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Desafios que o movimento feminista e a teologia feminista lançam à sociedade e às Igrejas

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Academic year: 2021

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feminista lançam à sociedade e às Igrejas.*

Ivone G eb ara

Entre os d ife re n te s m o vim e n to s o rg a n iza d o s para m o d ific a r o "sta tu s q u o " v ig e n te , situo o m o v im e n to fe m in is ta , a in d a in c ip ie n te na A m é ric a Latina e e s p e c ia lm e n te no Brasil.

V ive m o s nu m p e río d o histó rico e x tre m a m e n te c o m p lic a d o e co n ­ tu rb a d o . A sede de a u to n o m ia , p a rtic ip a ç ã o , respeito, justiça m a n ife s ta ­ d a nas d if e r e n t e s lu ta s lib e r t á r ia s d e in d íg e n a s , n e g ro s , tra b a lh a d o ra s(e s) do ca m p o e da cid a d e m a n ife sta a insatisfação g e n e ­ ra liz a d a em re la ç ã o à "d e s o rg a n iz a ç ã o " social in s titu c io n a liz a d a em que vivem os.

O m o v im e n to fe m in is ta p a rtic ip a desse m a l-e sta r p ro v o c a d o p e la e n fe rm id a d e social de nosso m u n d o . T am bém as m u lh e re s com eçam a p e rce b e r o q u a n to sua situ a çã o a tu a l de " o p r im id a / o p re sso ra " precisa e n tra r num processo re v o lu c io n á rio m ais a m p lo , capaz de c ria r " u m no­ vo h o m e m e um a nova m u lh e r" num m u n d o de novos re la c io n a m e n to s . M in h a p e rsp e ctiva na presente re fle x ã o é de a la rg a r a proposta fe m in is ta para a lé m dos p ro b le m a s da m u lh e r, e m b o ra seja e la seu p o n ­ to in ic ia l.

Três m om entos in tim a m e n te in te rlig a d o s co n d u z irã o o d iá lo g o a q u e m e p ro p o n h o :

I o) P erceberem os o se n tid o da in te rp e la ç ã o do m o v im e n to das m u lh e re s na A m é ric a Latina.

2o) P erceberem os as reações ou oposições a o m o v im e n to de m u ­ lheres e à te o lo g ia fe m in is ta .

3o) Um a rá p id a conclusão.

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1°) Sentido da interp elação do m ovim ento das m ulheres na A m érica Latina.

A q uestão da m u lh e r h o je é um a q uestão de toda a h u m a n id a d e . Tal a firm a ç ã o p o d e ria p a re ce r e x tre m a m e n te pretensiosa se não p ro cu ­ rarm os e n te n d ê -la no seu se n tid o exa to . Poderia p a re ce r um a red u çã o de todos os gra n d e s p ro b le m a s v iv id o s p e la h u m a n id a d e h o je a um ú n i­ co p ro b le m a . E ntretanto, não é esta p re te n sã o que m e a n im a . A o c o n trá ­ rio, é um a p e rce p çã o p ro fu n d a de qu e , a p a rtir do a c o rd a r da consciên­ cia histórica das m ulheres, está se o p e ra n d o um a m udança q u a lita tiv a na h u m a n id a d e , m udança q u e nos sugere um a n o va a n tro p o lo g ia p re si­ d in d o as relações hum anas.

A sociedad e p a tria rc a l, cujas raízes d ific ilm e n te consegu ire m os d e te cta r p ro d u ziu sua a n tro p o lo g ia , seu m o d e lo de hom em e m u lh e r e a p a rtir d e le , de certa fo rm a , o rg a n iz o u a sociedad e. V ive m o s a in d a nesse m o d e lo de características h ie rá rq u ica s, idea lista s e e xclu d e n te s. N ão que e le se d e fin a a p a rtir dessas características, mas são elas qu e a p a re ­ cem à p rim e ira vista q u a n d o te n ta m o s c o m p re e n d e r o h o m e m e a m u­ lh e r p ro d u zid o s p o r nossa a tu a l cu ltu ra . O m o d e lo a n tro p o ló g ic o p a tria r­ cal se desd o b ro u na histó ria do o cid e n te em m uitas fo rm a s e fo i o res­ ponsável p e la " p r o d u ç ã o " de um a série de co m p o rta m e n to s id e o ló g ico s qu e ju s tific a ra m m ú ltip la s e x p lo ra çõ e s desde o c o lo n ia lis m o , o racism o e a d o m in a ç ã o na re la ç ã o hom em e m u lh e r.

A " r e v o lu ç ã o " de c a rá te r quase m u n d ia l qu e está se o p e ra n d o h o je em nossa h istó ria , em especial por causa do a co rd a r da consciência da m u lh e r, está e x ig in d o um a re o rg a n iz a ç ã o do m u n d o , um a nova p a rti­

lha de tarefas, um n o vo sistem a de d ivisã o do tra b a lh o , um a p a rtic ip a ­ ção m ais e q u ita tiv a nas gra n d e s decisões políticas, um e q u ilíb rio da p re ­ sença m asculina e fe m in in a nos d ife re n te s a m b ie n te s e setores da vida h u m a n a p a ra s u p e ra r as h ip e rtro fia s p a lp á v e is e os e ste re ó tip o s de um e de o u tro la d o , que a ce n tu a m a in d a m ais a e n fe rm id a d e de nossa socie­ d ade.

A o rg a n iz a ç ã o das m u lh e re s tem sido um a constante nos d ife re n ­ tes m eios sociais. Entretanto, não é q u a lq u e r o rg a n iz a ç ã o de m ulheres que tem o o b je tiv o de ultrapassar as fro n te ira s re iv in d ic a tó ria s e m b o ra estas sejam um passo im p o rta n te e ta lve z p rim e iro nos d ife re n te s tipos de o rg a n iza çã o . U ltrapassar as fro n te ira s re iv in d ic a tó ria s s ig n ific a tocar no p ro b le m a a n tro p o ló g ic o m a io r, isto é, nã o se lim ita r a co n se g u ir lu g a ­ res sem e lh a n te s ou iguais ao do h o m e m , mas buscar um a re o rg a n iz a ç ã o da so cie d a d e no seu c o n ju n to .

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O b se rva n d o os d ife re n te s m o vim e n to s, so b re tu d o os de cunho m ais p o p u la r, constata-se q u e , cada vez m ais, a m u lh e r tem p e rc e b id o o a lca n ce de sua in flu ê n c ia a n iv e l d o m é stico e, apesar do v a lo r desse ní­ vel da e xistê n cia , e le pod e a p ris io n á -la e im p e d í-la de ter um a p a rtic ip a ­ ção e fe tiv a n u m a c a m in h a d a m ais a m p la . Pode ta m b é m a p ris io n a r o h o ­ m em a um e s te re ó tip o q u e rid o p e la so cie d a d e p a tria rc a l e im p e d í-lo de v iv e r um a d im e n s ã o h u m a n a m ais p le n a . Esta d iv is ã o m ais ou m enos rí­ g id a de p apéis de stin a um à " v a s tid ã o " d o m u n d o e a outra às fro n te ira s da casa. E com o se a o rg a n iz a ç ã o da so cie d a d e tal q u a l é h o je fosse um a espécie de " d e s tin o " , um a lei da natureza e nã o um a p ro d u çã o c u ltu ra l hum a n a . A nova a n tro p o lo g ia qu e se q u e r é p ro fu n d a m e n te histórica no se n tid o de le va r a sério as produçõe s históricas com o produções h u m a ­ nas e co n se q ü e n te m e n te possíveis de serem m udadas. Eis o d e s a fio que se d e lin e ia , d e s a fio qu e se a n u n c ia com o o ra ia r de um novo d ia e n ­ q u a n to as som bras da n o ite são a in d a m u ito espessas. Esse m esm o desa­ fio é c o lo ca d o às ig re ja s cristãs qu e nã o in te g ra ra m a p ro d u ç ã o e ação te o ló g ic a das m u lh e re s com o c o n trib u iç ã o ig u a lm e n te c ria tiv a e c ria d o ­ ra. Tam bém na Ig re ja a m u lh e r re p ro d u z a m esm a d o m e s tic id a d e que caracteriza sua ação. Cabe a e la a ta re fa da cateque se, da in ic ia ç ã o in ­ fa n til à fé , mas nada tem a d iz e r no n íve l das gra n d e s o rie n ta çõ e s e d e c i­ sões das Igrejas.

A te o lo g ia fe m in is ta assum e com o sua essa perspectiva a n tro p o ló ­ gica m ais a m p la e, à luz dessa a n tro p o lo g ia e das co nquista s da h u m a n i­ d a d e h o je nos d ife re n te s setores da a tiv id a d e h u m a n a , p ro p õ e a revisão das im agens p a tria rc a is de Deus, a re le itu ra da Escritura na te n ta tiv a de re cu p e ra r a " m e m ó ria s u b v e rs iv a " das m u lh e re s do passado e conse­ q ü e n te m e n te a re a b ilita ç ã o da m u lh e r com o lu g a r da m a n ife s ta ç ã o do d iv in o ta n to q u a n to o h o m e m . Tais a firm a ç õ e s não p o d e m a pena s serem aceitas te o ric a m e n te ou co m o p rin cíp io s ig u a litá rio s em si mesmos. De­ vem na re a lid a d e fa z e r p a rte das relações h um anas nos d ife re n te s níveis pois são e le m e n to s co n stitu tivo s de nosso ser histórico. A ssum í-las s ig n ifi­ ca viv ê -la s na h istó ria e não a p e n a s discursar sobre elas com o fa z e m os teóricos lib e rtá rio s.

2 °) Reações ou oposições ao m ovim ento de m ulheres e à teologia f e ­ m inista.

O m o v im e n to fe m in is ta tem e n c o n tra d o a depta s (os) e opositoras (es). C onstatar essas oposições ou resistências nos parece im p o rta n te p a ­ ra ca m in h a rm o s a d ia n te p e rc e b e n d o os c o n flito s e os b lo q u e io s qu e se m a n ife sta m em nossa história.

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a) Oposição da cultura ou da form ação social latino-am ericana

A c u ltu ra p a tria rc a l, com o o sabem os, p e rm itiu a in tro je ç ã o de um a d iv is ã o de co m p o rta m e n to s assim com o da d ivisã o do tra b a lh o . Há coisas e co m p o rta m e n to s p ró p rio s d o hom em e outros p ró p rio s da m u­ lher. Em certos aspectos essa in tro je ç ã o é a tal p onto p ro fu n d a q u e se to r­ na um a espécie de n a tureza. N ão se p e rce b e o c o m p o rta m e n to X ou Y com o produtos de um a c u ltu ra , com o fo rm a ç õ e s nascidas de há b ito s si­ tuados e datados, mas com o NATUREZA e esta não se m uda ou, ao m u d á -la , com ete-se um a v io la ç ã o g ra v e a um in te rd ito . Tal v io la ç ã o p o ­ de c o n d e n a r a pessoa e aca b a por m a rg in a liz á -la .

E bom le m b ra r que os m eios de co m u n ic a ç ã o m uitas vezes a ju ­ dam a fix a r certos c o m p o rta m e n to s e a g e m com o fo rça de resistência a certas m udanças, so b re tu d o p o rq u e em g e ra l estão a serviço dos “ v a lo ­ re s " d o status q u o e s ta b e le cid o .

O c a p ita lis m o m u n d ia l e o la tin o -a m e ric a n o " p e r m it iu " o nasci­ m e n to d o m o v im e n to fe m in is ta . A b e rta m e n te e le n ã o o a p ó ia e nem o destrói, pois tu d o d e p e n d e d o interesse do c a p ita l, do lucro. O lucro é a m e d ia ç ã o e fin a lid a d e ú ltim a de nossa sociedad e.

Em linhas gera is po d e m o s d ize r q u e há um a o posição ou resistên­ cia da c u ltu ra v ig e n te na m e d id a em q u e o m o v im e n to fe m in is ta p ro p õ e a m udança de hábitos m ile n a re s a d q u irid o s , há b ito s qu e fo ra m sè a d a p ­ ta n d o às d ife re n te s tra n sfo rm a çõ e s do m o d e lo e co n ô m ic o e social.

O m o v im e n to fe m in is ta não p re te n d e a pena s a m u d a n ça de cer­ tos háb ito s ou apena s a p e n e tra çã o da m u lh e r no m u n d o d o tra b a lh o p ro d u tiv o em se n tid o estrito. M esm o estando presente nesses d ife re n te s lugares, a s o cie d a d e , a re la ç ã o h o m e m /m u lh e r p o d e m nã o ser m o d ifi­ cadas ou a in d a tra n sfo rm a d a s por de n tro .

A proposta do m o v im e n to fe m in is ta é m ais a m p la , com o vim os a n te rio rm e n te . Por isso, a resistência a e le é bastante g ra n d e .

b) A oposição dos homens

Na re a lid a d e a m a io ria dos hom ens, m esm o os s im p a tiza n te s do m o v im e n to fe m in is ta , salvo raras exceções, não p e rce b e m o p ro je to m a io r que é p e rse g u id o . Tal d ific u ld a d e de perce p çã o se d e ve a d ife re n ­ tes fatores:

— o p ro je to m a io r fe m in is ta não é m u ito c la ro para a m a io ria das m u lh e re s, e, com m ais fo rte razão, para os hom ens q u e se vê e m a m e a ­ çados p e la " n o v id a d e " cria d a pelas m ulheres.

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— há um a espécie de b lo q u e io p s ico ló g ico nos hom ens d ia n te da sim ples id é ia de não re co n h e ce re m m ais suas m u lh e re s, filh a s , irmãs, m ães com a im a g e m tra d ic io n a l de subm issão que lhes fo i sem pre fa m i­ liar.

— há ta m b é m um a inseguran ça crescente d ia n te do fu tu ro , pois não conseguem p e rce b e r as conseqü ências da e m a n c ip a ç ã o da m u lh e r nos d ife re n te s setores da vid a fa m ilia r e social.

E nesse se n tid o qu e não se d e ve lim ita r o m o v im e n to fa m in is ta a um a m udança só do 2o sexo, mas s itu á -lo num p ro je to m ais a m p lo de so­ c ie d a d e e de m udança de re la c io n a m e n to e n tre hom em e m u lh e r em to ­ dos os níveis.

O m o v im e n to fe m in is ta é um m o v im e n to ta m b é m de d e s a lie n a - ção do ho m e m , de lib e rta ç ã o de certos e ste re ó tip o s e co n d ic io n a m e n to s que a sociedad e, a fa m ília e p a rtic u la rm e n te a m ãe lhes im p u se ra m . En­ tre ta n to , a perce p çã o de um a d e s a lie n a ç ã o pessoal a in d a está lo n g e de ch e g a r até a m a io ria dos hom ens. Sem d ú v id a , há um a d ific u ld a d e de a d m itirm o s nossas p ró p ria s a lie n a çõ e s. Por isso, os hom ens fic a m no a c i­ d e n ta l, na su p e rfície da p ro b le m á tic a fe m in is ta e resistem in te rio rm e n ­ te, e m b o ra a lg u n s m a n ife ste m um a certa a b e rtu ra e x te rio r te m e n d o se­ rem cham ados de retrógado s.

O h o m e m se d e p a ra com a luta fo ra do lar e esta é m arca d a pela co m p e tiçã o , in v e ja , inseguran ça, c o n flito , ra c io n a lis m o frio , m e n tira . Em casa, e le deseja com p e n sa r este m u n d o d e s a fia n te e instável e x ig in d o que a m u lh e r seja a g a ra n tia de um m u n d o de segurança : o lar. Para ele, a v e rd a d e ira m u lh e r é a que lhe g a ra n te um " u te r o a q u e c id o " lo n g e das d ific u ld a d e s co tid ia n a s. Por isso, e la se to rn a a " m u lh e r fo r te " na m e d i­ da em que obe d e ce a esses padrões e " f r a c a " p o rq u e o h o m e m tem que p ro te g ê -la para co n se rvá -la nesse m u n d o e conservar esse m u n d o para si p ró p rio . E isso que se co n v e n c io n o u ch a m a r de " m a rio n is m o " , o d u p lo co m p o rta m e n to da m u lh e r para satisfazer as e x ig ê n c ia s de " h a r m o n ia " no lar e na sociedade.

Os hom ens das Igrejas em g e ra l são os q u e m ais resistem às re i­ vin d ica çõ e s das m u lh e re s no in te rio r da estrutura eclesiástica. Sentem -se a m ea ça d o s com as propostas de p a rtilh a de re s p o n s a b ilid a d e nas d e c i­ sões, ou, em outros term os, p e la ascenção do p o d e r das m u lh e re s d e v id o à sua crescente in flu ê n c ia nas d ife re n te s c o m u n id a d e s cristãs.

Em g e ra l, os hom ens de Ig re ja são m u ito sensíveis às re iv in d ic a ­ ções sociais no m u n d o das fá b ric a s , do cam po, d o c o m é rcio , de grupos m in o ritá rio s perseguid os, mas não no in te rio r da p ró p ria Ig re ja , so b re tu ­

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do q u a n d o se trata de m ulheres. As ig re ja s in co n scie n te m e n te se ju lg a m p e rfe ita s e não a b re m espaços para re iv in d ic a ç õ e s sérias. M u ita s vezes, para conservar um a fa c h a d a de a b e rtu ra aos sinais d o m u n d o m o d e rn o , cedem para um a ou outra re iv in d ic a ç ã o sem assum irem de fa to a q u ilo qu e fo i re iv in d ic a d o .

O " p o d e r s a g ra d o " dos hom ens nas in stituições da re lig iã o c o m e ­ ça a ser q u e s tio n a d o e isto g e ra m u ita inseguran ça. As m u lh e re s não o b e d e ce m m ais: " tira ra m o v é u " , não cobrem m ais a cabeça e com eçam a fa la r nas asse m b lé ia s...

c) A oposição das m ulheres

C om o sabem os, nas classes p o p u la re s, o m o v im e n to fa m in ís ta se o rg a n iz a so b re tu d o em to rn o de re iv in d ic a ç õ e s sociais em pro l da vid a da c o m u n id a d e : lutas p e la á g u a , e n e rg ia e lé tric a , creches, m oradias, postos de saúde, etc. M u ita s vezes as m u lh e re s pobres viv e m num tal es­ ta d o de "a g re s s ã o " em todos os sentidos e níveis, q u e se sentem b lo ­ que a d a s a ir a lé m da o rg a n iz a ç ã o q u e satisfaça um a necessidade v ita l im e d ia ta . Daí qu e , para a lé m dos c o n d ic io n a m e n to s p ró p rio s à cu ltu ra , p a rtic u la rm e n te no m e io ru ra l, não se p o d e fa la r q u e estas m u lh e re s fa ­ çam um a v e rd a d e ira opo siçã o a o m o v im e n to fe m in is ta , pois este, a lé m de ser in c ip ie n te para elas, não tem condiçõe s sociais de se d e s e n v o lv e r em outros níveis de consciência.

Na classe m é d ia e a lta o p ro b le m a da resistência a o m o v im e n to fe m in is ta m uda de fig u ra . M u ita s m u lh e re s dessas classes não q u e re m p e rd e r o " p r iv ilé g io " de seu lu g a r social e a in d a o p riv ilé g io de serem "b o n e c a s " de lu xo , ra in h a s d o lar, m ã e s /m á rtire s . Estes co m p o rta m e n to s lhes d ã o id e n tid a d e e segurança. C riticam o m o v im e n to fe m in is ta com o se fosse a n e g a çã o de um a o rd e m e s ta b e le c id a por Deus, com o a lg u m a coisa d e s o rd e n a d a q u e lhes tira o tro fé u d o m a rtírio de ser m ãe e esposa d e d ic a d a a o lar e à fa m ília .

Em g e ra l, essas m u lh e re s consid e ra m sua co n d iç ã o com o um a es­ p é cie de se g u n d a n a tu re za in e re n te à re a lid a d e h u m a n a . Por isso, se d e ­ ve resistir a q u a lq u e r te n ta tiv a de m ud a n ça . A o rd e m d e ve ser m a n tid a , a tra d iç ã o re sg u a rd a d a e a m u lh e r é a c o lu n a m estra q u e sustenta esses v a lo re s " im u tá v e is " ...

d) A oposição das Igrejas

As ig re ja s cristãs p a rtic ip a m das m esm as d ific u ld a d e s e le n ca d a s a n te rio rm e n te , acrescido o fa to de se tra ta r de tocar em institu içõ e s d e ­ tentoras de um p o d e r ch a m a d o " s a g ra d o " .

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Tal p o d e r fa z com qu e a resistência à m u d a n ça seja m a io r, pois a rg u m e n ta m qu e este " v e m de D eus". In co n scie n te m e n te , ta lv e z os ho­ m ens da in s titu iç ã o re lig io s a sentem -se m ais p ró x im o s da d iv in d a d e p ro ­ jeta d a com o m a scu lin a p e la c u ltu ra p a tria rc a l. Por isso, d ific u lta m q u a l­ q u e r re fle x ã o qu e possa q u e s tio n a r suas im agens te o ló g ic a s e tem em q u a lq u e r p a rtilh a e fe tiv a do p o d e r sagrado.

S ubm etem as m u lh e re s e estas se su b m e te m , m uitas vezes com prazer, à m esm a d o m e s tic id a d e v iv id a no lar. A ta re fa da m u lh e r nas ig re ja s é em certo sen tid o o p ro lo n g a m e n to do lar. N ão e n tra m nos car­ gos de c h e fia ou d ire çã o . N ão são bispos, nem re ito ra s de se m in á rio .

As Igrejas resistem ta m b é m às propostas de e la b o ra ç ã o te o ló g ic a das m u lh e re s na m e d id a em qu e fo g e m dos padrões c o n v e n c io n a is , co n ­ siderados " v e r d a d e ir a " te o lo g ia e te o lo g ia c ie n tífic a .

A m eu ver, essa resistência à p ro d u çã o te o ló g ic a das m u lh e re s é d e v id a p rin c ip a lm e n te a três fa to re s:

a) os hom ens têm d ific u ld a d e s de sair do e squem a id e a lis ta a q u e estão h a b itu a d o s. A te o lo g ia é um a espécie de re p e tiç ã o de idéias pré- e sta b e le cid a s qu e e xiste m por si mesm as;

b) a c re d ita m qu e a te o lo g ia é sagrada e nesse se n tid o m arcada p e la im u ta b ilid a d e . Esquecem-se q u e e la é p ro d u çã o h u m a n a com o q u a lq u e r o u tro c o n h e c im e n to e q u e , não só é c o n d ic io n a d a a um a série de fa to re s, mas e v o lu i no espaço e no te m p o . C o n fu n d e m ò s a g ra d o com o je ito m ascu lin o de fa z e r te o lo g ia . E este je ito que é s a c ra liz a d o ...

c) p o rq u e a e la b o ra ç ã o te o ló g ic a fe m in is ta os o b rig a ria a re p e n ­ sar sua te o lo g ia e a o fa z e r isso to c a ria na questão do p o d e r e da a tu a l o r­ g a n iza çã o das igrejas.

3 ° ) C o n clu são

A títu lo de conclusão g o sta ria de le m b ra r qu e a te o lo g ia fe m in is ta é p ro fu n d a m e n te T e o lo g ia da Libertação, pois não só parte dos o p rim i­ dos e da m u lh e r o p rim id a da A m é ric a Latina, mas p ro p õ e um a nova m a ­ n e ira de fa z e r te o lo g ia com o expressão da v iv ê n c ia e co m p re e n sã o d ife ­ rentes da re la ç ã o e n tre os seres h um anos e Deus, re la ç ã o qu e é n o v id a ­ de e sinal do R eino em nossa história de hoje.

A te o lo g ia fe m in is ta , e m b o ra in c ip ie n te na A m é ric a Latina, pode d ir ig ir um a in te rp e la ç ã o e s p e c ia lm e n te às m u lh e re s te ó lo g a s ou in te re s­ sadas em te o lo g ia em cin co pontos q u e m ere ce m ser re fle tid o s com v a ­ g ar e com pletado s.

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1. A te n ç ã o crítica ao qu e se passa na so cie d a d e la tin o -a m e ric a n a , e s p e c ia lm e n te nas o rg a n iza çõ e s p o p u la re s e nas decisões d o p o d e r esta­ b e le c id o .

2. S e rie d a d e nas análises. N ão se d e ix a r le va r p elas p rim e ira s im ­ pressões, mas " c o b r a r " e n tre si um a re fle x ã o fu n d a d a na histó ria e na v i­ vê n cia a tu a l la tin o -a m e ric a n a .

3. P erm itir a crítica e fa z e r p e rio d ic a m e n te a a u to -crítica das ações e re fle x õ e s . N ão to m a r o h o m e m com o " in im ig o " e sim com o um d e sti­ n a tá rio im p o rta n te da te o lo g ia em vista da tra n s fo rm a ç ã o da sociedad e, on d e de fa to todos possam te r VIDA.

4. Fazer um a re le itu ra b íb lic a a p a rtir de um a h e rm e n ê u tic a fe m i­ nista qu e restaure a v e rd a d e da h istó ria , re sta u ra n d o a m e m ó ria "s u b ­ v e rs iv a " de m ilh a re s de m u lh e re s qu e e n tre g a ra m a p a ix o n a d a m e n te suas vidas p e lo povo, se rv in d o o R eino de Deus. Esta h e rm e n ê u tic a p re c i­ sa a in d a ser bastante " a f in a d a " a n ível de A m é ric a Latina.

5. O usar e n tra r no c a m p o da e la b o ra ç ã o te o ló g ic a com c ria tiv id a ­ de, sem m e d o de d iz e r sua p a la v ra sobre Deus e sobre o m u n d o . Nesse p a rtic u la r, co n sid e ra r ta m b é m a im p o rtâ n c ia da te o lo g ia nas lutas p o p u ­ lares e co n se q ü e n te m e n te a d im e n s ã o p o lític a da te o lo g ia e p a rtic u la r­ m ente da te o lo g ia fe m in is ta . Todas as re fo rm a s, m udanças e revoluções na so cie d a d e são in te rd e p e n d e n te s . Daí p o rq u e a h e rm e n ê u tic a fe m in is ­ ta e a te o lo g ia fe m in is ta são, não a p e n a s um e m p re e n d im e n to re lig io s o , mas um e m p re e n d im e n to p o lític o de fu n d a m e n ta l im p o rtâ n c ia .

A c re d ite m o s nas p o ssib ilid a d e s de construção de um m u n d o d ife ­ re n te no q u a l a lg u n s de nossos sonhos de a m o r à h u m a n id a d e possam de fa to se co n cre tiza r.

B IB L IO G R A F IA

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Referências

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