• Nenhum resultado encontrado

O Estado, a Cidadania e o Direito ao Futuro

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2020

Share "O Estado, a Cidadania e o Direito ao Futuro"

Copied!
8
0
0

Texto

(1)

O ESTADO, A CIDADANIA

E O DIREITO AO FUTURO*

ARNALDO RAGGI JÚNIOR**

O

estudo do Estado envolve, em uma síntese jurídica, a análise do conjunto for-mado por poder/soberania, população e território, sendo importante ressaltar a sua formação, com a capacidade de formular sua própria Constituição, base para seu desenvolvimento.

Há várias teorias justificando a existência do Estado, mas independentemente de qual se entenda mais apropriada, no dizer de Moraes (2008) deve ele ser considerado como uma grande conquista em termos de organização jurídica que apresenta, no sentido mo-derno, uma configuração em que se constata um poder supremo no plano interno ao mesmo tempo em que há um poder independente no cenário internacional.

Para uma análise mais ampla do Estado, não se atendo então apenas à natureza jurídica, é necessário que se faça uma incursão nos aspectos da política, da autoridade, da Ad-ministração Pública e do direito ao futuro. Para tanto, a discussão à luz das obras de Hannah Arendt revela uma perspectiva do cidadão, em relação ao qual, no Brasil, são importantes as transformações do Direito Administrativo, desde a obediência das regras legais ao novo para-digma em que há uma postura de cidadania ativa (FREITAS, 2012, p. 197).

Resumo: a Constituição da República Federativa do Brasil contém princípios delineadores

da atuação da Administração Pública, devendo haver, para a consecução de seus objetivos, a garantia dos direitos fundamentais em suas ações. Sendo relevante a atuação do Estado face ao direito ao futuro, traz o presente artigo análise do tema com abordagem da doutrina administrativista brasileira à luz dos estudos de Hannah Arendt.

Palavras-chave: Estado. Política. Cidadania. Direito ao futuro.

* Recebido em: 02.04.2014. Aprovado em: 05.03.2014.

** Mestrando do curso de Direito, Relações Internacionais e Desenvolvimento na PUC Goiás. Procurador do Estado de Goiás. Graduado em Direito pela PUC Goiás. E-mail: raggi3000@yahoo.com.br.

(2)

O foco na doutrina brasileira, portanto, se torna pertinente vez que a ação da Ad-ministração Pública se pauta ainda, em boa parte, em conceitos que realçam a sociedade em relação ao indivíduo. Isso porque o Estado, no Brasil, encontra como base para a sua ação os postulados dispostos na Constituição da República e, ao serem analisadas as normas constitu-cionais, constata-se que elas se dirigem com especial atenção aos direitos fundamentais, mas sem descurar da questão do interesse público, podendo este último inibir a garantia daqueles.

É então proposta a discussão quanto à questão do direito ao futuro no Brasil, a partir da análise que Hanna Arendt faz da política e da condição humana.

O PÚBLICO, A POLÍTICA E O CIDADÃO

Enveredando pela filosofia grega, Hannah Arendt, em sua obra A dignidade da política, ressalta que a polis, à época de Sócrates, era o domínio do público-político, em que o cidadão atingia a humanidade plena não somente por ser, mas também por aparecer. Nesse contexto, a palavra doxa, que abarca os significados de opinião, glória e fama, apresentava for-te relação com o domínio político e caracfor-terizava para os gregos “um grande privilégio que se ligava à vida pública e que faltava à privacidade doméstica, em que não se é visto nem ouvido por outros” (ARENDT, 1993, p. 97), destacando que a família, os escravos e os empregados não eram considerados como plenamente humanos, compondo estes o lar, o qual nascia da necessidade e era governado por esta, a própria necessidade da vida; já a polis, ao contrário, compunha a esfera da liberdade (ARENDT, 2014).

Essa separação entre o público e o privado, na polis, se traduzia então em uma diferenciação de papéis do indivíduo, que na esfera política deveria demonstrar coragem, enquanto na privacidade do lar mantinha posição de líder, desobrigando-se dos afazeres ine-rentes à superação das necessidades da vida. Para Aristóteles, a comunidade não era de iguais, mas composta de pessoas diferentes e desiguais, mas com o igualar-se havia o nascimento da comunidade, e “a política é necessária pelas necessidades da vida, das quais os homens esforçam-se por se libertar” (ARENDT, 1993, p. 99).

Verifica-se, portanto, uma relação entre política e liberdade, questão esta presente ainda em discussões atuais, por perpassar épocas pretéritas sempre com amplos debates. É essa a importância do trabalho de Arendt, por trazer a lume argumentações políticas e filosóficas que se aplicam ao estudo do Estado.

Discorre Arendt que, para Montesquieu, as leis têm por objetivo governar as ações do cidadão, havendo, porém, a falência das nações a partir da destruição progressiva da lega-lidade, “seja porque o governo no poder abusa das leis, seja porque as leis nascem de uma au-toridade que se torna questionável” (ARENDT, 1993, p. 46). Por conseguinte, os indivíduos deixam de ser cidadãos e a nação, cujas leis estão vinculadas à esfera da vida pública e política, acaba perdendo sua capacidade de ação política responsável.

A ação política, conforme Arendt (1993, p. 51), representa o início de algo novo, a essência da liberdade humana, sendo que o agir é o milagre da liberdade presente nessa capacidade de iniciar; o homem é então um novo início. Porém a ação política teria deixado de se situar na posição central do pensamento político quando as ciências históricas forne-ceram seus métodos e categorias ao campo da política. E já na modernidade, verifica-se que a esfera política tende a assegurar as provisões vitais da sociedade e a produtividade do livre desenvolvimento social, diferentemente do que ocorria na polis, onde o homem, o cidadão,

(3)

afastava-se das atividades relacionadas às necessidades da vida, no lar, para poder dedicar-se à vida pública.

Para Jean-Jacques Rousseau, lembra Arendt (2014, p. 47), a intimidade e o social, inicialmente, representavam formas subjetivas da existência humana, descoberta essa que ori-ginou reação contra a força niveladora da sociedade. Eis então que há o advento do social, plano em qual se verifica que a privatividade, no sentido moderno e “em sua função mais relevante, a de abrigar o que é íntimo, foi descoberta não como o oposto da esfera política, mas da esfera social, com a qual é, portanto, mais próxima e autenticamente relacionada” (ARENDT, 2014, p. 47). E é necessário ressaltar que a sociedade passa a exigir determinado tipo de comportamento e, assim, ao excluir a ação, impõe regras que tendem a normalizar os seus membros.

A fim de medirmos a extensão da vitória da sociedade na era moderna, sua inicial substituição da ação pelo comportamento e sua posterior substituição do governo pessoal pela burocracia, que é o governo de ninguém, pode convir também lembrar que sua ciência inicial, a economia, que altera padrões de comportamento somente nesse campo bastante limitado da atividade humana, foi finalmente sucedida pela pretensão oniabrangente das ciências sociais, que, como “ciências do comportamento”, visam a reduzir o homem como um todo, em todas as suas atividades, ao nível de um animal comportado e condicionado (ARENDT, 2014, p. 55).

É notória então a ascendência do domínio social, que minimiza a capacidade de ação e de discurso. Analisando-se no âmbito da estrutura interna de uma nação, o domínio social pode ser visto na Administração Pública pela sua ação com vista ao interesse público, cabendo então examinar a esfera jurídica do Estado brasileiro.

O ESTADO, A LEGALIDADE E O INTERESSE PÚBLICO

Hodiernamente o Estado revela-se como um ente político que no plano interno estabelece suas estruturas para o exercício de suas funções permanentes, as quais são efetivadas por meio da Administração Pública em sua maior parte. Assim se entendendo, a soberania do Estado é essencial à sua existência e sobrevivência.

A Constituição da República Federativa do Brasil, em seu art. 1º, estabelece que esta tenha como um dos fundamentos a soberania (BRASIL, 1988), a qual é especialmente identificada como a capacidade do Estado de editar “sua própria ordem jurídica (a começar pela Lei Magna), de tal modo que qualquer regra heterônoma só possa valer nos casos e nos termos admitidos pela própria Constituição” (MORAES, 2008, p. 21). Considerando a im-portância da Lei Maior, vale frisar a questão de a Carta brasileira de outubro de 1988 por em relevo os princípios gerais do direito, dispondo então no §2º do art. 5º, que “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte” (BRASIL, 1988).

Percebe-se, portanto, que para se avaliar a atuação do Estado é necessário exami-nar sua Carta Constitucional, em qual estão presentes regras e princípios norteadores das ações que afetarão os indivíduos aos quais é direcionada. E verifica-se a importância dessa exegese com suporte na análise que Hannah Arendt faz acerca de governo e interesse da sociedade:

(4)

É verdade que o governo de um só homem, o governo monárquico, que os antigos diziam ser a forma organizacional da família, é transformado na sociedade (como hoje a conhecemos, quando o topo da ordem social já não é constituído pela casa real de um governante absoluto) em uma espécie de governo de ninguém. Mas esse ninguém, o suposto interesse único da sociedade como um todo em questões econômicas, assim como a suposta opinião única da sociedade educada dos salões, não deixa de governar por ter perdido sua personalidade. Como verificamos pela forma mais social de governo, isto é, pela burocracia, (o último estágio do governo no Estado-nação, tal como o governo de um só homem constituía o primeiro estágio do despotismo benevolente e do absolutismo), o go-verno de ninguém não é necessariamente um não-gogo-verno; pode, de fato, em certas circunstâncias, vir a ser uma das suas mais cruéis e tirânicas versões. (ARENDT, 2014, p. 49)

Por conseguinte, merecedores de concisa exegese de alguns dos princípios cons-tantes na Constituição brasileira. Deve-se destacar, então, que se encontram espalhados pelo texto constitucional brasileiro princípios jurídico-constitucionais que estabelecem preceitos centrais de imprescindível observância, isto é, são eles informadores da ordem jurídica nacio-nal. Vale dizer, cada princípio constitucional disposto na Carta Magna da República Federati-va do Brasil possui sua relevância, pois todos são parâmetros de comportamento e, em relação ao Estado, balizam as ações e os atos a serem praticados.

Disposto está no artigo 5º, inciso II, da Constituição do Brasil (BRASIL, 1988) que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”, revelando-se, referido inciso, como o princípio da legalidade, o qual tem por escopo orientar o Estado, analisado aqui mais especificamente como máquina político-administrativa, no sentido de fazer somente o que estiver expressamente autorizado na norma legal, bem como autorizar o particular a realizar o que não for proibido em lei. E “esse princípio coaduna-se com a própria função administrativa, de executor do direito, que atua sem finalidade própria, mas sim em respeito à finalidade imposta pela lei, e com a necessidade de preservar-se a ordem jurídica” (MORAES, 2008, p. 320).

No contexto das disposições constitucionais é relevante verificar que, como Karl Larenz ressalta (apud MEDAUAR, 2011, p. 129), há grande importância na aplicação dos princípios, pois no âmbito administrativo eles se revestem de duas funções, sendo uma de cunho positivo, por exercerem na elaboração de normas e nas decisões posteriores uma in-fluência criadora, desenvolvedora e executora do direito, e outra de traço negativo, visto que estabelecem uma rejeição de valores e normas que os contrariam. A função positiva há de motivar a Administração Pública a se pautar pelo ordenamento jurídico, sempre sob o pris-ma dos princípios, caracterizando-a principalmente como executora do direito; já a função negativa dos princípios conforma não somente a legislação, mas as ações e os atos da própria Administração.

Percebe-se então que o ordenamento jurídico apresenta no Brasil uma condicionan-te para o Estado, sendo escondicionan-te submetido a restrições em função das disposições do primeiro. Assim, a máquina pública, entendida aqui como o braço operante do Estado, dispõe de meios legais para atingir os escopos estabelecidos constitucionalmente.

Surge, então, a discussão sobre autoridade, afirmando Hannah Arendt (2014, p. 37) que “é a liberdade da sociedade (e, em alguns casos, uma pretensa liberdade) que requer e justifica a limitação da autoridade política. A liberdade situa-se no domínio do social, e a força e a violência tornam-se monopólio do governo”.

Sendo o governo o detentor de poder (força e violência), bem como havendo a neces-sidade de preceitos limitadores deste, nas atividades da Administração Pública é necessário existir,

(5)

concomitantemente à legalidade, o interesse público. E assim Carvalho (2008, p. 26) explica ao discorrer sobre a questão do interesse público:

As atividades administrativas são desenvolvidas pelo Estado para benefício da coletividade. Mes-mo quando age em vista de algum interesse estatal imediato, o fim últiMes-mo de sua atuação deve ser voltado para o interesse público. E se, como visto, estiver presente esse objetivo, a atuação estará inquinada de desvio de finalidade.

Desse modo, não é o indivíduo em si o destinatário da atividade administrativa, mas sim o grupo social num todo. Saindo da era do individualismo exacerbado, o Estado passou a caracterizar-se como o Welfare State (Estado/bem-estar), dedicado a atender ao interesse público. Logicamente, as relações sociais vão ensejar, em determinados momentos, um conflito entre o interesse público e o interesse privado, mas, ocorrendo esse conflito, há de prevalecer o interesse público.

Trata-se, de fato, do primado do interesse público. O indivíduo tem que ser visto como integrante da sociedade, não podendo os seus direitos, em regra, ser equiparados aos direitos sociais. Vemos a aplicação do princípio da supremacia do interesse público, por exemplo, na desapropriação, em que o interesse público suplanta o do proprietário; ou no poder de polícia do Estado, por força do qual se estabelecem algumas restrições às atividades individuais.

E outros autores brasileiros, não menos expressivos, trilham nesse sentido, a exem-plo de Mello (2010) e Meirelles (2010), como também lembra Sarmento (2010), ao analisar a doutrina nacional.

Mas, em outra vertente, Di Pietro (2010, p. 37) rememora que o direito adminis-trativo tem origem em período do Estado liberal, momento em qual a maior preocupação era resguardar os direitos individuais frente aos abusos do poder estatal e, por conseguinte, a ideia de supremacia “do interesse público não coloca em risco os direitos individuais, por-que tem por-que ser aplicado em consonância com os princípios todos por-que informam o direito administrativo”.

A fomentar a discussão, a observação de Medauar (2011, p. 137), quanto ao que se refere a interesse público:

A expressão interesse público pode ser associada a bem de toda a coletividade, à percepção geral das exigências da vida na sociedade [...]. Mas vem sendo matizado pela ideia de que à Administração cabe realizar a ponderação dos interesses presentes numa determinada circunstância, para que não ocorra sacrifício a priori de nenhum interesse; o objetivo dessa função está na busca de compatibili-dade ou conciliação dos interesses, com a minimização dos sacrifícios.

Não é concebível atualmente, portanto, em um Estado Democrático de Direito, dissociar da prática estatal os interesses coletivos e os individuais. Mas para Sarmento (2010, p. 35), há inadequação plena “entre o princípio da supremacia do interesse público e a ordem jurídica brasileira, como também pelos riscos que sua assunção representa para a tutela dos direitos fundamentais”. Então se questiona se haveria uma igualdade entre os grupos sociais e entre os próprios indivíduos e, assim, não basta a concepção jurídica para aclarar a questão. Sobre essa igualdade moderna discorre Arendt (2014, p. 50):

Mas a sociedade iguala em quaisquer circunstâncias, e a vitória da igualdade no mundo moderno é apenas o reconhecimento político e jurídico do fato de que a sociedade conquistou o domínio público, e que a distinção e a diferença tornaram-se assuntos privados do indivíduo.

Entretanto Arendt alerta que a igualdade moderna tem por sustentáculo o confor-mismo inerente à sociedade, sendo que o comportamento, em relação ao qual são impostas

(6)

inúmeras e variadas regras tendentes a normalizar os indivíduos, substitui a ação como prin-cipal forma de relação humana, contrastando a autora esta igualdade à da cidade-Estado na Grécia, onde “cada homem tinha constantemente de se distinguir de todos os outros, de de-monstrar, por meio de feitos ou façanhas singulares, que era o melhor de todos” (ARENDT, 2014, p. 50). A compreensão política e jurídica da questão remete, pois, a como determinar a atuação do Estado, no sentido de garantir o interesse público, sempre com a preservação dos direitos fundamentais. É o que esperam a sociedade e o indivíduo.

A CONSTITUIÇÃO E O DIREITO AO FUTURO

Já examinados os papéis do cidadão na polis e a imposição de regras comportamen-tais pela sociedade moderna, bem como verificada a questão da igualdade na comunidade, faz-se necessário aclarar que o Estado “existe para propiciar as condições estruturais para o bem-estar das gerações presentes sem sacrificar o bem-estar das gerações futuras” (FREITAS, 2012, p. 265). Para isso, o Estado, como já visto, submete-se às normas e princípios consti-tucionais, subordinação esta que deve contemplar mais do que uma simples análise jurídica. Eis então a importância da interpretação.

A tarefa interpretativa é inerente ao processo que culmina com a aplicação do or-denamento jurídico e, assim, para Freitas (apud MORAES, 2008, p. 15) apenas com a “conjugação da letra do texto com as características históricas, políticas, ideológicas do mo-mento, se encontrará o melhor sentido da norma jurídica, em confronto com a realidade sociopolítico-econômica e almejando sua plena eficácia”. Com esse pensar, questões como a unidade da constituição, a harmonização de seus preceitos e sua força normativa são de imprescindível observância.

Porém, há obstáculos que a própria interpretação, utilizada para definição do sen-tido e alcance dos enunciados normativos, não consegue superar, visto que existem fatores indicados por Barcellos (2011, p. 121), como a dependência de valores adotados ou opções políticas em confronto, que implicam em escolhas cujos critérios não são extraídos facilmente do texto constitucional.

A importância do trabalho do intérprete, portanto, se revela diante do volume e da diversidade de informações a serem trabalhadas, não se restringindo somente à letra da nor-ma. E isso se reflete na eficácia das ações do Estado, ressaltando Freitas (2012, p. 196) quanto à questão da Administração Pública:

Como se afigura inequívoco, nas relações administrativas, os direitos fundamentais ainda não se impõem com a mínima densidade eficacial. Por exemplo, o Estado-Administração, em matéria de controle estratégico, dos danos pessoais e ambientais, permanecem frágil e pouco efetivo em áreas nevrálgicas, como ilustração a poluição do diesel e a falta de planejamento diante das espécies exóti-cas invasoras, que causam prejuízos sistêmicos de monta. [...] Mais: o acesso à informação é direito fundamental, porém claudicam os procedimentos assecuratórios, algo que inibe o controle relativo à implementação dos programas, projetos e ações dos órgãos e entidades públicas.

No entender de Freitas (2012, p. 198) o Direito Administrativo brasileiro, que en-contra seus fundamentos na Constituição, deve avançar do paradigma antiquado, caracterizado pela insaciabilidade patrimonialista e pelo inercismo, para o paradigma da sustentabilidade, “que se pauta pela racionalidade dialógica, pluralista e prospectiva, com plasticidade acoplada às

(7)

exigências de fundamentação e de estabilidade, no processo decisório”. Segundo Freitas (2012), a Administração Pública deve atuar em um modelo cognitivo e decisório que dê efetividade aos objetivos do Estado Constitucional, preservando o direito fundamental à boa administração e, assim, garantida estaria a sustentabilidade nas relações administrativas, em comunhão, es-pecialmente, com o princípio do interesse público; é o caminho para o fim da burocratização paralisante, kafkiana, a qual é oposta à eficiência e à eficácia da Administração. Reforça então o autor que o Estado deve atuar como guardião da constitucionalidade, não somente por meio do Poder Judiciário, mas através de toda a máquina administrativa, sendo que “a boa decisão ad-ministrativa exige análise e síntese, sopesamento objetivo, em lugar do impulsivismo enviesado, típico do paradigma da insaciabilidade” (FREITAS, 2012, p. 213).

Vislumbra-se, portanto, a necessidade de se trabalhar mais e com mais afinco a questão da atuação não somente do administrador público, mas também dos operadores do direito que lhe dão suporte, que devem conjugar as informações das mais diversas áreas do conhecimento (política, economia, jurídica, social) para que então a identificação do que realmente vem a ser a garantia do interesse público em uma determinada situação possa gerar decisões compatíveis com os preceitos constitucionais. E isso, repita-se, é a garantia do direito ao futuro, em que se assegura o bem-estar das gerações presentes sem que haja o sacrifício do bem-estar das gerações futuras.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Administração Pública, enquanto totalidade de órgãos criados para atingir os fins do Estado e cujas funções submetem-se aos preceitos constitucionais, deve pautar-se por parâmetros baseados em análises mais amplas, tendo como fontes informadoras as mais diver-sas áreas do conhecimento, pois é preciso considerar que o ordenamento jurídico existe para garantir o direito de forma integral não somente à coletividade, mas também ao indivíduo, sempre tendo em vista as gerações presentes e futuras. Assim, imprescindível a análise políti-ca, que aqui se fez por meio dos estudos de Hannah Arendt.

De outra parte, quando o aplicador do direito, administrador ou operador, for atuar, sua ação deve primar ainda pela completa observância da constitucionalidade da me-dida, e não somente legalidade, afastando a simplista alegação de primazia deste ou daquele princípio. E não se deve afastar o sopesamento, para que o direito definitivo tenha natureza de interesse público conjugado com as garantias fundamentais.

Sob o prisma dos princípios presentes na Constituição brasileira e considerando os instrumentais colocados à disposição do exegeta, pode-se avaliar a atuação da Administração Pública como merecedora de um aprofundamento na discussão aqui posta. O embate das normas constitucionais por certo encontram soluções com a interpretação e, ainda mais, com a utilização da ponderação.

Deve-se fomentar, portanto, a adoção de novos paradigmas para que a motivação do administrador público não seja restrita a conhecimentos que há décadas dão sustentáculo a decisões que podem, por vezes, atingir uma natureza arbitrária, caracterizando o Estado, nessas situações, como um infrator das normas constitucionais e não garantidor do direito ao futuro das gerações, presentes e futuras.

Outrossim, o direito ao futuro pode ser traduzido como o direito à boa adminis-tração, quando então o Estado atua conforme um modelo cognitivo e decisório que assegure

(8)

a eficiência e a eficácia de suas ações, juntamente ao reconhecimento das responsabilidades públicas em relação a todas as gerações, demonstrando haver uma evolução jurídica e política do indivíduo junto à sociedade.

STATE, CITIZENSHIP AND THE RIGHT TO THE FUTURE

Abstract: the Constitution of the Federative Republic of Brazil has principles that guides the prac-tice of public administration, so it must guarantee, to achieve its purpose, the fundamental rights in its actions. Such state administrative acts have great relevance in the face of the right to the fu-ture, and this present article brings an analysis of the theme through the brazilian administrativist doctrine, according to Hannah Arendt’s research.

Keywords: State. Politics. Citizenship. Right to the future Referências

ARENDT, Hannah. A condição humana. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2014. ______. A dignidade da política: ensaios e conferências. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1993. ______. Entre o passado e o futuro. 7. ed. 1.reimp. São Paulo: Perspectiva, 2013.

BARCELLOS, Ana Paula de. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: o princípio da dignidade da pessoa humana. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2011.

BRASIL. Constituição. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao. htm> . Acesso em: 20 jan. 2014.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 19. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2010. FREITAS, Juarez. Discricionariedade administrativa e o direito fundamental à boa administração pública. 2.ed. São Paulo: Malheiros, 2009.

______. Sustentabilidade: direito ao futuro. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012.

MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 15. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 36. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2010.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 27. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2010.

MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2008.

SARMENTO, Daniel. Livres e iguais: Estudos de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.

SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. 5. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009.

Referências

Documentos relacionados

No entanto, maiores lucros com publicidade e um crescimento no uso da plataforma em smartphones e tablets não serão suficientes para o mercado se a maior rede social do mundo

A cirurgia, como etapa mais drástica do tratamento, é indicada quando medidas não invasivas como dietas restritivas e a prática regular de exercícios físicos

Desta forma, conforme Winnicott (2000), o bebê é sensível a estas projeções inicias através da linguagem não verbal expressa nas condutas de suas mães: a forma de a

No primeiro livro, o público infantojuvenil é rapidamente cativado pela história de um jovem brux- inho que teve seus pais terrivelmente executados pelo personagem antagonista,

Estudos sobre privação de sono sugerem que neurônios da área pré-óptica lateral e do núcleo pré-óptico lateral se- jam também responsáveis pelos mecanismos que regulam o

Finally,  we  can  conclude  several  findings  from  our  research.  First,  productivity  is  the  most  important  determinant  for  internationalization  that 

Essa revista é organizada pela Sociedade Brasileira de Planejamento Energético (SBPE) e por isso foram selecionados trabalhos que tinham como objetivo tratar a

de lôbo-guará (Chrysocyon brachyurus), a partir do cérebro e da glândula submaxilar em face das ino- culações em camundongos, cobaios e coelho e, também, pela presença