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Notas sobre reacções redox nos seres vivos

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Academic year: 2022

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Notas sobre reacções redox nos seres vivos

Quando, para facilitar a aprendizagem, se classificam as reacções químicas em grupos, um dos grandes grupos é o das reacções de oxi-redução.

A importância das reacções de oxi-redução nos seres vivos, e particularmente nos mamíferos, fica evidenciada quando pensamos que uma grande parte do metabolismo diz respeito às transformações que os nutrientes sofrem no organismo e que, globalmente, podemos entender estas transformações como consistindo na oxidação dos nutrientes pelo oxigénio formando-se dióxido de carbono e água. Por razões que se prendem com a organização do curso daremos, aqui, particular atenção ao processo catabólico da glicose que leva à produção de CO2

e H2O.

1 - Definição de reacções de oxi-redução

As reacções de oxi-redução costumam ser definidas como reacções em que um dos reagentes, o oxidante, aceita electrões de um outro, o redutor. Um exemplo clássico é a oxidação do zinco metálico pelo ião Cu2+ em que os electrões passam do zinco metálico para o ião cobre formando-se, como produtos, cobre metálico e ião Zn2+. Uma outra definição faz apelo ao conceito de número de oxidação (n.o.) dizendo que, nas reacções de oxi-redução, há variação do n.o. de um ou mais elementos dos pares redox envolvidos na reacção. Assim, no exemplo em análise, o zinco metálico, ao oxidar-se, aumenta o seu n.o. de zero para +2 enquanto o ião Cu2+, ao reduzir-se, diminui o seu n.o. de +2 para zero. Uma forma de pôr em evidência a existência de uma reacção de oxi-redução é escrever as semi-equações de eléctrodo relativas a cada um dos pares redox envolvidos. Para o caso da reacção em análise a semi- equação de redução seria a equação 1 (relativa ao par redox Cu2+/Cu) e a semi-equação de oxidação a 2 (relativa ao par redox Zn2+/Zn).

Cu2+ + 2e- → Cu (1)

Zn → Zn2+ + 2e- (2)

Em bioquímica interessam-nos mais os compostos orgânicos que os inorgânicos e, aqui, o conceito de n.o. dos elementos constituintes desses compostos orgânicos, nomeadamente o n.o. dos carbonos, é, apesar de algo artificial, muito útil. Para determinar o n.o. de um elemento envolvido numa ligação atribuem-se ao elemento mais electronegativo todos os electrões envolvidos nessa ligação. (Tendo em conta os elementos que mais nos interessam alinhamos por ordem crescente de electronegatividade: H<C<S<N<O). Um determinado átomo terá um n.o.

negativo se, de acordo com a regra acima definida, “recebe” electrões dos átomos vizinhos menos electronegativos: o valor numérico corresponde ao número de electrões que “recebeu”.

De forma simétrica, um determinado átomo terá um n.o. positivo se “perde” electrões para os átomos vizinhos mais electronegativos: o valor numérico corresponde ao número de electrões que “perdeu”. Alguns exemplos destinados a ilustrar esta ideia são apontados a seguir. No metano (CH4) o n.o. do carbono é –4 e o dos hidrogénios é (como acontece na maioria dos compostos de que faz parte) +1. Nos casos do monóxido e do dióxido de carbono o n.o. do oxigénio é (como acontece na maioria dos compostos de que faz parte) –2 mas o do carbono é +2 no caso do monóxido e de +4 no caso do dióxido de carbono. O n.o. do carbono do formol (ou metanal; H2CO) é zero: “perde” 2 electrões para o oxigénio mas “recebe” 2 dos hidrogénios.

Quando um elemento de um determinado composto que reage aumenta o seu número de oxidação dizemos que esse composto se oxida; dizemos que o composto se reduz na condição

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contrária. Dizemos, por exemplo, que, na glicólise, a glicose se oxida a ácido pirúvico. O n.o.

dos oxigénios é –2 e o dos hidrogénios +1 em ambos os compostos, mas enquanto o n.o. médio dos carbonos da glicose é zero, no caso do ácido pirúvico é +2/3 (Fig. 1).

Uma regra simples, aplicável à grande maioria dos compostos orgânicos, permite calcular o n.o. médio dos carbonos conhecendo apenas a sua fórmula molecular:

n.o. médio dos carbonos = [(O X 2) + (N X 3) + (S X 2) – H + carga da molécula] / C. No caso do piruvato (C3O3H3

-1), por exemplo, o n.o. médio dos carbonos será [(3 X 2 – 3 – 1) / 3 = +2/3]. Notar que, porque a carga eléctrica do anião piruvato é –1, o valor correspondente à carga assumiu um valor

negativo.

Nas reacções de

dissociação (ou associação) protónica não

há variação do número de oxidação: as reacções ácido-base não são reacções de oxi-redução.

Se tomarmos como exemplo a dissociação de um qualquer ácido carboxílico, vemos que o electrão que “pertencia”

ao hidrogénio ligado ao oxigénio no grupo carboxílico já estava atribuído ao oxigénio onde se ligava antes da

dissociação e que, quando o protão sai, o electrão que fica no anião continua atribuído ao oxigénio. Ou seja o n.o. do “hidrogénio” que se dissocia é, em ambas as situações, +1 e o do oxigénio é sempre –2.

As reacções de hidrólise (AB + H2O → AOH + BH), como as que correspondem à acção das enzimas digestivas, também não são reacções de oxi-redução. Um exemplo é o caso da hidrólise da maltose a glicose (maltose + H2O → 2 glicose). O n.o. médio dos carbonos da maltose (C12H22O11) e da glicose (C6H12O6) é zero nos dois casos; o n.o. do oxigénio era –2 na H2O que reagiu e continua a ser –2 na glicose que se formou; o n.o. do hidrogénio era +1 na H2O que reagiu e continua a ser +1 na glicose que se formou.

Um exemplo que evidencia o carácter convencional de uma qualquer classificação (em que o caso das reacções de oxi-redução não é excepção) é o caso das reacções de hidratação (ou desidratação) como a que é catalisada pela enólase (Fig. 2). Na glicólise, o 2-fosfoglicerato

transforma-se em fosfoenolpiruvato, libertando-se

Fig. 1: Número de oxidação dos carbonos em compostos orgânicos.

Cada uma das setas a vermelho representa um electrão ligante que,

“pertencendo” ao átomo (na sua forma livre) de onde a seta parte , foi atribuído, para efeitos de cálculo do número de oxidação, ao elemento mais electronegativo.

Fig. 2: Reacção catalisada pela enólase.

Nesta reacção ocorre variação do número de oxidação dos carbonos 2 (aumenta de 0 para 1) e 3 (diminui de –1 para –2) mas o número de oxidação médio mantêm-se.

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água. O n.o. do carbono 2 do 2-fosfoglicerato é zero e, no fosfoenolpiruvato, o n.o. do mesmo carbono 2 é +1: quando atentamos no carbono 2 podemos considerar que o 2-fosfoglicerato se oxidou. Contudo, se atentarmos no carbono 3 notaremos que o n.o. diminuiu de –1 para –2: de acordo com isto consideraríamos, pelo contrário, que o 2-fosfoglicerato se reduziu. Um terceiro ponto de vista, que é o que é mais aceite, nota que o n.o. médio dos carbonos se manteve invariante e que, portanto, a reacção catalisada pela enólase não é uma reacção de oxi-redução.

2 - Na oxidação completa da glicose 24 electrões são transferidos para o O2

No metabolismo, a glicose e os outros nutrientes são oxidados levando à formação de CO2 sendo que o oxidante último, o aceitador final dos electrões, é o oxigénio . As equações 3 e 4 são, respectivamente, as semi-equação de redução e de oxidação que correspondem à equação de oxidação da glicose pelo oxigénio (equação 5, a equação soma):

6 O2 + 24 e- + 24 H+ → 12 H2O (3)

C6H12O6 + 6 H2O → 6 CO2 + 24 e- + 24 H+ (4)

C6H12O6 + 6 O2 → 6 CO2 + 6 H2O (5)

A diferença de potencial padrão (potencial redox, de eléctrodo ou de redução) entre os pares redox O2/H2O e CO2/glicose é muito elevado (1,24 V). Isto significa que, em condições que se definiram como padrão1, a forma oxidada do par com maior potencial (no caso, o O2) tem tendência a oxidar a forma reduzida do par com menor potencial (no caso, a glicose). Se quisermos ser mais precisos e atentarmos na equação de Nernst [∆Eº = (RT/nF) ln Keq ou ∆Eº = (0,059V/n) log Keq]2, que relaciona a diferença de potencial entre dois pares redox e a constante de equilíbrio para a reacção acima referida, podemos calcular que a constante de equilíbrio para a reacção representada pela equação 5 é da ordem de 10500 M-1, ou seja, a reacção tem tendência termodinâmica para evoluir até ao esgotamento do reagente limitante. Este facto poderia levar- nos a pensar que a reacção de oxidação da glicose poderia evoluir por transferência directa de 24 electrões da glicose para o oxigénio. Embora tal processo seja termodinamicamente favorecido não o é em termos cinéticos: podemos ter glicose em contacto directo com o oxigénio que, à temperatura de 37º, a reacção não acontecerá. Nos seres vivos, como o comprova o facto de consumirmos glicose e oxigénio e produzirmos CO2, a reacção acontece (a uma velocidade de algumas moles de glicose consumidas por dia) mas, porque não existe nenhuma enzima capaz de ligar simultaneamente a glicose e o oxigénio e de catalisar a transferência directa de 24 electrões da glicose para o oxigénio, o processo não é simples.

1 Essas condições são: 25 ºC; conc. de reagentes e produtos em solução com concentração de 1M ou 1 atm; pH 0 ou pH 7 (dependendo do contexto químico ou bioquímico, respectivamente).

2 R= constante dos gases perfeitos = 8,314 J K-1 mol-1; T= temperatura absoluta (K), n= número de moles de electrões transferidos na reacção considerada; F= constante de Faraday (carga de um mole de electrões) = 96500 C mol-1. É de notar que a equação de Nernst (∆Eº = (0,059/n) log Keq ⇔ log Keq =

∆Eº * n / 0,059) mostra que o log da Keq é directamente proporcional ao valor de ∆Eº e ao número de electrões trocados na reacção em análise. Dada uma reacção oxi1 + red2 → red1 + oxi2 os pares redox pertinentes são oxi1/red1 e oxi2/red2; o ∆Eº a usar para calcular a Keq da reacção esquematizada é a diferença entre o potencial redox padrão do par oxi1/red1 e o potencial redox padrão de oxi2/red2 (Eºoxi1/red1- Eºoxi2/red2).

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A transferência de electrões da glicose para o oxigénio ocorre através de etapas sucessivas (catalisadas por enzimas designadas genericamente de oxi-redútases – ver Anexo na página 11) em que a glicose vai cedendo electrões formando-se intermediários sucessivamente mais oxidados. Ignorando, porque é quantitativamente menos importante, a via das pentoses- fosfato, nesse processo o NAD+ (dinucleotídeo de adenina e nicotinamida) e o FAD (dinucleotídeo de flavina e adenina) desempenham um papel charneira podendo interagir com as enzimas que também ligam directamente os intermediários do catabolismo da glicose. Cada uma das enzimas que ligam estes dinucleotídeos e estes intermediários catalisa a transferência de um par de electrões em que os dinucleotídeos acima referidos funcionam como oxidantes (reduzindo-se a NADH e FADH2) e os intermediários do processo catabólico como redutores.

As enzimas dependentes do NAD+ envolvidas no processo de transferência de pares de electrões de intermediários do metabolismo glicídico para o oxigénio são as que catalisam a oxidação do gliceraldeído-3-P, do piruvato, do isocitrato, do α-cetoglutarato e do malato; a que envolve o FAD é a que catalisa a oxidação do succinato (Fig. 3). No total são seis enzimas que, tendo em conta a cisão que ocorre durante a glicólise (aldólase), explicam a transferência dos 24 electrões acima referidos.

Dissemos que o NAD+ e o FAD são os oxidantes directos nos processos catalíticos referidos no parágrafo anterior mas, tal como mostra a equação 3, o aceitador final dos electrões é o oxigénio. No caminho que os electrões percorrem desde o NADH e o FADH2 (as formas reduzidas do NAD+ e do FAD, respectivamente) até ao oxigénio estão envolvidos, como catalisadores, os complexos enzímicos da cadeia respiratória.

Fig. 3: Oxidação completa da glicose.

A oxidação da glicose envolve a perda de 24 electrões e ocorre através da acção de desidrogénases que, em cada passo, catalisam a perda de um par de electrões. O aceitador de electrões é sempre o NAD+ excepto no caso da desidrogénase do succinato.

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3 - O papel da cadeia respiratória na redução do O2

Para compreendermos melhor este processo podemos começar por descrever o percurso dos electrões desde o succinato (C4H4O4

2-) até ao oxigénio.

A enzima que catalisa a oxidação do succinato designa-se habitualmente por desidrogénase do succinato e é a única enzima do ciclo de Krebs que, embora com o centro activo voltado para a matriz da mitocôndria permitindo a ligação ao succinato, se situa na membrana mitocondrial interna. Um outro nome que costuma ser usado para designar esta enzima é complexo II porque contém várias sub-unidades proteicas. Quando se escreve a equação da reacção catalisada pela desidrogénase do succinato costuma pôr-se em evidência o papel do FAD (um dos grupos prostéticos

da enzima) como o aceitador directo dos electrões do succinato: succinato + FAD → fumarato + FADH2 (Fig. 4). No entanto, tendo em conta que o FADH2 permanece ligado à enzima e que esta pode ligar a ubiquinona (também designada de coenzima Q - um composto exterior à enzima) para onde os electrões, por acção catalítica da mesma desidrogénase do succinato, são transferidos, talvez fosse mais adequado escrever a equação que descreve a actividade do complexo II desta maneira:

succinato + ubiquinona ou Q → fumarato + ubiquinol ou QH2 (6)

Se atentarmos nas fórmulas químicas dos pares redox (forma oxidada /forma reduzida) envolvidos nas reacções catalisadas pela desidrogénase do succinato (fumarato/succinato;

FAD/FADH2; Q/QH2) notaremos que as formas reduzidas, para além de conterem mais um par de electrões que as formas oxidadas, também contêm mais um par de protões. Significa isto que, a par da reacção de oxi-redução, também ocorreu uma reacção ácido-base; a forma reduzida era uma base e aceitou dois protões. Assim, também podemos interpretar os fenómenos reactivos em análise como uma transferência de dois átomos de hidrogénio entre um substrato que se oxida (perdendo hidrogénios) e um outro que se reduz (aceitando hidrogénios)3. Tendo em conta o referido atrás a propósito da baixa electronegatividade do hidrogénio percebe-se que o n.o. dos carbonos do composto orgânico que recebeu os hidrogénios diminua.

A transferência de electrões entre o ubiquinol (QH2) e o oxigénio molecular (Fig. 5) envolve a acção catalítica de dois complexos enzímicos (contendo múltiplas sub-unidades proteicas) existentes na membrana interna da mitocôndria: o complexo III (ou redútase do citocromo c) e o complexo IV (ou oxídase do citocromo c). O citocromo c é uma proteína que contém como grupo prostético heme de tipo c, uma estrutura semelhante ao heme da hemoglobina e da mioglobina contendo um ião de ferro; na forma oxidada o citocromo c contém Fe3+ (ferro férrico) que, quando aceita um electrão, passa a Fe2+ (ferro ferroso). A equação 7 descreve a reacção de oxi-redução catalisada pelo complexo III.

3 As oxi-redútases que catalisam reacções em que há transferência de hidrogénios (ou de iões hidreto H- como veremos adiante)designam-se geralmente de desidrogénases ou, sem um critério rígido, às vezes, de redútases.

Fig. 4: Desidrogénase do succinato.

A desidrogénase do succinato contém como grupo prostético o FAD que, ao aceitar dois electrões (e dois protões), se reduz. O succinato oxida-se a fumarato perdendo esses dois electrões.

(6)

QH2 + 2 citocromo c (Fe3+) → Q + 2 citocromo c (Fe2+) + 2H+ (7)

Embora o mecanismo enzímico seja muito complexo, podemos esquematizar a acção catalítica do complexo III dizendo que dois electrões são

transferidos do ubiquinol (QH2) para dois iões férricos (componentes de dois citocromos c); ou seja, que o citocromo c na sua forma férrica oxida o ubiquinol. É frequente, nos livros de bioquímica, que as equações de oxi- redução não estejam acertadas e que a reacção envolva consumo ou libertação de protões, consumo ou formação de moléculas de água que são ignorados na equação final; trata-se de uma opção que visa pôr em evidência a reacção que se pretende destacar (a de oxi-redução) ignorando outros processos que no contexto se consideram irrelevantes. A equação 7 está acertada (inscrevemos dois protões como produtos) mas, no restante texto, optaremos algumas vezes por não fazer o acerto. No contexto da discussão da actividade catalítica do complexo III os protões têm uma enorme importância, não porque seja necessário inscrevê-los como produtos para acertar a equação, mas porque o complexo III é, não apenas uma enzima, mas simultaneamente uma enzima e um transportador de protões. Simultaneamente com a reacção de oxi-redução, o complexo III catalisa o transporte de protões que ocorre de forma direccionada da matriz da mitocôndria para o espaço intermembranar (é uma bomba de protões), sendo os dois processos indissociáveis. Assim, a equação que melhor descreve a actividade catalítica do complexo III é a equação 8:

QH2 + 2 citocromo c (Fe3+) + 2H+ (matriz) → Q + 2 citocromo c (Fe2+) + 4H+ (fora) (8)

O complexo III faz a acoplagem de um processo exergónico (a reacção de oxi-redução) com um processo endergónico (o transporte de protões contra-gradiente) de um espaço mais alcalino (a matriz) para um espaço mais ácido (o espaço intermembranar).

A actividade enzímica do complexo IV pode ser descrita pela equação 9: cada um dos átomos de uma molécula de oxigénio aceita dois electrões da forma reduzida (Fe2+) do citocromo c, originando H2O.

2 citocromo c (Fe2+) + ½ O2 + 2 H+ → H2O + 2 citocromo c (Fe3+) (9)

Tal como o complexo III, também o complexo IV é uma bomba de protões que contribui para a criação do gradiente de protões entre a matriz e o espaço intermembranar; a equação que melhor descreve a sua actividade é a equação 10:

Fig. 5: O trajecto dos electrões entre o succinato e o oxigénio molecular.

O aceitador último dos electrões é o oxigénio molecular (n.o.=0) que se reduz formando água (n.o.=-2). O processo envolve a actividade de complexos enzímicos que catalisam a transferência dos electrões do succinato para a coenzima Q, desta para o citocromo c e deste para o O2.

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2 citocromo c (Fe2+) + ½ O2 + 4H+ (matriz) → H2O + 2 citocromo c (Fe3+) + 2H+ (fora) (10)

O somatório das reacções (ignorando o transporte de protões) catalisadas pelos complexos II, III e IV é expresso pela equação 11.

succinato + ½ O2 → fumarato + H2O (11)

A diferença de potencial redox padrão entre os pares O2/H2O e succinato/fumarato é de 0,78 V o que, tendo em conta a equação de Nernst, corresponde a uma Keq para a reacção representada pela equação 11 de cerca de 1026 atm-1/2.

A equação 4 mostra que o produto final da oxidação da glicose é o CO2. Sendo que a glicose contém 6 átomos de carbono, há, no catabolismo da glicose, 6 reacções de descarboxilação, ou seja, 6 reacções em que ocorre a libertação de CO2. De facto, porque ocorre uma cisão durante a acção da aldólase, apenas estão envolvidas nos processos de descarboxilação 3 enzimas que, por coincidência, também catalisam reacções de oxi-redução e que são, portanto, oxi-redútases: a desidrogénase do piruvato, a desidrogénase do isocitrato e a desidrogénase do α-cetoglutarato (Fig. 3). As reacções catalisadas por estas enzimas são as que as equações 12, 13 e 14 descrevem:

piruvato + NAD+ + coenzima A → acetil-CoA + NADH + CO2 (12) isocitrato + NAD+ → α-cetoglutarato + NADH + CO2 (13) α-cetoglutarato + NAD+ + coenzima A → succinil-CoA + NADH + CO2 (14)

As reacções catalisadas pelas desidrogénases acima referidas são complexas. Embora se designem desidrogénases e sejam classificadas como oxi-redútases, as reacções por elas catalisadas não são apenas de oxi-redução. Tomemos como exemplo o caso da reacção catalisada pela desidrogénase do piruvato (Fig. 6). A desidrogénase do piruvato é um complexo

com várias sub-unidades e tem um mecanismo enzímico muito complexo, envolvendo 3 grupos prostéticos. Contudo, para melhor compreender a reacção catalisada por esta enzima, podemos fazer um exercício conceptual e pensá-la como sendo constituída por (i) uma reacção de oxi-redução acoplada (ii) a uma reacção de descarboxilação e (iii) a uma outra que pode ser entendida como o inverso da hidrólise da acetil-CoA, um dos produtos formados (Fig. 6). O agente oxidante é o NAD+ que se reduz a NADH; como acontece em todas as outras reacções que envolvem o NAD+, o processo de redução a NADH pode ser entendido como resultando da Fig. 6: Esquema interpretativo da actividade da desidrogénase

do piruvato.

A desidrogénase do piruvato catalisa a oxidação do piruvato a acetato e CO2 sendo o aceitador dos electrões o NAD+. O acetato, numa reacção “inversa à de hidrólise”, reage com a coenzima A formando acetil-CoA.

(8)

aceitação de dois electrões e um protão, ou, dito de forma mais curta, na aceitação de um ião hidreto (H-). A equação 15 representa a semi-equação de redução do NAD+.

NAD+ + 2 e- + H+ → NADH (15)

Os n.o. dos carbonos 2 e 1 do piruvato (CH3COCOO-) são, respectivamente, +2 e +3.

Na acetil-CoA o carbono 1 do resíduo acetato era o carbono 2 do piruvato e o seu n.o. é agora +3; o carbono 1 do piruvato é agora o carbono do CO2 cujo n.o. é +4 (Fig. 6). A semi-equação que representa a oxidação do piruvato a acetato e CO2 é a seguinte:

piruvato + H2O → acetato + CO2 + 2 e- + 2 H+ (16) Para além do CO2 e do NADH, o outro produto da acção catalítica da desidrogénase do piruvato é o acetil-CoA que pode ser conceptualmente entendida como resultando de uma reacção de hidrólise inversa:

acetato + CoA → acetil-CoA + H2O (17)

A soma das reacções 15, 16 e 17 é, como não podia deixar de ser, a reacção representada pela equação 12 ou, se quisermos ser rigorosos, a equação 12 a que acrescentámos um protão, para acerto, nos produtos.

Quer no metabolismo da glicose quer noutros metabolismos, os electrões do NADH acabam, através da acção dos complexos da cadeia respiratória, por reduzir o oxigénio. A enzima da cadeia respiratória que interage directamente com o NADH chama-se desidrogénase do NADH, mas também é conhecida como complexo I. Na reacção catalisada pelo complexo I, a ubiquinona (ou coenzima Q) oxida o NADH a NAD+:

NADH + Q → NAD+ + QH2 (18)

O complexo I é constituído por algumas dezenas de sub-unidades e o mononucleotídeo de flavina (FMN) é um dos seus grupos prostéticos. Durante o processo catalítico o FMN aceita dois electrões do NADH passando a FMNH2 que, de seguida, se volta a oxidar a FMN. A ubiquinona (Q) interage com o complexo I, aceitando o par de electrões que pertenciam ao NADH e que lhe foram transferidos via FMN. Também podemos pensar que o NADH cede um ião hidreto (dois electrões e um protão) à ubiquinona, que se reduz a ubiquinol-1 e que o ubiquinol-1 funciona como uma base, captando um protão do meio e gerando ubiquinol. Tal como acontecia no caso dos complexos III e IV, também o complexo I é uma bomba de protões e a equação que melhor descreve a actividade do complexo I é a equação 19.

NADH + Q + 4 H+ (matriz) → NAD+ + QH2 + 4 H+ (fora) (19)

Como já referido acima, a propósito da oxidação do succinato pelo oxigénio, o ubiquinol acaba por ser oxidado pelo oxigénio, via citocromo c, através da acção catalítica dos complexos III e IV. As equações 20 e 21 descrevem, respectivamente, o somatório das reacções de oxi-redução catalisadas pelos complexos I, III e IV e a actividade global (enzímica e de transporte de protões) dos mesmos complexos:

NADH + ½ O2 → NAD+ + H2O (20)

NADH + ½ O2 + 10 H+ (matriz) → NAD+ + H2O + 10 H+ (fora) (21)

(9)

A diferença de potencial padrão entre o par redox O2/H2O e o par NAD+/NADH é de 1,13 V, o que corresponde a uma constante de equilíbrio para a reacção descrita pela equação 20 de cerca de 1038 atm-1/2.

A reacção de oxidação do NADH pelo oxigénio é exergónica; por cada par de electrões transferidos, 10 protões são transportados da matriz para o espaço intermembranar, sendo este transporte o componente endergónico do processo.

4 - A relação entre diferença de potencial de eléctrodo e a razão Keq/QR

A tabela I mostra os potenciais padrão de eléctrodo de uma série de pares redox relevantes para o metabolismo dos seres vivos4. É frequente pensar-se que quando um par redox qualquer (seja oxi1/red1) tem um potencial padrão de eléctrodo superior a outro (seja oxi2/red2) é forçoso deduzir que a forma oxidada do par redox com potencial mais elevado (oxi1) oxida a forma reduzida do par redox com potencial mais baixo (red2). Esta ideia tem a sua razão de ser porque, como já referido na nota 2, o logaritmo da Keq é directamente proporcional ao ∆Eº e, se o valor de ∆Eº for muito elevado, o valor da Keq será tão grande que a reacção só pode evoluir num sentido. Todas as reacções de oxi-redução referidas até aqui, neste texto, enquadram-se nesta afirmação.

Tabela I: Semi-reacção Eº’ (Volt)

½ O2 + 2 e- + 2 H+ ↔ H2O + 0,815

Cyt c (Fe3+) + e- ↔ Cyt c (Fe2+) +0,254 Q + 2H+ + 2 e- ↔ Q

H

2

fumarato + 2 e- + 2 H+↔ succinato

+0,045 +0,030 Oxalacetato + 2H+ + 2 e- ↔ malato -0,166 Piruvato + 2H+ + 2 e- ↔ lactato -0,185 NAD+ + 2 e- + H+ ↔ NADH

6

CO2 + 24 e- + 24 H+ ↔ glicose + 6 H

2

O

-0,315 -0,430

Contudo, em rigor, o que determina o sentido em que uma determinada reacção (qualquer reacção) evolui não é a sua Keq, mas sim a razão entre a Keq e o quociente de reacção (QR). Em condições padrão, as concentrações dos reagentes e dos produtos consideram-se unitárias (ver nota 1); por isso, em condições padrão, o valor do QR é 1 e o valor da razão Keq/QR = Keq. O potencial real de uma pilha electroquímica depende da diferença de potencial padrão dos pares redox pertinentes (equivalente à Keq), mas também das concentrações reais dos reagentes (o QR). O valor da diferença de potencial real numa pilha electroquímica pode ser calculado usando a equação de Nernst escrita desta maneira5:

∆E’ = (0,059V/n) log (Keq/QR) (22) O valor de ∆E’ só é positivo se Keq > QR e só nesta circunstância a reacção tem tendência termodinâmica a evoluir no sentido em que a forma oxidada do par redox com potencial mais elevado oxida a forma reduzida do par redox com potencial mais baixo. O potencial padrão do par redox piruvato/lactato é superior ao do par NAD+/NADH [ver tabela I;

4 Ao contrário do que acontece no casos dos químicos, em que se considera que o pH é zero, no caso dos bioquímicos é mais vulgar considerar que o pH é 7 e, por isso, na presente tabela, em vez de Eº está escrito Eº’.

5 Notar que a equação 22 ⇔ ∆E’= (0,059/n) log Keq - (0,059/n) log QR ⇔ ∆E’= ∆Eº’ - (0,059/n) log QR.

(10)

∆Eº’= -0,185 – (-0,315) = +0,13]6 o que poderia fazer-nos pensar que o sentido desta reacção (catalisada pela desidrogénase do lactato) seria sempre aquela em que o piruvato funciona como oxidante e o NADH como redutor (equação 23):

piruvato + NADH → lactato + NAD+ (23)

De facto, a reacção catalisada pela desidrogénase láctica encontra-se sempre muito próximo do equilíbrio químico no citoplasma das células (Keq ≈ QR ⇔ ∆E’ ≈ 0) evoluindo no sentido da formação do lactato (redução do piruvato pelo NADH) ou no sentido inverso (oxidação do lactato pelo NAD+) de acordo com a lei da acção das massas. Nos eritrócitos, nos tumores mal irrigados ou

quando o trabalho muscular é feito em regime “anaeróbio”

as concentrações dos reagentes e produtos

“empurram” a reacção no sentido da formação do lactato porque a Keq > QR (⇔ ∆E’ > 0) (ver Fig. 7). Mas durante o recobro do exercício, quer nos músculos quer no fígado (onde ocorre captação de lactato), a reacção evolui em sentido inverso ao indicado na equação 23; no músculo durante o recobro e no fígado as concentrações dos reagentes e produtos

“empurram” a reacção no sentido da formação do piruvato, ou seja, nestes casos a Keq < QR (⇔ ∆E’ < 0).

6 Calculando a partir da equação de Nernst (log Keq = n ∆Eº’ / 0,059), deduz-se que a constante de equilíbrio da reacção expressa pela equação 23 é 104,4.

Fig. 7: Redução do piruvato a lactato em anaerobiose.

Em situações de anaerobiose aumenta a concentração de NADH e desce a de NAD+, o que força a reacção catalisada pela desidrogénase do lactato no sentido em que o NADH reduz o piruvato.

(11)

Anexo – Oxi-redútases

Embora algumas reacções de oxi-redução não enzímicas possam ter importância na evolução de certas doenças e no envelhecimento (nomeadamente as que envolvem as chamadas espécies reactivas de oxigénio ou de azoto – ROS e RNS), a esmagadora maioria das reacções de oxi-redução que ocorrem nos seres vivos são catalisadas por enzimas.

De acordo com a Comissão de Enzimas da União Internacional de Bioquímica, as enzimas que catalisam reacções de oxi-redução agrupam-se num grande grupo e designam-se de oxi-redútases.

As enzimas designam-se de acordo com a sua actividade, mas não existem normas rígidas que permitam de forma previsível estabelecer uma relação entre uma actividade e um nome. Para cada enzima existe um nome sistemático (que, na prática, é pouco usado) mas aceitam-se, como sinónimos, muitos outros que, muitas vezes à revelia de todas as regras, se impuseram por tradição. O texto abaixo destina-se a facilitar a aprendizagem da nomenclatura usada para denominar as oxi-redútases, explicando o significado de algumas palavras usadas com frequência neste contexto.

A- Desidrogénases e redútases

Muitas reacções enzímicas de oxi-redução podem ser esquematizadas da seguinte maneira:

XH2 + NAD+ (ou NADP+, FAD, FMN) ↔ X + NADH (ou NADPH, FADH2, FMNH2) (A1)

Nestas reacções a enzima envolvida no processo catalisa uma reacção em que o NAD+, o NADP+, o FAD ou o FMN oxidam um substrato XH2. Nos casos em que o oxidante é o FAD ou o FMN, a reacção pode ser interpretada como a perda de dois hidrogénios pelo reagente que se oxida (XH2) e a sua aceitação pelo FAD ou pelo FMN. Quando o oxidante é o NAD+ ou o NADP+, a reacção pode ser interpretada como a transferência de um hidrogénio e dois electrões (ião hidreto) entre um reagente que se oxida (XH2) e o NAD+ ou o NADP+. Nestes casos, a enzima que catalisa a reacção é frequentemente denominada desidrogénase do XH2. Obviamente que a mesma enzima também pode catalisar a reacção inversa, mas o nome adequado será desidrogénase do “composto orgânico que cede o hidreto ou os hidrogénios ao NAD+, NADP+, FAD ou FMN”. São exemplos as desidrogénases do lactato (equação A2), do piruvato (equação A3), da glicose-6-fosfato (equação A4) e do succinato (equação A5).

lactato + NAD+ ↔ piruvato + NADH (A2)

piruvato + NAD+ + CoA → acetil-CoA + NADH + CO2 (A3) glicose-6-fosfato + NADP+ → 6-fosfogliconolactona + NADPH (A4)

succinato + FAD → fumarato + FADH2 (A5)

A desidrogénase do NADH também existe, mas não se refere a nenhuma das enzimas acima referidas. De facto, lidas em sentido inverso, as reacções representadas pelas equações A2 e A3 podem ser interpretadas como a perda de um ião hidreto pelo NADH, mas o nome desidrogénase do NADH não se aplica às enzimas que catalisam aquelas reacções. A desidrogénase do NADH é uma enzima da cadeia respiratória (também designada como complexo I) que catalisa a oxidação do NADH pela coenzima Q (ubiquinona). O agente oxidante directo é o FMN, que se reduz a FMNH2 e acaba por ceder os hidrogénios à coenzima Q. A equação A6 representa a primeira parte do processo catalisado pela desidrogénase do NADH.

(12)

NADH + FMN → NAD+ + FMNH2 (A6)

Com alguma frequência as oxi-redútases em que um dos substratos é o NADPH catalisam reacções fisiologicamente irreversíveis em que o NADPH funciona como agente redutor. São reacções do tipo:

NADPH + Y → NADP+ + YH2 (A7)

Nestas reacções o NADPH reduz o composto Y cedendo-lhe um ião hidreto. Com muita frequência as enzimas que catalisam reacções deste tipo designam-se “redútase do Y”. São exemplos a redútase das aldoses (equação A8 – um das aldoses possíveis é a glicose que se reduz ao poli-alcool correspondente), a redútase do hidroxi-metil-glutaril-CoA (equação A9) e a redútase do glutatião (equação A10).

NADPH + glicose → NADP+ + sorbitol (A8)

2 NADPH + hidroxi-metil-glutaril-CoA → 2 NADP+ + mevalonato + CoA (A9) NADPH + GS-SG (dissulfureto do glutatião) → NADP+ + 2 GSH (glutatião) (A10)

B- Oxídases e oxigénases

Nalgumas reacções de oxi-redução o oxigénio molecular é um dos reagentes, funcionando como oxidante de um outro substrato (um composto orgânico). Quando o O2 é um dos reagentes as enzimas designam-se de oxídases ou de oxigénases.

Embora haja excepções, o nome oxídase é usado quando, como resultado da redução do O2, se forma H2O, peróxido de hidrogénio (H2O2) ou o ião superóxido (O2

•-)7 e nenhum dos átomos de oxigénio fica incorporado no composto orgânico que se oxida. São exemplos a oxídase do citocromo c (equação B1), a oxídase do protoporfirinogénio III (equação B2) e a oxídase do NADPH (equação B3).

2 citocromo c (Fe2+) + ½ O2 + 2 H+ → 2 citocromo c (Fe3+) + H2O (B1) protoporfirinogénio III + 3O2 → protoporfirina III + 3 H2O2 (B2) NADPH + 2 O2 → NADP+ + H+ + 2 O2•-

(B3)

O nome oxigénase é atribuído às enzimas em que, tal como no caso das oxídases, o oxigénio molecular é o agente oxidante, mas em que pelo menos um dos átomos do oxigénio fica incorporado no substrato orgânico que se oxida.

Dentro do grupo das oxigénases destaca-se um grande grupo designado de mono- oxigénases. As reacções catalisadas pelas mono-oxigénases são particularmente complexas porque existem sempre dois agentes redutores, quer dizer, há duas substâncias distintas (WH2 e VH) que são oxidadas durante o processo catalítico. Em geral, as reacções catalisadas pelas mono-oxigénases podem ser interpretadas pensando que um dos redutores (WH2) cede dois átomos de hidrogénio reduzindo um dos átomos do O2 a H2O enquanto o outro (VH) aceita o outro átomo de oxigénio:

WH2 + O2 + VH → W + H2O + VOH (B4)

7 De notar que o O2•- (-½), o H2O2 (-1) e a H2O (-2) contêm o elemento oxigénio com números de oxidação menores (os indicados entre parêntesis) que o oxigénio molecular (zero).

(13)

Porque as mono-oxigénases oxidam simultaneamente duas substâncias distintas também se designam como oxigénases de função mista. Porque uma dessas substâncias, o VH (que passa a VOH, “hidroxilando-se”), sofre hidroxilação durante o processo, as mono-oxigénases deste tipo são, muitas vezes, designadas de hidroxílases do VH. São exemplos a hidroxílase da fenilalanina (equação B5) e a hidroxílase da tirosina (equação B6):

fenilalanina + tetra-hidro-biopterina + O2 → tirosina8 + di-hidro-biopterina + H2O (B5) tirosina + tetra-hidro-biopterina + O2 → di-hidroxi-fenilalanina + di-hidro-biopterina + H2O (B6)

Com frequência as hidroxílases são componentes de um sistema enzímico que, além da hidroxílase, inclui uma redútase, a redútase do W. Nos dois exemplos acima referidos a tetra- hidro-biopterina (WH2) é oxidada a di-hidro-biopterina (W) por acção da hidroxílase, mas, para que o ciclo catalítico possa continuar, tem de ser novamente reduzida a tetra-hidro-biopterina. O componente do sistema enzímico que catalisa a redução da di-hidro-biopterina a tetra-hidro- biopterina é a redútase da di-hidro-biopterina (equação B7).

NADPH + di-hidro-biopterina → NADP+ + tetra-hidro-biopterina (B7)

Algumas hidroxílases contêm como grupo prostético um grupo heme que se liga ao O2

(o agente oxidante nas mono-oxigénases) durante o processo catalítico. Muitas destas hidroxílases hemínicas designam-se de citocromos P4509. Os citocromos P450 estão envolvidos na hidroxilação de compostos que são intermediários na síntese de corticosteróides e na metabolização de xenobióticos10. Tal como as outras hidroxílases acima referidas, os citocromos P450 fazem parte de sistemas enzímicas que incluem uma redútase, a redútase do citocromo P450. Tal como já acontecia nos casos dos sistemas enzímicos que incluíam as hidroxílases da fenilalanina ou da tirosina, a actividade dos sistemas enzímicos que incluem o citocromo P450 pode ser esquematizada como se segue:

NADPH + O2 + VH → NADP+ + H2O + VOH (B8)

De notar que a equação B8 é a que resulta da soma da equação B4 com a equação correspondente à redução de W pelo NADPH.

C- Peroxídases

As enzimas que catalisam a redução do oxigénio de peróxidos (que passa de -1 a -2) designam-se de peroxídases. São exemplos a peroxídase do glutatião (equação C1) e a mieloperoxídase (equação C2).

2 GSH + H2O2 → GS-SG + 2 H2O (C1)

Cl- + H2O2 → ClO- (hipoclorito) + H2O (C2)

No caso da peroxídase do glutatião, o agente redutor é o glutatião: o n.o. do S do grupo tiol do glutatião reduzido (GSH) é -2 aumentando para -1 no dissulfurero de glutatião (oxidado;

8 De notar que a tirosina também se pode designar como p-hidroxi-fenilalanina.

9 A razão desta designação prende-se com o facto de, caracteristicamente, absorverem intensamente luz de comprimento de onda de 450 nm quando, em determinadas condições experimentais, são complexadas com o monóxido de carbono.

10 Xeno é um prefixo que quer dizer “estrangeiro”; designam-se de xenobióticos os fármacos e outros compostos que não fazem parte do metabolismo normal do ser vivo em questão.

(14)

GS-SG). No caso da mieloperoxídase, o agente redutor é o ião Cl- (n.o. do cloro = -1) que se oxida a hipoclorito (n.o. do cloro = +1).

D- Reacções enzímicas de dismutação

Designam-se como reacções de dismutação reacções de oxi-redução em que uma mesma substância funciona, simultaneamente, como oxidante e como redutor. São exemplos as reacções catalisadas pela dismútase do superóxido (equação D1) e pela catálase (equação D2).

2 O2•-

+ 2 H+ → O2 + H2O2 (D1)

2 H2O2 → O2 + 2 H2O (D2)

De notar que na reacção D1 uma das moléculas de superóxido (n.o. do oxigénio = -½ ; ver nota 7) se oxida a O2 enquanto a outra se reduz a H2O2 (n.o. do oxigénio = -1; ver nota 7).

De forma semelhante, na reacção D2, enquanto uma das moléculas de H2O2 se oxida a O2 a outra reduz-se a água.

BIBLIOGRAFIA

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8. Sahlin, K., Katz, A. & Henriksson, J. (1987) Redox state and lactate accumulation in human skeletal muscle during dynamic exercise, Biochem J. 245, 551-6.

Este texto foi escrito por Rui Fontes em Novembro de 2004 e foi sendo corrigido posteriormente. A última correcção foi feita em Outubro de 2006. O autor agradece todas as críticas que queiram fazer no futuro e as que já foram feitas pela professora Isabel Azevedo.

Referências

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