NOTA TÉCNICA N°01/2015/DEPARTAMENTO JURÍDICO SINFFAZ
Ementa: A ilegalidade do bloqueio do correio eletrônico institucional do Sinffaz nos computadores da SEF/MG.
1. Introdução
Diante do bloqueio, realizado pela Secretaria do Estado de Fazenda do Estado de Minas Gerais - @fazenda.mg.gov.br, dos correios eletrônicos remetidos pelo Sinffaz - @sinffaz.org.br - e também pelos seus diretores, aos seus filiados, foi necessária a elaboração de Nota Técnica para esclarecer o incidente.
2.
Da conduta antissindical da administração públicaA conduta da administração pública em bloquear os e-mails remetidos pelo Sinffaz
através de @sinffaz.org.br, ou pelo e-mail de seus Diretores, revela-se prática antissindical, pois tem como objetivo, ainda que indireto, de limitar o exercício da liberdade sindical, impedindo a livre comunicação entre o sindicato e os trabalhadores por ele representados, em clara violação a preceito constitucional.
O e-mail institucional é uma forma de comunicação que vai além do mero serviço postal e configura autêntico instrumento de comunicação virtual disponibilizado pelo empregador, assim, equipara-se a uma ferramenta de trabalho.
É notório que o correio eletrônico, nesses casos, se destina essencialmente a troca de mensagens de caráter profissional, com o objetivo de maior agilidade, eficiência e produção no serviço público.
Contudo, deve-se observar que a utilização da ferramenta de trabalho para fins de veiculação de informações pela entidade sindical não pode ser atrelada ao uso indevido da ferramenta de trabalho, para fins de justificar a recusa na comunicação da entidade sindical com os filiados. Isso porque, a comunicação do sindicato possui como objetivo a
discussão e o repasse de informações de interesse dos trabalhadores e, portanto, é totalmente atrelada às questões laborais.
Com efeito, o poder da Administração Pública não é absoluto e não pode impedir o direito fundamental do servidor à efetiva representação sindical.
Ademais, ainda que o trabalhador possa ter outros meios de exercer a liberdade sindical, os bloqueios apresentados explicitam a inexistência de parceria entre a entidade sindical e a SEF/MG, bem como o desinteresse desta em manter uma proximidade com a entidade, com a intenção de discutir questões postas e que poderiam ser negociadas, evitando maiores conflitos de interesses entre a administração e os seus servidores.
O óbice ao direito de informação, que possui guarida constitucional (art. 5º, inciso XV1, CR/88), também restou violado sem qualquer justificativa plausível, apenas com o intuito de enfraquecimento da entidade sindical.
A comunicação entre o Sindicato e os seus filiados está relacionada às questões profissionais e, por isso, não há justificativa na conduta da Administração Pública em impedir esse acesso. Tal atitude da SEF/MG é uma tentativa de enfraquecer a tutela sindical, configurando conduta antissindical.
Salienta-se que pode ser conceituado como prática antissindical qualquer ato que prejudique indevidamente o titular de direitos sindicais, a causa da atividade sindical ou limite de forma abusiva ao exercício da atividade sindical.
Ainda, segundo Raquel Betty de Castro Pimenta "a proteção contra as condutas antissidicais equivale à tutela do direito fundamental à liberdade sindical, reprimindo os atos de violação aos direitos sindicais".2
O exercício da liberdade sindical como direito fundamental possui previsão, tanto no ordenamento jurídico nacional, no art. 5°, XX3 e art. 8° caput e I4, da Constituição da
1 Art. 5º (...) XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;
2 Condutas Antissidicais Praticadas pelo Empregador. SP: LTr, 2014, p.57
3 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)
XX - ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado;
República de 1988, como no direito internacional, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, a Convenção Americana Sobre Direitos Humanos, assim como também na Constituição da Organização do Trabalho e nas Convenções de n°. 875 e 98 da OIT, sendo esta última devidamente ratificada pelo Brasil.
Acrescenta-se que a Convenção nº. 98/OIT - promulgada pelo Decreto nº. 33.196/53, com vigência nacional a partir de 18 de novembro de 1953, determina rigorosa proibição de cláusulas antissindicais como observado no caso em análise (o bloqueio dos e-mails enviados pelo Sindicato), in verbis, artigo 1º:
Art. 1º - 1. Os trabalhadores deverão gozar de proteção adequada contra quaisquer atos atentatórios à liberdade sindical em matéria de emprego. 2. Tal proteção deverá particularmente, aplicar-se a atos destinados a: a) subordinar o emprego de um trabalhador à condição de não se filiar a um sindicato ou deixar de fazer parte de um sindicato; b) dispensar um trabalhador ou prejudica-lo, por qualquer modo, em virtude de sua filiação a um sindicato ou de sua participação em atividades sindicais, fora das horas de trabalho ou com o consentimento do empregador, durante as mesmas horas.
I - a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical;
II - é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores
III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;
IV - a assembléia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei;
V - ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato;
VI - é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho; VII - o aposentado filiado tem direito a votar e ser votado nas organizações sindicais;
VIII - é vedada a dispensa do empregado sindicalizado a partir do registro da candidatura a cargo de direção ou representação sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se cometer falta grave nos termos da lei.
Parágrafo único. As disposições deste artigo aplicam-se à organização de sindicatos rurais e de colônias de pescadores, atendidas as condições que a lei estabelecer.
5Art. 3 — 1. As organizações de trabalhadores e de empregadores terão o direito de elaborar seus estatutos e regulamentos administrativos, de eleger livremente seus representantes, de organizar a gestão e a atividade dos mesmos e de formular seu programa de ação. 2. As autoridades públicas deverão abster-se de qualquer intervenção que possa limitar esse direito ou entravar o seu exercício legal.
Ainda, referida Convenção Internacional determina que as autoridades públicas deverão abster-se de qualquer intervenção que possa limitar o direito de liberdade sindical ou entravar o seu exercício:
Art. 3 — 1. As organizações de trabalhadores e de empregadores terão o direito de elaborar seus estatutos e regulamentos administrativos, de eleger livremente seus representantes, de organizar a gestão e a atividade dos mesmos e de formular seu programa de ação. 2. As autoridades públicas deverão abster-se de qualquer intervenção que possa limitar esse direito ou entravar o seu exercício legal.
Dessa forma, o bloqueio dos e-mails do Sindicato apresenta-se como uma conduta antissindical e, portanto, ilegal e inconstitucional pela violação dos dispositivos mencionados.
3. Fundamento equivocado dos bloqueios com base no Decreto Estadual n°.46.226/2013
O Decreto Estadual n°. 46.226, de 24 de abril de 2013, dispõe sobre o uso de correio eletrônico institucional no âmbito da Administração Pública Direta, Autárquica e Fundacional do Poder Executivo.
Em seu artigo 3° prevê ser possível o bloqueio de usuários, temporariamente ou permanentemente, quando constatado o uso indevido do serviço e, no artigo 4°,
apresenta rol taxativo6 do que seria considerado uso indevido, especificamente, no inciso
IV, o envio de material com caráter pessoal, associativo ou sindical.
6Art. 4. É considerado uso indevido do correio eletrônico institucional:
I – a tentativa de acesso não autorizado às caixas postais de terceiros;
II – o uso do correio eletrônico institucional para cadastro e acesso a redes sociais pessoais, em sítios de compras, bem como qualquer outra utilização não relacionada às funções profissionais; III – o envio de material e mensagens de natureza ou com conteúdo racista, profana, obscena, intimidadora, difamatória, ilegal, ofensiva, abusiva, não ética, comercial, estritamente pessoal, de entretenimento, spam, com caráter eminentemente associativo, sindical, religioso, político e partidário;
IV – acesso, a qualquer título, da lista de endereços dos usuários do serviço de correio eletrônico institucional a pessoas alheias aos quadros da Administração Pública do Estado, salvo para finalidade institucional;
V – o envio de mensagens ofensivas que visem atingi r a honra ou a dignidade das pessoas; VI – o envio de mensagens contendo vírus ou qualquer forma de rotinas de programação prejudiciais ou danosas às estações de trabalho e ao sistema de correio eletrônico;
In verbis:
Art. 3. São condições gerais de utilização do correio eletrônico institucional:
(...)
IV – os órgãos e as entidades possuem a prerrogativa de eliminar mensagens e arquivos, e de bloquear conteúdos e usuários, permanentemente ou temporariamente, quando houver ameaças à segurança das informações ou quando constatado o uso indevido do serviço;
Art. 4. É considerado uso indevido do correio eletrônico institucional: (...)
III – o envio de material e mensagens de natureza ou com conteúdo racista, profana, obscena, intimidadora, difamatória, ilegal, ofensiva, abusiva, não ética, comercial, estritamente pessoal, de entretenimento, spam, com caráter eminentemente associativo, sindical, religioso, político e partidário;
Assim, o Decreto supramencionado, de fato, prevê que é considerado uso indevido o ENVIO de referidos materiais de cunho estritamente pessoal, associativo e sindical. Contudo, não há nenhuma previsão sobre ser indevido o recebimento de e-mails com conteúdo sindical ou associativo.
Percebe-se que, o artigo 4° apenas faz alusão aos e-mails enviados do correio eletrônico institucional, no caso em análise, dos remetidos através de @fazenda.mg.gov.brpara outros destinatários.
Portanto, ao analisar o Decreto Estadual n°.46.226/2013, conclui-se não haver qualquer dispositivo normativo que autorize o bloqueio indevido dos e-mails enviados pela entidade sindical ou seus diretores através do @sinffaz.org.br para @fazenda.mg.gov.br.
Destaca-se que não se discute a legalidade do disposto no Decreto Estadual n°. 46.226/2013, mas fato é que a administração pública somente pode fazer o que a lei autoriza e, portanto, está havendo a violação do princípio constitucional e administrativo da legalidade.
VIII – transmitir ilegalmente propriedade intelectual de terceiros ou outros tipos de informações proprietárias sem a permissão do proprietário ou licenciante;
IX – modificar, adaptar, traduzir ou fazer engenharia reversa de qualquer parte do serviço de correio eletrônico institucional;
X – praticar quaisquer atos que violem a legislação aplicável;
Na clássica comparação de Hely Lopes Meirelles, “enquanto os indivíduos no
campo privado podem fazer tudo o que a lei não veda, o administrador público só pode atuar onde a lei autoriza”.7
Dessa forma, os e-mails do Sinffaz e de seus Diretores não podem ser bloqueados sob a justificativa de que configuraria uso indevido do email institucional, já que inexiste qualquer dispositivo no Decreto ou na legislação mineira que impeça o recebimento de e-mails emitidos pela entidade sindical para os seus trabalhadores representados.
Ademais, referida vedação seria notoriamente inconstitucional, já que configuraria prática antissindical, já que a Administração Pública, na qualidade de empregadora, não pode limitar o acesso às informações repassadas pelo sindicato aos trabalhadores.
Percebe-se que está sendo feita uma leitura superficial e insuficiente do Decreto por parte da SEF/MG, e uma interpretação com cunho estritamente antissindical, visto que o referido bloqueio de recebimento de e-mails remetidos pela entidade sindical é evidentemente ilegal e inconstitucional.
4. Conclusão
O bloqueio do recebimento dos e-mails enviados pelo Sinffaz (@sinffaz.org.br) e/ou seus Diretores para os servidores no correio eletrônico institucional (@fazenda.mg.gov.br) é ilegal e inconstitucional, pois ausente previsão normativa, além de configurar-se como prática antissindical por parte da SEF/MG e deve ser de pronto suspenso.
É o que se tem a esclarecer e orientar quanto ao tema. Belo Horizonte, 26 de fevereiro de 2015.
Departamento Jurídico do Sinffaz Bárbara Macedo OAB/MG: 143.834 De acordo, Sarah Campos OAB/MG: 128.257
Coordenadora Jurídica do Depto. Jurídico do Sinffaz