A PROTEÇÃO PREVIDENCIÁRIA DO
EMPREGADO DOMÉSTICO
NO DIREITO POSITIVO BRASILEIRO
MESTRADO EM DIREITO
A PROTEÇÃO PREVIDENCIÁRIA DO
EMPREGADO DOMÉSTICO
NO DIREITO POSITIVO BRASILEIRO
Dissertação apresentada à banca examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito das Relações Sociais, sub-área de Direito Previdenciário, sob orientação do Professor Doutor Wagner Balera.
MESTRADO EM DIREITO
À Irene, minha mãe, que dedicou sua vida em prol de seus
filhos e netos, e que está guardada eternamente em meu
coração como exemplo de mãe.
Aos meus irmãos, de sangue e de jornada, Moacir e Albani, a
quem amo tanto.
À Ana Rita, mulher de fibra, empregada doméstica, que me
O trabalho de pesquisa, embora se desenvolva em momentos de solidão,
se traduz impossível sem a participação de mestres, amigos, familiares, enfim,
pessoas que nos ladeiam e dividem conosco momentos de alegrias, ansiedade,
vicissitude, cansaço. Entre elas não posso deixar de mencionar e agradecer
àquelas que me acompanharam de perto neste desafio.
Ao professor Wagner Balera, por sua dedicação ao magistério e amplitude
de conhecimentos, que me orientou neste trabalho e abriu minha mente para um
novo Direito Social.
Aos meus amigos da FAD, pelo ombro amigo nos momentos de desânimo
e cansaço.
Aos meus alunos, que me inspiram e motivam.
A minha amiga Therezinha, por seus sábios conselhos técnicos,
ay,para mí no hay justicia hasta mis padres están explotados.
Yo no he venido a robar tu riqueza yo no he venido a hacerme patrona sólo he venido buscando trabajo sólo he venido buscando justicia.
Todos me dicen que soy empleada todos me dicen que soy muchachita empleada pero luchadora muchachita pero muy valiente.
Esta dissertação de mestrado teve por escopo a pesquisa, a análise e a reflexão científica acerca do Empregado Doméstico junto à Previdência Social brasileira, desde a origem da modalidade trabalhista, quando, ainda vigia, lamentavelmente, a escravidão em território nacional até as nóveis conquistas levadas a efeito no decorrer deste primeiro quartel do século XXI. Para tanto, observou-se as diversas fontes do Direito, tais como a legislação constitucional e infraconstitucional, a doutrina, a jurisprudência, a analogia, as publicações em jornais e revistas de grande circulação e conceituado prestígio, bem como dos diferentes órgãos de proteção ao trabalho, e que versam acerca das questões trabalhistas e previdenciárias, e enfrentadas pelos empregados domésticos. Registre-se, ademais, que o cotejo dessas diferentes fontes permitiu retratar a diversidade de tratamento na elaboração das normas e de sua aplicação no que tange a categoria profissional, objeto desta obra, aliás, fato esse que facilita e proporciona o descumprimento dos específicos dispositivos legais. Todavia, face ao estudo efetivado, restou provado que, embora a alteração legislativa pertinente venha se apresentando, de maneira lenta e gradual, essa conquista se traduz em grande avanço da categoria a quem – e tão somente a ela – cabe a pertinente mobilização a fim de que, efetivamente, o empregado doméstico, num futuro bem próximo, venha a ser equiparado aos demais (empregados) no que diz respeito aos seus merecidos e constitucionalmente consagrados, direitos sociais.
The aim of this thesis is the research, analysis and scientific reflection about the House Servant in the view of the Brazilian Social Welfare, from the origin of the working modality – when the slavery in our national territory was a fact – up to the latest conquests carried on during the very beginning of this century. Being so, several sources of the Law Legislation were taken in account, such as its constitutional and infra-constitutional legislations, its doctrine, its juris-prudence, its analogy, the publications in periodicals and magazines of great circulation and appraised prestige as well as documents from other different departments, concerning the labour protection, which are working to solve these problems faced by the house servants. The analyses of these different sources allowed us to portray the different possible ways of dealing with the elaboration of the rules and their application in relation to this professional category – about which this work is concerned – whose fact makes it more difficult to pursue the specific legal devices. However, based on this study, it could be proved that, although the pertinent legislative alteration has been introduced slowly and gradually, it also means a great advance for this category to whom - and only to them - fits this mobilization itself. So that, in a very near future, the house servant will certainly come to be equalized to other employees, concerning his deserved and constitutionally approved social rights.
ROSELI DOS SANTOS MARTINS
A PROTEÇÃO PREVIDENCIÁRIA DO EMPREGADO
DOMÉSTICO NO
DIREITO POSITIVO BRASILEIRO
Ando, ando como empleada acompañada de tantos engaños ay,para mí no hay justicia hasta mis padres están explotados.
Yo no he venido a robar tu riqueza yo no he venido a hacerme patrona sólo he venido buscando trabajo sólo he venido buscando justicia.
Todos me dicen que soy empleada todos me dicen que soy muchachita empleada pero luchadora muchachita pero muy valiente.
RESUMO
Esta dissertação de mestrado teve por escopo a pesquisa, a análise e a reflexão científica acerca do Empregado Doméstico junto à Previdência Social brasileira, desde a origem da modalidade trabalhista, quando, ainda vigia, lamentavelmente, a escravidão em território nacional até as nóveis conquistas levadas a efeito no decorrer deste primeiro quartel do século XXI. Para tanto, observou-se as diversas fontes do Direito, tais como a legislação constitucional e infraconstitucional, a doutrina, a jurisprudência, a analogia, as publicações em jornais e revistas de grande circulação e conceituado prestígio, bem como dos diferentes órgãos de proteção ao trabalho, e que versam acerca das questões trabalhistas e previdenciárias, e enfrentadas pelos empregados domésticos. Registre-se, ademais, que o cotejo dessas diferentes fontes permitiu retratar a diversidade de tratamento na elaboração das normas e de sua aplicação no que tange a categoria profissional, objeto desta obra, aliás, fato esse que facilita e proporciona o descumprimento dos específicos dispositivos legais. Todavia, face ao estudo efetivado, restou provado que, embora a alteração legislativa pertinente venha se apresentando, de maneira lenta e gradual, essa conquista se traduz em grande avanço da categoria a quem – e tão somente a ela – cabe a pertinente mobilização a fim de que, efetivamente, o empregado doméstico, num futuro bem próximo, venha a ser equiparado aos demais (empregados) no que diz respeito aos seus merecidos e constitucionalmente consagrados, direitos sociais.
Palavras-chave= empregado doméstico; direitos sociais: Previdência Social
ABSTRACT
The aim of this thesis is the research, analysis and scientific reflection about the House Servant in the view of the Brazilian Social Welfare, from the origin of the working modality – when the slavery in our national territory was a fact – up to the latest conquests carried on during the very beginning of this century. Being so, several sources of the Law Legislation were taken in account, such as its constitutional and infra-constitutional legislations, its doctrine, its juris-prudence, its analogy, the publications in periodicals and magazines of great circulation and appraised prestige as well as documents from other different departments, concerning the labour protection, which are working to solve these problems faced by the house servants. The analyses of these different sources allowed us to portray the different possible ways of dealing with the elaboration of the rules and their application in relation to this professional category – about which this work is concerned – whose fact makes it more difficult to pursue the specific legal devices. However, based on this study, it could be proved that, although the pertinent legislative alteration has been introduced slowly and gradually, it also means a great advance for this category to whom - and only to them - fits this mobilization itself. So that, in a very near future, the house servant will certainly come to be equalized to other employees, concerning his deserved and constitutionally approved social rights.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ... 14
CAPITULO I OS DIREITOS SOCIAIS DOS TRABALHADORES ...18
1.1 Conceito de Direito Social ... 18
1.2. Origem e Evolução Histórica dos Direitos Sociais ... 22
1.2.1 Cidadania e Conquistas Sociais ... 25
1.3 A Constitucionalização dos Direitos Sociais ... 26
1.4 Direitos Sociais e as Constituições Brasileiras ... 28
1.4.1 Constituição Imperial de 1824 ... 28
1.4.2 Constituição Federal de 1891 ... 29
1.4.3 Constituição Federal de 1934... 30
1.4.4 Constituição Federal de 1937 ... 31
1.4.5 Constituição Federal de 1946 ... 32
1.4.6 Constituição Federal de 1967 ... 33
1.4.7 Constituição Federal de 1969 ... 34
1.4.8 Constituição Federal de 1988: “Carta Cidadã”... 34
1.5 Direitos Sociais e a Reforma Constitucional ... 36
1.5.1 Cláusulas Pétreas... 38
1.5.1.1 Cláusulas pétreas explícitas ... 38
1.5.1.2 Cláusulas pétreas implícitas ... 39
1.5.2 Revisão... 40
1.5.4 Princípio de Vedação ao Retrocesso Social... 41
CAPÍTULO II PROTEÇÃO E SEGURIDADE SOCIAL ... 44
2.1 Conceito de Seguridade Social ... 44
2.2 A Noção de Risco e sua Evolução ... 52
2.3 Seguridade Social nas Constituições Brasileiras ... 55
2.4 Seguridade Social na Constituição de 1988 ... 55
2.5 Previdência Social ... 57
2.6 Os Princípios na Ciência do Direito: Breves Apontamentos ... 59
2.6.1 Diferença entre Princípios e Regras Constitucionais... 61
2.7 Princípios da Seguridade Social na Constituição Brasileira de 1988 ... 63
2.7.1 Princípio da Solidariedade... 64
2.7.2 Demais Princípios... 66
2.7.2.1 Princípio da universalidade de cobertura e do atendimento ... 66
2.7.2.2 Princípio da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais ... 68
2.7.2.3 Princípio da seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços ... 70
2.7.2.4 Princípio da irredutibilidade do valor dos benefícios ... 72
2.7.2.5 Princípio da equidade na forma de participação no custeio ... 74
2.7.2.6 Princípio da diversidade da base de financiamento ... 75
2.8 A Regra da Contrapartida ... 79
CAPÍTULO III EMPREGADO DOMÉSTICO: NOÇÕES PROPEDÊUTICAS ... 81
3.1 Evolução Histórica ... 81
3.2 Conceito ... 89
3.2.1. Empregador Doméstico... 89
3.2.2 Empregado Doméstico... 92
3.3 Empregado doméstico e sua Proteção no Plano Internacional ... 98
3.4 Empregado Doméstico nas Constituições Brasileiras... 101
3.5 Empregado Doméstico na Constituição Federal de 1988... 102
3.5.1 A Constituição Federal de 1988 e o Valor Social do Trabalho... 104
3.6 Diplomas Infraconstitucionais de Proteção ao Empregado Doméstico no Direito Brasileiro ... 108
CAPÍTULO IV O EMPREGADO DOMÉSTICO COMO OBJETO DE PROTEÇÃO PREVIDENCIÁRIA 4.1 Proteção Legal do Empregado Doméstico na Previdência Social: Panorama Histórico... 111
4.2 Contribuição Previdenciária do Empregado Doméstico ... 114
4.2.1 Natureza Jurídica da Contribuição Previdenciária... 115
4.2.2 Contribuição do Empregador Doméstico.. ... 116
4.3 Benefícios Previdenciários Conferidos ao Empregado Doméstico... 121
4.3.2 Aposentadoria... 125
4.3.2.1 Aposentadoria por idade ... 126
4.3.2.2 Aposentadoria por invalidez ... 129
4.3.2.3 Aposentadoria por tempo de contribuição ... 130
4.3.3 Auxílio-doença... 133
4.3.4 Pensão por Morte ... 135
4.3.5 Auxílio-reclusão... 137
4.4 Benefícios Previdenciários A Que Não Faz Jus O Empregado Doméstico ... 138
4.5 Análise do Empregado Doméstico à Luz do Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana ... 140
4.5.1 Breve Histórico ... 142
4.5.2 No Brasil... 143
4.6 Análise do Empregado Doméstico à Luz do Princípio da Igualdade ... 146
CAPÍTULO V EMPREGADO DOMÉSTICO E O DIREITO DO TRABALHO 5.1 Fundamentos da Proteção Trabalhista ... 151
5.2 Contrato de Trabalho e Principais Direitos... 152
5.2.1 Salário Mínimo... 155
5.2.2 Princípio da Irredutibilidade do Salário ... 157
5.2.3 Décimo Terceiro Salário... 158
5.2.4 Repouso Semanal Remunerado... 160
5.2.5 Férias... 162
5.2.7 Licença Paternidade... 169
5.2.8 Estabilidade da Gestante... 172
CONCLUSÕES ... 175
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 182
ANEXOS A) Maus tratos: comissões vão acompanhar denúncias ... 191
B) 30 mil domésticas trabalham sem salário no Brasil ... 192
C) Pobreza – Convenções – Exploração Sexual ... 194
D) Dia Nacional da Trabalhadora Doméstica ... 197
E) Ide a eles as criancinhas ... 201
F) OIT/ Trabalho Infantil Doméstico ... 203
INTRODUÇÃO
Este trabalho consubstancia-se no estudo dos direitos sociais, notadamente
acerca dos direitos previdenciários conferidos a um tipo específico de trabalhador, o
empregado doméstico, sobretudo face às peculiaridades da atividade, no que se
refere a conceitos, doutrina e jurisprudência e do próprio exercício laboral e sua
decorrência no âmbito previdenciário.
Por um lado o conceito e a evolução do empregado doméstico. Por outro
lado, igualmente, a evolução, qualificação e quantificação dos direitos sociais aos
empregados domésticos inerentes.
No exame dessa atividade, tem-se que no Brasil do passado, o serviço
doméstico dentro dos casarões era realizado por escravos, principalmente mulheres,
que cumpriam as tarefas domésticas de forma plena: nos afazeres habituais da
casa, na criação dos filhos dos senhores, inclusive amamentação, e na companhia
das senhoras, como amas e confidentes. Porém, como escravos que eram, havendo
qualquer contrariedade eram submetidos aos mais cruéis castigos. E, ainda que não
contrariasse, o tratamento dispensado aos escravos era desumano, sendo
ainda, uma agravante, eram escravas sexuais também, tanto do senhor como de
seus familiares.
Os traços marcantes desse momento histórico ficaram registrados no
passado, porém, várias nuances, ainda, se fazem presente atualmente.
De acordo com estatísticas recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), mais de 80% dos trabalhadores domésticos são negros ou
pardos; mais de trinta mil trabalhadores domésticos não recebem qualquer tipo de
salário, ficando adstritos ao trabalho em troca de casa e comida; grande parte
desses trabalhadores iniciam essa atividade antes dos 14 anos de idade, sendo esta
a porta de entrada para o abuso sexual infantil. Portanto, ainda tem-se no Brasil de
hoje, grande parte de empregados domésticos trabalhando em condições análogas
a de escravos, embora o sistema escravocrata tenha sido abolido em 1888. Prova
disso é que, inobstante a abolição da escravatura no País na data apontada, o
problema mereceu legislação específica, tipificando como crime a contratação de
trabalhadores na condição análoga a de escravo, vez que é ainda encontrada essa
situação.
O tratamento diferenciado, negativamente, e a ausência de legislação de
proteção, tanto na contratação quanto no decorrer do contrato de trabalho do
empregado doméstico ainda impera e a conseqüência no âmbito previdenciário se
Assim, foi essa a motivação principal da escolha do tema do presente
trabalho.
Como alicerce para melhor compreensão do objeto de análise proposto, o
estudo foi sistematizado em cinco capítulos, com vista a propiciar ao leitor a
contextualização do empregado doméstico inserido no universo jurídico-social.
No Capítulo I, são abordados o conceito e a evolução dos Direitos Sociais,
desde o seu nascedouro até os dias atuais, assim como a forma de proteção desses
direitos ao indivíduo, notadamente no plano constitucional.
No Capítulo 2, a abordagem se refere à Previdência Social, um dos membros
do Direito Social e que, dentro do contexto apresentado, vai abrigar sob seu manto
protetor toda a massa de contingente humano, fundamentada no respeito a seus
princípios e regras, e traduzida como um dos pilares da Seguridade Social.
Nos Capítulos 3 a 5 é desenvolvido o tema central deste trabalho, a saber, o
empregado doméstico. Inicia-se com a conceituação desse tipo específico de
trabalhador e de suas modalidades, abrangendo a legislação que norteia a proteção
do empregado doméstico no que se refere ao trabalho e à previdência social, sem
deixar de destacar a análise do empregado à luz dos princípios constitucionais da
dignidade da pessoa humana e da igualdade
No decorrer desta reflexão, verifica-se a interdisciplinariedade do Direito do
brasileiro, uma vez que se tratam de matérias afins, e, desta forma, não podem ser
deixados à margem os direitos trabalhistas do empregado doméstico, inobstante o
objeto desse estudo seja o âmbito previdenciário no trabalho desenvolvido pelo
doméstico.
Utilizaram-se, para a elaboração e análise do tema proposto no trabalho, a
pesquisa bibliográfica e jurisprudencial específica, além de alguns resumos
estatísticos, apresentados através de matéria jornalística em periódicos da grande
imprensa que estão colacionados, ao final, em anexos.
Não se pretende aqui esgotar o tema, posto ser bastante recente e, com
certeza muitos problemas ainda estão por vir acerca de relevante assunto, mas
pesquisar, analisar, refletir e tecer considerações sobre o mesmo.
Por fim, pretende-se com este trabalho apresentar o ideário a ser atingido
pelo empregado doméstico na garantia dos princípios constitucionais de garantia de
dignidade em seu trabalho, igualdade de tratamento com os demais empregados e a
garantia de trabalho que, embora esteja caminhando timidamente, poderá ser
alcançado com a implementação de políticas de proteção, não só ao empregado
doméstico, mas a todo empregado para que seja alcançada a Justiça Social,
CAPÍTULO I
OS DIREITOS SOCIAIS DOS TRABALHADORES
1.1 CONCEITO DE DIREITO SOCIAL
O Direito Social encontra-se amparado no Texto Constitucional vigente, em
seu Título II, Capítulo II. Para que seu estudo, como norma possuidora de caráter
fundamental que é, seja mais aprofundado, deve ser examinado inicialmente a partir
dos conceitos que lhe são atribuídos.
De uma forma bastante singela, pode ser conceituado o direito social
como aquele imposto ao Estado, como norma positiva, com objetivo primordial de
reduzir a desigualdade e problemas sociais, e de fazer algo, de natureza social, em
Segundo ZENO SIMM 1,
“...tal denominação encontra amparo muito mais pelos autores laboristas que pelos constitucionalistas, jusfilósofos ou outros pensadores que atribuem aos direitos sociais uma conotação bem mais ampla e que considera o indivíduo como ser humano integrante do mundo social, com direito a uma vida digna e a ter satisfeitas suas necessidades básicas de saúde, educação, segurança, trabalho, lazer, habitação, alimentação, etc. E é neste sentido que, modernamente e cada vez mais, vem sendo empregada a expressão direitos sociais, não mais limitada aos direitos oriundos de uma relação de emprego, porém, sim, como algo mais além dos simples e tradicionais direitos individuais, correspondendo àquilo que os autores em geral chamam de direitos fundamentais de segunda geração ou segunda dimensão.”
Citando FRANÇOIS EWALD, o mesmo autor assevera que2
“... o que caracteriza o direito social é bem mais que a legalização de objetos ou situações que por muito tempo estiveram excluídas do direito, mas que se trata de um processo de socialização e que não corresponde a uma ordem a respeito da qual se possa chegar a um acordo, mas, ao contrário, desfaz essa idéia: o direito social pretende ser um instrumento de intervenção destinado a compensar e corrigir desigualdades, a restaurar equilíbrios ameaçados, acrescentando que se trata de um direito de preferências, um direito de não-reciprocidades, um direito de discriminações positivas”.
Por outro lado, JOSÉ AFONSO DA SILVA conceitua direitos sociais
“...como dimensão dos direitos fundamentais do homem, e como prestações positivas, enunciadas em normas constitucionais, que possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, direitos que tendem a realizar a igualização de situações sociais desiguais. São, portanto, direitos que se conexionam com o direito de igualdade. Valem como pressupostos do gozo dos direitos individuais na medida em que criam condições materiais mais propícias ao auferimento da igualdade real que, por sua vez, proporciona condição mais compatível com o exercício efetivo da liberdade.”3
1 Zeno Simm.Direitos fundamentais e a seguridade social. São Paulo: LTr, 2005, p 54. 2 Idem, p. 56.
Para uma melhor compreensão do tema, não basta a simples
conceituação,ou o que seja direito social, mas igualmente se faz necessário sua
classificação para que se possa entender também quais são.
De uma maneira geral, os direitos sociais, pertencentes ao grupo denominado
direitos fundamentais da pessoa humana têm merecido variadas tipologias,
conforme não apenas os critérios de cada autor e a perspectiva em que se
colocaram, como também do respectivo momento histórico.
Nessa esteira ZENO SIMM 4, citando NORBERTO BOBBIO que, em sua excelente obra “A Era dos Direitos”, adota uma classificação dos direitos pelo critério
de “gerações”, a saber:
“1. de primeira geração, que são os direitos civis, como tais “as liberdades civis básicas e clássicas “surgidas ao longo do Século XVIII, de caráter “negativo” porque exercidos “contra” o Estado;
2. de segunda geração, que são os direitos políticos , conquistados no curso do Século XIX e início do Século XX, de caráter “positivo” porque se traduzem numa participação no Estado;
3. de terceira geração, que são os direitos econômicos e sociais , já próprios do começo do Século XX, ditos direitos “de crédito” por tornarem os indivíduos credores de uma atuação do Estado nos campos econômico e social;
4. de quarta geração, que são os direitos de solidariedade, compreendendo o homem numa visão internacional, ou supranacional, amparando o gênero humano independentemente das fronteiras nacionais.”
Contrariamente a esta tese, o conceituado autor apresenta ainda, a
classificação divergente de LINDGREN ALVES5 que assevera que:
4 Norberto Bobbio. Apud Zeno Simm. Op.cit .p.32/33. 5
“...há autores que defendem a precedência temporal dos direitos sociais sobre os direitos civis e políticos, porque aqueles teriam sido consagrados pela Organização Internacional do Trabalho (oriunda da antiga Liga das Nações, 1919), antecedendo a própria criação da ONU.6
Já, com base na Lei Maior vigente, JOSÉ AFONSO DA SILVA7, aponta a seguinte classificação:
- direitos individuais (art. 5º);
- direitos coletivos(art. 5º);
- direitos sociais (art. 6º e 193 e seg.);
- direitos à nacionalidade (art. 12);
- direitos políticos (art. 14 e 17).
Portanto, embora através de diferentes classificações ou até não o fazendo,
mas apenas arrolando-os, uma vez que não há consenso entre os diversos autores
e, principalmente, porque se encontram em constante processo de transformação,
os direitos sociais são espécie do gênero direitos fundamentais da pessoa humana
na forma do preceituado na Constituição Federal de 1988, ou seja, a natureza
jurídica dos direitos sociais seja mesmo a de direitos fundamentais e, conforme
asseverado pelo constitucionalista ANDRÉAS JOACHIN KRELL,
“...os direitos fundamentais sociais não são direitos contra o Estado, mas sim direitos através do Estado, exigindo do poder público certas prestações materiais, dando prevalência aos interesses coletivos antes que aos individuais, uma vez que são concebidos para atenuar as desigualdades de fato na sociedade.8
6 J.A Lindgrem Alves, apud Zeno Simm.Op.Cit p. 33.
Por outro lado, ILÍDIO DAS NEVES arremata a conceituação de direitos sociais sob uma nova perspectiva, em que aborda a missão de tais direitos quando, de forma brilhante assevera que os direitos sociais tem como missão fundamental
“assegurar de forma organizada a proteção aos cidadãos
contra determinados riscos da existência, pois se considera que os seus efeitos danosos não interessam apenas individualmente às pessoas, mas também à sociedade no seu todo.”9
1.2 ORIGEM E EVOLUÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS
Embora, de acordo com o entendimento dominante, os direitos sociais –
dentre eles os trabalhistas e previdenciários – tivessem seu nascedouro e
ganhassem maior força a partir da Revolução Industrial no século XIX, pode-se
afirmar que a proteção social precede a qualquer situação, uma vez que é inerente
à pessoa humana.
Desde os tempos mais remotos, a preocupação com os infortúnios
faz parte do cotidiano no seio familiar, em que os mais novos deferem proteção aos
mais velhos ou, em que os mais fortes protegem os mais fracos. Porém, essa
situação não perdura no tempo, uma vez que a desagregação familiar passa a
rejeitar tal preocupação e outros sistemas protetivos passam a ser adotados pela
8 Andréas Joachin Krell. Direitos sociais e controle judicial no Brasil e na Alemanha. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editora,2002. p.19.
sociedade, como o voluntariado e os socorros públicos10, o que vai culminar com a
proteção do Estado.
Dessa forma, a industrialização, com os problemas sociais e econômicos que
provocou, aliada às doutrinas socialistas e a constatação de que a previsão
meramente formal de liberdade e igualdade não garantia o gozo desses direitos,
trouxe, já a partir do século XIX, movimentos reivindicatórios em prol de uma
atuação positiva do Estado na realização da justiça social. Surgiram, assim, os
direitos econômicos, sociais e culturais da segunda dimensão, especialmente a partir
do século XX, com a sua inserção em um maior e crescente número de
Constituições e tratados internacionais, consagrando-se aos indivíduos o direito a
algumas prestações estatais de natureza social (saúde, trabalho, seguridade social,
educação, ...)11.
A partir do início do século XX, o movimento que se denominou
“Constitucionalismo Social” deu origem à inclusão dos primeiros direitos trabalhistas
e previdenciários às Constituições de seus Estados. Inicialmente com a Constituição
do México, de 1917, notadamente em seu art. 123, e Constituição Alemã, conhecida
como a Constituição de Weimar, em 1919, as quais foram as primeiras a prever tal
proteção, o que para muitos estudiosos vem a ser o nascedouro dos direitos sociais.
10 Os socorros públicos se manifestavam através de uma assistência à população carente. Segundo Miguel Horvath Junior, na obra Direito Previdenciário, p. 18,os socorros públicos são uma dívida sagrada,uma vez que, na forma como preceituado no art. 21 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1793, à sociedade cabe a subsistência aos infelizes, fornecendo-lhes trabalho e meios de existência àqueles que não estão em condições de trabalho.
Com a invenção da máquina a vapor, da instalação das linhas de montagem e
produção, da sociedade industrial e o trabalho assalariado, tem-se o início do direito
do trabalho, na forma como se apresenta atualmente.
Ademais disso, não foi um processo rápido e uniforme. A transformação do
Estado Liberal, e de plena liberdade contratual, em Estado Neoliberalista em que o
Estado intervém na ordem econômica e social limitando a liberdade plena das partes
da relação de trabalho, influíram politicamente na mudança desse estado de coisas.
Por outro lado, os trabalhadores, então reunidos nas fábricas, passaram a
formar associações com intuitos reivindicatórios de melhores condições de trabalho
e, na medida em que o direito de associação passou a ser tolerado pelo Estado,
deu-se a criação do sindicalismo com a criação das primeiras convenções de
trabalho e do contrato individual do trabalho.
Toda essa situação ensejou a criação de uma legislação capaz de coibir os
abusos perpetrados pelos empregadores e de preservar a dignidade do homem no
trabalho, que até então estava sujeito a jornadas excessivas de trabalho, salários
irrisórios, exploração dos menores e mulheres e desproteção total diante dos
acidentes de trabalho e riscos sociais como a doença, o desemprego, ...
A par desses fatos, a idéia de justiça social defendida, principalmente pela
Igreja Católica, através de suas Encíclicas, como a Rerum Novarum (1891) que
Laborem Exercens (1981) elaborada pelo Papa João II, o profeta do ano 2000,
também influenciou sobremaneira essas alterações.12
Se, no passado, o centro da questão era a “classe”, em épocas mais
recentes, o problema colocado é o “mundo”, para exame das desigualdades e
injustiças, ou seja, os destinatários da proteção passaram a ser considerados em
razão da coletividade e não mais da individualidade.
Para João Paulo II, “a Igreja vai encontrar logo nas primeiras páginas do Livro
do Gêneses a fonte dessa sua convicção, de que o trabalho constitui uma dimensão
fundamental da existência humana sobre a terra”.13
1.2.1 Cidadania e Conquistas Sociais
Historicamente, o termo cidadania sempre se referiu a homens livres que
vivem em cidades, partindo de uma concepção individualista – o indivíduo singular –
evoluindo do homem genérico, ou homem em abstrato, para uma posição de maior
concretitude, visto como um ente social com diversos status sociais.
Por outro lado, antes do século XVIII a cidadania era prerrogativa de um
círculo muito reduzido de pessoas e se revestia de contornos aristocráticos. Os
demais indivíduos ficavam totalmente desprotegidas de qualquer direito.
Essa mudança, constante da passagem das liberdades negativas do Estado
Liberal, para o Estado Democrático de Direito e, finalmente, para o Estado Social de
Direito, em que a intervenção do Estado é cada vez mais reclamada pelo cidadão
para a garantia e proteção dos direitos sociais, durou séculos.14
1.3 A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS
Além dos direitos individuais, que tem como característica principal a
imposição de um não fazer ou uma abstenção do Estado, as Constituições mais
recentes impõem aos órgãos estatais uma conduta positiva, um dever de assegurar
aos indivíduos prestações positivas, visando o seu bem-estar e o pleno
desenvolvimento da personalidade humana.
Anote-se, outrossim, que a inserção, de direitos trabalhistas e previdenciários
nas Constituições dos mais variados países deu-se o nome de Constitucionalismo
Social.
A primeira Lei Fundamental a inserir os direitos sociais em seu texto, foi a do
México, 1917, que tratava, em seu art. 123, dos direitos dos trabalhadores como a
jornada diária máxima de 8 horas, a proibição de trabalho ao menor de 12 anos,
limitação da jornada do menor, o direito ao salário mínimo e à igualdade salarial,
entre outros.
13 Irany Ferrari, Amauri Mascaro Nascimento e Ives Gandra da Silva Martins Filho. História do trabalho, do direito do trabalho e da justiça do trabalho.São Paulo:LTr, 1998. P.25
No mesmo sentido, a Constituição de Weimar, de 1919, na Alemanha, fincou
vários princípios com vistas à melhoria de vida dos homens e a preservação da
dignidade do trabalhador, contendo um conjunto de normas unificadas em um
sistema contemplando a ordem econômica e social.
Na esteira desse pensamento, CARLOS HENRIQUE BEZERRA LEITE
assevera que a “repercussão dessa Carta na Europa serviu de base para as demais
democracias sociais, sendo certo que, a partir de então, todas as Constituições
passaram a se ocupar das questões sociais.”15
No mesmo sentido, MANOEL JORGE SILVA NETO complementa que
“a introdução das normas de direito social nas constituições, se não forem remetidas ao plano da declaratividade e da retórica, revela o compromisso solenemente assumido entre os detentores dos meios de produção e da força de trabalho no sentido de buscarem uma sociedade menos desigual, ao mesmo tempo dignificadora do trabalhador e viável à atividade empresarial como expressão da economia de mercado e da livre iniciativa.”16
Dessa forma, está o constitucionalismo social fundamentalmente vinculado ao
princípio da não neutralidade, isto é, do não comprometimento da filosofia
constitucional com os desfavorecidos, como tem se visto nas constituições, como o
Texto Magno brasileiro de 1988, que organizam, de forma taxativa, os direitos
sociais.
15 Carlos Henrique Bezerra Leite. Constituição e direitos sociais dos trabalhadores. São Paulo: LTr, 1997. P.14.
1.4 OS DIREITOS SOCIAIS E AS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS
Na esteira do defendido pelos doutos em matéria constitucional, entre eles
TARSO FERNANDO GENRO, todos os direitos sociais, porque pressupõem como
contrapartida o respeito aos direitos alheios, são direto-deveres. Neste sentido, os
direitos sociais inscritos nos diversos Textos Constitucionais brasileiros refletiram de
uma parte as necessidades decorrentes da formação social capitalista que aqui
vigora com a universalização das suas relações de mercado e, de outra, a
capacidade de barganha dos trabalhadores com suas forças mais ou menos
organizadas, nos enfrentamentos de classe.
Todos os Textos Constitucionais brasileiros arrolam uma série de direitos,
inseridos no princípio maior de proteção do direito à propriedade privada, que o
sistema jurídico como um todo impõe o dever de respeitá-los de maneira inequívoca,
conforme se pode verificar do elenco aqui arrolado.
1.4.1 - Constituição Imperial de 1824
A chamada “Constituição Política do Império do Brasil”, de 25 de março de
1824, de caráter acentuadamente liberal, e recebeu o influxo absenteísta da
Constituição francesa de 1814 que trazia assentados os princípios de igualdade e de
A dissolução da Assembléia Constituinte de 1823, face ao eficiente
liberalismo adotado, influiu de forma direta para o caráter liberal do texto de 1824,
principalmente ao atentar-se à circunstância da elaboração da Lei Magna por um
Conselho de Estado composto de antigos constituintes.
Face ao momento histórico apontado, não poderia a Constituição de 1824
inscrever normas constitucionais sociais, o que redundaria em posição de vanguarda
e sem precedente no direito constitucional comparado.17
1.4.2 Constituição Federal de 1891
Examinando sob a ótica da dimensão histórico-evolutiva, o Texto de 1891,
primeiro texto republicano, também não trouxe qualquer avanço em termos de
inclusão dos direitos sociais. Seu caráter foi mais direcionado à modificação da
estrutura política (de Monarquia para República) do que em relação à inovação do
sistema econômico.
Inobstante, o direito social foi pela vez primeira inserido num Texto
Constitucional, ao versar sobre direito do trabalho, quando confere competência ao
Congresso Nacional para legislar a respeito.18
1.4.3 Constituição Federal de 1934
O Texto Fundamental de 1934 teve a primazia de introduzir um capítulo
dedicado à Ordem Econômica e Social, nas Constituições brasileiras, sendo um
marco da evolução histórica do direito constitucional pátrio, uma vez que garantiu os
direitos sociais. Essa garantia, como se disse, foi seguida pelas seguintes,
porquanto passaram a eleger o constitucionalismo social como instrumento à
consecução do bem-estar geral, como programa a ser desenvolvido pelo
administrador e obedecido pelo legislador, mitigando as tensões oriundas da relação
entre o capital e o trabalhador.19
Inspirada na Constituição de Weimar, a Norma de 1934 apresenta um
paradoxo: o corporativismo e o pluralismo sindical.
Nessa esteira de pensamento, lembra AMAURI MASCARO NASCIMENTO
que:
“...o corporativismo da Constituição de 1934 está expresso na organização do Poder Legislativo, com a presença, no processo de elaboração legislativa, ao lado da representação política, da representação profissional e econômica, de modo a acrescentar, na Câmara dos Deputados, além dos representantes eleitos por sufrágio universal, os deputados classistas, representando as forças produtivas, o capital e o trabalho. Elaborada por duzentos e cinqüenta e quatro constituintes, dos quais duzentos e quatorze deputados eleitos e quarenta deputados classistas, teve duzentos e treze artigos e foi promulgada em 16 de julho de 1934”.20
Dessa forma, a Norma Vértice de 1934, traduziu-se como intervencionista,
mostrando claramente sua preferência pelo Welfare State (estado do bem-estar)21.
1.4.4 Constituição Federal de 1937
Sob a justificativa de que o Estado não dispunha de meios normais
de preservação e de defesa da paz, da segurança e do bem-estar do povo, com o
apoio das Forças Armadas e cedendo às inspirações da opinião nacional, foi editada
pelo então Presidente da República, Getúlio Vargas, a Carta de 1937.
Era o início do Estado Novo, nitidamente intervencionista, principalmente na
Ordem Econômica e Social.22
Esse Texto representou um retrocesso em relação à Constituição anterior, de
caráter democrático, uma vez que restringiu a autonomia privada coletiva.
Embora vinculada ao Poder Executivo, foi criada a Justiça do Trabalho e, com
o intuito de obter o apoio dos setores estratégicos da sociedade não procedeu à
diminuição ou eliminação das normas constitucionais trabalhistas, porém,
apresentou radical diversidade de tratamento em relação ao direito individual e ao
21Welfare State, traduzido como Estado de Bem-Estar Social, preconizava que cabe ao Estado assegurar ao cidadão um nível de vida suficientemente digno, prevalecendo acima de tudo o bem-estar social, através do atendimento a outras demandas da sociedade, inclusive a previdência social.
direito coletivo do trabalho, manifestando, por exemplo, que a greve, na forma como
estava colocada, era um verdadeiro delito.23
1.4.5 – Constituição Federal de 1946
Considerada como uma das mais avançadas para a época, a Constituição
democrática de 1946 declarou o trabalho como um dever social, que tinha por
objetivo assegurar a todos, uma existência digna.
Essa Lei Fundamental, votada por Assembléia Constituinte legalmente
estruturada, reorganizou o Estado brasileiro nos moldes democráticos, incluiu a
Justiça do Trabalho como órgão do Poder Judiciário, sendo certo, ainda, que a sua
constituição encontra-se presente até hoje.
Além dessa modificação, merece destaque outras importantes disposições
sociais ali contidas: ficou assegurada a participação obrigatória e direta do
trabalhador nos lucros da empresa; repouso remunerado, preferencialmente aos
domingos; estabilidade na empresa; direito de greve; liberdade de associação
profissional ou sindical; e, competência da Justiça do Trabalho para julgar os
dissídios coletivos.
1.4.6 Constituição Federal de 1967
Num período em que se encontrava o País sob regime militar, instaurado com
a Revolução de 30/março/1934, que intentava garantir a harmonia e a solidariedade
entre os fatores de produção, bem como a valorização do trabalho humano, foi
promulgada a Constituição de 1967.
Embora autoproclamando-se promulgada, essa Carta foi imposta pela força
militar, razão pela qual alguns doutrinadores atribuam a Ela uma classificação de
semi-outorgada.
Os direitos dos trabalhadores, individuais e coletivos, anteriormente
garantidos na Constituição de 1946, foram mantidos, sendo, porém, restringido o
direito de greve que ficou proibida nos serviços essenciais e nos serviços públicos.
Enfatizou-se a integração do trabalhador na vida e no desenvolvimento da
empresa, com participação nos lucros e, excepcionalmente, na gestão da
empresa.24
Foi, ainda, introduzida uma alteração em relação à idade mínima de ingresso
do adolescente no mercado de trabalho formal, que retrocedeu de 14 para 12 anos
de idade, assim como foi instituído o regime do Fundo de Garantia do Tempo de
Serviço (FGTS) que passou a coexistir com o sistema de estabilidade decenal.25
Cumpre registrar, contudo, que tal regime somente não era obrigatório,
cabendo ao empregado a opção entre o regime anteriormente em vigor e que
permanecera – estabilidade decenal – e o novo regime – FGTS.
1.4.7 Constituição Federal de 1969
Em razão de recesso forçado em que se encontrava o País, em 1969, três
ministros da Forças Armadas outorgam, sob o rótulo de uma Emenda Constitucional,
nova Constituição Federal, em 17/outubro/1969.
Os direitos sociais, nesse Texto, foram praticamente mantidos como no
anterior, mas, por ter consagrado privilégio exacerbado à União, atribuiu
competência à Justiça Federal para as causas em que ela, as autarquias e
empresas públicas federais, figurassem na condição de autoras, rés ou terceiras
interessadas, inclusive em matéria trabalhista, ou seja, retirou da Justiça do Trabalho
a competência para apreciar e julgar as referidas causas.
1.4.8 Constituição Federal de 1988: “Carta Cidadã”
A Constituição Federal brasileira de 1988 traduziu-se como uma das mais
avançadas na proteção dos Direitos Sociais do cidadão.
Desta forma, embora as Constituições brasileiras anteriores trouxessem em
seu bojo a garantia de Direitos Sociais, oriundas do Constitucionalismo Social
inaugurado pelas Constituições do México e da Alemanha, conforme analisado em
itens anteriores nesse trabalho, a Norma Máxima vigente, promulgada em 5 de
outubro de 1988, traz, já no preâmbulo a garantia dos direitos sociais, quando diz:
“Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício
dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o
desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL”. (grifou-se)
A consagração do novo Estado Social de Direito, lastreado no sistema
democrático, elegeu como fundamentos da unidade política nacional a “dignidade da
pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo
político.”26
Os direitos sociais, previstos na Norma Vértice vigente encontram-se
sediados no Título II (Dos direitos e garantias fundamentais).
Os doutos em matéria constitucional, classificam os direitos sociais,
merecendo destaque a tipologia formulada por JOSÉ AFONSO DA SILVA, que os
agrupam em cinco classes:
a) direitos sociais relativos ao trabalhador;
b) direitos sociais relativos à seguridade, compreendendo os direitos à saúde, à
previdência e à assistência social;
c) direitos sociais relativos à educação e à cultura;
d) direitos sociais relativos à família, criança, adolescente e idoso;
e) direitos sociais relativos ao meio ambiente.
Outra tipologia é mencionada pelo referido jurista:
a) do homem produtor
b) do homem consumidor.
Já, CARLOS HENRIQUE BEZERRA LEITE, abarca outra classificação para
os direitos sociais:
a)direitos trabalhistas individuais (art. 7º da CF/88);
b)direitos trabalhistas coletivos (art. 8º A 11 da CF/88)27
São esses direitos sociais dos trabalhadores domésticos, conforme
exposto no § único do art. 7º da Lei Maior já citado, notadamente aqueles referidos
no plano previdenciário, que examinar-se-á no decorrer do presente trabalho.
1.5 DIREITOS SOCIAIS E A REFORMA CONSTITUCIONAL
Antes de adentrar no exame dos direitos sociais dos trabalhadores
domésticos garantidos constitucionalmente, cumpre inicialmente tratar de sua
proteção, de forma que denotem a segurança jurídica inerente a um Texto Maior
perante a sociedade.
No dizer de LUIS PINTO FERREIRA, uma Constituição não é uma obra
eterna, que se perpetua durante séculos.28 Na sua elaboração de um texto constitucional tem-se como objetivo que deverá se perpetuar no tempo, porém com
possibilidades de alteração face a necessidade de adequação daquelas ao processo
de evolução, das condições sócio-econômicas e do desenvolvimento ideológico
daquela sociedade.
Dessa forma, o próprio texto constitucional há de prever as formas com que
poderão ser revisadas ou emendadas. Se através de processo específico para tal
fim, serão denominadas Constituições rígidas, se através dos mesmos critérios
estabelecidos para a elaboração de leis ordinárias, serão Constituições flexíveis.
O Texto Constitucional de 1988, com base nessa diferenciação, é uma
Constituição rígida, uma vez que nela estão contidas pelo menos três formas de
limitação ao poder de reforma: limitação temporal, limitação circunstancial e
limitação material.
Limitação temporal em razão, por exemplo, da previsão de que após cinco anos de
sua promulgação (1993) poderia ser reformada, conforme previsto no art. 3º do Ato
das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT):
A revisão constitucional será realizada após cinco anos, contados da promulgação da Constituição, pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão unicameral.
Limitação circunstancial diz respeito a determinadas situações ou eventos que são
limitadores do processo de reforma, na forma prevista no art. 60, § 1º do texto
permanente:
A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio.
A limitação material, também denominadas cláusulas pétreas, que ficam a salvo de
reformas pelo poder constituinte reformador, podendo então ser explícitas ou
implícitas.
1.5.1 Cláusulas pétreas
Conforme já mencionado, as cláusulas pétreas assim denominadas em razão
da limitação ao Poder Reformador derivado, podem ser explícitas, quando o próprio
texto define quais matérias não serão alvo de reforma e implícitas quando, embora
não traduzidas expressamente, decorrem do próprio espírito da Constituição, de
princípios norteadores da Constituição.
1.5.1.1 Cláusulas pétreas explícitas
Como cláusulas pétreas explícitas do Texto Constitucional de 1988, o § 4º do
“Art. 60 (...)
§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I – a forma federativa de Estado;
II – o voto direto, secreto, universal e periódico; III – a separação dos Poderes;
IV – os direitos e garantias individuais.”
1.5.1.2 Cláusulas pétreas implícitas
Já as cláusulas pétreas implícitas, aquelas não expressamente declaradas
como tal mas que são inerentes aos princípios norteadores da Constituição e que,
segundo NELSON SOUZA SAMPAIO, citado por CELSO RIBEIRO BASTOS29 estão caracterizadas em quatro categorias:
1ª) as relativas aos direitos fundamentais, os quais, por força do Título II, Capítulos I,
II, III e IV, da Constituição, abrangeriam os Direitos Individuais e Coletivos, os
Direitos Sociais, os Direitos de Nacionalidade e os Direitos Políticos;
2ª) as concernentes ao titular do poder constituinte;
3ª) as referentes ao titular do poder reformador;
4ª) as relativas ao processo da própria emenda ou revisão constitucional.
Além do elenco mencionado, o saudoso jurista30 informa, ainda, que se trata
de cláusula implícita proibitiva aquela que estabelece o órgão competente para
1.5.2 Revisão
Embora a doutrina brasileira utilize indiferentemente os termos reforma,
revisão e emendas para se referir às alterações efetivadas nas Constituições, e com
JOSÉ AFONSO DA SILVA, PINTO FERREIRA e MEIRELLES TEIXEIRA,
entende-se que a expressão reforma entende-se trata de gênero do qual são espécies a emenda e a
revisão, com significados distintos.31
Desta forma, revisão há de ser entendida como uma alteração considerável
mediante processo específico, mais lento e com maior grau de dificuldade de
reforma com o fim precípuo de estabilidade do texto constitucional.
Para a grande maioria de constitucionalistas a Lei Fundamental de 1988
somente comporta revisão (comportou) na forma do capitulado no Art. 3º do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias, que expressamente previu a possibilidade,
o tempo e a forma de revisão permitida em seu texto. Assim, tem-se:
A revisão constitucional será realizada após cinco anos contados da promulgação da Constituição, pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão unicameral.
1.5.3 Emendas
Por seu turno, a reforma constitucional na forma de emenda há de ser
entendida como aquela em que os pontos a serem reformados não possuem grande
relevância no que tange a garantia da estabilidade constitucional, podendo ser
efetivada por processos mais específicos e dificultosos que os previstos para a
elaboração das leis ordinárias, porém menos que na elaboração da revisão
constitucional.
Em arremate, se o texto constitucional já previu expressamente a única forma
de revisão, todas as demais modificações somente poderão ser levadas a efeito
mediante emendas, na forma do art. 60 do texto vigente, sem contudo abandonar a
preocupação de que um excessivo número de emendas pode levar a uma revisão
constitucional por via indireta.
1.5.4 Princípio de vedação ao retrocesso social
Por conseguinte resta a indagação:, os preceitos constantes no Título II – Dos
direitos e garantias fundamentais, Capítulo II – Dos direitos sociais, deferidos aos
trabalhadores, são passíveis de reforma, por via de emenda ?
E mais: quando o legislador constituinte limitou o poder de reforma, previsto
no art. 60, utilizando a expressão “aos direitos e garantias individuais” teria a
intenção de se referir aos “direitos e garantias fundamentais”?
De acordo com o entendimento esposado por CARLOS HENRIQUE
BEZERRA LEITE32, o princípio ali contido comporta uma interpretação extensiva e sistemática da expressão.
31 José Afonso da Silva. Curso de direito constitucional, cit.,p.64.
Segundo o autor, é extensiva porque os direitos e garantias fundamentais
previstos no Título II compreendem, entre outros, aqueles elencados no Capítulo I –
Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, portanto protegidos contra o Poder
Reformador.
Também entende que a interpretação há de ser sistemática uma vez que os
direitos sociais individuais são intangíveis, pois que guardam conexão com o
princípio da isonomia insculpido no caput do art. 5º da Lei Magna e que traduzem o
espírito norteador da Assembléia Nacional Constituinte, conforme traduzido no Preâmbulo da Constituição de 1988:
“... instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias...”
Dessa forma, admitir que sejam passíveis de reforma os direitos elencados
no Capítulo de Direitos e Deveres Individuais e Sociais, seria na visão defendida por
JOSÉ JOAQUIM GOMES CANOTILHO, citado por MARCUS ORIONE
GONÇALVES CORREIA, uma “contra-revolução social ou evolução reacionária.”33
Dessa forma, pretende o autor informar que, em relação aos direitos sociais, assim
entendidos como os direitos dos trabalhadores, direito à assistência, direito à
educação, uma vez que atingido determinado grau de satisfação, passam a
constituir, ao mesmo tempo, uma garantia institucional e um direito subjetivo.
São direitos conquistados por avanços da sociedade, não por dádivas
estatais.
Assim, os direitos fundamentais, aí compreendidos os direitos sociais,
incorporam o patrimônio jurídico de um povo, não podendo, portanto, serm
destruídos, anulados ou reformados de forma a diminuir seu alcance, de forma a um
retrocesso. Somente poderão se substituídos por outro princípio mais importante na
CAPÍTULO II
PROTEÇÃO E SEGURIDADE SOCIAL
A situação do empregado doméstico perante a previdência social, objeto
principal do presente trabalho, não pode ser abordada sem ser levado a efeito um
breve estudo sobre a seguridade social, uma vez que a proteção ao homem nos
momentos de infortúnio, em que se busca ampará-lo e dar-lhe os meios necessários
para uma subsistência com um mínimo de dignidade, passa invariavelmente pelo
sistema de seguridade social, o qual, no ordenamento jurídico brasileiro, traduz-se
como a mais importante forma de proteção do homem pelo Estado, e, portanto,
merecedora desse capítulo.
2.1 CONCEITO DE SEGURIDADE SOCIAL
Como matéria complexa que é, a seguridade social não é de fácil
social igualmente há de se levar em conta o local e o momento histórico, em razão
da transitoriedade das necessidades que se pretende proteger.
Assim, não se pretende nesse trabalho trazer um conceito definitivo de
seguridade social, tão somente apresentar alguns conceitos recortados da doutrina
pátria e alienígena, que haverão de alicerçar essa pesquisa científica.
Desta forma também a doutrinadora MARISA FERREIRA DOS SANTOS34 entende que
“...conceituar a seguridade social, contudo não é assim tão simples. A definição das necessidades protegidas, que conduzem ao bem-estar e à justiças sociais, é sempre transitória, tornando transitório, também, o seu conceito, que só pode ser dado em vista de um ordenamento jurídico específico”.
Em razão dessa dificuldade, cumpre inicialmente abordar o significado
etimológico da expressão “seguridade social”. Na definição de AURÉLIO BUARQUE
DE HOLANDA, seguridade social seria sinônimo de segurança, de tranqüilidade. 35
Na mesma esteira de pensamento, CELSO BARROSO LEITE, em estudo que
trata do conceito de seguridade social, informa que:
“a idéia essencial de seguridade social reside em tranqüilidade e muitos consideram e alguns ainda consideram espanholismo a palavra seguridade, decerto pela freqüência da expressão seguridade social no idioma espanhol. Entretanto trata-se de vocábulo vernáculo, que, com acepção mais genérica, já foi uso corrente, embora tenha depois desaparecido do vocábulo cotidiano; e pode ser
34 Marisa Ferreira dos Santos. O princípio da seletividade das prestações de seguridade social.São Paulo: LTr, 2003. P.164
encontrada pelo menos no autorizado Dicionário da Língua Portuguesa, de Antonio de Moraes e Silva, publicado em 1813. A título de curiosidade, registro que no romance “Maurício” de Bernardo Guimarães, cuja primeira edição é de 1877, encontrei várias vezes seguridade com o sentido genérico de tranqüilidade e segurança.”36
Ademais, consoante enfatizado por JOSÉ DOS REIS FEIJÓ COIMBRA,
segurança é um dos termos do binômio que, com a liberdade, forma o sustentáculo
da felicidade humana.37
Em sua visão, informa, ainda, o conceituado jurista, que o homem, ao
integrar-se em uma sociedade, abre mão de uma parcela da liberdade, em troca da
quantidade de segurança que almeja. Em contrapartida, aquela, no seio da qual o
indivíduo vive, e que, por razões de conveniência geral, lhe exige a renúncia de uma
parcela da liberdade, não poderá deixar de compensá-lo da perda que sofre, com a
atribuição da desejada segurança.
Por esse caminho, a Constituição Federal de 1988, traduz o conceito de
Seguridade Social, em seu art. 194, in verbis:
Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.
De uma certa forma, divergindo vez por outra aqui e ali, mas em geral
caminhando no mesmo sentido, várias são as definições para o tão complexo tema.
36 Celso Barroso Leite. Curso de direito previdenciário: homenagem a Moacir Veloso Cardoso de Oliveira. Coord. Wagner Balera. 2.ed. São Paulo: LTr,2002.p.15.
MARISA FERREIRA DOS SANTOS, citando AUGUSTO VENTURI, define
“Os vocábulos seguridade e social são individualmente compreensíveis. Juntos, porém, formam uma expressão que tem sentido apreensível apenas dentro de um específico conjunto de normas. Isto porque o Direitoos anseios da sociedade em face das contingências que causam insegurança. O caráter transitório desses fatores faz com que freqüentemente a legislação da seguridade social se torne obsoleta, incapaz de dar conta das aspirações sociais, porque o Direito sempre se manifesta depois que os fatos demonstrem a necessidade de regulamentação.”38 Para CELSO BARROSO LEITE, em seu Curso de Direito Previdenciário
citado, também conceitua que:
“... a seguridade social deve ser entendida e conceituada como o conjunto das medidas com as quais o Estado, agente da sociedade, procura atender à necessidade que o ser humano tem de segurança na adversidade, de tranqüilidade quanto ao dia de amanhã. A capacidade de pensar é uma das características mais marcantes do homem; e pensar no futuro é uma forma ao mesmo tempo natural e avançada de exercer essa capacidade.”39
Igualmente definindo o mesmo título, o mestre WAGNER BALERA informa
que Seguridade Social “é o conjunto de medidas constitucionais de proteção dos
direitos individuais e coletivos concernentes à saúde, à previdência e à assistência
social.”40
Dada a importância e complexidade do tema, não apenas os doutrinadores
pátrios se preocuparam nessa conceituação, mas também em outros países,
respeitadas as suas próprias peculiaridades no tocante ao sistema de proteção de
cada um .
Segundo a denominação de JEAN JACQUES DUPEYROUX, seguridade
social é
“...o conjunto integrado de medidas públicas de ordenação de um sistema de solidariedade para a prevenção e remédio de riscos pessoais mediante prestações individualizadas e economicamente avaliadas. A seguridade social aparece assim como uma organização e meios técnicos estatais específicos destinados a garantir bens e serviços aos cidadãos que se encontrem em determinadas situações de inseguridade econômica.”41
De todas as manifestações doutrinárias apresentadas, vê-se que não basta
identificar o que seja seguridade social para o entendimento da matéria em
destaque. A pesquisa deve ir mais além. Há de buscar o objetivo principal da
seguridade social, qual seja a justiça social, de forma igualitária a todos os que de
dela necessitem.
Nessa esteira de pensamento, o conceituado jurista WAGNER BALERA,
através de estudo detalhado e profundo, assevera que:
“...para uma completa compreensão da seguridade social, é necessário vislumbrar-se a importância e alcance dos valores do bem-estar e justiça sociais, os quais são , de fato, bases do Estado Brasileiro, assim como diretrizes de sua atuação. A seguridade social é então meio para atingir-se a justiça, que é o fim da ordem social.”42
40 Wagner Balera. Noções preliminares de direito previdenciário. São Paulo: Quartier Latin, 2004.p.72. 41 Jean-Jacques Dupeyroux. Droit de la securité sociale. Paris: 1998.p.78.
Complementa, citando BEVERIDGE43 em seu afamado relatório, que o
conceito de seguridade social se confunde com o de política social, uma vez que a
“seguridade social tem por objeto abolir o estado de necessidade”. 44
Dessa forma, deixando para trás o conceito simplista de seguridade social, há
que se examinar principalmente os fundamentos nele contidos originariamente.
Nesse sentido, diversos doutrinadores têm se manifestado sobre a definição
de Seguridade Social, na modelo como se apresenta atualmente, e que aqui
merecem, de igual forma, serem analisados.
Assim já se posicionou ZENO SIMM quando afirma que
“Uma conceituação de seguridade social, portanto, deve partir, necessariamente, dessa idéia de proteção contra os riscos sociais que provocam as necessidades sociais. Alárcon Caracuel e Santiago González Ortega, afastando o critério puramente finalista, entendem que a idéia de satisfação de necessidades sociais é um elemento essencial – mas não suficiente – para a conceituação de seguridade social, porque essa é uma finalidade comum a toda a ação político-social do chamado “Estado de bem-estar”. Por isso e tomando em consideração outros elementos que reputam relevantes, dizem que “Seguridade Social é uma instituição jurídico-pública que tem como finalidade expressa dar satisfação a um determinado tipo dos direitos econômicos e sociais reconhecidos constitucionalmente, e como finalidade latente contribuir para a manutenção do sistema econômico-social vigente.”45
43 Relatório Beveridge que deu origem ao Plano do mesmo nome, foi o documento criado por Lord Beveridge, na Inglaterra em 1942, com o objetivo de apresentar alternativas para os problemas oriundos da reconstrução no pós-guerra. Neste projeto Bveridge visava a proteção “do berço ao túmulo” com a responsabilidade do Estado não só do seguro social, mas também de ações na área de saúde e assistência social, que originou a Seguridade Social, modelo utilizado até hoje.
44 Wagner Balera, Idem. p.69.