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A legitimidade do ministério público para liquidação e cumprimento de sentença prolatada em ação civil pública sando sobre direitos individuais homogêneos

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Academic year: 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO

DEPARTAMENTO DE DIREITO PRIVADO

VIVIANE MOURÃO FERREIRA

A LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA LIQUIDAÇÃO E CUMPRIMENTO DE SENTENÇA PROLATADA EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA VERSANDO SOBRE DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS

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VIVIANE MOURÃO FERREIRA

A LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA LIQUIDAÇÃO E CUMPRIMENTO DE SENTENÇA PROLATADA EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA VERSANDO SOBRE DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Federal do Ceará como requisito parcial para obtenção do título de Bacharela em Direito da Universidade Federal do Ceará.

Orientador: Prof. Ms. William Paiva Marques Júnior.

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VIVIANE MOURÃO FERREIRA

A LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA LIQUIDAÇÃO E CUMPRIMENTO DE SENTENÇA PROLATADA EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA VERSANDO SOBRE DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Federal do Ceará como requisito parcial para obtenção do título de Bacharela em Direito da Universidade Federal do Ceará.

Orientador: Prof. Ms. William Paiva Marques Júnior.

Aprovada em: ____/____/______.

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________ Prof. Ms. Sc. William Paiva Marques Júnior (Orientador)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

___________________________________________ Mestrando Álisson José Maia Melo

Universidade Federal do Ceará (UFC)

__________________________________________ Mestranda Tainah Simões Sales

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A Deus.

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5 AGRADECIMENTOS

A Deus, por estar sempre ao meu lado, guiando-me em todos os momentos da minha vida acadêmica.

Ao Prof. William Paiva Marques Júnior, pela orientação sempre diligente e disponível do começo ao fim do presente trabalho, com colaborações e sugestões enriquecedoras.

Aos professores participantes da Banca Examinadora pela total disponibilidade para análise desta monografia.

À minha mãe, pela paciência comigo durante a elaboração do presente trabalho durante dias, noites e madrugadas. Às minhas irmãs, pelo cuidado e apoio durante a minha história estudantil nesta faculdade.

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7 RESUMO

Os direitos individuais homogêneos são aqueles decorrentes de uma origem comum, podendo ser tutelados pelo Ministério Público por meio de Ação Civil Pública. Esses direitos foram delineados no direito brasileiro no Código de Defesa do Consumidor, por influência norte-americana, dando origem a uma nova categoria dentro dos direitos coletivos lato sensu. O presente estudo tem como finalidade verificar a legitimidade do Ministério Público para liquidação e cumprimento de sentença coletiva versando sobre direitos individuais disponíveis, analisando-se os possíveis obstáculos a essa atuação, sendo realizada pesquisa doutrinária e jurisprudencial do assunto. Com a análise das informações obtidas por meio deste trabalho percebeu-se que o Ministério Público é legitimado subsidiário para liquidação e cumprimento de sentença proferida em Ação Civil Pública que trata de direitos individuais homogêneos, em virtude da natureza individual e disponível dos direitos tutelados. Verificou-se, ainda, que existem regramentos bastante específicos e inovadores sobre o tema do presente estudo, mas ainda são necessários outros regramentos e uma aplicação mais efetiva dos já existentes para que seja conferida efetividade aos provimentos positivos obtidos em sentença coletiva.

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8 ABSTRACT

The individual interests commons to a class are that from an common origin, and can be protected by the Public Minister by the Brazilian class action of damages. These rights were writed in Brazil law in the Code of Consume Defense, under the influence of the United States, being a new category of collective rights. This study have the objective of check the legitimacy of Public Minister to liquidation and execution of collective sentence about Individual interests commons to a class, analyzing the inconvenient to this acting, by the study of doctrine and collective decisions about the theme. With the analyses about the information obtained in this study, verified that the Public Minister is a subsidiary legitimated to liquidation and execution of sentences in Brazilian class action of damages about Individual interests commons to a class, in the face of individual and available sort of the interests protected. The study verified also that there are very specific rules about the theme in discussion, but is still necessary other rules and a practical application to the effectiveness of collective sentences.

Key-words: Individual interests commons to a class. Public Minister. Legitimacy. Liquidation and execution of collective sentence. Effectiveness of jurisdiction.

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9 SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO...10

2 OS DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS E SUA DEFESA EM JUÍZO...12

2.1 A origem histórica e a abrangência dos Direitos Individuais Homogêneos...12

2.2 Conceito de Legitimidade e a Tutela dos Direitos Individuais Disponíveis...17

2.3 Legitimidade do Ministério Público para a defesa dos Direitos Individuais Homogêneos...19

3 A AÇÃO CIVIL PÚBLICA COMO INSTRUMENTO DE TUTELA DOS DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS...23

3.1 Origem Histórica da Ação Civil Pública...23

3.2 Legitimidade ad causam do Ministério Público para propositura da Ação Civil Pública e a defesa dos direitos individuais homogêneos...25

3.3 Aspectos gerais do processo de conhecimento no procedimento da Ação Civil Pública...29

3.4 A coisa julgada coletiva nas ações que versam sobre direitos individuais homogêneos...31

4 LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA LIQUIDAÇÃO E CUMPRIMENTO DE SENTENÇAS QUE VERSAM SOBRE DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS...35

4.1 Liquidação de Sentença proferida em Ação Civil Pública versando sobre Direitos Individuais Homogêneos...35

4.2 Legitimidade para liquidação e execução de sentença condenatória proferida em Ação Civil Pública: procedimento individual...40

4.3 Legitimidade do Ministério Público para liquidação e execução de sentença condenatória proferida em Ação Civil Pública: legitimação residual...46

5 CONCLUSÃO...53

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10 1 INTRODUÇÃO

O estudo dos direitos individuais homogêneos vem sendo cada vez mais aprofundado no âmbito jurídico. A atualidade do tema, tendo em vista que o legislador definiu essa espécie de direito coletivo apenas em 1990, com o Código de Defesa do Consumidor, enseja diversos questionamentos acerca da sua aplicabilidade prática, especialmente no tocante à execução de sentenças obtidas quando há a atuação do Ministério Público como substituto processual. Isso ocorre porque tais direitos são divisíveis e individualizáveis, sendo possível o pedido de execução por cada um dos indivíduos que tiveram seus direitos violados.

O Código de Defesa do Consumidor permite a atuação do Ministério Público não só na esfera do processo de conhecimento, mas também na liquidação e o cumprimento das sentenças que abordam os direitos individuais homogêneos, sem, contudo, tratar o tema de uma forma mais coerente com a realidade e as peculiaridades dos casos concretos. Como há um interesse individual na execução da referida sentença, a liquidação e a execução das Ações Civis Públicas movidas pelo Parquet acabam acontecendo por iniciativa daqueles que tiveram seus interesses violados, fazendo com que não haja o enfrentamento do tema de forma a se criar uma jurisprudência uniforme sobre os procedimentos a serem adotados caso o próprio Ministério Público promova liquidação e execução das referidas sentenças.

Por outro lado, reside a discussão doutrinária acerca de ser ou não cabível tal execução pelo MP, tendo em vista a disponibilidade e divisibilidade dos direitos individuais homogêneos, estes que receberam tratamento coletivo por uma opção do legislador brasileiro, este que agiu em consonância com as tendências do tratamento dado a esses direitos em outros Estados do mundo.

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A escolha do tema se deu em virtude da verificação do crescimento do número de ações de tutela dos interesses coletivos, especialmente com a Lei 7.347/85(Lei da Ação Civil Pública) e da sua necessária compatibilização com os interesses individuais homogêneos no âmbito da defesa do consumidor, direitos estes inicialmente individuais, mas que, hoje, recebem tratamento coletivo nas situações em que há relevante interesse público e social.

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12 2 OS DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS E SUA DEFESA EM JUÍZO

Os direitos individuais homogêneos são importante categoria de direitos coletivos, vez que são resultado da evolução da sociedade e suas relações jurídicas cada vez mais complexas, em que se faz necessária a tutela de novos direitos antes não discutidos. Assim, não pode ocorrer a simples normatização desses interesses, mas deve ocorrer, também, a sua tutela em juízo, com a adoção de regramentos que possam se adequar a essa nova realidade de direitos a serem protegidos pela via coletiva.

2.1 A origem histórica e a abrangência dos Direitos Individuais Homogêneos

Por volta do século XIX, os litígios versavam basicamente acerca de direitos individuais. Segundo Mauro Cappelletti (1988, p.3), tal situação era reflexo da organização da sociedade da época, caracterizada pelo estado liberal burguês, o qual visualizava o acesso à justiça como um “direito natural” do ser humano, cabendo ao Estado apenas a proteção da agressão do direito de uns em relação aos outros indivíduos, numa postura estatal notadamente passiva em relação à defesa da sociedade com um todo.

Apenas na segunda metade do século XX é que se pôde verificar a evolução da atuação estatal na defesa dos direitos de toda a sociedade, por meio de ações que tutelavam interesses coletivos, especialmente os difusos(Cappelletti, 1988, p.19). Isso porque não só ocorreu uma preocupação maior com o efetivo acesso à justiça, por meio de uma participação estatal ativa, como também a preocupação acerca da adoção de mecanismos que pudessem assegurar os direitos dos indivíduos coletivamente considerados.

Os direitos coletivos lato sensu tiveram suas primeiras discussões e seus primeiros estudos por volta dos anos 1970, na Itália. Tal categoria de direitos, inicialmente, não versava ainda sobre os chamados direitos individuais homogêneos, abrangendo apenas interesses de natureza indivisível e de titularidade indeterminada.

Ada Pellegrini Grinover (2007, p.875-876) afirma que a discussão a respeito dos direitos individuais homogêneos tem sua gênese na chamada class

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qualquer indivíduo participante de determinada classe pudesse vir a juízo defender interesses pertencentes a todo o grupo atingido.

Grinover afirma que as ações coletivas norte-americanas tiveram sua origem ligada ao Bill of Peace, instituto inglês do século XVII de tutela coletiva. Como os Estados Unidos eram colônia da Inglaterra, aquele país acabou herdando tal instrumento processual, imprimindo a ele diversas características que permitem conferir aos americanos o mérito pelo desenvolvimento dessa modalidade de proteção de direitos quando da defesa dos direitos individuais homogêneos.

Existiam na época, por meio da Rule 23 (depois reformada em 1966) três espécies de class actions, estas que eram diferenciadas de acordo com os limites subjetivos da coisa julgada obtida quando do ajuizamento ação cabível.

Na primeira espécie, conhecida como true class action, o direito deveria ser comum a todos os membros da classe, pois, nesse caso, os efeitos da coisa julgada atingiam todos os integrantes da referida classe, gerando efeitos mesmo sobre aqueles que não participaram como partes na demanda.

Na segunda espécie, conhecida como hybrid class action, a origem comum decorria da existência de várias ações versando sobre um só bem, mesmo que fossem discutidos direitos distintos. Nesse caso, como havia um interesse comum na referida demanda, os efeitos da preclusão sobre a matéria ocorria apenas em relação aos membros, no tocante aos direitos específicos que haviam sido discutidos na lide.

Já na terceira espécie de class action(spurious class action), os direitos discutidos eram dependentes de uma questão comum de fato ou de direito, por meio da qual várias pessoas que tinham seus direitos violados se reuniam para demandar, por uma questão de praticidade e economia processual. Assim, os efeitos da decisão prolatada se projetavam apenas na esfera de direitos dos participantes da lide, gerando efeito apenas inter partes.

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caso concreto levava os juristas a crerem crer que as cortes americanas não acertavam na escolha da categoria de tutela a ser adotada.

Após a reforma da Rule 23 norte-americana, conferiu-se nova redação aos artigos referentes às categorias de class actions. Criou-se um rol de sete requisitos que devem ser previamente preenchidos para a possibilidade de ajuizamento das ações coletivas, devendo, ainda, ser a situação narrada descrita em outra subdivisão constante da referida lei, subdivisão esta composta por três hipóteses.

Na primeira hipótese, determina-se que a propositura das ações de forma individual causem prejuízos ao judiciário, pela possibilidade da ocorrência de decisões antagônicas ou pela possibilidade de a sentença proferida gerar prejuízos a detentores do mesmo direito, mas que não estejam presentes na demanda ajuizada.

Na segunda situação, o direito norte-americano prevê a hipótese em que há tratamento desigual em relação a indivíduos que integram a mesma classe. A sentença proferida não pode ter caráter patrimonial, mas apenas mandamental, garantindo tratamento igualitário aos indivíduos pertencentes a uma mesma classe. É nessa situação que parte da doutrina vem percebendo uma semelhança entre o direito norte-americano e a ação civil pública brasileira quando na defesa dos interesses difusos.

A terceira hipótese, por sua vez, abrange a denominada class action for

damages, em que as questões de fato e de direito discutidas são

predominantemente individuais, mas, em virtude da maior eficácia alcançada, são tuteladas por meio de ações coletivas. Nesta situação, o tribunal deve analisar a conveniência e a relevância do interesse discutido, bem como a possibilidade ou não de processamento da demanda na forma de class action. É nessa categoria que a doutrina pátria encaixa o modelo de defesa dos direitos coletivos adotada pelo nosso ordenamento jurídico quando da elaboração da Lei 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor).

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versa acerca das ações de responsabilidade em caso de violação de direitos como os que dizem respeito à proteção do meio ambiente e aos consumidores.

Vê-se que o referido diploma legal passou por um importante processo de aprimoramento dos direitos que pretendia tutelar, passando, ao longo dos anos, a proteger outros direitos coletivos, tais como os relativos à ordem urbanística e à ordem econômica.

Marcante alteração na Lei 7.347/85 pode ser verificada pela inclusão do inciso IV de seu artigo 1º, momento em que o legislador optou por adotar a redação “qualquer outro interesse difuso ou coletivo”, a fim de não correr o risco de excluir da tutela da referida lei qualquer direito coletivo lato sensu que pudesse vir a necessitar de atenção especial. A cautela do legislador foi bastante adequada, pois, com a evolução dos direitos coletivos e sua defesa em juízo, não há como se prever um rol exaustivo que delineie com exatidão os interesses que deverão ser objeto, no futuro, de uma tutela mais efetiva por parte do Estado pela via coletiva.

Assim, deu-se abertura à defesa coletiva dos chamados direitos individuais homogêneos, os quais foram positivados na Lei nº 8.072/90 (Código de Defesa do Consumidor) em seu artigo 81, que assim preleciona:

Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.

Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de: I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;

II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;

III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.

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Percebe-se, assim, que a unidade que deve ser verificada nos casos de direitos individuais homogêneos diz respeito à origem, à procedência da violação, não necessariamente uma unidade no tocante ao momento do dano causado ou ao fato ocorrido.

O cabimento da tutela de maneira coletiva não está diretamente ligado ao fato de que os lesados podem ser individualmente identificados, o que corrobora a tese majoritária, defendida por Didier (2011), de que os direitos individuais homogêneos não são apenas direitos individuais coletivamente tratados, mas sim, de categoria específica que necessita de regramentos específicos, a fim de que determinados interesses não restem prejudicados pela falta de proteção efetiva.

Sabe-se, por outro lado, que uma grande novidade trazida na tutela dos interesses individuais homogêneos diz respeito ao fato de que, por ser o titular do direito plenamente identificável, há a possibilidade de se pleitear por meio de ação coletiva ou por meio individual interesse violado, cabendo ao titular do direito buscar a via mais adequada para sua satisfação. Ressalte-se que, conforme preleciona Kazuo Watanabe (2007, p.807), a legislação pátria sobre o assunto não legitimou o cidadão para propositura das ações coletivas, mas apenas para a tutela individualmente considerada de seu interesse individual disponível.

A gravidade do dano nas situações em que são violados direitos individuais homogêneos só é considerável quando coletivamente considerada, sendo o Código de Defesa do Consumidor em seu artigo 100 um mecanismo de garantia da efetividade das sentenças em que são garantidos esses direitos. Isso porque esse dispositivo prevê a possibilidade de liquidação e execução de sentença por substitutos processuais nas situações em que são concedidas indenizações aos lesados. Esse novo regramento permite que o agente violador não fique impune diante da ausência de interesse dos indivíduos atingidos quando individualmente considerados.

Assim, constata-se que a origem dos interesses individuais homogêneos é bastante recente, tendo o direito brasileiro se inspirado nos ditames da class action

of damages norte-americana. A definição de tais interesses visa à delimitação de

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dispositivos normativos modernos que possam se adequar à atual realidade, a fim de que importantes interesses não sejam letra morta no ordenamento jurídico pátrio.

2.2 Conceito de Legitimidade e a Tutela dos Direitos Individuais Disponíveis

A legitimidade ad causam, a teor do que dispõe Marcus Vinicius Rios Gonçalves (2012, p138-143), é uma das condições da ação definidas pelo Direito pátrio, diz respeito à possibilidade de uma determinada pessoa ingressar em juízo para litigar a respeito de determinado direito. Trata-se de situação em que é necessária a análise em relação ao caso concreto se há pertinência entre o que se está pleiteando e quem está pleiteando, vez que, em regra, não se pode pleitear, em nome próprio, direito alheio, a teor do disposto no artigo 6º do Código de Processo Civil.

Tal legitimidade é necessária para que a vitória em juízo possa repercutir na esfera de direitos do litigante. Isso porque, como há íntima relação entre a legitimidade e o interesse de agir, não haveria como se concretizar determinado direito obtido pela via judicial por terceiro que não possui relação com o interesse discutido. Também não poderia o beneficiado que não esteve em juízo executar o direito obtido por outrem, tendo em vista que não participou do contraditório ou da ampla defesa que deram origem à tutela obtida. Da mesma forma deve ser entendida a ilegitimidade passiva, pois determinada pessoa não pode ter contra si execução de sentença de processo em que não pôde influir na formação do entendimento a respeito de dado direito.

Assim, caso seja verificado que o integrante dos polos ativo ou passivo da demanda não possui alguma das condições da ação, deve-se extinguir o processo sem resolução de mérito, como aduz o artigo 267, VI do Código de Processo Civil.

A situação em que determinado direito só pode ser pleiteado por quem supostamente o detém é chamada de “legitimidade ordinária”, sendo que, como se pode verificar da leitura do artigo 6º do Código de Processo Civil, trata-se de regra que comporta exceções. Trata-se da situação de legitimidade extraordinária, em que o titular do direito não atua na relação processual, mas sim um substituto processual, o qual justamente defende, em nome próprio, direito alheio.

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próprio defender interesse próprio, sendo que, por não possuir algum elemento referente à capacidade processual, tem de ser auxiliado por representante.

Nos casos em que são discutidos direitos por meio de tutela coletiva, a lei tratou de definir quem seriam os legitimados, a depender do tipo de ação utilizada. É no Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 82 que são definidos os legitimados para a defesa das diversas espécies de direitos coletivos. Assim dispõe o referido dispositivo:

Art. 82. Para os fins do art. 81, parágrafo único, são legitimados concorrentemente:

I - o Ministério Público,

II - a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal;

III - as entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, ainda que sem personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e direitos protegidos por este código;

IV - as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e que incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos protegidos por este código, dispensada a autorização assemblear.

§ 1° O requisito da pré-constituição pode ser dispensado pelo juiz, nas ações previstas nos arts. 91 e seguintes, quando haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido.

O artigo acima transcrito é claro ao definir como concorrente a legitimidade dos entes que podem defender em juízo os direitos coletivos lato sensu, a fim de ser conferida maior efetividade à proteção dos referidos direitos, não conferindo qualquer privilégio de um legitimado sobre o outro. Trata-se, ainda de uma legitimidade disjuntiva, vez que não há necessidade de pedido de autorização de uma entidade legitimada para outra a fim de exercer o direito de ação por meio de ação coletiva.

Assim, percebe-se que, no Brasil, foi adotado um sistema misto no tocante aos legitimados para propositura de ação coletiva, vez que possibilita a adoção de mais de uma técnica possível para a configuração de determinada pessoa como legitimada. Isso porque, embora não esteja elencado no artigo acima transcrito, a possibilidade de propositura de ação de natureza coletiva pelo cidadão, além das entidades acima transcritas, é possível, definida em diversas leis e mesmo na Constituição, como se pode apreender da redação do artigo 5º, inciso LXXIII. Fredie Didier Junior (2011) bem expressa um resumo dessa via mista, conforme se pode verificar pela leitura do seguinte trecho:

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19 LXX, da CF/88); ou, 3) legitimação de órgãos do Poder Público (MP, por exemplo, a ação civil pública, Lei 7.347/1985).

Percebe-se, assim, que a tutela coletiva apresenta rol próprio de legitimados, a fim de que tais direitos possam ser protegidos de maneira efetiva, sendo os entes constantes nos incisos II a IV considerados como legitimados ordinários, por defenderem interesses próprios, sendo o Ministério Público, este que consta no inciso I, classificado como legitimado extraordinário, vez que defende em nome próprio interesse alheio, atuando diretamente como parte no processo. Ressalte-se que, principalmente nas situações de defesa de direitos individuais disponíveis, também há a legitimidade do próprio indivíduo lesado, corroborando a tese defendida por Didier em sua obra.

2.3 Legitimidade do Ministério Público para a defesa dos Direitos Individuais Homogêneos

A Constituição Federal de 1988 em seu artigo 127 conferiu ao Ministério Público a legitimidade para “defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”. Como se pode verificar pela redação do referido artigo, a Constituição ainda não previa a legitimidade do Parquet para a tutela dos interesses individuais disponíveis, sendo essa nova espécie de legitimidade atribuída ao Ministério Público por meio da Lei Complementar 73 de 1993, a qual adotou a seguinte redação em seu artigo 6º:

Art. 6º Compete ao Ministério Público da União: (...)

VII - promover o inquérito civil e a ação civil pública para: a) a proteção dos direitos constitucionais;

b) a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente, dos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;

c) a proteção dos interesses individuais indisponíveis, difusos e coletivos, relativos às comunidades indígenas, à família, à criança, ao adolescente, ao idoso, às minorias étnicas e ao consumidor;

d) outros interesses individuais indisponíveis, homogêneos, sociais, difusos e coletivos;

Vê-se pela redação das alíneas acima transcritas que o legislador buscou conferir o sentido mais amplo possível à competência do Ministério Público, a fim de adaptar o sistema jurídico pátrio às diversas situações concretas que surgiram e surgirão com a evolução da sociedade.

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concorrente apenas para os casos de liquidação e execução de indenização quando o produto da indenização deveria ser revertido ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos.

O artigo 82 da Lei 8.078/90, hoje, adota texto de redação conferida pela Lei nº 9.008/95, determinando que a legitimidade concorrente para a defesa coletiva

lato sensu (artigo 81, parágrafo único do Código de Defesa do Consumidor) seja

exercida por órgãos e entidades elencados nos incisos do próprio artigo 82, ampliando sobremaneira a legitimidade do Ministério Público. A nova redação adotada permitiu que o Parquet não só liquidasse e executasse sentenças indenizatórias, mas também pudesse promover a própria ação principal em caso de violação a direitos coletivos em geral, abrangendo, portanto, a defesa dos interesses individuais homogêneos.

O que se percebe, na verdade, é a positivação de norma que confere ao Ministério Público a possibilidade de defesa dessa espécie de direitos individuais disponíveis, pois, antes mesmo do que se dispõe na Lei Complementar 75/1993 e da Lei 8.078/90 após suas modificações pela Lei nº 9.008/95, já havia previsão não expressa de atuação do órgão ministerial para a defesa desses interesses, havendo exemplos nas Leis 7.853/89 e 8.069/90(Estatuto da Criança e do Adolescente).

Doutrinadores como Wambier, conforme constante na obra de Didier (2011), têm criticado essa possibilidade de ajuizamento de ações coletivas pelo Ministério Público nas situações de defesa de interesses individuais disponíveis, mas tal posicionamento vem sendo cada vez mais reduzido em virtude de uma interpretação mais ampla da função ministerial em nosso ordenamento jurídico. Isso porque para que esses direitos individuais possam ser defendidos pelo Parquet, conforme assevera Kazuo Watanabe (2007, p837-839), deve haver relevante interesse público ou social, pois, caso contrário, não haveria legitimidade do Ministério Público para a propositura das ações civis públicas respectivas. Há a necessidade, ainda, de que haja um abalo na estabilidade de um sistema social, político ou econômico, de modo que a ofensa a esses direitos, que são individuais por sua natureza, exijam tutela específica do Estado, a fim de que sejam evitadas novas ofensas.

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texto constitucional em seu artigo 127 confere ao órgão a atribuição de defesa dos interesses sociais, sendo aquela espécie de direitos coletivos de repercussão social, não podendo o Parquet deixar de tutelá-los. Trata-se de situação em que deve haver interpretação teleológica e sistemática dos diplomas legislativos, a fim de que não se deixe fora do amparo legal a proteção de direitos que são de interesse da sociedade como um todo. É nesse sentido que vem se consolidando a jurisprudência pátria, conforme se vê pela ementa abaixo transcrita:

“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO CIVIL. CONCURSO. ISENÇÃO DE TAXA DE INSCRIÇÃO DE CANDIDATOS CARENTES. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. DECISÃO RECORRIDA EM HARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. (…) PRECEDENTES.

1. A legitimação do Ministério Público para o ajuizamento de ação civil pública, não se restringe à defesa dos direitos difusos e coletivos, mas também abarca a defesa dos direitos individuais homogêneos, máxime quando presente o interesse social. Nesse sentido, o RE 500.879 – AgR, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, Primeira Turma. (...) 3. Agravo Regimental a que se nega provimento

(AI 737.104-AgR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 17.11.2011).

Há que se ponderar, por outro lado, que a legitimação do órgão ministerial deve ser aferida no caso concreto pelo Poder Judiciário, a fim de que não haja abuso da competência atribuída ao Parquet. Tal fato pode ocorrer notadamente quando se dá uma conotação excessivamente ampla à essa atribuição do órgão ministerial, o que pode acabar desvirtuando um dos objetivos fundamentais deste órgão, que é a defesa dos interesses sociais, ou seja, dos interesses da coletividade, e não de direitos de caráter apenas individual e disponível.

Nas palavras de Teori Albino Zavascki (2005):

A atuação do Ministério Público se dá em forma de substituição processual e é pautada pelo trato coletivo e impessoal dos direitos subjetivos lesados. E é nesta dimensão, e somente nela, que a defesa de tais direitos - divisíveis e disponíveis - pode ser promovida pelo MP sem ofensa à Constituição

É nessa esteira da proteção pelo MP apenas em casos que realmente contenham em seu bojo direitos individuais homogêneos de natureza consumerista que o Supremo Tribunal Federal (STF) já firmou o entendimento de não ser possível a tutela pelo órgão ministerial dos interesses individuais disponíveis de natureza tributária. Vejamos:

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22 A jurisprudência desta Casa se encontra firmada no sentido de que o Ministério Público não ostenta legitimidade para a propositura de ação civil publica contra a Fazenda Pública em defesa de interesses individuais homogêneos de contribuintes. Precedentes. Agravo regimental conhecido e não provido.

(Ag.Reg. No REx. 604.481, Distrito Federal, Rel. Min Rosa Weber, julgado em 16/10/2012, DJ 09/11/2012).

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23 3 A AÇÃO CIVIL PÚBLICA COMO INSTRUMENTO DE TUTELA DOS DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS

A efetividade dos direitos coletivos, da mesma forma que ocorre com as situações em que são violados direitos individuais, deve ser garantida por meio de instrumentos processuais adequados à realidade dos interesses tutelados. É nesse diapasão que surgiu a LACP, a qual buscou conferir proteção adequada aos direitos coletivos lato sensu, permitindo, portanto, que os direitos individuais homogêneos pudessem vir a ser, também tutelados em juízo.

É por meio desse instrumento processual, combinado especialmente com os regramentos contidos no CDC, que essa nova categoria de direitos coletivos pôde ter normatizada em seu favor diversos mecanismos de proteção, os quais serão abordados no presente capítulo.

3.1 Origem Histórica e evolução legislativa da Ação Civil Pública

A Ação Civil Pública é um instrumento processual que visa ao controle pela população dos atos do poder público, bem como à repreensão a danos contra o meio ambiente, o patrimônio público e os direitos coletivos em geral. Vê-se que a Constituição Federal adotou em seu artigo 129, inciso III rol meramente exemplificativo, permitindo que, hoje, possa-se utilizar esse instrumento processual para a defesa dos interesses individuais homogêneos.

Destaque-se que tal espécie de ação, como assevera Teori Albino Zavascki (1994, p.6-7), possui procedimento especial destinado à tutela de interesses transindividuais, sendo este procedimento positivado por meio da Lei nº 7.347/85. Esse diploma legislativo aponta mecanismos não só no tocante ao ajuizamento de processos de conhecimento, mas também de demandas preventivas e cautelares, a fim de conferir uma maior efetividade à proteção dos interesses coletivos.

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Nos casos em que são discutidos direitos individuais homogêneos, há a possibilidade de reversão do valor da condenação diretamente ao próprio ofendido, mostrando-se tal possibilidade como importante avanço procedimental. A possibilidade de conversão às pessoas diretamente lesadas dos valores obtidos quando do julgamento de ações de natureza coletiva se deu pela primeira vez com a Lei nº 7.913/89. Esse diploma legislativo versava sobre danos causados a investidores no mercado imobiliário, possibilitando a habilitação das vítimas para ressarcimento na medida do prejuízo individualmente sofrido.

Quanto à origem histórica da Ação Civil Pública, verifica-se que esse importante instrumento de defesa coletiva, segundo Teori Zavascki (2005, p.15-19), assim como os próprios direitos individuais homogêneos, teve origem no Bill of

Peace norte-americano(século XVII), estes que evoluíram para as chamadas class

actions, em que um único elemento de determinada classe poderia ir a juízo em

busca da defesa dos direitos de toda a classe, nas situações previstas em lei.

Após as necessárias adaptações das class actions à nossa realidade, surgiu a Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/85), esta que, inicialmente, tutelava apenas os direitos difusos e coletivos de natureza indivisível, não abrangendo, ainda, a defesa dos direitos individuais disponíveis coletivamente considerados. Nas situações em que o indivíduo sofria um dano de ordem pessoal, deveria se valer das ações de ressarcimento comum, não havendo um procedimento específico para tais situações.

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variações do procedimento adotado na Lei da Ação Civil Pública, deixando patente a importância desse diploma legislativo no tocante à tutela coletiva.

No tocante à denominação desse instrumento processual, anteriormente à edição da Lei nº7.347/85, defendia-se que o termo “pública” dizia respeito ao fato de que a titularidade da referida ação era exclusiva do Ministério Público, ou seja, buscava-se justificar a terminologia adotada pela adoção de um critério subjetivo. Ocorre que tal justificativa restou rechaçada quando da edição da referida lei, a qual conferiu a outros legitimados a possibilidade de ajuizamento da ação civil púbica.

A doutrina pátria aponta como sendo na obra de Piero Calamandrei (Istituciones de derecho procesal civile) a primeira vez em que se utilizou a

expressão “ação civil pública” como o conjunto de procedimentos que vinham sendo adotados para a defesa dos direitos da coletividade. A doutrina pátria aponta, diversas críticas acerca da adoção dessa nomenclatura, embora esta já esteja consagrada no ordenamento jurídico pátrio.

Como crítica, primeiramente, fala-se que o termo “civil” tem o condão apenas de excluir a possibilidade de sua utilização em situações em que se deve aplicar o Direito Penal. Assim, trata-se na verdade de um critério de exclusão, sem que haja uma delimitação mais específica da matéria objeto da referida ação.

Outra crítica que é dirigida à nomenclatura desse instrumento de tutela diz respeito ao fato de que o termo “pública” não teria razão para existir, pois toda ação é de natureza pública, pois, quando se busca o auxílio do Judiciário, o interessado se dirige ao Estado, para que este verifique o cabimento do pedido e, consequentemente, determine ou não a prestação de determinado provimento, podendo se utilizar, inclusive, de meios coercitivos.

O fato é que, apesar das diversas ponderações que são feitas pela doutrina, a nomenclatura “ação civil pública” se consagrou na realidade normativa pátria, sendo esse instrumento processual, hoje, sinônimo de avanço legislativo no tocante à defesa de direitos coletivos, sendo seus regramentos seguidos por outros dispositivos de lei sobre o tema.

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O Ministério Público pelos dispositivos adotados pelo ordenamento jurídico pátrio, pode adotar dois posicionamentos básicos numa dada lide: o de fiscal da lei, como custos legis, ou a posição de parte processual, nos casos previstos em lei.

Nas ações coletivas, a doutrina pátria, conforme preleciona Fredie Didier (2011), a fim de justificar a legitimação de pessoas diversas dos titulares dos direitos pleiteados, dividiu-se em três correntes sobre o tema: uma que defende a legitimação extraordinária por substituição processual, outra que trata a legitimidade ativa nas ações coletivas como ordinária e uma terceira que defende a legitimação extraordinária como espécie de “legitimação autônoma”.

Segundo Didier, a primeira corrente é liderada por Barbosa Moreira, o qual defende que a legitimidade nas situações de ações coletivas é resultado de uma análise sistêmica do ordenamento jurídico. José Manoel Arruda Alvim também integra essa corrente, afirmando que deve ser feita uma interpretação extensiva do artigo 6º do CPC, conferindo-se ao vocábulo “lei” um sentido amplo, abrangendo outros textos normativos. Nesse diapasão, a legitimidade extraordinária por substituição processual, nos casos em que a lei previsse, de maneira expressa ou não, seria cabível a propositura de ação coletiva por pessoa diversa do titular do direito pleiteado.

A segunda corrente a respeito do tema é inspirada nas doutrinas alemã e italiana, tendo Kazuo Watanabe como expoente no Brasil na defesa da existência de uma legitimação ordinária quando há a tutela por entidades associativas de direitos de seus associados. Para essa corrente, como se trataria de defesa de direitos ligados aos fins associativos, tratar-se-ia de legitimidade ordinária, numa interpretação mais ampla do disposto no Código de Processo Civil. Ocorreria legitimidade por substituição processual apenas nos demais casos, estando a legitimidade do Ministério Público, portanto, encaixada apenas nesta última categoria quando da defesa dos direitos individuais homogêneos.

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direito não seriam identificáveis, sendo a escolha pela lei de determinadas pessoas para a defesa dos direitos coletivos uma mera opção do legislador, vez que os verdadeiros titulares não poderiam realizar efetivamente essa defesa.

Percebe-se que, hoje, a corrente adotada pela maior parte da doutrina pátria, corrente à qual se filia Teori Albino Zavascki (2005, p.134-135) e o próprio Didier, é a que preleciona ser situação de legitimidade extraordinária a verificada no caso das entidades determinadas nas leis atinentes à tutela coletiva de direitos. Tal fato se deu, inclusive, em virtude do surgimento de diplomas legais expressos em relação ao cabimento de legitimidade por pessoas diversas dos titulares dos direitos, como pode se verificar pelo disposto na Lei da Ação Civil Pública e no Código de Defesa do Consumidor.

No caso do Ministério Público, sabe-se que há possibilidade de atuação na defesa de seus interesses e suas prerrogativas, tendo a possibilidade de demandar, em casos excepcionais, como substituto processual (Zavascki, 2005, p.135). É nesta última hipótese que se encaixa a atuação do Parquet quando da propositura de Ação Civil Pública, vez que atua em nome próprio na defesa de direitos que não lhe pertencem, no caso, os direitos coletivos lato sensu. Essa possibilidade está prevista expressamente no artigo 5º da LACP, já em seu inciso I, permitindo que o MP ajuíze não só ação principal, mas também atue necessariamente como fiscal da lei nos casos em que não figurar diretamente como parte.

Essa hipótese de legitimação extraordinária, embora haja posições divergentes, como acima demonstrado, é essencial à concretização da defesa dos interesses coletivos, pois, caso contrário, restaria um intervalo de direitos que, embora previstos pelos regramentos normativos pátrios como defensáveis, não encontrariam instrumento adequado ou legitimados interessados para sua defesa. No caso da Ação Civil Pública, é bastante visível essa busca do legislador de conferir efetividade na defesa dos direitos coletivos por meio da legitimação extraordinária. Nessa esteira de que se trata de legitimação extraordinária é que Hugo Nigro Mazzilli (2000, p.59-60) afirma:

A ação civil pública ou coletiva presta-se basicamente à defesa de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos. Por meio dessas ações, alguns legitimados substituem processualmente a coletividade de lesados (legitimação extraordinária). Essa legitimação especial dá-se em proveito da efetividade da defesa do interesse violado, pois que, em matéria

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28 ordem jurídica violada se usássemos a legitimação ordinária e deixássemos a cada lesado a iniciativa de comparecer individualmente em juízo, o que, sobre impraticável, faria gerar decisões contraditórias para os poucos que se aventurassem a comparecer em juízo.

(...) de nossa parte identificamos na ação civil pública ou coletiva a

legitimação extraordinária ou a substituição processual, o que não ocorre na hipótese em que o titular da pretensão aja apenas na defesa do próprio

interesse. Na ação civil pública ou coletiva, embora em nome próprio, os legitimados ativos, ainda que ajam de forma autônoma e, às vezes, também defendam interesses próprios, na verdade estão a defender em juízo mais que meros interesses próprios: zelam também por interesses transindividuais, de todo o grupo, classe ou categoria de pessoas, os quais não estariam legitimados a defender a não ser por expressa autorização legal. Daí porque esse fenômeno configura preponderantemente a legitimação extraordinária, ainda que, em parte, alguns legitimados ativos possam, na ação civil pública ou coletiva, também estar a defender interesse próprio.

Sabe-se que, embora tenha prevalecido a tese defendida por Nelson Nery Junior apresentada por Didier (2011) em sua obra, a situação de substituição processual deve ser interpretada restritivamente. Tal fato se dá a fim de que não se alargue de maneira temerária o disposto no artigo 6º do CPC, dispositivo este que elenca como exceção a possibilidade de se pleitear em nome próprio de direito alheio.

Há posições divergentes em relação a essa interpretação que deve ser dada às hipóteses de atuação do Ministério Público na defesa dos interesses coletivos lato sensu. Assim, a atuação do Parquet, para parte da doutrina, deveria ocorrer apenas nos casos expressos em Lei, a fim de que a regra, que é a do pleiteio pelo detentor do direito ou por pessoa que o representa, não seja sobreposta pela exceção, que é a substituição processual. Para outra parte da doutrina, seria possível a atuação do órgão ministerial em situações não previstas expressamente no ordenamento pátrio, a fim de se alcançar o real objetivo normativo quando da adoção de conceitos amplos e enumerações não taxativas ao tratar dos diversos direitos coletivos passíveis de tutela pelo MP.

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29 3.3 Aspectos gerais do processo de conhecimento no procedimento da Ação Civil Pública

A Lei da Ação Civil Pública em seu texto originário afirmava que este instrumento processual tinha o objetivo de regulamentar as ações de responsabilidade em caso de danos. Apenas no ano de 1994 é que nova redação foi conferida à LACP, momento em que se optou pela agregação dos termos “morais e patrimoniais” ao seu artigo 1º, a fim de se dirimir controvérsias existentes acerca do fato de ser essa espécie de ação cabível ou não nos casos de danos apenas de natureza moral.

Em regra, uma Ação Civil Pública (ACP), segundo Fredie Didier (2011), tramita sob o rito ordinário, podendo adotar o rito sumário nas hipóteses previstas no artigo 275, I, este que versa acerca do valor da causa (não superior a 60 salários mínimos). Há quem denomine o procedimento adotado nesse tipo de ação de “procedimento especial regulado em legislação extravagante”, embora o trâmite seja marcadamente de natureza ordinária, variando apenas em relação a determinados aspectos.

As principais peculiaridades da ACP dizem respeito à legitimidade de sua propositura, à competência para seu ajuizamento, à necessidade de inquérito civil, ao procedimento para concessão de medidas liminares, aos efeitos da coisa julgada, aos efeitos recursais e à situação em caso de condenação pecuniária. Estes três últimos aspectos serão discutidos adiante em tópicos próprios, por serem de maior importância para o presente estudo.

Vale ser destacado neste momento que a LACP buscou estimular os referidos legitimados ao ajuizamento desse instrumento processual, por meio da dispensa do pagamento de custas quando da propositura de uma ACP. Só será exigido esse pagamento em caso de comprovada má-fé, conforme determina o artigo 18 desse diploma normativo.

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dirigida a lide à capital do respectivo estado nos casos de danos a consumidores quando ocorridos em mais de uma comarca.

Nas ações que versarem sobre direitos individuais homogêneos, por outro lado, a competência deve ser considerada como territorial relativa, não sendo possível a eleição de foro, impedindo, com isso, que um legitimado acabe por necessariamente vincular os demais. Nesse aspecto, outras exceções são encontradas ao longo de outros diplomas normativos, estes que são subsidiariamente regidos pelos regramentos da LACP, tais como as ações coletivas em que se discute a responsabilidade do fornecedor, em que é possível o ajuizamento no foro do local do dano ou no foro do domicílio do autor.

A LACP prevê, também, a hipótese de elaboração de inquérito civil, que consiste em uma peça não obrigatória produzida pelo Ministério Público para subsidiar o ajuizamento da ação devida. Da produção desse inquérito pode resultar o aforamento da ACP, o arquivamento dos autos, ou a celebração de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), este que consiste em um verdadeiro compromisso do ofensor em adotar determinadas medidas de reparação e/ou prevenção do dano, sendo previsto como um título executivo extrajudicial.

No tocante ao procedimento liminar, a LACP determina não ser necessária a justificação prévia para a concessão de liminares, sendo cabível recurso de agravo em face dessa decisão. Entretanto, esse regramento sobre a concessão de medidas antecipatórias comporta exceções, como na situação em que a parte demandada é o Poder Público, sendo necessária a sua oitiva prévia.

A LACP prevê, ainda, a possibilidade de suspensão da liminar pelo presidente do tribunal a quem competir o julgamento do recurso de agravo, nos casos em que houver risco de lesão ordem, à saúde, à segurança e à economia pública, quando requerida por pessoa jurídica de direito público interessada. Dessa decisão de suspensão da liminar cabe agravo para uma das turmas julgadoras, no prazo de cinco dias. Outro aspecto relevante apresentado na referida lei diz respeito à possibilidade expressa de concessão de efeito suspensivo ao recurso de agravo quando o juiz verificar perigo de lesão irreparável à parte, nos termos do artigo 14 da LACP.

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Vê-31

se que são adotados alguns procedimentos que visam a conferir estímulos à propositura desse tipo de ação, bem como uma maior celeridade em relação aos efeitos pretendidos, sem o esquecimento, por outro lado, das necessárias cautelas para que não haja irreversibilidade ou ameaça, especialmente, nos provimentos liminares. Essa conduta comedida do legislador, ao disciplinar diversas possibilidades de concessão de efeito suspensivo aos recursos pode acabar, por muitas vezes, barrando a pretendida celeridade processual buscada pela LACP, embora a desnecessidade de justificação prévia para concessão de liminares possa ser considerada como um considerável avanço.

3.4 A coisa julgada coletiva nas ações coletivas que versam sobre direitos individuais homogêneos

A Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) e o Código de Processo Civil trataram de adotar definições acerca do que vem a ser a coisa julgada nos processos cabíveis no ordenamento jurídico pátrio. Assim preleciona a LINDB:

Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.

(...)

§3º Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba recurso

O Código de Processo Civil assim aduz:

art. 467. Denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário.

A coisa julgada é um dos elementos mais marcantes no tocante à diferenciação entre o processo individual e o processo coletivo. Sobre esse aspecto, três são os principais dados a serem analisados: os limites subjetivos e objetivos da coisa julgada e o modo como ela se forma. Os limites subjetivos correspondem aos efeitos da coisa julgada sobre os sujeitos, podendo ser inter partes(entre os participantes do processo), ultra partes(atingindo terceiros não participantes da lide)

ou erga omnes(todos, participantes ou não do processo).

No tocante ao modo como se forma a coisa julgada, verifica-se a possibilidade de sua produção de três formas: pro et contra, secundum eventum litis

ou secundum eventum probationis. Na primeira situação, a coisa julgada é produzida

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houver julgamento de procedência da lide. Na terceira hipótese, por sua vez, a coisa julgada é formada quando do esgotamento de provas, podendo ser modificada no caso de surgimento de prova nova.

As peculiaridades existentes sobre esses três pontos acima citados ocorrem em virtude do risco que correm os detentores do direito, estes que podem ter de arcar com prejuízos advindos de um processo do qual não participaram, em virtude da imutabilidade trazida pela coisa julgada, tendo em vista a legitimidade extraordinária cabível nos casos de tutela coletiva, em que os titulares do direito não participam da relação processual formada.

Outro importante ponto que gera essa necessidade de criação de dispositivos específicos para a tutela coletiva diz respeito ao fato de que o réu também não pode vir a sofrer a insegurança jurídica de ser em diversas oportunidades demandado pelo mesmo fato. Essa situação também deve ser vista sob o prisma estatal, pois este tem interesse na estabilidade e na segurança jurídica, a fim de que as decisões não sejam revistas por indefinidas vezes.

A sentença proferida em Ação Civil Pública terá, em regra, efeito erga

omnes, a teor do que dispõe o artigo 16 da LACP. Esse mesmo dispositivo é

expresso em relação à exceção a essa regra, exceção esta que afirma ser a eficácia

inter partes em caso de sentença de improcedência por insuficiência de provas.

Neste caso, o surgimento de novo elemento probatório possibilitará o ajuizamento de nova demanda sobre o mesmo fato anteriormente discutido, mas, apenas nos casos em que a nova prova seja suficientemente capaz, por si só, de ensejar alguma alteração na decisão anteriormente prolatada. A chamada “prova suficiente” é uma premissa específica das ações de natureza coletiva, não sendo obrigatório que a deficiência probatória seja claramente expressa na sentença de improcedência.

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33

103, disciplinou diversas regras para tentar criar um microssistema jurídico mais adequado à realidade da tutela coletiva. Vejamos os referidos regramentos:

Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa julgada:

I - erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I do parágrafo único do art. 81;

II - ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo improcedência por insuficiência de provas, nos termos do inciso anterior, quando se tratar da hipótese prevista no inciso II do parágrafo único do art. 81;

III - erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81.

§ 1° Os efeitos da coisa julgada previstos nos incisos I e II não prejudicarão interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade, do grupo, categoria ou classe.

§ 2° Na hipótese prevista no inciso III, em caso de improcedência do pedido, os interessados que não tiverem intervindo no processo como litisconsortes poderão propor ação de indenização a título individual.

§ 3° Os efeitos da coisa julgada de que cuida o art. 16, combinado com o art. 13 da Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, não prejudicarão as ações de indenização por danos pessoalmente sofridos, propostas individualmente ou na forma prevista neste código, mas, se procedente o pedido, beneficiarão as vítimas e seus sucessores, que poderão proceder à liquidação e à execução, nos termos dos arts. 96 a 99.

§ 4º Aplica-se o disposto no parágrafo anterior à sentença penal condenatória.

Art. 104. As ações coletivas, previstas nos incisos I e II e do parágrafo único do art. 81, não induzem litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes a que aludem os incisos II e III do artigo anterior não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida sua suspensão no prazo de trinta dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva.

Os dispositivos acima transcritos são bastante inovadores, vez que enumeram diversas hipóteses nas quais há a adoção de tese diversa da regra comumente adotada sobre a coisa julgada, sendo o presente tópico destinado à análise dessas peculiaridades quando da formação de coisa julgada nos processos coletivos em que se discutem direitos individuais homogêneos.

Sobre essa espécie de direitos coletivos lato sensu, enumerada no artigo 81, §único, inciso III do CDC, a coisa julgada operará efeitos erga omnes apenas em caso de julgamento procedente da demanda coletiva, nos termos do artigo 103, inciso III do Código de Defesa do Consumidor acima citado. Vê-se que há, portanto, segundo Fredie Didier Junior (2011), a adoção do modo de produção secundum

evetum litis da coisa julgada coletiva nas situações que tratam de interesses

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substituídos pelos legitimados disciplinados em lei, não participaram diretamente da formação da convicção do julgador para o surgimento do provimento jurisdicional.

Outro detalhe importante enfatizado por Didier Junior acerca da coisa julgada nos casos de tutela dessa espécie de direito diz respeito ao fato de que em caso de acolhimento do pedido coletivo pode haver já a liquidação e posterior execução da sentença pelos detentores do direito violado. Esse fato decorre do disposto no artigo 103, §3º, o qual permite a extensão da coisa julgada às ações individuais, gerando economia e celeridade processual, bem como harmonia do ordenamento jurídico, vez que uma única decisão é capaz de amparar todos aqueles que poderiam vir a juízo discutir o mesmo direito já garantido a título coletivo.

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35 4 LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA LIQUIDAÇÃO E CUMPRIMENTO DE SENTENÇAS QUE VERSAM SOBRE DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS

Os direitos individuais homogêneos, pelas peculiaridades de sua natureza, recebem tratamento diferenciado dentro do Código de Defesa do Consumidor, diploma este que é subsidiário ao procedimento adotado na Ação Civil Pública. Assim, para liquidação e cumprimento do julgado coletivo obtido, faz-se necessário o estudo dos regramentos existentes, com a verificação da efetividade ou não dos dispositivos sobre o assunto vigentes em nosso ordenamento jurídico.

A análise mais detida acerca da liquidação e do cumprimento de sentença coletiva sobre interesses individuais disponíveis é mais enfatizada no presente estudo em decorrência da atualidade do tema. A pequena ocorrência prática de situações em que seja necessária a adoção desses regramentos deixa ainda muitas dúvidas acerca do fato de serem suficientes e adequadas ou não as normas constantes da atual legislação. O estudo a seguir é uma análise crítica do tema, com a busca de soluções para as diversas possibilidades de situações que podem surgir nos casos concretos.

4.1 Liquidação de Sentença proferida em Ação Civil Pública versando sobre Direitos Individuais Homogêneos

A sentença, como título executivo por excelência que é, exige como requisito para que seja possível a sua execução a liquidez, a certeza e a exigibilidade da obrigação contida no referido título, a teor do disposto no artigo 586 do CPC. Trata-se, inclusive, de regramento reproduzido no Projeto do Novo Código de Processo Civil, em seu artigo 742, demonstrando a atualidade desses requisitos. Ressalte-se que certeza e liquidez não se confundem, vez que a certeza está relacionada à definição da existência de uma dada obrigação e seus limites definidos no julgado, sendo a liquidez ligada ao valor específico a ser arbitrado quando de uma condenação.

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pelo demandado, bem como nas situações em que não se pode definir ao certo as consequências do fato ou ato ilícito realizado.

Assim, a liquidação de sentença é mecanismo adotado pelo Código de Processo Civil para a integração do decisum, a fim de permitir que determinado provimento jurisdicional possa vir a ser executado. Trata-se de situação em que se busca a complementação da norma estabelecida no título executivo formado, podendo se apresentar como uma fase processual, um incidente ou na forma de processo autônomo.

Embora seja considerada uma exceção no ordenamento jurídico nacional, a condenação genérica se apresenta como verdadeira regra no caso das ações de natureza coletiva, conforme assevera Grinover (2007). Essa exceção é ainda mais marcante quando da análise dos casos em que são discutidos direitos individuais homogêneos, por ser praticamente impossível que o legitimado extraordinário saiba ao certo o valor a ser conferido a cada um dos ofendidos que estão sendo substituídos no processo coletivo em determinados casos concretos. Nesse sentido, o próprio Código de Defesa do Consumidor em seu artigo 95 normatizou o entendimento de ser genérica a condenação do réu, fixando a responsabilidade do demandado pelos danos causados.

Outro aspecto peculiar da condenação nos casos em que são discutidos direitos individuais disponíveis diz respeito ao fato de que, diferentemente da apuração normal feita em uma liquidação de sentença, naqueles casos deve-se apurar não só o valor efetivamente devido pelo condenado, mas também os próprios titulares do crédito obtido com a condenação.

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Passando-se à análise propriamente dita da liquidação, vê-se, logo de início, que é necessária uma cognição mais profunda na liquidação de julgados no caso de direitos individuais homogêneos, pois deve ser apurado o dano individualmente sofrido e sua dimensão, juntamente com o nexo causal ou não do referido dano com o fato danoso contido na sentença proferida. Adotando-se esse raciocínio, percebe-se que a decisão acerca da liquidação do julgado deverá conter uma declaração que confirme ser determinado indivíduo credor de indenização conferida em título executivo judicial, assim como o quantum individualmente cabível a esse sujeito.

Sobre o foro competente para a propositura da liquidação de sentença pelos legitimados, deve-se conferir uma interpretação adequada dos dispositivos do CDC. Isso porque o artigo 97 teve seu parágrafo único vetado, o qual afirmava ser possível o ajuizamento da liquidação de sentença no foro do liquidante. Como razões do veto, temos:

Esse dispositivo dissocia, de forma arbitrária, o foro dos processos de conhecimento e de execução, rompendo o princípio da vinculação quanto à competência entre esses processos, adotado pelo Código de Processo Civil (Art. 575) e defendido pela melhor doutrina. Ao despojar uma das partes da certeza quanto ao foro de execução, tal preceito lesa o princípio de ampla defesa assegurado pela Constituição (Art. 5º, LV).

Vê-se pela explanação acima que o veto adotado tem, em parte, razão de ser. Apenas no tocante ao fato de que o princípio da vinculação deve ser plenamente respeitado quando a liquidação tiver de ser promovida pelos legitimados extraordinários, os quais não encontrarão maiores obstáculos à promoção da liquidação do julgado, por ter o conjunto dos autos se formado naquele respectivo foro, estando as partes em igualdade quanto à providências necessárias à correta liquidação a ser processada.

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Assim, em virtude da ausência de regramento em vigor que defina expressamente o foro competente para a liquidação de sentença coletiva, deve ser feita interpretação teleológica do CDC, adotando-se para as situações narradas no artigo 97 o disposto no artigo 98, parágrafo segundo. Este artigo determina que a execução pode ser realizada tanto no foro da liquidação quanto no foro da execução, quando a liquidação tiver sido realizada pelos legitimados. Por outro lado, afirma ser competente para a execução coletiva apenas o foro da ação condenatória.

A adoção da interpretação de que seria possível a liquidação do julgado no foro do domicílio do titular do direito, além de conferir efetividade ao julgado coletivo, também advém da própria leitura da redação do inciso I do artigo 98, §2º do CDC. Como as redações legislativas adotam, em regra, apenas vocábulos necessários à correta apreensão dos artigos, a possibilidade de execução no juízo “da liquidação da sentença ou da ação condenatória” deixa claro que, embora não seja a regra geral para todos os casos de liquidação de sentença (coletiva ou individual, como determinava o disposto no parágrafo único do artigo 97, que foi vetado), é possível sim o ajuizamento da liquidação no foro do domicílio do titular do direito, quando diverso do foro da ação condenatória.

Essa interpretação vem sendo adotada nos tribunais pátrios, conforme se vê pela ementa abaixo transcrita:

PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LIQUIDAÇÃO COLETIVA DE SENTENÇA.

1. A controvérsia reside em definir o juízo competente para processar e julgar ação civil pública ajuizada com fundamento nas Leis 7.347/85 (Ação Civil Pública) e 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), em fase de liquidação de sentença promovida pelo Ministério Público.

2. Constatado o caráter coletivo da liquidação nas ações ajuizadas com o fim de preservar direitos difusos e coletivos, o foro competente será o da condenação, observando-se o rito do § 2º do artigo 475-A do CPC, tendo em vista a inexistência de dispositivo legal específico no Código Consumerista.

3. Da mesma forma, diante da ausência de regra acerca da competência para a liquidação coletiva de sentença nos processos em que sejam tutelados direitos individuais homogêneos, deve ser realizada

interpretação extensiva da norma prevista no artigo 98, § 2º, inciso II, segundo o qual competirá ao juízo condenatório a execução coletiva da sentença.

4. Assim, independentemente da natureza do direito tutelado pelo Ministério Público Federal - se difuso, coletivo ou individual homogêneo - o juízo competente para a liquidação será o da ação condenatória, já que se trata de liquidação coletiva, ou seja, requerida por um dos legitimados de que trata o artigo 82 do CDC.

(39)

39 (CC 113523/RJ, Relator Min CASTRO MEIRA, 1ª Seção, julgado em 23/02/2011, DJ 04/03/2011).

Percebe-se, portanto, que a liquidação de sentença prolatada em ação coletiva que verse acerca dos direitos individuais homogêneos deve obedecer a algumas peculiaridades procedimentais, sendo necessária maior carga cognitiva nessa fase processual. Embora haja quem diga ser sempre necessária a liquidação para a posterior execução do julgado, há de se ponderar que, em alguns casos concretos, é possível a simples realização de cálculos aritméticos para a verificação

do quantum devido a cada sujeito interessado.

Em contratos bancários, por exemplo, conforme afirma Fredie Didier (2011) a respeito do posicionamento de Luiz Rodrigues Wambier, é possível a intimação do sujeito passivo para que indique os ofendidos e seus respectivos valores, sem que haja uma necessária fase processual, esta que, na maioria dos casos, é bastante demorada e de difícil condução pelos sujeitos ativos, diante das diversas manobras processuais possíveis para que o devedor postergue o adimplemento da obrigação declarada em sentença.

Quanto às opiniões acerca do foro competente para a propositura da liquidação, vê-se que há notório avanço legislativo quando da autorização de ajuizamento da demanda no foro do domicílio do ofendido, que não é necessariamente o local onde foi proposto o processo de conhecimento. Imagine-se pessoa idosa e sem recursos que tem de juntar aos autos comprovantes de pagamento de cobrança abusiva perpetrada pelo ofensor a fim de demonstrar sua legitimidade para execução individual do julgado. A obrigatoriedade de propositura da liquidação no foro onde se processou a ação poderia se tornar um obstáculo intransponível para esse indivíduo, que provavelmente deixaria de ver seu direito efetivado pela falta de condições de realizar as diligências necessárias à sua satisfação.

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