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PROFISSIONALIDADE E IDENTIDADE PROFISSIONAL DO PROFESSOR DE MATEMÁTICA: O FENÔMENO DO MAL-ESTAR DOCENTE E SUAS IMPLICAÇÕES

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC/SP

MAURICIO BERANGER

PROFISSIONALIDADE E IDENTIDADE PROFISSIONAL

DO PROFESSOR DE MATEMÁTICA: O FENÔMENO DO

MAL-ESTAR DOCENTE E SUAS IMPLICAÇÕES

MESTRADO PROFISSIONAL EM ENSINO DE MATEMÁTICA

(2)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC/SP

MAURICIO BERANGER

PROFISSIONALIDADE E IDENTIDADE PROFISSIONAL

DO PROFESSOR DE MATEMÁTICA: O FENÔMENO DO

MAL-ESTAR DOCENTE E SUAS IMPLICAÇÕES

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE PROFISSIONAL EM ENSINO DE MATEMÁTICA, sob a orientação da Profa. Dra. Célia Maria Carolino Pires.

(3)

Banca Examinadora

____________________________________

____________________________________

(4)

Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta Dissertação por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos.

(5)

Dedicatória Aos meus pais: EURIDES BERANGER (in memorian) e EUZA BERANGER,

Às minhas filhas: IZABELA e IASMIM IACI,

Aos meus irmãos: DÉBORA,LAODICÉIA,DIÓGENES,JONATAS e VIVIANE,

Aos demais familiares: tios, tias e sobrinhos,

em especial ao meu afilhado LUIZ EDUARDO SCABAR,

Às companheiras de convivências,

A todos agregados da família,

Aos companheiros e companheiras da oposição no sindicato APEOESP,

(6)

Mas vocês, estudantes de todo o mundo, jamais se esqueçam de que por trás de cada técnica há alguém que a empunha e que esse alguém é uma sociedade e que se está a favor ou contra essa sociedade. Que no mundo há os que pensam que a exploração é boa e os que pensam que a exploração é ruim e que é preciso acabar com ela. E que mesmo quando não se fala de política em nenhum lugar, o homem político não pode renunciar a essa situação imanente à sua condição de ser humano. E que a técnica é uma arma e que quem sinta que o mundo não é tão perfeito quanto deveria ser deve lutar para que a arma da técnica seja posta a serviço da sociedade, e antes, por isso, resgatar a sociedade, para que toda técnica sirva à maior quantidade possível de seres humanos, e para que possamos construir a sociedade do futuro [...]

(7)

AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos que, de uma forma direta ou indireta, contribuíram para a

realização deste trabalho, em especial:

À Professora Doutora CÉLIA MARIA CAROLINO PIRES, minha orientadora,

que com sua magnitude acadêmica aceitou mais esse desafio, proporcionando

dedicação, empenho e paciência, que demonstrou com muita simplicidade ser

uma verdadeira educadora e uma grande amiga.

Aos Professores Doutores UBIRATAN D’AMBROSIO e MARIA DO CARMO S.

DOMITE, que aceitaram participar da banca examinadora e deram contribuições

valiosas no exame de qualificação.

Aos meus professores do Mestrado Profissional que demonstraram e se

dedicaram à realização da arte do aprender a aprender. Em especial, aos

Professores Doutores VINCENZO BONGIOVANNI e LULU HEALY.

Ao meu amigo Ivan, pela imensa demonstração de amizade, carinho e

afeto, mostrando ser um mestre nato que nos ajudou a caminhar nos trechos mais

difíceis.

Aos meus amigos: SEBASTIÃO, LUIZ e ICLÉA, companheiros de longas

jornadas de estudos durante o curso, e em especial à MARIA APARECIDA DELFINO,

companheira que se destacou na preocupação em ajudar os colegas.

Aos professores que participaram da pesquisa, sem o que seria inviável a realização deste trabalho, e aos professores coordenadores pedagógicos e

diretores que contribuíram na coleta dos dados em suas escolas.

À companheira SÔNIA, pela a atenção, carinho e por organizar a coleta de

(8)

Ao companheiro JEFERSON, pelas colaborações valiosas pelo apoio e

incentivo e ajuda dada.

À companheira MONALIZA, pelo apoio e incentivo a minha pessoa para

realizar este curso.

À companheira MARIA DE MENEZES, pelo apoio, preocupação e incentivo a

minha pessoa para conclusão deste curso.

A todos os estudantes do Mestrado Profissional, que me confiaram o papel

de representante discente neste Programa de Educação Matemática.

Por fim, agradeço a todos os amigos e amigas que proporcionaram as

inter-relações humanas que serviram de crítica, apoio e ajuda na metamorfose

(9)

RESUMO

Este trabalho tem como objetivo contribuir para identificar e compreender alguns

comportamentos, conhecimentos, atitudes e valores que constituem a

especificidade de ser professor de Matemática (profissionalidade) e como sua

identidade profissional, composta e moldada por variadas componentes de

natureza (cultural, religiosa, étnica, entre outras) e resultante de mudanças

sociais, políticas, econômicas e tecnológicas, se revela no grupo pesquisado.

Busca demonstrar como um grupo de professores de Matemática se percebem na

sociedade atual e nas suas comunidades de atuação, como eles interagem com

as orientações curriculares veiculadas em propostas oficiais, como analisam os

resultados das avaliações e como se posicionam em relação a políticas públicas,

como as de inclusão, sistema de cotas e progressão continuada. Tem como

referências teóricas os trabalhos de Freire, Gimeno Sacristán, Apple e Thompson.

A pesquisa de campo foi elaborada por meio de um questionário organizado em

três blocos. No primeiro, procurou-se colher informações para delinear o perfil dos

professores pesquisados. No segundo bloco, cinco questões abertas foram

formuladas para que os pesquisados manifestassem suas opiniões e concepções

sobre a percepção que têm do papel do professor na sociedade, sobre sua

interação com as orientações curriculares veiculadas nas propostas oficiais, sobre

a análise dos resultados das avaliações em Matemática apontados em

macroavaliações e sobre seu posicionamento perante políticas públicas. No

terceiro bloco, foram elaboradas seis afirmativas para que os professores

entrevistados apresentassem sua concordância e discordância com cada uma

delas. Os resultados mostram que os professores participantes dessa coleta de

dados se sentem desmotivados, desvalorizados e deslocados social e

historicamente, pressionados pelas políticas públicas como macroavaliações e

progressão continuada. São contrários às cotas nas universidades

(considerando-as racist(considerando-as) e demonstraram não ter uma opinião definida do seu papel social e

de como os fatores culturais, sociais e políticos influenciam na sua ação

pedagógica.

(10)

ABSTRACT

The following research aims to contribute, identify and understand some

behaviors, knowledge, attitudes and values which will take part in the peculiarity of

being a Math teacher and how the professional identity, which is composed and

shaped by a variety of items such as cultural, religious, ethnic, among others, and

also resulting in social, political, economical and technological changes are

showed in the analyzed group. It is aimed by this piece of work to demonstrate

how a group of teachers see their roles in modern society and in their working

communities, how they interact with the curricula orientations in the official

documents, how the results of the tests are analyzed and how they face the

government decisions such as inclusion, cote system and developing program of

studies. The theorical references are the work done by Freire, Gimeno Sacristan,

Apple and Thompson. The field of research was made through a questionnaire

organized in three parts. On the first part, questions were made in order to draw

the teacher’s profiles. On the second part, five open questions were made so then

the teachers could express their opinions and conceptions about the role of the

teacher in the society, their interaction with the curricula orientation transmitted by

the official proposals, about the analysis of the results in the Math tests indicated

in macro tests, and also the point of view over the government decisions. On the

third part, six statements were formulated and the teachers had to agree and

disagree with each one. The results show that the teachers who participated in this

research do not feel motivated, valued, and feel apart from the society, also

historically under pressure because of the government decisions as:

macro-evaluation and the teacher training programme. They disagree with the university

cotes (finding them a way of expressing racial prejudice). They do not have a clear

opinion about their role and of cultural, social and political matters influence their

teaching practice.

(11)

SUMÁRIO

RESUMO... 09

ABSTRACT ... 10

APRESENTAÇÃO DA PESQUISA ... 14

I. Trajetória de vida e justificativa da escolha do tema ... 14

II. Justificativa da escolha e relevância do tema ... 17

III. Objetivos ... 18

IV. Procedimentos metodológicos ... 19

V. Estrutura do texto ... 20

CAPÍTULO 1 – REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ... 22

1.1 Alguns dados estatísticos sobre os professores brasileiros ... 22

1.2 As lições de Paulo Freire ... 25

1.3 Profissionalidade e identidade profissional ... 31

1.4 O fenômeno do mal-estar docente ... 34

1.5 Os professores e os projetos curriculares ... 39

1.6 As avaliações internacionais ... 47

1.7 Os professores de Matemática e suas concepções e crenças sobre a Matemática ... 50

1.8. As questões de pesquisa que emergem dessa revisão bibliográfica . ... 52

CAPÍTULO 2 – APRESENTAÇÃO DOS DADOS COLETADOS ... 53

2.1 Os instrumentos de coleta de dados ... 53

2.2 Caracterização do perfil dos professores participantes da coleta de dados ... 55

2.3 Categorização das respostas das cinco questões abertas apresentadas aos professores participantes da coleta de dados ... 56

(12)

2.3.2 Como o professor de Matemática interage com as orientações

curriculares veiculadas em propostas oficiais ... 60

2.3.3 Como o professor analisa e se posiciona perante os resultados das avaliações em Matemática apontados em macroavaliações

como SAEB, SARESP, ENEM, PROVA BRASIL, entre outras ... 64

2.3.4 Como o professor se posiciona em relação a políticas públicas, como a progressão continuada implantada na rede pública estadual;

a adoção do sistema de cotas para minorias nas universidades ... 68

2.3.5 Como o professor analisa se os sistemas públicos de ensino deveriam deixar totalmente a cargo da escola e de seus professores a definição de competências e habilidades, de conteúdos a serem ensinados, de abordagens metodológicas ou os sistemas de ensino

deveriam direcionar mais a ação das escolas e dos professores ... 72

2.4 Categorização das respostas das seis afirmações indicadas aos

professores participantes da coleta de dados ... 76

2.4.1 Os professores de Matemática deveriam ficar mais atentos aos valores que eles próprios incorporam, porque eles determinam a seleção dos conteúdos, estratégias, a metodologia, as habilidades e a avaliação. A própria relação com seus alunos está impregnada de

ideologia ... 76

2.4.2 Os professores de Matemática não têm assegurado o pleno conhecimento de novos currículos, antes de sua implementação em sala de aula, e em conseqüência não desenvolvem uma posição

crítica em relação a eles ... 80

2.4.3 Os currículos de Matemática propostos e praticados, de modo geral, são voltados para a transformação social, tendo em vista

formar um cidadão consciente, crítico e participante ... 83

2.4.4 Em sua atuação, os professores de Matemática levam em conta os direitos dos grupos desprivilegiados da sociedade e

também os valores culturais e históricos presentes no cotidiano ... 87

2.4.5 Os currículos de Matemática praticados não ajudam a superar a situação de marginalidade vivida por grande parte dos alunos, nem a modificam no sentido de um processo de conscientização cultural e

política ... 90

2.4.6 De modo geral, os currículos prescritos e praticados valorizam o supérfluo, contribuindo para perpetuar e legitimar as desigualdades

(13)

CAPÍTULO 3 CONCLUSÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 99

Respostas às questões de pesquisa 3.1 Como os professores de Matemática que participaram deste estudo se percebem na sociedade atual e nas suas comunidades de atuação ... 99

3.2 Como os professores de Matemática que participaram deste estudo interagem com as orientações curriculares veiculadas em propostas oficiais ... 100

3.3 Como os professores de Matemática que participaram deste estudo analisam os resultados das avaliações apontados em macro-avaliações como SAEB, SARESP, ENEM, PROVA BRASIL, entre outras ... 102

3.4 Como os professores de Matemática que participaram deste estudo se posicionam em relação a políticas públicas, como as de inclusão, sistema de cotas e progressão continuada ... 103

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 104

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 106

(14)

APRESENTAÇÃO DA PESQUISA

I. Trajetória de vida e justificativa da escolha do tema

Atuando como docente na rede pública estadual desde 1984 e participando

ativamente da organização sindical do magistério paulista como conselheiro

estadual desde 1993, ao longo desse tempo vivenciamos as políticas

educacionais implementadas pelo governo Federal e pelo Estado de São Paulo,

os efeitos da queda do prestígio social, da deterioração das condições de

trabalho, a perda do poder aquisitivo salarial e da precária situação econômica

dos professores, com sérias implicações como: a falta da identidade política e

profissional da função do educador em nossa sociedade, o grande desânimo no

exercício da profissão e a conseqüência da baixa procura, pelas novas gerações,

por cursos de formação de professores.

Nas escolas onde trabalhamos, podemos vivenciar situações conflitantes

que nos levam a questionar: por que professores, que são de origem operária, na

sua prática profissional têm tanta dificuldade de estabelecer uma identidade

classista com alunos das escolas públicas, operários ou filhos de operários?; por

que tantos professores de Matemática acabam por reforçar alguns mitos, como

os da incompetência dos alunos que freqüentam a escola pública, dando ênfase

às suas dificuldades em aprender Matemática?; por que tantos professores de

Matemática resistem em aceitar mudanças na sua prática docente, com intuito de

buscar uma verdadeira Educação Matemática de seus alunos?; por que tantos

professores demonstram, freqüentemente, tanta insatisfação com a profissão

docente e não se sentem responsáveis pela educação de seus alunos?

Retomando nossa trajetória de vida, como filho de uma família operária

composta de seis filhos, com pai ferramenteiro e mãe tecelã até se casar, tivemos

origem humilde que marcou nosso modo de ver o mundo. Nossos pais, por

encontrarem muitas dificuldades de locomoção e acesso, tiveram pouca

instrução escolar. Mesmo assim, formou-se ferramenteiro pelo Senai, em nível

(15)

destaque nos locais de trabalho por seu desempenho, criatividade e pela

disposição em ensinar cálculos aos demais empregados. Tanto nosso pai como

nossa mãe procuraram fortalecer a educação familiar baseada nos valores éticos,

morais e no respeito à pessoa humana, ressaltando a importância da escola.

Em nossa juventude vivenciamos algumas mudanças na organização do

ensino feitas pelos governos estaduais e federais, entre elas a que propunha no

ensino do 2.º grau uma formação profissionalizante (Lei 5.692/71) para atender às

necessidades de mercado, tendo sido, posteriormente, modificada.

Estudamos em escola pública no curso primário e ginasial, mas concluímos

o ensino médio numa instituição privada, com bolsa de estudos. Nessa instituição

tivemos oportunidade de perceber nossa vocação em ser professor, ajudando os

colegas de classe nas suas dificuldades, o que nos incentivavam a escolher essa

profissão.

Em 1983 ingressamos no Curso de Licenciatura em Ciências, com

habilitação em Matemática na Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de

Sorocaba. No último ano da faculdade, durante o estágio, solicitávamos ao

professor da sala para dar aulas. No último ano do curso, começamos a dar aulas

como professor eventual em escolas públicas da região de Sorocaba. Em 1986, já

formado, começamos a lecionar em São Roque. Cada vez mais, íamos vendo a

necessidade de ampliar os conhecimentos tanto em Matemática como na área do

ensino dessa disciplina, buscando então fazer cursos no Programa de Verão do

Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo.

No início da década de 90 passamos a ministrar aulas em Cotia para

facilitar as viagens a São Paulo para o curso de nivelamento no IME. No entanto,

os cursos não atendiam nossas necessidades, pois estávamos em busca de

alternativas para “ensinar Matemática”. E poucos se preocupavam em

desenvolver e estudar o “como ensinar Matemática”, de forma que se

transformasse em uma ferramenta para ajudar os alunos a superar os seus

obstáculos. Buscamos então cursar a disciplina “Prática de Ensino em

(16)

Oriosvaldo de Moura, na Faculdade de Educação, por meio do convênio entre a

USP e o Governo do Estado de São Paulo, onde tive a oportunidade de começar

a perceber a importância da “Educação Matemática”.

A partir de 1993, concomitante a essa procura do aperfeiçoamento de sua

formação acadêmica (institucional), motivados pela necessidade de estabelecer e

compreender o papel social do educador matemático, participamos das reuniões

da APEOESP – Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São

Paulo, com uma presença marcante na organização dos professores.

Fomos eleitos conselheiro regional e estadual, participando de reuniões,

simpósios, palestras e congressos para entender e analisar as políticas

governamentais para a educação do Estado de São Paulo. As principais

reivindicações profissionais tinham como eixo a reposição das perdas salariais e

reposição do poder aquisitivo, contra o aumento da jornada sem aumento salarial,

normalização da situação dos professores não-efetivos (contratados), entre outras

políticas neoliberais aplicadas pelos governos na educação do nosso país.

Participamos de agrupamentos de oposição, por nos posicionar contra as políticas

sindicais pro positivas, reformista e de conciliadora de classe adotada pelo nosso

sindicato Apeoesp. Essa procura da participação no meio sindical proporcionou

uma formação política social classista, motivados pela necessidade de

compreender o papel social e revolucionário do educador matemático.

Em 2004, ingressamos no Mestrado Profissional em Ensino de Matemática,

incentivados pela formação: familiar, acadêmica, sindical e pela existência do

Programa de Bolsas para cursos de Pós-Graduação da Secretaria Estadual de

Educação, com a finalidade de aperfeiçoarmos nossos conhecimentos sobre os

conteúdos matemáticos, aspectos didáticos e curriculares essenciais à atuação

do professor de Matemática. Ao longo do curso, foram muitas as aprendizagens e

diferentes temas abordados que despertavam interesse em investigá-los.

Entretanto, era preciso optar por um deles e essa escolha acabou recaindo na

proposição de estudar a profissionalidade e identidade profissional do professor

de Matemática. Estudando esse tema, buscamos compreender o fenômeno do

(17)

profissão, seu desprestígio social e a conseqüência da baixa procura, pelas novas

gerações, por cursos de formação de professores.

II. Justificativa da escolha e relevância do tema

A mídia e diferentes institutos de pesquisa têm dado destaque à situação

da educação do País e apresentado dados de forma bastante alarmante. A

literatura sobre o tema nos mostra que esse quadro não ocorre apenas no Brasil.

Autores portugueses, como Esteve (1995), denunciam que a sociedade parece

que deixou de acreditar na educação como promessa de um futuro melhor; os

professores enfrentam a sua profissão com uma atitude de desilusão e de

renúncia, que foi se desenvolvendo em paralelo à degradação da sua imagem

social.

O mal-estar generalizado entre os professores, segundo Esteve (1995),

precisaria ser enfrentado com a finalidade de ajudar os professores a diminuir ou

até eliminar os desajustes introduzidos por situações de reforma educativa. Para

tanto, deveriam ser realizados estudos das influências resultantes de mudanças

sociais sobre a função docente, estudos estes que subsidiariam o delineamento

de políticas de intervenção coerentes e que melhorassem as condições em que

os professores desempenham a sua atividade.

Concordando com Esteve, ressaltaríamos que, no caso do Brasil, a

ampliação de oportunidades educacionais, conquista do sistema de ensino em

nosso país, trouxe como conseqüência o aumento do número de professores que

passaram a atuar mesmo sem formação adequada e muitas vezes sem clareza

do que é a escola e de qual é o seu papel na sociedade atual.

Um destaque que gostaríamos de apontar refere-se ao fato de que os

professores estão imersos num contexto em que, ao mesmo tempo, há um

discurso sobre a crescente valorização do papel da educação na sociedade

contemporânea, direcionando o sistema educacional público ao desenvolvimento

de oferecer uma educação básica a alunos de todos os estratos sociais, e

(18)

internacionais. Muitos temas são polemizados: progressão continuada na escola

básica e sistema de cotas nas universidades, a grade curricular, o número de

alunos por sala de aula, a municipalização, a reorganização, as salas ambientes e

outras políticas de contenção de gastos aplicados pelos governos são alguns

exemplos que dividem as opiniões públicas.

Considerando o contexto acima descrito, julgamos relevante identificar qual

é a perspectiva de professores de Matemática a respeito de problemas e desafios

presentes no seu cotidiano e revelar valores que eles incorporam, levando em

conta que esses valores determinam a seleção dos conteúdos, estratégias, a

metodologia, as habilidades e a avaliação e que a prática docente está

impregnada de ideologia.

Assim, o presente estudo pretende contribuir para a sensibilização e

compreensão das influências resultantes de mudanças sociais e políticas sobre a

função docente, no caso particular de professores de Matemática, buscando

oferecer alguns subsídios para o delineamento de políticas de intervenção

coerentes e que possam subsidiar, melhorar e aliviar o mal-estar docente e as

condições em que os professores desempenham a sua atividade.

III. Objetivos

Nosso trabalho se insere na linha de pesquisa “Matemática na estrutura

curricular e formação de professores” e faz parte do projeto “Inovações

curriculares e formação de Professores de Matemática”, que reúne mestrandos e

doutorandos do Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação Matemática.

Tem como finalidade investigar os processos de formação inicial e continuada de

professores de Matemática e evidenciar as características do conhecimento do

professor que ensina Matemática, estimulando a reflexão sobre seu papel social e

os conhecimentos do professor, considerados essenciais, como também a

influência de crenças, cultura, de concepções e de atitudes do professor da

(19)

Tem como objetivo contribuir para identificar e compreender alguns

comportamentos, conhecimentos, atitudes e valores que constituem a

especificidade de ser professor de Matemática (profissionalidade) e como sua

identidade profissional, composta e moldada por variadas componentes de

natureza (cultural, religiosa, étnica, entre outras) e resultante de mudanças

sociais, políticas, econômicas e tecnológicas, se revela no grupo pesquisado.

Busca demonstrar como um grupo de professores de Matemática se percebe na

sociedade atual e nas suas comunidades de atuação, como eles interagem com

as orientações curriculares veiculadas em propostas oficiais, como analisam os

resultados das avaliações e como se posicionam em relação a políticas públicas,

como as de inclusão, sistema de cotas e progressão continuada.

IV. Procedimentos metodológicos

Nossa pesquisa foi desenvolvida segundo uma abordagem qualitativa.

Uma investigação qualitativa compreende características que, de acordo

com Bogdan e Biklen (1994), são as seguintes: na investigação qualitativa a fonte

direta de dados é o ambiente natural, constituindo o investigador o instrumento

principal; a investigação qualitativa é descritiva; os investigadores qualitativos

interessam-se mais pelo processo do que simplesmente pelos resultados ou

produtos; os investigadores qualitativos tendem a analisar os seus dados de

forma intuitiva; o significado é de importância vital na abordagem qualitativa.

Numa pesquisa qualitativa é fundamental buscar compreender o pesquisado

enquanto sujeito condicionado a fatores psíquicos e sociais inserido num espaço

demarcado por condições existenciais, das quais ele é produto.

Nosso primeiro passo neste trabalho de pesquisa foi apropriarmo-nos de

estudos que analisam questões referentes à profissionalidade, identidade

profissional, ideologia, currículo, concepções e crenças.

A coleta de dados foi elaborada por meio de um questionário organizado

em três blocos. No primeiro, procurou-se colher informações para delinear o perfil

(20)

formuladas para que os pesquisados manifestassem suas opiniões e concepções

sobre a percepção que têm do papel do professor na sociedade, sobre sua

interação com as orientações curriculares veiculadas nas propostas oficiais, a

respeito da análise dos resultados das avaliações em Matemática apontados em

macro-avaliações e sobre seu posicionamento perante políticas públicas. No

terceiro bloco, foram elaboradas seis afirmativas para que os professores

entrevistados apresentassem sua concordância e discordância com cada uma

delas.

Esse instrumento de coleta de dados foi distribuído a 50 professores,

pessoalmente, em visitas a escolas estaduais de Cotia, 8 em Osasco e 4 em uma

escola municipal da Capital. Também solicitamos resposta de professores de

São João da Boa Vista, Itapecerica e Promissão.

Dos 70 instrumentos entregues recebemos respostas de 27 professores de

Matemática da rede oficial estadual e municipal, sendo: 6 professores de São

Paulo/Capital, 8 de Cotia, 6 de São João da Boa Vista, 4 de Osasco, 1 de Itapevi,

1de Itapecerica da Serra e 1 de Promissão, que serão identificados como P1,

P2,..., P27, para assegurar o anonimato dos entrevistados.

As entrevistas foram transcritas sem correções ou inserções. Delas

extraímos trechos com base em algumas categorias que possibilitaram a

elaboração de uma síntese.

V. Estrutura do texto

Nosso trabalho está organizado em: apresentação da pesquisa e três

capítulos.

Na apresentação da pesquisa apresentamos a trajetória de vida do

mestrando e justificativa da escolha do tema, justificativa da escolha e relevância

(21)

No capítulo 1 abordamos a revisão bibliográfica, destacando os seguintes

pontos: alguns dados estatísticos sobre os professores brasileiros, as lições de

Paulo Freire, a profissionalidade e identidade profissional, o fenômeno do mal

estar docente, os professores e os projetos curriculares, as avaliações

internacionais, os professores de Matemática e suas concepções e crenças sobre

a Matemática e questões de pesquisa que emergem dessa revisão bibliográfica.

No Capítulo 2 apresentamos a coleta de dados, que se subdivide nos

seguintes pontos: os instrumentos de coleta de dados, caracterização do perfil

dos professores participantes da coleta de dados, e o processo de categorização

dos dados coletados das respostas das cinco questões abertas acompanhadas

dos respectivos comentários e categorização das respostas das seis afirmações

indicadas com os respectivos comentários.

Finalizamos com o capítulo 3, apresentando as conclusões e

considerações finais. Neste capítulo foram respondidas as quatro questões de

(22)

CAPÍTULO 1

REVISÃO BIBLIOGRAFICA

1.1 Alguns dados estatísticos sobre os professores brasileiros

Antes de apresentar uma síntese das leituras que fundamentaram nosso

estudo, consideramos interessante transcrever alguns resultados de um estudo feito pelo Unesco, em 2002, intitulado Estatísticas dos professores no Brasil, e que aponta algumas características da profissão de professor em nosso país.

O estudo mostra que um professor que atuava na Educação Infantil

ganhava, em média, R$ 423,00. Docentes que lecionavam em turmas de 1ª a 4ª

série recebiam R$ 462,00, e de 5ª a 8ª, R$ 600,00. Um professor que atuava no

Nível Médio ganhava, em média, R$ 866,00.

A remuneração de um professor do Ensino Médio, de R$ 866,00, é quase a

metade do salário de um policial civil e um quarto do que ganha um delegado de

polícia no Brasil. Entre o menor salário, o de professor da Educação Infantil, e o

de juiz, a diferença chega a ser de 20 vezes.

As diferenças salariais também são marcantes entre os professores nas

diversas regiões do País, e os menores rendimentos estão no Norte e Nordeste.

Um professor da Região Sudeste ganha, em média, duas vezes mais que seu

colega da Região Nordeste. Na Educação Infantil, por exemplo, o professor do

Sudeste ganha R$ 522,00 e o do Nordeste, R$ 232,00. No Ensino Fundamental

de 5ª a 8ª séries os salários são de R$ 793,00 e R$ 373,00 respectivamente, nas

Regiões Sudeste e Nordeste.

Segundo o estudo, o salário dos professores é o índice de maior peso no

cálculo do custo do aluno. Como a maioria dos professores da Educação Básica

encontra-se na rede pública, totalizando 85% das funções docentes, isso implica

a necessidade de uma reformulação da política de financiamento.

As condições de trabalho em relação à infra-estrutura das escolas da

(23)

insuficientes. Nas escolas públicas brasileiras, 45% dos professores atuavam em

escolas sem biblioteca. Na Região Nordeste, essa era a realidade para 66% dos

mestres.

Ainda em relação à infra-estrutura, 74% trabalhavam em estabelecimentos

sem laboratório de informática e cerca de 80% não contavam com laboratórios de

ciências.

O número de alunos por turma também é considerado elevado em todos os

níveis de ensino. Na creche, por exemplo, a média é de quase 18 alunos por

turma. No Ensino Médio é de mais de 37, e mais de 20% das turmas desse nível

de ensino no País possuem além de 40 alunos.

Em relação ao tempo de dedicação ao magistério, a maioria dos docentes

tem carga horária semanal superior a 20 horas. Na 3.ª série do Ensino Médio,

quase 25% dos professores de Língua Portuguesa e Matemática estão

submetidos a uma carga horária superior a 40 horas. Para os autores do estudo,

independentemente da causa, a dupla ou tripla jornada com certeza compromete

o desempenho do professor, pois concorre com outras atividades que exigem

tempo adicional para docência: planejamento das atividades em sala de aula,

disponibilidade para oferecer atendimento ao aluno e atividades administrativas

relacionadas à escola.

A formação dos professores melhorou em todos os níveis de ensino e

houve redução dos professores leigos na última década. Contudo, afirma o

estudo, “apenas 57% dos docentes que atuavam na pré-escola, ensino

fundamental e ensino médio, possuíam formação em nível superior, que seria

aquela ideal”.

Na pré-escola, por exemplo, 27% dos 259 mil docentes tinham nível

superior, em 2002, contra 17% em 1991. O índice de profissionais com o

fundamental incompleto caiu de 6% para apenas 1%, nesse período.

Considerando a formação exigida pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional (LDB) – magistério ou licenciatura – 91% dos professores que atuam

(24)

No Ensino Médio, das 469 mil funções docentes, 89% têm a graduação

completa e 79% deles, a licenciatura. Neste nível de ensino, no entanto, quase

11% dos docentes ainda possui somente o Ensino Médio completo, indicando a

necessidade de maiores investimentos em formação.

Na educação superior, do total de professores em 2001, 54% tinham

mestrado ou doutorado concluídos, 31% possuem especialização e cerca de 15%

concluíram somente a graduação. Em 1991, o percentual de mestres e doutores

era de 35%, 19 pontos percentuais menor.

Nos últimos anos, o número de ingresso nos cursos de graduação que

oferecem licenciatura mais que dobrou, passando de 166 mil, em 1991, para 362

mil, em 2002. Neste período a matrícula cresceu de 556 mil para 1.059 milhões e

o número de cursos passou de 2.512 para 5.880, com uma grande participação

da rede pública, que concentra 3.116 cursos.

Apesar do aumento no número de licenciados, a estimativa de novos

postos para atendimento das metas do Plano Nacional de Educação era de que

haveria carência de mão-de-obra até 2006. O problema deveria ser maior para as

séries finais do Ensino Fundamental e para o Ensino Médio, principalmente nas

áreas de Física e Química.

Em geral, mais de 80% dos professores da Educação Básica, de acordo

com dados do SAEB, participaram de formação continuada nos últimos dois anos.

Essa realidade é similar para todas as regiões do País. No entanto, o cruzamento

dessa informação com os resultados alcançados pelos alunos nas provas de

Língua Portuguesa e Matemática do SAEB indica que os cursos de formação

continuada aparentemente apresentam pouco impacto no desempenho dos

alunos. Segundo o estudo, isso mostra “a necessidade de ampliar as pesquisas

nessa área e, eventualmente, reorganizar esses cursos, redefinindo seus

objetivos e métodos”.

Lecionam em escolas da área rural brasileira cerca de 354 mil docentes,

15% do total. O campo concentra cerca de 50% dos estabelecimentos de ensino

(25)

geralmente, pequenas e com um único professor que trabalha com turmas

multisseriadas.

Em função dessas características, o quadro de carência de pessoal

qualificado no meio rural é ainda mais crítico do que na zona urbana. No Brasil,

cerca de 9% dos docentes da zona rural que atuam nas séries iniciais do Ensino

Fundamental têm formação superior. Na zona urbana esse contingente

representa 38%.

As Regiões Norte e Nordeste apresentam situação ainda mais

problemática. No Norte, menos de 1% dos professores das séries iniciais do

Ensino Fundamental tem a graduação, enquanto na Região Sul chega-se a 23%.

Por outro lado, o quantitativo de docentes leigos neste nível de ensino na Região

Norte é de 12% e de 4% para a Sul.

1.2 As lições de Paulo Freire

Com esse panorama que mostra as inúmeras dificuldades que os

professores precisam enfrentar no seu dia-a-dia, poderíamos dizer que é quase

inacreditável que diariamente as escolas brasileiras estejam funcionando e que,

apesar de todos os problemas de desempenho, deveríamos olhar para a situação

educacional brasileira de outra maneira.

Esse olhar, com certeza, encontra explicações, alentos e desafios nas

lições de Paulo Freire. Gadotti, diretor do Instituto Paulo Freire, num texto em que

apresenta uma entrevista concedida a ele por Paulo Freire, destaca que a obra

desse estudioso tem sido um divisor de águas em relação à prática

político-pedagógica tradicional. A partir daí, e em conjunção com outras teorias críticas,

numerosas perspectivas teóricas e práticas foram se desenhando em distintas

partes do mundo, impactando muitas áreas do conhecimento. Gadotti comenta:

(26)

ciências (sociais e naturais), elementos para, compreendendo mais cientificamente a realidade e poder intervir de forma mais eficaz nela. Por isso ele pensa a educação ao mesmo tempo como ato político, como ato de conhecimento e como ato criador.

Segundo Gadotti, todo o pensamento tem uma relação direta com a

realidade. Essa é sua marca. Ele não se comprometeu com esquemas

burocráticos, sejam os esquemas do poder político, sejam os do poder

acadêmico. Comprometeu-se acima de tudo com uma realidade a ser

transformada. No pensamento de Paulo Freire, tanto os alunos quanto o professor

são transformados em pesquisadores críticos. A educação visa à libertação, à

transformação radical da realidade, para melhorá-la, para torná-la mais humana,

para permitir que os homens e as mulheres sejam reconhecidos como sujeitos da

sua história e não como objetos.

Gadotti destaca que na obra de Freire é essencial mencionar dois

elementos fundamentais da sua filosofia educacional: a conscientização e o

diálogo.

A conscientização não é apenas tomar conhecimento da realidade. A tomada de consciência significa a passagem da imersão na realidade para um distanciamento desta realidade. A conscientização ultrapassa o nível da tomada de consciência através da análise crítica, isto é, do desvelamento das razões de ser desta situação, para constituir-se em ação transformadora desta realidade.

O diálogo consiste em uma relação horizontal e não vertical entre as pessoas implicadas, entre as pessoas em relação. No seu pensamento, a relação homem, mulher, mulher-mulher e homem-mundo são indissociáveis. Como ele afirma: “ninguém educa ninguém. Ninguém se educa sozinho. Os homens se educam juntos, na transformação do mundo”. Nesse processo se valoriza o saber de todos. O saber dos alunos não é negado. Todavia, o educador também não fica limitado ao saber do aluno. O professor tem o dever de ultrapassá-lo. É por isso que ele é professor e sua função não se confunde com a do aluno.

Paulo Freire foi, sem dúvida alguma, um educador humanista e militante. Em

concepção de educação parte-se sempre de um contexto concreto para

responder a esse contexto. Em Educação como prática da liberdade, esse

(27)

superação da cultura colonial nas “sociedades em trânsito”. Freire procura

mostrar, nessas sociedades, qual é o papel da educação, do ponto de vista do

oprimido, na construção de uma sociedade democrática ou “sociedade aberta”.

Para ele, essa sociedade não pode ser construída pelas elites porque elas são

incapazes de oferecer as bases de uma política de reformas. Essa nova

sociedade só poderá se constituir como resultado da luta das massas populares,

as únicas capazes de operar tal mudança.

Paulo Freire entende que é possível engajar a educação nesse processo de conscientização e de movimento de massas. Ainda em Educação como prática da liberdade, ele desenvolve o conceito de “consciência transitiva crítica”, entendendo-a como a consciência articulada com a práxis. Segundo ele, para se

chegar a essa consciência, que é ao mesmo tempo desafiadora e transformadora,

são imprescindíveis o diálogo crítico, a fala e a convivência.

O diálogo proposto pelas elites é vertical, forma o “educando-massa”,

impossibilitando-o de se manifestar. Nesse suposto diálogo, ao educando cabe

apenas escutar e obedecer. Para passar da consciência ingênua à consciência

crítica, é necessário um longo percurso, no qual o educando rejeita a

hospedagem do opressor dentro de si, que faz com que ele se considere

ignorante e incapaz. É o caminho de sua auto-afirmação enquanto sujeito.

“Na concepção de Paulo Freire, o diálogo é uma relação horizontal. Nutre-se

de amor, humildade, esperança, fé e confiança. Ele retoma essas características

do diálogo com novas formulações ao longo de muitos trabalhos,

contextualizando-as. Assim, por exemplo, ele se refere à experiência do diálogo,

ao insistir na prática democrática na escola pública: “é preciso ter coragem de nos

experimentarmos democraticamente”. Lembra ainda que “as virtudes não vêm do

céu nem se transmitem intelectualmente, porque as virtudes são encarnadas na

práxis ou não”, como disse em palestra realizada na abertura da primeira sessão pública do Fórum de Educação do Estado de São Paulo, em agosto de 1983”.

Na opinião de Gadotti, em sua obra Pedagogia do oprimido Freire completaria suas concepções pedagógicas acerca das diferenças entre a

(28)

aparece mais nitidamente: a pedagogia burguesa do colonizador seria a

pedagogia “bancária”. A consciência do oprimido, diz ele, encontra-se “imersa” no

mundo preparado pelo opressor; daí existir uma dualidade que envolve a

consciência do oprimido: de um lado, essa aderência ao opressor, essa

“hospedagem” da consciência do dominador – seus valores, sua ideologia, seus

interesses – e o medo de ser livre e, de outro, o desejo e a necessidade de

libertar-se. Trava-se, assim, no oprimido, uma luta interna que precisa deixar de

ser individual para se transformar em luta coletiva: “ninguém liberta ninguém,

ninguém se liberta sozinho: os homens se libertam em comunhão”.:

1º) o educador é o sujeito da sua prática, cumprindo a ele criá-la e recriá-la

por meio da reflexão sobre o seu cotidiano.

2º) a formação do educador deve ser permanente e sistematizada, porque a

prática se faz e refaz.

3º) a prática pedagógica requer a compreensão da própria gênese do

conhecimento, ou seja, de como se dá o processo de conhecer.

4º) o programa de formação dos educadores é condição para o processo de

reorientação curricular da escola.

Esse programa de formação dos educadores teve como eixos básicos:

1º) a fisionomia da escola que se quer, enquanto horizonte da proposta

pedagógica;

2º) a necessidade de suprir elementos de formação básica aos educadores

nas diferentes áreas do conhecimento humano;

3º) a apropriação, pelos educadores, dos avanços científicos do

conhecimento humano que possam contribuir para a qualidade da escola que se

quer.

Com esse programa, Paulo Freire queria formar professores para uma nova

(29)

O Brasil nasceu autoritário. Tem 500 anos de tradição autoritária. Por isso

não se pode esperar que em poucos anos isso seja superado. Por isso Paulo

Freire pôs à prova a sua conhecida paciência pedagógica, com decisão política,

competência técnica, amorosidade e sobretudo com o exercício da democracia.

Acabou tendo enorme êxito nessa sua tarefa.

A formação do educador ultrapassa, transcende, os cursos explicativos

teóricos em torno da democracia. A formação se dá por meio da prática, da real

participação. A prática da democracia vale muito mais do que um curso sobre

democracia.

Segundo Gadotti, Paulo Freire publicou, no Brasil, nos primeiros cinco anos

da década de 90, seis importantes obras: A educação na cidade (1991),

Pedagogia da esperança (1992), Política e educação (1993), Professora sim, tia

não (1993), Cartas a Cristina (1994) e À sombra desta mangueira (1995). São

obras que revelam um Paulo Freire mais literário e poético e um pensamento

analítico-histórico e em evolução permanente. O que está acrescentando ao seu

legado com essas novas obras, pergunta Gadotti e responde:

Paulo Freire parece preocupado com uma questão: de que tipo de educação necessitam os homens e as mulheres do próximo século, para viver neste mundo tão complexo de globalização capitalista da economia, das comunicações e da cultura e, ao mesmo tempo, de ressurgimento dos nacionalismos, do racismo, da violência e de certo triunfo do individualismo? Segundo a minha leitura e percepção particular destas obras recentes – que eles e elas necessitam de uma educação para a diversidade, necessitam de uma ética da diversidade e de uma cultura da diversidade.

Uma sociedade multicultural deve educar o ser humano multicultural, capaz

de ouvir, de prestar atenção ao diferente, respeitá-lo. Neste novo cenário da

educação será preciso reconstruir o saber da escola e a formação do educador.

Não haverá um papel cristalizado tanto para a escola quanto para o educador. Em

vez da arrogância de quem se julga dono do saber, o professor deverá ser mais

criativo e aprender com o aluno e com o mundo. Numa época de violência, de

agressividade, o professor deverá promover o entendimento com os diferentes e a

escola deverá ser um espaço de convivência, onde os conflitos são trabalhados,

(30)

O livro Professora sim, tia não tem tido uma grande repercussão entre as jovens professoras justamente por tratar do tema da sua profissionalização, tão

deteriorada nos últimos anos em termos salariais e em termos das próprias

condições de trabalho que cercam a atividade docente. Paulo Freire afirma que

a tentativa de reduzir a professora à condição de tia é uma “inocente” armadilha ideológica em que, tentando-se dar a ilusão de adocicar a vida da professora o que se tenta é amaciar a sua capacidade de luta ou entretê-la no exercício de tarefas fundamentais. Entre elas, por exemplo, a de desafiar seus alunos, desde a mais tenra e adequada idade, através de jogos, de estórias, de leituras para compreender a necessidade da coerência entre discurso e prática; um discurso sobre a defesa dos fracos, dos pobres, dos descamisados e a prática em favor dos camisados e contra os descamisados; um discurso que nega a existência das classes sociais, seus conflitos e a prática política em favor exatamente dos poderosos (p. 25).

A escola não deve apenas transmitir conhecimentos, mas também

preocupar-se com a formação global dos alunos, numa visão em que o conhecer

e o intervir no real se encontrem. Mas, para isso, é preciso saber trabalhar com as

diferenças, isto é, é preciso reconhecê-las, não camuflá-las, e aceitar que para

me conhecer preciso conhecer o outro.

Gadotti perguntou a Freire: O que você faria, como professor(a), na sala de

aula? Ele respondeu:

(31)

1.3 Profissionalidade e identidade profissional

Enfrentar condições adversas de trabalho é ter que recriar todo dia as suas

táticas para superar o exclusivismo de uma compreensão cultural estreita. Saber

trabalhar com as diferenças, reconhecê-las e não camuflá-las; aceitar que para

me conhecer preciso conhecer o outro. Lidar com cobranças de desempenho e

compreender mudanças de cenário.

Esteve (1995) refere o exemplo de um grupo de atores que desempenham

o seu papel numa peça que retrata uma determinada época histórica e a quem,

de repente, se muda o cenário:

A primeira reação dos atores seria a surpresa, Depois, tensão e desconcerto, com um forte sentimento de agressividade, desejando acabar o trabalho para procurar os responsáveis, a fim de, pelo menos, obter uma explicação. Que fazer? Continuar a recitar versos, arrastando largas roupagens em metade de um cenário pós-moderno, cheio de luzes intermitentes? Parar o espetáculo e abandonar o trabalho? Pedir ao público que deixe de rir para que se ouçam os versos? O problema reside em que, independentemente de quem provocou a mudança, são os atores que dão à cara. São eles, portanto, quem terá de encontrar uma saída airosa, ainda que não sejam os responsáveis (p. 97).

Nesse contexto de mudanças e incertezas, para Ponte (1995), uma

questão se coloca de imediato: “O que são e o que querem ser hoje os

professores de Matemática?” (p. 4).

A forma como se acede à profissão é, na perspectiva desse investigador,

um dos aspectos que delimita e contribui para a formação da identidade do

professor. Um outro aspecto é o da cultura profissional dos docentes, que

abrange questões como o horário de trabalho, as responsabilidades relativamente

aos alunos, as relações estabelecidas com os outros professores, entre outras.

Neste sentido, importa definir alguma terminologia empregada usualmente

quando se pretende estudar questões relacionadas com a profissionalidade e a

(32)

Para Gimeno (1995), o termo “profissionalidade” refere-se a tudo o “que é

específico na ação docente, isto é, o conjunto de comportamentos,

conhecimentos, destrezas, atitudes e valores que constituem a especificidade de

ser professor” (p. 65), mas pode também definir-se como “a observância de um

certo tipo de regras, baseadas num conjunto de saberes e de saber-fazer” (p. 77).

A profissionalidade dos professores assume características observáveis e

manifesta-se a diferentes níveis: ensino e orientação do estudo dos alunos; apoio

individual; regulação das relações escolares e extra-escolares; preparação de

materiais; avaliação; organização de espaços e de atividades.

O conceito de “identidade” é utilizado de modo pouco definido em campos

diversos do conhecimento e até dentro da mesma disciplina. É encarado ora

como apresentando características individuais, ora como algo coletivo.

Ferreira (1995) aponta duas tradições teóricas que têm constituído a base

da abordagem da questão da identidade profissional: a de Durkheim e a de

Weber. A tradição durkheimiana privilegia o eixo temporal dos processos

identitários e distingue a identidade individual da identidade social. A identidade

social decorre, nesta linha de pensamento, da transmissão de conhecimentos e

técnicas, normas, valores e hábitos, de geração em geração. Entendida como

transmissão de um patrimônio cultural da geração adulta à geração jovem, a

educação constitui o mecanismo de transformação social das predisposições

individuais, procurando assegurar por essa via a adaptação e pertença estável do

indivíduo a uma sociedade e aos seus grupos sociais de convivência. A outra

tradição teórica – weberiana – considera as identidades dos atores sociais mais

como efeitos emergentes de sistemas de ação social do que como produtos de

trajetórias biográficas. O eixo espacial é, portanto, mais valorizado que o eixo

temporal, pretendendo salientar, deste modo, as relações entre atores de um

mesmo sistema de ação e as formas de construção social nele operadas (p. 5).

A expressão “‘identidade profissional” surge também freqüentemente

identificada como retratando algo estável e que resulta de uma tradição cultural.

Esta idéia é contrariada por Silva (1994), em Ferreira (1995), que refere que a

(33)

aquisição, enriquecimento, reelaboração, adaptação, aplicação, dissolução, etc.,

de tradições é um processo tão dinâmico, conjuntural, estruturante, ativo e

estratégico como a generalidade dos outros processos sociais. Também as

tradições estão instaladas na mudança (p. 3).

Por analogia, a “identidade profissional” do professor pode ser tomada

como um processo dinâmico de produção social. A identidade profissional é

composta e moldada por variadas componentes de natureza cultural, religiosa,

étnica, lingüística, entre outras, resultantes das mudanças sociais, políticas,

econômicas e tecnológicas profundas e rápidas da sociedade, e encontra-se em

construção e/ou reconstrução permanentes.

Há que apresentar agora alguns traços importantes da profissão docente

de modo que questões da sua profissionalidade e da sua identidade profissional

sejam mais adequadamente compreendidas.

A função docente constituiu-se inicialmente como ocupação secundária,

“subsidiária e não especializada” de religiosos e a “gênese da profissão de

professor tem lugar no seio de algumas congregações religiosas, que se

transformaram em verdadeiras congregações docentes” (Nóvoa, 1995, p. 15).

Esta situação prevaleceu em toda a Europa até a primeira metade do século

XVIII, quando se tentou institucionalizar essa ocupação secundária, que era a

educação. Ainda que se assistisse a uma manutenção dos modelos escolares

determinados pela Igreja, a responsabilidade da educação dos indivíduos cabia

agora ao Estado, nas pessoas de um conjunto de professores laicos.

Durante os séculos XVII e XVIII, as congregações dos jesuítas e dos

oratorianos foram definindo um corpo de saberes e de técnicas e um conjunto de

normas e de valores específicos da profissão. Nesse âmbito, Nóvoa (1995) refere

que a elaboração de um corpo de saberes e de técnicas é a conseqüência lógica

do interesse renovado que a Era Moderna consagra ao porvir da infância e à

intencionalidade educativa. Trata-se mais de um saber técnico do que de um

conhecimento fundamental, na medida em que se organiza preferencialmente em

torno dos princípios e das estratégias de ensino. Por outro lado, é importante

(34)

exterior do “mundo dos professores”, por teóricos e especialistas vários. A

elaboração de um conjunto de normas e de valores é largamente influenciada por

crenças e atitudes morais e religiosas. A princípio, os professores aderem a uma

ética e a um sistema normativo essencialmente religioso; mas, mesmo quando a

missão de educar é substituída pela prática de um ofício e a vocação cede o lugar

à profissão, as motivações originais não desaparecem.

Os professores nunca procederam à codificação formal das regras

deontológicas, o que se explica pelo fato de lhes terem sido impostas do exterior,

primeiro pela Igreja e depois pelo Estado, instituições mediadoras das relações

internas e externas da profissão docente (p. 16).

Esta afirmação da importância dos professores não deixa, no entanto, de

ser “manchada” por momentos de crise e de recuos em relação aos direitos

adquiridos. Também a Igreja, o Estado e a Família questionam a importância da

escola sempre que temem que ela ameace os seus interesses ou projetos sociais

e econômicos.

1.4 O fenômeno do mal-estar docente

Diferentes causas podem ser apontadas como explicativas das crises que

a profissão docente tem vivido: a massificação do ensino; a conseqüente

necessidade do aumento do número de indivíduos que integraram a profissão,

ainda que sem formação adequada, ou em certos casos suficiente; e uma certa

indefinição acerca do que é a escola e de qual é o seu papel na sociedade atual.

O atual panorama da profissão docente enferma de vários problemas que

se traduzem numa situação de mal-estar generalizado entre os professores. O

estudo do mal-estar docente tem, segundo Esteve (1995), tem três funções

precisas: (a) a de ajudar os professores a debater e até eliminar os

desajustamentos introduzidos por situações de reforma educativa; (b) o estudo

das influências resultantes de mudanças sociais sobre a função docente (falta de

apoio aos docentes, as críticas e a demissão da responsabilidade da sociedade

(35)

coerentes que melhorem as condições em que os professores desempenham a

sua atividade.

Atualmente, e ao longo de períodos de tempo bem definidos

historicamente, o baixo nível das remunerações pecuniárias tem, ou teve, como

conseqüência imediata a procura de acumulações, quer no ensino, quer noutros

ramos de atividade. Dessa sobrecarga de trabalho decorre, atualmente, efeitos

imediatos, como um aumento dos já elevados índices de absentismo, ou até de

abandono, uma atitude crescente de desinvestimento na profissão e a ausência

de momentos destinados à reflexão crítica sobre atividade profissional. Alguns

investigadores falam de desencanto e de desresponsabilização dos professores

relativamente à sua profissão.

A sociedade parece que deixou de acreditar na educação como promessa

de um futuro melhor; os professores enfrentam a sua profissão com uma atitude

de desilusão e de renúncia, que se foi desenvolvendo em paralelo com a

degradação da sua imagem social (Esteve, 1995, p. 95).

Há na atitude de muitos professores um grande desinvestimento e uma

forte tendência para a desresponsabilização (Ponte, 1995, p. 6).

Considerando este quadro pouco otimista, não é difícil perceber que a

“profissão professor” é vista como uma semiprofissão do ponto de vista

sociológico. A esta forma de definição da profissão docente não serão certamente alheios alguns fatos respeitantes ao status do grupo profissional e à dimensão desse mesmo grupo, ou à relação obrigatória que os professores têm que

estabelecer com os seus alunos, imposta por normas socialmente

institucionalizadas relativas à obrigatoriedade do ensino. Pelas razões anteriores,

entre outras, os professores não possuem “uma posição social elevada, ainda que

sejam freqüentes as declarações sobre a importante missão que lhes incumbe”

(Gimeno, 1995, p. 67).

As funções docentes são definidas por normativas sociais, políticas e

administrativas, que definem e regulam o sistema educativo, elaboradas a partir

(36)

necessidades sociais tendem a atribuir cada vez mais à escola um conjunto

alargado de responsabilidades e de funções, de tal modo que hoje se verifica uma

crescente indefinição do que seja papel da escola e dos professores. Esteve

(1995) menciona, neste sentido, “o choque do futuro” conceituado por Toffler

(1972) “como um efeito da mudança social acelerada, cuja principal conseqüência

é o desajustamento do indivíduo, quando perde as referências culturais

conhecidas” (1995, p. 96). Os efeitos da mudança social acelerada são imediatos

e preocupantes e traduzem-se em desajustamentos profundos dos professores

que sentem que o contexto em que desempenham a sua atividade profissional

mudou, não reconhecendo semelhanças à realidade envolvente, não havendo

nenhuma possibilidade de retorno à antiga paisagem social, que dominavam e conheciam. […] O sentimento de insegurança está na origem do cepticismo e da recusa dos professores em relação às novas políticas de reforma educativa (Esteve, 1995, p. 96).

No entanto, a atividade educativa não é da única e inteira responsabilidade

dos professores. Antes de mais, “os professores não produzem o conhecimento

que são chamados a reproduzir, nem determinam as estratégias práticas de ação”

(Gimeno, 1995, p. 68).

Além dessa razão, há que considerar que os professores não limitam a sua

atividade ao que é observável: as suas práticas pedagógicas (o desempenho dos

professores nas aulas encontra-se afetado pelas suas concepções acerca do

ensino-aprendizagem, do que é relevante ensinar aos alunos de um determinado

grupo etário ou social, e por valores sociais acerca da importância de certos

conteúdos que devem ser transmitidos aos alunos).

Sendo assim, é de referir que “aquilo que vulgarmente chamamos

educativo não esgota as práticas relacionadas com a educação, porque remete

para outros âmbitos de ação, que incidem sobre a realidade escolar imediata” e

que à educação se referem “ações muito diversas, que influenciam a prática

didática” (Gimeno, 1995, p. 68).

Atualmente, existem alguns indicadores de que a qualidade do ensino tem

(37)

contínuo das ciências e a necessidade de integrar novos conteúdos” num

processo que impõe uma dinâmica de ação e de atualização permanentes aos

professores, que se confrontam com a necessidade de aceitarem “mudanças

profundas na concepção e no desempenho da sua profissão” (Esteve, 1995, p.

98).

Não obstante a atual conjuntura não ser muito favorável ao desempenho

da atividade docente, há professores que manifestam uma grande reserva de

energia e de generosidade que se traduzem em disponibilidade para com os

alunos, para os colegas em dificuldades, para a escola. Nos últimos anos, tem-se

afirmado em largos sectores da profissão um gosto por se envolver em projetos

inovadores que se possam traduzir em melhorias no ensino e na aprendizagem

dos alunos (Ponte, 1995, p. 6).

A educação e a prática educativa surgiram muito antes da sua formalização

e institucionalização como sistemas. A educação constitui uma prática histórica

que permitiu a partilha dos valores, dos hábitos e da cultura dos vários grupos

humanos e se considerou como uma atividade geradora de cultura intelectual. A

educação formal nas sociedades desenvolvidas, além de ter substituído esse

modo informal de transmissão de saberes e de valores, procurou responder às

necessidades de essas mesmas sociedades reproduzirem o conhecimento. No

entanto, a sociedade que institucionalizou a escola como local privilegiado para a

aquisição de saber manteve sempre uma escola paralela de transmissão da

cultura, fato que subentende não ser a educação exclusivo domínio dos

professores. Tal como salienta Gimeno (1995), em sentido rigoroso, as destrezas

relativas à atividade de educar e de ensinar, bem como toda a cultura que as

rodeia, constituem uma competência distribuída socialmente que não se encontra

limitada a um só grupo profissional. Assim como as idéias a respeito da saúde

não são exclusivas da classe médica, embora o avanço da ciência e a

organização do grupo profissional monopolizem progressivamente esse

conhecimento especializado, as práticas educativas também assentam no sentido

comum de um determinado grupo cultural, do qual os professores fazem parte (p.

(38)

Ainda que a educação seja uma atividade social, para responderem às

exigências sociais os professores assumem por vezes posturas de individualismo

profissional, uma vez que a avaliação da sua atividade se faz quase

exclusivamente perante as autoridades escolares. A prática profissional dos

professores depende, assim, de decisões individuais, o que pode parecer

contraditório com o fato de ela se reger por normas coletivas adotadas por outros

professores e por regulamentações institucionais. As idéias de que os professores

trabalham individualmente e de que não possuem tradições de trabalho

cooperativo parecem coerentes com a sua postura essencialmente individual.

No entanto, a noção de que os professores são autônomos na realização

do seu trabalho parece não ser muito adequada à realidade do contexto em que

os professores se movem. A autonomia é relativa e limitada por questões de

natureza política ou histórica. Considere-se, por exemplo e apenas, o modo como

se procede à elaboração dos currículos escolares. Os professores não tomam

parte desse processo burocrático, limitam-se a seguir de perto as orientações

emanadas por órgãos que lhes são hierarquicamente superiores, o que os torna

dependentes nessa relação de poder nada equilibrada.

Neste sentido, Gimeno (1995) afirma que esta dependência dos

profissionais relativamente ao meio socialmente organizado em que desenvolvem

o seu trabalho apresenta conflitos manifestos e latentes nos professores, porque

nem sempre as exigências coincidem com as interpretações pessoais. E é neste

terreno que se detecta o vazio mais preocupante para o desenvolvimento

profissional dos docentes, quando se esquece a necessidade de transformar as

situações de trabalho como condição para mudar a prática de ensino (p. 72).

A atitude dos professores, quando desempenham a sua atividade, pode

apresentar duas características diferentes e divergentes: por um lado, os

professores podem, simplesmente, adaptar as suas condutas às condições

existentes, impostas por entidades que lhes são hierarquicamente superiores; ou,

por outro lado, podem assumir uma atitude crítica em face das orientações

exteriores, adotando estratégias de intervenção nos contextos em que

desenvolvem as suas atividades profissionais. Nesta segunda perspectiva,

(39)

sim um profissional que pode utilizar o seu conhecimento e a sua experiência

para se desenvolver em contextos pedagógicos práticos preexistentes” (p. 74).

1.5. Os professores e os projetos curriculares

Sabemos que o termo “currículo” nas escolas é entendido, de modo geral,

como programas de ensino, conteúdos ou matriz curricular. Na realidade existe

uma pluralidade de definições e cada uma pressupõe valores e concepções

implícitas.

A palavra curriculum, de origem latina, significa o curso, a rota, o caminho da vida ou das atividades de uma pessoa ou grupo de pessoas. O currículo

educacional representa a síntese dos conhecimentos e valores que caracterizam

um processo social expresso pelo trabalho pedagógico desenvolvido nas escolas.

Para Goodson (1996) o currículo é definido como um percurso a ser seguido,

como conteúdo apresentado para estudo.

Os primeiros estudos no campo do currículo, de origem norte-americana,

foram influenciados pelo modelo tecnicista de natureza prescritiva, baseados nas

categorias de controle e eficiência social. Nesse contexto é muito representativa a

obra de Ralph Tyler (1949), em que ele mostra preocupação com o

estabelecimento de objetivos educacionais e com a avaliação. O currículo era

visto como uma atividade neutra, instrumento de racionalização da atividade

educativa e controle do planejamento. O pensamento de Tyler influenciou nos

estudos sobre currículo no Brasil, adotado como fundamento teórico na

organização curricular do ensino na década de 70.

Em função das críticas a esse modelo, buscou-se discutir os aspectos

internos da escola, a relação entre a educação e as desigualdades sociais. Desse

modo, o desvelamento (desmistificar) das implicações do currículo com a

estrutura de poder político e econômico na sociedade inseriu a problemática

(40)

Michael Apple, em Ideologia e currículo (1982), colocou em destaque a relação entre dominação econômica e cultural e o currículo escolar. Baseado na

abordagem neomarxista, o autor trabalhou a noção de currículo oculto buscando

demonstrar como as escolas produzem e reproduzem a desigualdade social. A

discussão sociológica do currículo, a crítica ao reducionismo e estruturalismo tem

sido feita pelos autores como Young (1989), Apple (1989) e Silva (1988).

Apple, em sua obra Ideologia e currículo, utiliza a expressão tradição seletiva:1 (apud Apple, 1979:15) “[...] a questão e a seletividade, a forma que, de todo um campo possível de passado e presente, escolhem-se como importantes

[...] significados e práticas, [...] outros são negligenciados e excluídos”.

Efetivamente, como assinala Forquin (1992), “aquilo que as escolas

transmitem da cultura é sempre uma escolha de elementos considerados

socialmente válidos e legítimos”.

Estudos críticos do currículo apontam que a seleção cultural sofre

determinações políticas, econômicas, sociais e culturais. Neste sentido, a seleção

do conhecimento escolar não é um ato desinteressado e neutro, é resultado de

lutas, conflitos e negociações. Assim, entende-se que o currículo é culturalmente

determinado, historicamente situado e não pode ser desvinculado da totalidade do

social.

Os estudos que analisam os efeitos do currículo para além da aquisição de

conhecimentos formais voltam-se para a concepção de currículo oculto. Apontam

que por meio do currículo oculto são transmitidas ideologias, concepções de

mundo pertencentes a determinados grupos hegemônicos na sociedade e que

servem para reproduzir as desigualdades sociais.

A literatura crítica no campo do currículo tem argumentado a favor de uma

teoria que leve em consideração a dimensão prática do currículo. Trata-se de uma

perspectiva que busca compreender o currículo em ação, ou seja, os contextos de

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Referências

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