A intervenção privada como motor de espaço público. Da escala do edifício à escala da cidade
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(5) AGRADECIMENTOS Aos meus orientadores, Prof. Luís Afonso e Prof. Amílcar Pires. Aos meus pais e aos meus avós. À Sara. Aos meus colegas e amigos, Pedro Lima, Susana Neves, João Botelho, Pedro Rechena, Guilherme Clara, João Correia e João Lopes. .
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(7) Resumo O presente documento serve de base teórica ao projecto de tese final mestrado. O projecto assenta na concepção de um equipamento público de carácter cultural e artístico, numa zona com um forte pendor habitacional, em articulação com a praça urbana que este define. O tema do projecto prende‐se então com a estreita relação que se estabelece entre o edifício e o espaço público, revelada numa interligação programática e funcional, que dá ao conjunto uma unidade espacial, permitindo‐lhe anular as fronteiras entre os dois. A tese debruça‐se sobre ao espaço da cidade, o estilo de vida urbano e consequentemente sobre a forma como as pessoas usam o espaço público urbano. A importância do espaço público como forma de preservação dos valores de cidadania e como palco para manifestações espontâneas e interacção social. O exercício de projecto vem ao encontro destes valores, promovendo uma relação intrínseca entre o espaço público e privado que projecta. Esta fusão tipológica promove um intercâmbio entre os dois, dinamizando‐os mutuamente. A cidade contemporânea apresenta um novo paradigma nas dinâmicas urbanas e do espaço público, fruto de uma mobilidade urbana cada vez mais ampla, o tempo dispendido na deslocação entre dois pontos é cada vez menor, consequentemente permite à população aumentar a distância a percorrer em trajectos diários, visto terem ao seu alcance meios de transporte rápidos. Este facto leva à fragmentação do tecido das cidades, à medida que as ruas ganham capacidade de abarcar velocidades de deslocação cada vez mais rápidas vão, simultaneamente, perdendo qualidades enquanto espaços de convivência e partilha, dando origem a comunidades fechadas sejam elas habitacionais, empresariais ou comerciais. A expansão destas comunidades fechadas, espaços que se encerram sobre si mesmos com ambientes controlados, não é apenas uma consequência da perda de vitalidade e abandono do espaço público mas também a sua origem. Quanto mais as pessoas se isolam mais segregado fica o espaço público. É necessário por isso um trabalho de preservação e incentivo ao uso do espaço urbano por parte do privado, é premente que o privado expanda os seus limites até à esfera do espaço publico para que este não seja negligenciado e com ele negligenciado também o estilo de vida urbana e os princípios de cidadania. Palavras‐chave: Espaço Público, Edifício Híbrido, Espaço Transição. .
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(9) Abstract The following document serves as a theoretical basis to the final master's thesis project. The project builds on the concept of a public facility with a cultural and artistic character, in an area with a strong housing nature, in conjunction with the urban square that defines it. The theme of the project has to do with the close relationship established between the building and public space, revealed in a programmatic and functional interconnection, giving the whole a spatial unit, allowing it to cancel the boundaries between the two. The thesis focuses on the city space, urban lifestyle and consequently on the way people use public urban space. The importance of public space as a means of preserving the values of citizenship and as a stage for spontaneous demonstrations and social interaction. The project exercise is in line with these values, promoting an intrinsic relationship between the public and private space that it projects. This typological merger promotes an exchange between the two, revitalizing each other. The contemporary city presents a new paradigm in urban dynamics and public space, the result of an increasingly larger urban mobility, the time spent travelling between two points is getting smaller and smaller, thus allowing the population to increase the distance to travel on daily journeys since they have at hand the means of rapid transit. This leads to fragmentation of the fabric of cities, as the streets gain the ability to cover increasingly higher travel speeds, they will, simultaneous, lose qualities as living and sharing spaces, giving rise to gated communities whether residential, business or commercial. The expansion of these closed communities, places that close themselves in controlled environments, are not just a consequence of the loss of vitality and abandonment of public space but it is also its origin. The more people isolate themselves the more segregated public space gets. Therefore it is necessary to work on the preservation and encouragement of the use of urban space by the private, it is urgent that the private sector expanda its limits to the public space sphere so that it is not neglected and with it also neglected the urban lifestyle and the principles of citizenship. Keywords: Public Space, Hybrid Building, Transitional Space. .
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(11) ÍNDICE 1.. Introdução . . . . . . . . . 1 . 2.. Estado da Arte . . . . . . . . 2 . 2.1 CASOS DE ESTUDO . . . . . . . 2 . . . 2.1.1 Elbe Philharmonic . . . . . . 3 . . . 2.1.2 TEK Building . . . . . . 4 . . . 2.1.3 Museum of Tolerance Jerusalem . . . . 5 . . . 2.1.4 Abdullah II House of Culture & Art . . . . 6 . 3.. A CIDADE – Vida em sociedade . . . . . . 7 . 3.1 A CIDADE ‐ Vida Urbana . . . . . . . 7 . 3.2 A CIDADE – Espaço Público . . . . . . 9 . 3.2.1 História da Praça e do Espaço Público . . . . 9 . 3.2.2 O papel do Espaço Público na Cidade . . . . 12 . 3.2.3 A Praça Urbana 4.. 5.. . . . . . . 15 . Novo Paradigma do Espaço Urbano . . . . . . 17 . 4.1 A MOBILIDADE URBANA . . . . . . . 17 . 4.2 COMUNIDADES FECHADAS . . . . . . 20 . 4.3 NOVOS CONCEITOS DE ESPAÇO PÚBLICO . . . . 23 . Projecto . . . . . 25 . . . . . 25 . . . . . 27 . . . . . . 5.1 ENQUADRAMENTO E CONDICIONANTES 5.2 PROGRAMA FUNCIONAL . . . . .
(12) 5.2.1 Tipologias Privadas . . . . . . . 27 . 5.2.2 Tipologia Urbana . . . . . . . 28 . 5.3 RELAÇÃO PRIVADO PUBLICO . . . . . . 31 . 5.4 MORFOLOGIA CONCEPTUAL . . . . . . 34 . 5.5 FRUIÇÃO ESPACIAL . . . . . . . 35 . 6.. Conclusão . . . . . . . . . 39 . 7.. Bibliografia . . . . . . . . . 41 . 8.. Anexos . . . . . . . . . 42 . . . .
(13) ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1 ‐ Elbe Philharmonic Hall 1 http://www.dezeen.com/2010/05/28/elbphilharmonie‐by‐herzog‐de‐meuron/ Figura 2‐ Elbe Philharmonic Hall, Corte http://www.dezeen.com/2010/05/28/elbphilharmonie‐by‐herzog‐de‐meuron/ Figura 3‐ Elbe Philharmonic Hall 2 http://www.dezeen.com/2010/05/28/elbphilharmonie‐by‐herzog‐de‐meuron/ Figura 4‐ Elbe Philharmonic Hall 3 http://www.dezeen.com/2010/05/28/elbphilharmonie‐by‐herzog‐de‐meuron/ Figura 5 ‐ TEK Building 1 http://www.designboom.com/weblog/cat/9/view/13030/big‐architects‐tek‐building.html Figura 6 ‐ TEK Building, Corte http://www.designboom.com/weblog/cat/9/view/13030/big‐architects‐tek‐building.html Figura 7 ‐ TEK Building 2 http://www.designboom.com/weblog/cat/9/view/13030/big‐architects‐tek‐building.html Figura 8 ‐ TEK Building 3 http://www.designboom.com/weblog/cat/9/view/13030/big‐architects‐tek‐building.html Figura 9 ‐ Museum of Tolerance 4 http://www.dezeen.com/2010/10/05/museum‐of‐tolerance‐jerusalem‐by‐chyutin‐architects/ Figura 10 ‐ Museum of Tolerance, Corte http://www.dezeen.com/2010/10/05/museum‐of‐tolerance‐jerusalem‐by‐chyutin‐architects/ Figura 11 ‐ Museum of Tolerance 5 http://www.dezeen.com/2010/10/05/museum‐of‐tolerance‐jerusalem‐by‐chyutin‐architects/ .
(14) Figura 12 ‐ Museum of Tolerance 6 http://www.dezeen.com/2010/10/05/museum‐of‐tolerance‐jerusalem‐by‐chyutin‐architects/ Figura 13 ‐ King Abdullah II House of Culture & Art 7 http://www.archdaily.com/51018/king‐abdullah‐ii‐house‐of‐culture‐art‐zaha‐hadid‐architects/ Figura 14 ‐ King Abdullah II House of Culture & Art 8 http://www.archdaily.com/51018/king‐abdullah‐ii‐house‐of‐culture‐art‐zaha‐hadid‐architects/ Figura 15 ‐ King Abdullah II House of Culture & Art 9 http://www.archdaily.com/51018/king‐abdullah‐ii‐house‐of‐culture‐art‐zaha‐hadid‐architects/ Figura 16 ‐ A Polis Grega http://4.bp.blogspot.com/_xGpjfByVFG0/SLC1mHTlFVI/AAAAAAAAADg/_wWEnZHuYiY/s1600‐ h/A+p%C3%B3lis+grega.jpg Figura 17 – A revolução industrial http://www.blogers.com.br/wp‐content/uploads/2009/05/revolucao.jpg Figura 18 – Plano de Argel de Le Corbusier http://3.bp.blogspot.com/_ImU0bSkEJkI/SkEYtt9lalI/AAAAAAAAASk/lwpTDNlnniA/s1600‐ h/argel2.jpg Figura 19 – Praça da Republica, Viana do Castelo http://static.panoramio.com/photos/original/44151163.jpg Figura 20 ‐ Odivelas http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:OdivelasPortugal.jpg Figura 21 – Rua Augusta http://www.pps.org/graphics/gpp/ruaaugust1_large Figura 22 – Galerias Vittorio Emanuele http://www.aboutmilan.com/pt/galeria‐de‐fotos/imagegallery/Milano02.jpg .
(15) Figura 23 – C.C.Colombo Figura 24 – Planta Piso Térreo Figura 25 – Render Projecto 1 Figura 26 – Render Projecto 2 Figura 27 – Render Projecto 3 Figura 28 – Render Projecto 4 Figura 29 – Render Projecto 5 Figura 30 – Rua em Alfama http://3.bp.blogspot.com/_p3NatTZCsl0/Sw3I9TNiYVI/AAAAAAAAGqU/4b5BsLatm94/s1600/Li sboa+‐+Bairro+de+Alfama+(p).jpg Figura 31 – Render Projecto 6 Figura 32 – Render Projecto 7 Figura 33 – Render Projecto 8 Figura 34 – Render Projecto 9 Figura 35 – Render Projecto 10 Figura 36 – Planta Piso 1 .
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(17) 1. Introdução Será que o espaço público urbano é o único local possível para um domínio público de interacção social? Na história do ocidente tem sido atribuído ao domínio do público o carácter unificador da sociedade, espaço de mistura social onde os cidadãos se podem conhecer melhor a si próprios através da percepção dos outros. O tema do espaço público é fulcral nos nossos dias, sobretudo porque muitos factores influenciam o seu abandono. As cidades estendem‐se para além dos seus limites naturais em processos de sub‐urbanização, sendo que os centros têm sofrido abandonos constantes. As pessoas usam cada vez mais intensamente os transportes individuais, transformando as cidades em ilhas, deixando as ruas de ser percorridas a pé dando origem a um sentimento de insegurança. Por outro lado, em franca expansão estão os centros comerciais e outros espaços privados ligados ao consumo que simulam a vivência urbana de uma forma artificial. A configuração espacial e social contemporânea da própria cidade altera radicalmente o papel da esfera pública no conjunto das dinâmicas urbanas. Não só, os espaços públicos deixam de ser o elemento formalmente ordenador dos tecidos urbanos da cidade, como perdem o seu papel estruturante das actividades e das interacções sociais urbanas, e mesmo a capacidade de ser suporte de rotinas e actividades partilhadas, levando ao enfraquecimento da cultura urbana pública. É necessário, por isso, implementar estratégias para re‐estimular o uso do espaço público, criar condições para dar atractividade aos espaços de partilha e socialização, até porque disso depende o futuro das cidades e também o futuro das sociedades. O exercício projectual assenta sobre esta problemática. Se o desenho do edificado integrar o desenho do espaço público de maneira a que estes funcionem como um só, consegue anular as fronteiras entre eles, promovendo o uso do espaço público e estimulando o uso do espaço privado? Será que o futuro dos espaços públicos está condenado, ou simplesmente estaremos a entrar num novo paradigma onde os espaços públicos que utilizamos têm uma gestão privada? Se sim será que é possível explorar outras dinâmicas de espaços privados com utilização colectiva sem estarem associados aos espaços de consumo? . 1 .
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(19) 2. Estado da Arte A discussão sobre a morfologia do espaço público, fruto de um novo paradigma da utilização do espaço, é mote para muitas teorias sobre o futuro da vivência em sociedade e consequente, sobre a utilização do espaço que a define. Para Herman Hertzberger a questão do gradual abandono do espaço público é consequência de um crescente individualismo e indiferença à vida em sociedade. Hertzberger defende que a resolução do problema passa pela responsabilização dos cidadãos pela cidade: se as pessoas sentirem a cidade como sua e não como um espaço de ninguém tenderão a expandir a sua esfera de influência para o espaço público e logo torná‐lo vivo. Fernando Cabral Sacadura aborda o tema de suburbanização como problema para o abandono das cidades e consequentemente para desumanização do espaço público. Na sua perspectiva o estigma social reflectido na sociedade actual reflecte‐se na utilização destes espaços, remetendo‐os para uma situação de passagem, de utilização acidental, onde não apetece parar e usar. Pedro Brandão aponta o tema do consumo associado às cidades como um dos factores para a descaracterização da matriz que a formaliza. O autor defende que o facto de ser o poder económico a definir o rumo das cidades as tem levado a uma lógica de competição urbana de onde deriva a ideia do próprio espaço urbano como produto a ser comercializado. A escolha dos casos de estudo em que se baseia esta tese assenta sobre a procura de novas concepções de espaço público, todos relacionados com programas que cruzam tipologias privadas com tipologias públicas. Os projectos apresentados são todos propostas contemporâneas que de uma forma recíproca tentam dinamizar o espaço público e o espaço privado, pelas dinâmicas subjacentes à interligação entre ambos. Cada caso de estudo procura uma forma diferente de fundir o espaço público urbano com o interior do edifício. Todos os projectos apresentados têm como base um programa semelhante, associados a espaços multi‐funcionais com um forte pendor cultural, e subjacentemente com uma patente utilização pública. Todos têm uma forte vertente representativa para a cidade onde são edificados, procurando enquanto edifícios, criar novas centralidades para a cidade não só pela sua escala, que tenta alcançar a qualidade urbana, mas também pela necessidade de atrair o público para a dinamização do próprio espaço interior. . 2 .
(20) 2.1 CASOS DE ESTUDO 2.1.1 Elbe Philharmonic . Figura 1 ‐ Elbe Philharmonic . O Projecto para a Elbe Philharmonic Hall dos arquitectos Herzog & de Meuron em Hamburgo, Alemanha, envolve a recuperação de um antigo armazém na zona industrial ribeirinha da cidade construído em 1963. A intervenção consiste, além da recuperação do edifício existente, na construção de uma estrutura em vidro que “flutua” sobre o edifício existente criando entre ambos uma praça pública urbana a 37m do rio. . Figura 2 ‐ Elbe Philharmonic . A praça adquire a qualidade de promontório a 360º sobre a cidade, explorando a concepção e morfologia de uma praça pública construída entre duas massas edificadas. O edifício alberga para além das três salas de concerto, um hotel, apartamentos e uma série de equipamentos, conferindo à praça um forte carácter urbano, fruto das várias vivências associadas ao edifício. . . . Figura 3 e 4 ‐ Elbe Philharmonic . 3 .
(21) 2.1.2 TEK Building . Figura 5 ‐ TEK Building . O projecto para o TEK Building dos BIG Architects, em Taipei, Taiwan dá origem a um edifício cúbico de 57m x 57m x 57m que alberga no seu interior uma rua pública em espiral que dá acesso às zonas privadas do edifício ao longo do percurso, desde a cota da rua à cota da cobertura. O edifício transforma a sua circulação vertical interna, espaço geralmente com carácter condicionado, numa escadaria exterior em espiral com um carácter claramente urbano. . Figura 6 ‐ TEK Building . O programa do edifício inclui zonas de comércio e serviços, zonas de trabalho, espaços de conferências e espaços expositivos, restaurantes e galerias, culminando num anfiteatro urbano localizado na cobertura ajardinada. Adaptando o espaço de circulação interno à escala urbana o edifício quebra as barreiras entre o espaço privado e o espaço publico, usufruindo das dinâmicas dessa mesma apoderarço informal do espaço interno. . . Figura 7 e 8 ‐ TEK Building . 4 .
(22) 2.1.3 Museum of Tolerance Jerusalem . Figura 9‐ Museum of Tolerance . O projecto para o Museum of Tolerance dos Chyutin Architects em Jerusalém formaliza um edifício em ponte que se debruça sobre um jardim fazendo a porta entre este e a cidade. O programa inclui um teatro, um centro educativo, zonas de trabalho, um restaurante, sala de exposições, para além do espaço de plataformas ajardinadas que direcciona os visitantes à praça rebaixada que dá acesso ao interior do edifício sem quebrar visualmente a ligação entre a cidade e o jardim. . Figura 10‐ Museum of Tolerance . A concepção do edifício em ponte, utilizando o piso enterrado como átrio de entrada, introduz a noção de um atravessamento urbano pelo centro do edifício, usufruindo o edifício das dinâmicas provenientes desta transposição informal do transeunte que fazem o percurso entre a cidade e o jardim . . . Figura 11 e 12 ‐ Museum of Tolerance . 5 .
(23) 2.1.4 Abdullah II House of Culture & Art . Figura 13 ‐ King Abdullah II House of Culture & Art . O projecto para o King Abdullah II House of Culture & Art da arquitecta Zaha Hadid em Amman, Jordania, propõe um centro performativo para a cidade que se funde com um espaço de utilização informal com características urbanas. Este é, no entanto, o único caso de estudo em que o espaço urbano criado pelo edifício é interior. . Figura 14 e 15 ‐ King Abdullah II House of Culture & Art . O edifício formaliza um bloco paralelepipédico ao qual, pela aplicação do principio da “erosão fluída”, é escavado o espaço público, espaço esse responsável por garantir o acesso aos espaços privadas do edifício. O interior público da praça é um espaço contínuo que se desenvolve em vários pisos, atravessando todo o edifício, ligando o lado Norte e Sul do vale. Enquanto a erosão, que evoca a forma da cidade de Petra, cria o espaço público da praça e foyer, a massa reminiscente representa os espaços performativos e outras espaços mais privadas do edifício. . 6 .
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(25) 3. A CIDADE – Vida em sociedade 3.1 A CIDADE ‐ Vida Urbana A cidade conhece‐se e reconhece‐se pelos seus centros. As cidades descrevem a história, são o espaço que contem o tempo e a memória do passado. Cada parte ou zona da cidade tem um património de conjuntos de edifícios e percursos, de monumentos e símbolos, que são referências da sua identidade. A protecção destes centros contribui, por isso, para a preservação da memória mas também para estimular para a evolução da cidade, somente assim a cidade poderá ser atractiva e integradora. A cidade nasce da necessidade de um grupo de pessoas viverem perto umas das outras, com as vantagens e benefícios das dinâmicas provenientes desse facto. Essas vantagens e benefícios criaram uma atracção e dependência tal que nos dias de hoje metade da população mundial vive em centros urbanos. Das primeiras cidades, planeadas de acordo com a sua localizaão em função de questões de defesa ou aproveitamento de recursos naturais, adaptação à topografia, evoluímos para uma cidade desenhada pela crescente necessidade de albergar pessoas perto dos centros, independentemente do território para onde se desenvolvem. A forte atracção das cidades, fruto das supostas vantagens, foi tal que os planos foram ineficientes e as cidades cresceram de forma descontrolada. O resultado são cidades retalhadas e desconexas, onde os seus habitantes não se revêm nem se reconhecem. Se o desenho urbano tem como objectivo melhorar a qualidade de vida dos cidadãos, esta preocupação deveria manifestar‐se na qualidade ambiental dos espaços públicos, nos quais ocorrem a maior parte dos encontros e relações. Tal como defende Fernando Brandão Alves1, é a organização do espaço e as suas propriedades que dão sentido à forma como as áreas urbanas se tornam mecanismos poderosos para gerar, manter e controlar os padrões de movimento e a conduta dos indivíduos no espaço. A organização espacial ainda que sujeita aos efeitos provocados pela localização das actividades e pela densidade populacional, tem um efeito determinante na forma como os indivíduos se movem numa determinada área e consequentemente na forma como os mesmos se aproximam ou afastam uns dos outros. 1. ALVES, Fernando M. Brandão (2003) . 7 .
(26) A defesa da cidade por parte de quem nela vive implica uma solidariedade, uma participação e uma humanização, reflectido numa aproximação dos cidadãos e na definição de prioridades, na descentralização e na comunicação, tendo em vista o desenvolvimento que se quer sustentado. Herman Hertzberger2 defende que a concepção de cidade terá de partir de uma lógica de organização proporcionada dos vários elementos, sejam estes privados ou públicos, de forma a que a população ocupe os espaços de forma homogénea. O resultado deverá ser então um espaço público utilizado por todos, acolhendo esferas de espaços que se vão tornando cada vez mais privadas. A cidade deverá também ser poli‐funcional e não segmentada de forma a cruzar diferentes vivências nos mesmos locais, criando uma diversidade de utilizações dos espaços, integrando zonas de trabalho, zonas de habitação, zonas culturais e zonas comerciais. A concepção da cidade, apesar de ser conseguida através da construção de edifícios e infra‐ estruturas, consegue a sua caracterização formal pela ausência de edificado, são os espaços vazios, que caracterizam o espaço urbano da cidade. A escala e complexidade que define a cidade de hoje dificulta a definição do seu papel e o papel da natureza. Devido a uma força matriz de expansão e urbanização cada vez mais notória assistimos a uma crescente mudança na escala da cidade, que se distancia das suas origens tradicionais para se dissolver pelo território, transformando‐se, cada vez mais, numa massa fragmentada em vez de um lugar com uma unidade urbana unitária. . 2. HERTZBERGER, Herman (1999) . 8 .
(27) 3.2 A CIDADE – Espaço Público 3.2.1 História da Praça e do Espaço Público As primeiras civilizações desenvolveram‐se nos vales do Nilo, do Indo, do Tigre e do Eufrates, as suas cidades dividiam‐se em duas partes bastante diferenciadas. Por um lado uma zona formada pelo conjunto de pequenas casas à volta de pátios de dimensões reduzidas onde vivia a população, não existindo espaços públicos de maior escala; por outro lado a zona constituída pelo conjunto de palácios e templos que deixam transparecer uma maior monumentalidade, tanto do edificado como do espaço urbano circundante, surgindo a forma da praça. Também as construções religiosas assumiam o papel de cidade monumental; junto a estas construções sucediam‐se inúmeras praças para acolherem as cerimónias religiosas dirigidas às divindades ou aos líderes. Na Grécia enforma‐se a primeira ideia clara de acontecimento urbano. Na polis grega, a cidade está unida ao território, sendo cidadãos todos os habitantes ‐ da urbe ao campo – de modo que a cidade é quase um lugar mental a que se refere toda a sua organização. A polis grega origem primigénia da cidade ocidental baseou‐se em 3 princípios: 1‐ A continuidade do tecido urbano. 2‐ A implantação de três tipos de espaços: o privado, o sagrado e o público 3‐ O investimento do estado como regulador desses três espaços. A construção da cidade grega obedecia também a uma organização rígida, dividindo e agrupando funções em diferentes zonas. A acrópole é a cidade alta, cidade dos deuses, uma praça aberta sobre a colina, donde se percepcionam os templos. A cidade baixa, o astu, cidade propriamente dita, desenvolve‐se à volta do Agora, verdadeira praça pública, centro da vida urbana. Aí se organiza o mercado e se localiza o teatro, a Agora não tem uma forma muito precisa, já que para os Gregos a ordem urbana “racional” estruturada pelas vias não existia, o desenho da Agora está, no entanto, muito relacionada com os edifícios que o configuram, dispostos numa desordem aparente, mas harmoniosamente. É o lugar de encontro social, comercial, intelectual ou artístico. Nalgumas cidades o mercado é transferido para um espaço adjacente e a Agora converte‐se num autêntico centro cívico onde conflui a dinâmica urbana. No caso Romano, mais especificamente da cidade de Roma, as actividades mercantis e as feiras dos primeiros povoados, estão associadas aos fóruns romanos. Júlio César foi o primeiro a construir um fórum regular porticado, no seu perímetro dispõem‐se os edifícios públicos e 9 .
(28) em frente a norte, o templo dedicado a Júpiter, os outros lados são constituídos por colunatas de dois pisos, configurando uma grande praça, utilizada para grandes reuniões e por isso privada de acessos. . Figura 16 ‐ A Polis Grega . No império construíram‐se fóruns, cada vez mais majestosos, espaços regulares, fechados, ligados a grandes construções junto ao Capitólio. O desenho do fórum romano deveria ser proporcional ao número de habitantes, de modo a que não fosse demasiado pequeno para ser útil ou parecesse excessivo. Posteriormente na cidade medieval, a ordem social manifesta‐se com clareza. O crescimento é orgânico, intra‐muralhas: as casas dispõem‐se junto à muralha à volta da igreja e do castelo, criando‐se a praça do mercado, o largo da igreja ou da catedral. As formas são muito diversas mas próximas da escala do homem, as preocupações defensivas explicam a forte adaptação à topografia. A cidade islâmica segue uma tradição distinta caracterizada por um sentido intimista no qual a casa é um santuário. As portas das cidades muçulmanas são de grande complexidade, duplas e, por vezes, em recanto, junto às quais se desenvolve todo o movimento dos mercados ou se acumula a multidão para assistir a acontecimentos ou manifestações característicos nestes espaços públicos. Os teóricos do Renascimento seguiram princípios muito rígidos na construção da cidade. Alberti defendia que deveria haver várias praças distribuídas por diferentes partes da cidade, algumas para darem lugar às actividades comerciais em tempos de paz, outras para as actividades próprias da juventude e outras para armazenar provisões em tempos de guerra. Chegou mesmo a detalhar vários tipos de praças mercantis, associando‐as a zonas da cidade – . 10 .
(29) as praças deveriam ser diferentes mercados, uns para prata e ouro, outros para especiarias, outros ainda para madeira, bem como para gado, etc. Com a chegada da Revolução Industrial, as cidades tiveram de se adaptar às necessidades da era industrial, transformando a sua organização funcional, e consequentemente a sua forma. Em primeiro lugar, há que salientar o crescimento exponencial da população devido ao êxodo rural. Aumentando a população urbana aumentou o número de habitações necessárias ao seu alojamento na cidade bem como a necessidade de produção de bens e serviços agrícolas e industriais. Estes dois últimos acontecimentos conduziram à redistribuição dos habitantes dentro e em redor das cidades, o que gerou um crescimento heterogéneo entre estas e o restante território. As inovações tecnológicas da época, nomeadamente na área dos transportes, permitiram que houvesse um maior fluxo de pessoas e produto entre as cidades, criando também o aumento das mesmas. Verificaram‐se também alterações a nível do pensamento político. Os economistas incentivavam o limite da intervenção pública em vários sectores, incluindo o urbanístico, e passou a haver uma nova tendência em desvalorizar o controlo público sobre o ambiente construído. Com o rápido crescimento verificado na era industrial, observou‐se o nascimento de um nova coroa à volta das cidades. A periferia era assim ocupada por famílias abastadas, enquanto que o centro da cidade era continuamente invadido por construções e ocupações de edifícios antigos ou abandonados, curiosamente o oposto do que se verifica no presente. No entanto, dado o crescimento da cidade ser tão rápido, a periferia tornou‐se facilmente um misto de bairros de luxo e bairros pobres, indústrias e depósitos. Foi também nesta altura que se começou a verificar uma separação de zonas por estratos sociais: burgueses e proletariado. As pessoas passaram a viver mais isoladas, perdendo‐se gradualmente o sentido de pluralidade social da comunidade. A segregação das zonas mais pobres levou a piores condições de salubridade, o que se reflectiu num quase abandono no cuidado com o espaço público. Nos bairros operários a situação era dramática. O crescimento da cidade era de tal maneira rápido que não havia espaço nem tempo para planear áreas verdes com qualidade e em quantidade suficiente. No inicio do século XIX, o que se verificava eram cidades sem qualquer tipo de saneamento básico e onde não havia espaços para actividades de lazer ao ar livre, favorecendo a proliferação de epidemias. 11 .
(30) Figura 17 – A revolução industrial . As práticas mono funcionalistas, de separação e segregação de funções, associadas à arquitectura e urbanismo do Movimento Moderno, provaram ser um contratempo na arte de construir a cidade. O produto desse pensamento, os complexos maciços de edifícios de serviços ou os vastos recintos comerciais, imobilizaram largas áreas da cidade ao encerrarem ao fim do dia as suas actividades. As praças urbanas mais bem sucedidas, ainda que tenham uma função dominante pela qual são conhecidas e classificadas, são na sua maioria aquelas que asseguram uma forte dinâmica pela diversidade de usos ao longo do dia e da noite. A noção de urbanismo surge no Século XX e com ela diferentes modos de pensar e desenhar a cidade. Segundo Alexandra Castro3 foi nos anos 60 que deu o abandono do espaço público devido a uma perspectiva de implantação funcionalista do solo em que “ a forma urbana não era gerada a partir da produção de uma estrutura de espaço público, tendo como resultado prático a existência de um espaço público sem qualidade, caracterizado pela monofuncionalidade, uso fragmentado, zonamento excessivo bem como pela sua forma física demasiado rígida.” Todavia, por volta dos anos 80, esta maneira de pensar alterou‐se por via do surgimento da concorrência urbana e com ela a necessidade da criação de espaços de excelência rumo a uma qualidade de vida urbana e um pensamento sustentável da mesma. Assim, passa a ser usual aplicar‐se a noção de “nova cultura de cidade” para a nossa contemporaneidade, na qual o espaço público se tornou num elemento de competitividade entre as cidades, já que se elevou o padrão cultural de expectativas e os termos comparativos da qualidade de vida. 3.2.2 O papel do Espaço Público na Cidade O desenho do espaço público implica o assimilar dos múltiplos propósitos sociais, através de um desenho que vá ao encontro de objectivos públicos da comunidade. Assumindo que a vida 3. CASTRO, Alexandra (2002) . 12 .
(31) pública está pujante na cidade contemporânea industrializada, o uso do espaço público constitui uma das medidas mais importantes para o seu êxito. Tal como defende Fernando Brandão Alves4 a popularidade de um lugar depende em muita da relação entre a localização, desenho de pormenor, uso e significado, por outras palavras da construção do seu Genius Loci, criação de um “lugar”. Ao contrário do espaço físico residual este retoma o valor da memória colectiva, dando à cidade uma pluralidade de níveis de significado (histórico, económico, ético, social, psicológico, etc.), que qualificam a par da mudança de rumo proposta pelos padrões de vida emergente a nova arquitectura da cidade. Nas actividades que desenvolvemos, o espaço público urbano mais do que um suporte físico específico representa uma modalidade de composição entre actividades e grupo, simultaneamente indutor e induzido, exprimindo as relações entre a morfologia dos espaços e os aspectos sociais e afectivos da vida urbana. O espaço público, bem como a interacção social que nele tem lugar, são a razão pela qual a cidade, enquanto sistema, promove o contacto humano. Nessa medida, as zonas centrais da cidade assumem‐se como importantes pólos, dado que proporcionam a oportunidade das pessoas se encontrarem. Por isso, os espaços públicos devem ser acessíveis a todos, independentemente da idade, capacidades, origens ou rendimento. Deste modo, o espaço público é um mecanismo fundamental para a socialização da vida urbana. Para garantir a qualidade dos espaços de circulação e espaços de estar é necessário oferecer condições favoráveis para deambular e permanecer nesses espaços, assim como condições para a realização de diversas actividades sociais e recreativas. A qualidade dos espaços de encontro permite a interacção entre gerações, classes sociais e diferentes comunidades. A inexistência destes espaços empobrece a cidade e o estilo de vida urbano, sem o convívio dos cidadãos, dá‐se um isolamento e alienação do mundo exterior, levando à exclusão da vida colectiva e à segregação. Mas por outro lado, para que estes tipos de espaço existam na cidade é necessário muito mais que o convívio dos cidadãos. É obrigatório que sejam bem tratados pelos seus frequentadores, que exista mobiliário urbano adequado a todo o tipo de pessoas, boa iluminação pública, incentivando a permanência e usabilidade dos cidadãos nos espaços de encontro. . . 4. ALVES, Fernando M. Brandão (2003) . 13 .
(32) Os espaços públicos devem por isso ser planeados para que a comunidade se sinta pessoalmente responsável pela sua caracterização, fazendo com que cada membro contribua não só para a definição do que é a sua casa, mas também da rua onde vive ou do seu bairro. Herman Hertzberger5 afirma que: “Os espaços colectivos das sociedades deveriam ser administrados por entidades pequenas e funcionais, não maiores do que as pessoas necessárias para as sustentar”. Desta forma cada unidade será utilizada de forma mais eficaz, sendo mais eficaz a sua gestão. Quanto maior autonomia tiver mais deixa aos seus utilizadores a responsabilidade de fazerem dela o que quiserem. Descentralizar a gestão destes espaço, responsabilizando os seus utilizadores pela sua manutenção, levará a um sentimento de pertença e logo de zelo. A humanização é assim uma forma muito própria de expressar a defesa da cidade, sendo desejável que marque a “produção” e a “vivência” do espaço público. Este deve‐se entender mais como o resultado de um forte processo participativo onde se procurem acordos e convergências, do que gestos individuais isolados. O facto da gestão e definição dos espaços estar a cargo dos seus utilizadores não implica que não exista um plano orientador ou uma estrutura global para a coerência da cidade. O plano de Argel de Le Corbusier é pragmático em relação a este ponto, propondo uma mega‐estrutura linear onde os seus habitantes podem construir a sua habitação de acordo com as suas aspirações, sendo o resultado um padrão homogéneo e harmonioso, composto pelas escolhas de cada utilizador. . Figura 18 – Plano de Argel de Le Corbusier . Os espaços públicos permitem o encontro de pessoas num terreno aparentemente neutro de forma planeada ou não planeada, para interacção com outros dentro do contexto de toda a 5. HERTZBERGER, Herman (1999) . 14 .
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