não dominados pela lógica do mercado.

O Estado cria as condições sem as quais a colectividade pereceria; o Estado tem que gerar e gerir os bens de custos uniformemente decrescentes, tem que socializar exterioridades e assumir os que ninguém quer correr; porque só ele pode defender o interesse geral, tem uma perspectiva ilimitada do tempo, dispõe de autoridade para impor regras de utilização de bens sem outro tipo de financiamento.

5. Finanças Públicas e Finanças Privadas

Do que se disse pode concluir-se que o Estado tem necessidades a satisfazer tanto quanto os particulares, não obstante haja diferenças entre as características de actividade financeira desenvolvida por uns e outros, particularmente nos modos de financiamento.

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Os meios de financiamento usados pelos particulares, incluídas aqui também as empresas privadas, são de natureza contratual, havendo sempre uma relação de troca que tem o preço como a expressão da contraprestação.

Não que o Estado não possa recorrer a este tipo de financiamento mas é certo que esta receita não é significativa. As mais significativas receitas não provêem de um exercício que implique contraprestação do Estado ao cidadão, decorrendo do exercício do seu imperium.

O facto de o Estado dispor de impostos seria, pois, a primeira diferença a registar entre Finanças Públicas e finanças privadas..

A outra, que deve ser entendida habilmente19, reside no facto de os privados determinarem as despesas em função das suas receitas efectivas enquanto que o Estado através de vários meios, o mais poderoso dos quais é o imposto, não subordina estritamente as suas despesas às receitas.

Por fim, enquanto o fim último das finanças privadas é produzir o lucro, conseguido pela produção de bens ou serviços com despesas mínimas e sua venda pela receita máxima, o Estado não tem como fim contabilizar receitas superiores às despesas, preordenando-se à satisfação de necessidades colectivas, de que atrás falámos.

Aponta-se ainda como traço distintivo entre as duas finanças – públicas e privadas – a circunstância de estas dizerem respeito aos aspectos monetários do financiamento dos agentes económicos (moeda e crédito) enquanto aquelas respeitam à actividade económica de entes públicos com o fim de satisfazer necessidades colectivas20.

19 Não queremos que se vá concluir que a capacidade do Estado gastar é infinitamente elástica. Cada vez mais o Estado vai ou deve ir moderando o exercício do seu poder de lançar impostos, dada a crescente capacidade dos cidadãos resistirem vitoriosos ao seu agravamento. Acresce ainda o facto de o Estado estar mais atento ao efeito dos desequilíbrios, em particular dos défices orçamentais, sobre a economia.

(19)

As finanças públicas são seguramente diferentes das privadas, designando duas realidades distintas21.

6. O fenómeno financeiro

É a realidade e o objecto científico das Finanças Públicas, o modo como se estabelecem as reacções entre pessoas e as instituições sociais, de um lado, e o Estado ou outros entes públicos, doutro.

O fenómeno financeiro é identificável na economia privada, social e pública no sentido de que todos os agentes económicos numa sociedade exercem a sua actividade de variadíssimas formas.

Famílias, indivíduos ou mesmo organizações têm como base nas suas relações económicas o contrato. A Economia Privada, em regra, é contratual.

Noutros casos as cooperativas desenvolvem a sua capacidade numa base comunitária. É a Economia Comunitária, cooperativa ou colectivista.

Existem casos em que as pessoas se organizam em grupos de interesse político com o objectivo de atender a satisfação de interesses sociais recorrendo a poderes de autoridade para atingir tais objectivos. É a Economia Pública.

Do exposto depreende-se que:

a) A Economia Privada é caracterizada pela livre atracção dos agentes económicos; numa economia de mercado fixa os preços de acordo com a oferta e a procura existentes; a base fundamental para o contrato;

21 Não tem ainda consagração generalizada o uso distinto dos vocábulos financial para qualificar as finanças privadas e financeiro para as finanças públicas que o Professor Sousa Franco (ob. cit., p. 3) emprega.

(20)

b) Na Economia Comunitária temos a solidariedade do grupo. Combina-se a propriedade privada e a propriedade social ou comunitária;

c) Na Economia Pública temos uma solidariedade organizada e dotada de poder político.

O fenómeno financeiro é, assim, em sentido lato, o conjunto das modalidades, instituições, processos, instrumentos e técnicas que tornam inteligível a apropriação e utilização de bens ou meios económicos por parte de entidades públicas, com o objectivo de satisfazer determinadas necessidades sociais, desenvolvendo uma actividade de natureza económica.

O fenómeno financeiro é um termómetro22 das relações existentes entre o poder e a sociedade onde ele se exerce.

Desenrolando-se numa sociedade politicamente organizada tem normas jurídicas que o enquadram e tem uma natureza multifacetada.

Este conceito é, possivelmente, demasiado abrangente se considerarmos que outras áreas de estudo têm zonas de intersecção com as Finanças Públicas. Contudo, trata-se de valorizar, devidamente, o carácter não exclusivamente financeiro desta actividade, incorporando-lhe aspectos relevantes para a sua inserção no conjunto das ciências sociais.

Como fenómeno social, pode ser encarado sob três perspectivas: política, económica e jurídica.

6.1. Perspectiva política do fenómeno financeiro

O fenómeno financeiro pressupõe um processo organizado e coactivo de determinação, hierarquização e satisfação das necessidades públicas.

22 SOUSA FRANCO, ob. Cit., p. 5.

(21)

Por isso, em nenhum caso o fenómeno financeiro pode assumir uma posição de completa neutralidade política23 e deixar de reflectir as concepções políticas dominantes no meio social em que se verifica.

O fenómeno financeiro não é uma criação da vontade política nos pressupostos a ela ajustáveis.

Bem se vê que a actividade financeira implica (1) a existência de necessidades sociais, sentidas pelos indivíduos (elementos integrantes da sociedade) e pela sociedade, ela mesma, e a existência (2) de um processo pelo qual são determinadas as necessidades a satisfazer.

Não se conclua, porém, ser absoluto que a actividade financeira só é possível num quadro estadual.

Por exemplo, as comunidades religiosas, organizações internacionais e entidades infra-estaduais são capazes de actividade financeira ou quase financeira.

(i) Organizações religiosas

Em relação às comunidades religiosas, as necessidades colectivas são financiadas através de doações espontâneas, do pagamento de taxas para certos serviços, mexendo-se num domínio de actividade própria, não recorrendo à coacção pública.

Nem sempre, porém, o elemento coacção, necessário à caracterização da actividade financeira, está ausente.

(ii) Organizações internacionais

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Fora o reconhecimento da existência de regras internacionais com repercussão na actividade financeira dos Estados (tratados, convenções, etc.), as organizações internacionais têm forma de financiamento e processos internos que se aproximam dos que são próprios dos Estados. Esta actividade financeira cria as chamadas finanças supranacionais.

(iii) Comunidades infra-estaduais

Não esgota o Estado a satisfação das necessidades públicas. Há entidades que exercem uma verdadeira actividade financeira. Tal é o caso dos Fundos (FUTUR, FUNDAC – Fundo para o Desenvolvimento Artístico e Cultural), Empresas Públicas, Serviços e Autarquias locais.

São entidades com autonomia financeira pela qual têm o direito de organizarem orçamento privativo, de possuírem receitas próprias e de não carecerem, por isso, de autorização para a realização das suas despesas.

6.2. Perspectiva jurídica do fenómeno financeiro

À volta do fenómeno financeiro, criou-se e desenvolveu-se um conjunto de normas jurídicas que configuram, hoje, regimes próprios, diferentes de direito comum e de outros ramos do direito público.

Estas normas regulam a actividade do Estado em dois planos:

a) Plano de organização e funcionamento do aparelho financeiro; b) Plano das relações entre o Estado e os particulares.

É neste segundo plano, em que reside a preocupação de dar garantias aos particulares, aspecto essencial para a defesa dos seus direitos e interesses contra eventuais abusos do Estado.

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Por poder deve entender-se o poder político, que é a forma de organização do Estado ou, melhor, a capacidade de influenciar comportamentos. Ligado a este aspecto temos a actividade económica, entanto que processo orgânico de satisfação de necessidades humanas mediante afectação de bens materiais raros a fins alternativos individuais ou sociais, privados, comunitários ou públicos.

Daqui resultam relações, como atrás se disse, de três tipos que se seguem:

7.1. Ordenação Económica

A Ordenação Económica ou domínio da ordenação económica24 corresponde à função da máquina política à qual compete a definição do quadro geral de natureza jurídica e social em que se desenvolve a actividade económica, que inclui a constituição económica, a legislação económica, as directivas e decisões concretas da administração económica, isto é, o aspecto jurídico fundamental como forma de normar a actividade económica.

Teremos, neste caso, a política financeira de redistribuição pela qual se transfere parte dos rendimentos dos que se encontram acima da nédia para os que se encontram abaixo da linha dos rendimentos médios, isto é, dá-se dos ricos aos pobres.

Os argumentos para esta redistribuição são vários:

a) Injustos desníveis de rendimentos que, julga-se, não dependem do esforço ou do mérito;

b) O carácter desumano da carência de bens essenciais e do negar-se a dignidade das pessoas;

c) O inconveniente das consequências nocivas das situações de pobreza;

d) A incorrecção das diferenças dos pontos de partida, comprometendo e agredindo uma competição leal.

(24)

Já se vê que por mais liberal que seja a filosofia económica e social de um Estado, daqui resulta a necessidade de se definir a doutrina ou a política económica e social que deverá ser por ele seguida, por exemplo, se de inspiração abstencionista, se liberal, se socialista ou se intervencionista.

Na política económica e social há, sem dúvida, um comportamento, uma actuação interligada do Estado e dos sujeitos privados.

É o Estado, o agente regulador da economia, que deve garantir o cumprimento da actividade económica, fazendo valer a norma jurídica económica.

Este conjunto de normas fundamentais que subordinam a doutrina ou filosofia social é a constituição económica a partir da qual podem emergir normas que constituem a legislação ou regulamentação económica e institucional geral ou periférica, nomeadamente sectorial (ex.: agricultura, indústria ...).

Como forma de ordenação temos, ainda, a administração e a jurisdição exercida pela Administração activa ou pelos Tribunais, respectivamente. Sem interferir, directamente, coordena-se e ordena-se o comportamento dos sujeitos económicos, definindo e exercitando padrões e quadros em cujo âmbito deve livremente desenvolverem-se.

7.2. Intervenção económica

A intervenção do Estado na economia poderá ser directa ou indirecta, consoante os casos em que o interesse se mostrar evidente obrigando o Estado a tomar posição.

Com a sua intervenção na economia o Estado modifica o comportamento dos restantes agentes económicos.

(25)

A forma mais racionalizada de intervenção é a política económica. Pela intervenção o Estado altera o comportamento dos produtores e consumidores sem tomar decisões sobre a utilização de bens e satisfação das necessidades sociais.

A intervenção económica estadual pode, entre outras, ser através de:

- Taxas de juro para influenciar o investimento;

- Taxas cambiais para intervir na área das exportações e importações; - Benefícios fiscais para incentivar o investimento;

- Limites prudenciais, como elementos de persuasão; - Tabelamento de preços, como medida anti-inflacionista; - Agravamento ou desagravamento tributário;

- Fixação de quotas de produção.

Como se vê, na intervenção o Estado não é ele próprio sujeito económico25.

7.3. Actuação Económica do Estado

O Estado pode actuar como agente económico. A extensão dessa actividade é, porém, variável.

Há serviços que pode entender-se que só o Estado poderá garantir aos cidadãos tais como o de abastecimento de água, energia, saúde, administração de justiça, defesa e segurança. Na actividade económica directa do Estado, o Estado, ele próprio, actua como agente ou sujeito económico, formulando escolhas ou opções económicas no interesse da comunidade.

(26)

Não há fronteiras estanques entre ordenação, intervenção e actuação nem mutuamente se excluem, existindo nos Estados modernos cumulativamente, com graus diferentes, conforme as razões, objectivos e tempo.

8. Decisão política e decisão financeira

As decisões tomadas no âmbito do poder político levantam sempre dúvidas quanto à sua validade ou eficiência, na prossecução dos objectivos do Estado.

No âmbito das finanças idênticas dúvidas sobre a eficiência das opções do Estado seja qual for a sua concepção26 ou a sua forma doutrinária27.

A decisão financeira é tomada em função de interesses dos governantes que buscam simpatias e suporte político e, como decisão económica, que também é, não está isenta das disputas do poder por pessoas ou grupos destas.

O cidadão deposita o voto para maximizar o seu interesse individual ou dos partidos que apoiam.

Os partidos comportam-se como que num mercado; disputam o monopólio do poder “como concorrentes de oferta relativamente a uma procura expressa no voto dos eleitores”28

, predispondo-se a praticar políticas populistas, antes das eleições, para ganhar a preferência dos eleitores e políticas impopulares depois das eleições, em clara confirmação da existência de ciclos político-económicos. A determinação da função de preferência dos eleitores e da função de popularidade dos governos, componente idealista, cria incapacidades e irracionalidades do Estado.

26 Estado soberano, Estado República, Estado de Classe, Estado conglomerado – ver SOUSA FRANCO, ob. cit., p. 75.

27 Sem querermos ser exaustivos, podemos ter o Estado patrimonial, Estado-polícia, Estado guarda nocturno, Estado de serviços, Estado providência, Estado de bem-estar, Estado de desenvolvimento, Estado de Direito Democrático ou autocrático, Estado social, Estado Tecnológico, Estado de cultura, Estado autoritário e Estado totalitário.

(27)

Os tecnoburocratas condicionam a decisão financeira, pelo seu saber, pelo “poder de agenda”29 e pela sub-regulamentação burocrática.

O Estado, na sua missão de prosseguir o bem-estar social, tem tomado decisões cujo objectivo é fortalecer o seu poder político independentemente do resultado de tal decisão.

Noutros momentos, as decisões que o Estado toma no âmbito das finanças têm a ver com a análise dos processos e objectivos na actividade financeira.

No primeiro caso, a decisão política é tomada por consenso mínimo social30, livre31, implícito ou explícito, no exercício da democracia.

No segundo caso (decisão financeira) obedece a princípios da actividade financeira do Estado, das opções tendentes à satisfação pública das necessidades e ao nível do sector público, em confronto com o privado, tendo em atenção a base do financiamento disponível.

A decisão financeira, tendencialmente bipolar, abrange a provisão de bens e o financiamento, sabido que os bens mercantes (provisionados) são produzidos para o mercado e nele são avaliados e que os bens colectivos ou públicos são produzidos fora do mercado e, a maior parte, avaliados através de critérios próprios do poder político.

Qual é o consenso mínimo social, de que atrás falámos?

29 Levantam problemas, traçam alternativas, comandam a execução e ganham influência.

30 Um consenso social, segundo o Professor Sousa Franco (ob. cit., p. 88) tem três características essenciais: (1) incide sobre aspectos fundamentais da sociedade, (2) deriva da situação de incerteza (pois caso ela não exista dificulta-se, impossibilita-se o acordo por sobrevalorização da sua posição) quanto ao futuro; (3) voluntário, espontâneo, livre e esmagadoramente unânime.

31 Designa-se de livre o consenso que decorre de um entendimento (voluntário e unânime) implícito entre a generalidade dos cidadãos, individualmente ou organizados em grupo sobre instituições e modos de organização, como por exemplo sobre o processo de tomada de decisões, isto é, sobre a regra de definição de regras.

(28)

É o que abrange as regras fundamentais e instituições da sociedade, tais como a liberdade económica e a propriedade privada, a estruturação do Estado limitada aos direitos individuais e à participação dos cidadãos, através da democracia económica e financeira, da democracia directa, semi-directa e da co-decisão.

Capitulo III

Os sistemas económicos: doutrinas e regimes

1. Aspectos gerais e conceitos

A intervenção do Estado, utilizando medidas de compensação e utilizando medidas de compensação e correcção, justifica-se pelas limitações, incapacidades ou falhas32 do mercado que, apesar de poder fazer uma eficiente gestão de recursos, não está em condições de fazer a melhor redistribuição de rendimentos.

Por regime económico entendem-se todas as formas de articulação estrutural do poder político com a actividade económica.

Ora, antes interessa, falar do conceito de sistema económico que cobre realidades diversas.

Partindo de noção fundamental de sistema como sendo o conjunto de elementos unidos por um conjunto de relações, teremos que o sistema económico integra formas típicas e globais de organização e funcionamento da sociedade em geral e da sua actividade económica em especial33.

32 SOUSA FRANCO, A., ob. cit., p. 17.

33 Para aprofundamento, veja-se SOUSA FRANCO, A., ob. cit., p. 48 e PEREIRA DE SOUSA, Domingos, Finanças Públicas, Universidade Técnica, ISCSP, Lisboa, 1992, p. 59.

(29)

Quanto ao sistema financeiro temos que ele exerce funções que podem constituir fins possíveis da sua gestão, configurando grandes tipos e efeitos objectivos resultantes do respectivo financiamento, com destaque para as funções sociais do Estado.

Os sistemas económicos remontam do período pré-industrial e industrial por excelência, resultando em sistemas pré-industriais e em sistemas da sociedade industrial.

A revolução industrial aparece como elemento chave de delimitação do sistema económico no tempo, faz a ruptura fundamental, constituindo um marco histórico importante.

Destaque para as alterações técnicas e formas de organização institucional e da actividade económica.

De seguida enunciam-se os sistemas económicos dominantes e as instituições que lhes são características.

2. Os sistemas económicos dominantes na actividade são:

Sistema económico capitalista

O sistema económico capitalista tem como base os ideais liberalistas, as regras de iniciativa privada dos agentes económicos e a livre concorrência.

É o sistema mais antigo e emerge da revolução industrial e caracteriza-se por34:

a) Existência de um conjunto de instituições jurídico-sociais típicas;

(30)

b) Um conjunto de princípios, leis económicas fundamentais que regulam o funcionamento da vida económica;

c) Um móbil específico das actividades económicas.

Quanto a instituições

No domínio da produção salientam-se o capital e a empresa. Para o funcionamento do sistema capitalista integram-se no quadro organizacional:

a) A propriedade privada;

b) Iniciativa privada da qual destaca-se . liberdade de contratar,

. liberdade de trabalho, . liberdade de empresa.

Princípios económicos

Os princípios fundamentais deste sistema são os seguintes:

a) Princípio de mercado, onde se destacam as regras da oferta e da procura;

b) A propriedade privada e a liberdade económica como condições básicas para o progresso e bem-estar social de todo o povo;

c) O lucro como motivação típica, ao contrário do que acontece no sistema colectivista.

Regimes

(31)

A. Liberalismo; e B. Intervencionismo35.

2.4.1. O liberalismo

No liberalismo temos como características as finanças clássicas ou neutrais, com um reduzido peso do poder político na actividade económica, por entender-se que a economia privada, através do mecanismo dos mercados, pode assegurar o máximo de produção e a recta distribuição do rendimento36.

No liberalismo as finanças públicas são dominadas pelas seguintes perspectivas:

a) Quanto ao seu lugar e função: dominam os princípios de privatização da economia, sector público reduzido, mínimo quantitativo e qualitativo e simplicidade da actividade económica;

b) Quanto às suas relações com a economia privada: dominam as ideias de separação entre finanças e economia, elasticidade dos fenómenos e abstracção económica do Estado;

c) Quanto à estrutura jurídica das finanças: os aspectos principais resumem-se na importância da participação democrática parlamentar na actividade financeira, arbitragem entre o poder público e o direito privado, em ordem a garantir os direitos do homem cidadão-proprietário e o princípio da legalidade;

d) Quanto à configuração dos instrumentos financeiros: a importância primordial do imposto e do equilíbrio orçamental.

2.4.2. O intervencionismo

35 Sobre estes dois regimes, para maiores desenvolvimentos, veja-se SOUSA FRANCO, ob. cit., pp. 50 a 66.

(32)

No intervencionismo encontramos as finanças activas, modernas ou funcionais37, as quais são dominadas pelo critério de intervenção do Estado sobre a actividade económico-social38 com vista a modificar as condições da economia privada39.

Seguindo o mesmo critério, vejamos os traços definidores das finanças públicas intervencionistas:

a) Quanto ao seu lugar e função: autonomia do sector público (que passa a ter, para além da supletiva satisfação das necessidades colectivas, realiza objectivos de política económica e social), equilíbrio entre economias pública e privada, regra do óptimo (melhor satisfação das necessidades públicas e o óptimo social), crescente dimensão, pluralidade e complexidade do sector público;

b) Quanto às relações entre actividade financeira e economia privada: o princípio é o da integração entre economia e finanças, finanças funcionais (que visam realizar fins financeiros e extra-financeiros) e finanças activas e o Estado a abandonar a sua passividade e atitude abstencionista;

c) Quanto à evolução das instituições jurídico-políticas: os aspectos de garantia individual e predomínio parlamentar alteram com o declínio da instituição parlamentar (tecnoburocratização das decisões) e formas de participação diversificada da sociedade (civil), afirmação predominante dos direitos económicos e sociais e limitações ao princípio de legalidade;

d) Em relação às instituições financeiras assiste-se ao ressurgimento do património (mobiliário e imobiliário), à saturação fiscal (com o imposto a ter uma utilização extra-fiscal e subida contínua da carga fiscal real e psicológica), limitações ao princípio do equilíbrio orçamental com recurso a receitas não efectivas.

2.5. Intervencionismo stricto sensu e dirigismo

Antes de passar para o estudo de outros sistemas importa sublinhar que no intervencionismo financeiro devemos distinguir o intervencionismo stricto sensu, no qual o Estado só

37 Finanças funcionais porque a escolha dos instrumentos financeiros depende dos efeitos que cada uma delas exerce na economia – para mais desenvolvimentos, veja-se TEIXEIRA RIBEIRO, ob. cit., p. 43

38 SOUSA FRANCO, A., ob, cit., p. 51.

(33)

intervém no caso de o livre comportamento dos agentes económicos não resultar no progresso e o bem-estar geral do dirigismo.

No dirigismo o Estado fixa objectivos globais para a actuação económica e para os sujeitos económicos e para os sujeitos económicos que pautam a sua actividade por aqueles objectivos fixados para toda a economia.

Trata-se, pois, como diz o Professor Sousa Franco40, de uma diferença qualitativa uma vez que no intervencionismo preside a ideia de correcção enquanto no dirigismo, como a expressão sugere, há uma clara ideia de direcção da economia.

2.6. Principais factores para as finanças modernas

A concepção política do Estado actuante, isto é, regulador e produtor decorre de vários factores que a seguir sumariamente se expõem, na linha do Professor Sousa Franco41:

a) Evolução interna das economias liberais, onde se assiste à passagem do sufrágio de censitário a universal e ao aumento da intervenção das classes mais desfavorecidas, ao aparecimento de partidos trabalhistas e socialistas, crescente concentração de empresas, diversificação dos modelos de desenvolvimento e à profissionalização das forças armadas crescentemente caras;

b) Movimentos doutrinários e teóricos entre as quais as teorias marcantes de Keynes e Wicksell defendendo a existência de factores permanentes e fundamentais de desequilíbrios na economia que só a intervenção do Estado podia corrigir, e as correntes ideológicas antiliberais (socialistas e doutrina social da Igreja);

c) A primeira grande guerra;

d) A necessidade de restabelecimento depois das guerras por entender-se a paz, a abundância e a prosperidade bens maiores e mais apetecíveis à liberdade individual pois, de facto, é preferível libertar-se da miséria do que ter a oferta da liberdade jurídica teórica42.

40 Ob. Cit., p. 62.

41 Ob. Cit., p. 58.

(34)

e) A crise de 1929 e a grande depressão que impôs a intervenção na economia à maioria dos governos em destacar-se as políticas “New Deal” que consagraram o afastamento do princípio do equilíbrio orçamental, um dos alicerces das finanças clássicas;

f) Novas teorias económicas em que Keynes, impulsionador do “Welfare State”, defende a intervenção do Estado para corrigir desequilíbrios que conduzem, por exemplo, ao desemprego;

g) As crises do petróleo que demonstraram a necessidade de uma Nova Ordem Económica Internacional;

h) Outras, tais como o surgimento dos Não-Alinhados (trazendo experiências de novos sistemas económicos), as descolonizações, etc..

2.7. Sistema económico colectivista

2.7.1. Generalidades

Caracterizam os sistemas colectivos três traços tais como a apropriação pública dos meios de produção, o papel central do plano como super-lei e o interesse estatal, a solidariedade e o bem-estar colectivo como motivações dominantes.

O caso paradigmático é o da URSS – União das Repúblicas Socialistas Soviéticas43, onde por o Estado ser o principal produtor pergunta-se ser correcto falar da fronteira entre actividade financeira e economia privada. A resposta afirmativa decorre de se reconhecer que se justifica a distinção entre o sector público administrativo e o sector público produtivo, entre o orçamento e a actividade empresarial do Estado44.

Embora as instituições sejam idênticas às dos sistemas capitalistas as funções diferem e passamos a estudá-las.

43 Anterior à prossecução dos princípios de glos nost (transferência) e perestroika (reestruturação) de Mikhail Gorbatchov.

(35)

2.7.2 Funções dos instrumentos financeiros

A primeira função dos instrumentos financeiros, na fase revolucionária de implementação do socialismo, é a de desapropriação.

Na fase de transição os instrumentos financeiros visam assegurar actividades colectivas essenciais não produtivas, o equilíbrio sectorial e regional na distribuição dos recursos; o orçamento funciona como instrumento da execução do plano e de canalização de recursos estéreis para o funcionamento das actividades públicas ou socialmente úteis.

2.7.3. Características fundamentais dos instrumentos financeiros

Podem apontar-se como características fundamentais dos instrumentos financeiros:

a) A relevância do orçamento na execução do plano; b) Relevo das receitas patrimoniais;

c) Reduzida pressão social; d) Equilíbrio orçamental.

Capitulo IV

Conceito, natureza, autonomia e relações do Direito Financeiro

1. Aspectos introdutórios

(36)

A actividade financeira do Estado, dada a sua característica especial, envolve, como já se disse, em virtude da complexidade de interesses em jogo e das estruturas envolvidas, normas jurídicas que aglutinadas à actividade financeira do Estado constituem Direito Financeiro.

As normas do Direito Financeiro abrangem:

a) Organização e funcionamento interno da actividade financeira do Estado e demais entidades; b) Relações financeiras entre o Estado e outras entidades, nomeadamente os particulares.

No primeiro caso temos englobadas as normas de Direito Constitucional e Direito Administrativo onde se incluem matérias inerentes à competência quanto à aprovação do orçamento e a sua autorização política; a fiscalização financeira e a execução orçamental; o património e o tesouro do Estado.

No segundo caso, temos normas relativas ao direito das receitas e financiamento das necessidades públicas e que regulamentam os aspectos atinentes ao imposto e outros tributos, ao crédito público, entre outras fontes de receitas do Estado.

2. O conceito de Direito Financeiro

Por Direito Financeiro designa-se o conjunto de normas jurídicas que regulam a actividade económica do Estado ou outro ente público com vista à afectação de bens para a satisfação de necessidades sociais, isto é, as normas que regulam a obtenção, a gestão e o dispêndio dos meios financeiros públicos45 ou, ainda, o ramo do Direito que disciplina juridicamente a actividade do Estado.

O Direito Financeiro regula, pois, mediante um regime próprio, parte46 da actividade financeira do Estado.

45 TEIXEIRA RIBEIRO, José Joaquim, Lições de Finanças Públicas, 5.a Edição, Coimbra Editora, 1997, p. 46.

46 Dizemos parte porque o Direito Financeiro não é o único revestimento jurídico da actividade financeira, havendo aspectos deste que se reportam ao Direito Constitucional, ao Direito Administrativo e ao Direito comum.

(37)

O Direito Financeiro projecta-se para além de normas internas de organização, para as garantias dos particulares e para os princípios da autorização, legalidade, controlo e intervenção judicial47.

A actividade financeira, repete-se, que se concretiza em receitas e despesas que dão origem a complexas arbitragens de intervenção nas relações entre os particulares e o Estado que, num Estado de Direito, têm que submeter-se a normas jurídicas, e a uma organização em razão dos fins públicos.

As normas de Direito Financeiro abrangem as áreas seguintes:

(i) Direito Constitucional Financeiro: princípios fundamentais de organização e exercício de poder político e da actividade financeira do Estado e a sua estrutura;

(ii) Direito de Administração Financeira: regula a actividade administrativa financeira do Estado. Usa como base também as normas do Direito Administrativo;

(iii) Direito Patrimonial: normas reguladoras do património do Estado;

(iv) Direito Orçamental: regula o regime geral do Orçamento do Estado e a sua execução; (v) Direito das Receitas: (Direito Tributário, Direito Fiscal) que estabelece as regras quanto ao regime jurídico dos impostos, Direito do Crédito Público praticado em regime especial por entidades públicas;

(vi) Direito Processual Financeiro: regula a organização e funcionamento processual da Administração e dos Tribunais Financeiros com destaque para os fiscais e os de contas.

3. Natureza do Direito Financeiro

Qualquer que seja o critério perfilhado – o do interesse, o da posição relativa dos sujeitos ou da qualidade em que intervêm na relação jurídica – é pacífica a qualificação do Direito Financeiro como um ramo do Direito Público.

(38)

É certo, pelo que temos vindo a estudar, que este ramo – o Direito Financeiro – prossegue a realização de interesses colectivos, com um dos sujeitos – o Estado – investido de garantias e poderes próprios.

A existência de receitas patrimoniais em regra disciplinadas pelo Direito Privado não retira a homogeneidade deste Direito tão pouco as características já enunciadas que o enquadram no Direito Público.

4. Autonomia do Direito Financeiro

Controvertido é o problema da autonomia do Direito Financeiro havendo os que reclamam a sua autonomia do Direito Administrativo e os que sustentam a não autonomia.

O Direito Financeiro, tal como qualquer ramo de Direito, caracteriza-se por ter uma função própria de que decorrem conteúdos e normativos próprios e regimes específicos48, autónomos, coerentes, axiológica e normativamente unidos, e por ter instituições e vida próprias.

Estas características delimitam-no como um ramo de Direito com uma relativa e convencional autonomia49.

Aos administrativistas dir-se-á que apesar de se reconhecer que a actividade financeira é uma actividade política e administrativa não pode o Direito Financeiro confundir-se com o Direito Administrativo, caracterizado pelo poder e autoridade administrativos. O Direito Financeiro, com a génese nos séculos XVII e XVIII na Inglaterra, para além de ser anterior ao Direito Administrativo que é fruto do liberalismo (séc. XIX) resulta da preocupação de delimitar os poderes da Administração em relação aos cidadãos e do primado do Poder Legislativo.

48 Sobre a evolução histórica do Direito Financeiro: ARMINDO MONTEIRO, Introdução ao Estado de Direito Fiscal na “Revista da Faculdade de Direito de Lisboa”, Vol. 6, 1949, pp. e 36 ss; SOARES MARTINEZ, Da personalidade tributária, Lisboa, 1953, pp. 51 e ss; Elementos para um Curso de Direito Fiscal em “Ciência e Técnica Fiscal”, n.o 138 (Junho de 1970), pp. 14-25.

(39)

Admitida a plurivocidade do termo autonomia importa delimitar que a autonomia que é defendida é legislativa, didáctica e científica, não havendo dúvidas que o Direito Financeiro cifra-se na existência de leis próprias e de um sistema próprio de fontes, constitui em muitas escolas uma disciplina específica no plano curricular dos estudos.

Entende-se, pois, que o Direito Financeiro não é estanque, aceitando normas subsidiárias de tratamento das matérias no seu âmbito desde que não se confrontem com os princípios próprios do mesmo.

Apesar disso a autonomia de Direito Financeiro é uma questão assente; uma vez igualmente assente a autonomização de certos tipos de normas em virtude de sua conexão com uma função delimitada.

5. Divisão do Direito Financeiro

A actividade financeira objecto do Direito Financeiro, comporta a obtenção de receitas, a realização de despesas e a previsão e contabilização daquela e destas, do que pode dizer-se que o Direito Financeiro contém o Direito das Despesas, o Direito das Receitas e o Direito da Administração Financeira.

No Direito das Receitas, por sua vez, podem distinguir-se o Direito Tributário que regula a aquisição de todas as receitas coactivas e o Direito Fiscal que regula, em especial, os impostos e o seu processo administrativo.

6. A relação do Direito Financeiro e outros ramos do Direito

Entre os vários ramos do Direito não existem compartimentos estanques mas interinfluência, quer de soluções, quer dogmática.

O Direito Financeiro tem mais afinidades com os seguintes ramos, de que recebe importantes contributos:

(40)

a) Direito Constitucional

Esta relação é compreensível partindo do pressuposto de que a Constituição é a mater legis.

b) Direito Administrativo

As relações do Direito Financeiro com o Direito Administrativo devem-se ao facto de a actividade financeira implicar o funcionamento dos órgãos que se enquadram na Administração Pública.

c) Direito Penal

É ao Direito Penal que o Direito Financeiro vai buscar os contributos sobre normas punitivas relativas à violação dos seus preceitos.

d) Direito Processual

O Direito Financeiro contém disposições reguladoras das formas de oposição pelos contribuintes aos actos da Administração financeira e de aplicação de sanções por violação de leis financeiras.

d) Direito Privado

A relação entre o Direito Financeiro e o Direito Privado, para além deste ser o Direito Comum, há aspectos da actividade do Estado que são regulados pelo Direito Privado, tal é o caso, por exemplo, da dos empréstimos públicos.

(41)

Embora ao Direito Financeiro presida o princípio da territorialidade, existem situações de convenções bilaterais ou plurilaterais e comunitárias.

Capitulo V

Fontes, Interpretação e Aplicação da Lei em Direito Financeiro

1. Sobre as Fontes

1.1. Noção de fonte

O Direito é um subsistema social de intersecção entre a normatividade e a realidade em que a questão das fontes se apresenta como “jurística”50

.

Mas para não embarcar num recursum ad infinitum, recorrendo à doutrina tradicional, diremos que entende-se por fontes do Direito os modos de formação ou de revelação do direito, isto é, aqueles factos normativos a que se atribui predicados de factos produtores (fontes materiais) de comandos vinculantes (fontes formais).

São o voluntarismo, o estatismo, o dogmatismo e o formalismo dominantes do pensamento jurídico contemporâneo que a isto nos remetem.

1.2. Fontes em geral

(42)

1.2.1. Enunciação

Entendido, como quisermos, que a expressão fonte não tem significado unívoco, que é plurisignificativa, podemos enumerar as seguintes fontes de maior consenso515253:

- Lei, - Costume, - Jurisprudência, - Doutrina.

1.2.2. O Costume

Se não considerarmos, como não devemos, certas praxes da Administração Financeira, como costume, podemos admitir que o costume não é fonte do Direito Financeiro.

1.2.3. Jurisprudência

Se considerarmos que o Tribunal Administrativo pode produzir assentos que dirimem conflitos de aplicação contraditória de normas existentes e que eles só cedem perante nova lei, há que considerar os assentos, com carácter jurisprudencial, fonte de Direito54.

1.2.4. Doutrina

51 BAPTISTA MACHADO, ob. cit., pp. 157 e ss.

52 CASTRO MENDES, J., Introdução ao Estudo do Direito, Lisboa, 1984, p. 90.

53 BRAZ TEIXEIRA, António, Finanças Públicas e Direito Financeiro, AAFDL, 1991, p. 25.

54 Não se afasta, porém, a questão da sua possível inconstitucionalidade já que estaria envolvido o exercício do poder legislativo por um órgão jurisdicional.

Referências

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