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DEMOCRACIA SEMIDIRETA E EXERCÍCIO DA CIDADANIA

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Vol. 13, Nº. 17, Ano 2010

Leandro da Silva Carneiro Faculdade Anhanguera de Jacareí

leandrodasilvacarneiro@ig.com.br

DEMOCRACIA SEMIDIRETA E

EXERCÍCIO DA CIDADANIA

Dos sistemas representativos às formas de

participação no poder

RESUMO

O estudo do instituto da democracia revela que o poder atribuído pelo povo a si mesmo e a seus representantes está estritamente condicionado à sua capacidade de governar. Quanto maior for a cultura da participação popular nos atos relacionados à gestão pública, mais significativos e eficientes tornam-se os mecanismos de atividade direta do cidadão no múnus publico. Democracia e cidadania são expressões correlatas e, do exercício da cidadania, depreende-se a espécie democrática em vigor, se substancial ou simplesmente formal. Com o objetivo de sistematizar os principais sistemas eleitorais e os mecanismos de participação popular no Poder, apropriando-se, para tanto, de análises bibliográficas sobre a temática, conclui-se que a democracia brasileira mostra-se em nítido processo de consolidação, pautada na garantia dos direitos fundamentais dos cidadãos e na ampliação da gestão participativa, mas que ainda resta muito para alcançar o grande desafio da transparência democrática e da homogênea expressão da vontade geral.

Palavras-Chave: democracia; cidadania; participação popular; sistema representativo; sistemas eleitorais.

ABSTRACT

The analysis of the institute of democracy reveals that the power given from the people to themselves and to their representatives is strictly conditioned with the ability to govern. Higher the culture of popular participation in the acts related to the public management, more significant and efficient become the mechanisms of the citizen’s direct activity within the public duty. Democracy and citizenship are related expressions and, from the citizenship’s exercise, the democratic model is inferred, if substantial or simply formal. In order to organize the main election’s systems and the mechanisms of popular participation in the Government, using, for this purpose, bibliographic analysis of the subject, is concluded that the Brazilian democracy shows itself in clear consolidation’s process, guided by the guarantee of the citizens fundamental rights and by the enlargement of the participative management, however it remains a long way before reaching the big challenge of democratic transparency and the homogeneous expression of the general willing.

Keywords: democracy; citizenship; popular participation; representative system; electoral system.

Anhanguera Educacional S.A.

Correspondência/Contato Alameda Maria Tereza, 2000 Valinhos, São Paulo CEP 13.278-181

rc.ipade@unianhanguera.edu.br

Coordenação

Instituto de Pesquisas Aplicadas e Desenvolvimento Educacional - IPADE

Informe Técnico

(2)

1.

INTRODUÇÃO

O Brasil é um Estado Sócio-Democrático de Direito, em que todo o poder emana do povo.

O regime democrático característico do Estado brasileiro atribui o Poder ao povo, o qual o

exercerá de maneira indireta e ora diretamente nos termos da Constituição Federal de

1988.

O instituto da democracia, em oposição aos regimes autoritários e totalitários,

caracteriza-se, segundo Manoel Gonçalves Ferreira Filho,

[...] por permitir a livre formulação das preferências políticas, prevalecendo as liberdades básicas de associação, informação e comunicação, com o objetivo de propiciar a disputa, a intervalos regulares, entre líderes e partidos a fim de alcançar o poder por meios não violente e consequentemente exercê-lo (FERREIRA FILHO, 2008 p. 79).

A democracia brasileira, semidireta ou participativa, congrega a

representatividade e a tomada direta de decisões políticas pelo povo e, envolta ainda sob

o manto da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência,

fundamenta-se no pluralismo político e na cidadania. Isso insurge que a cidadania é viga

mestra estatal, a qual, com a Constituição de 1988, teve seu conceito estendido, não se

limitando apenas a status político stricto sensu da pessoa, ou seja, cidadão não se resume mais simplesmente àquele que vota.

Apesar dos bons passos galgados pela nação brasileira em se sustentar no regime

democrático, o status de cidadão ainda encontra óbices na falta de efetivação dos direitos

que lhe são inerentes, pautados na dignidade da pessoa humana, principalmente aqueles

relativos à formação do cidadão. O cidadão precisa conhecer seus deveres e direitos para,

a partir de então, poder exercê-los e exigi-los de maneira correta e coerente com os

acontecimentos. Para tanto, é imprescindível que o povo instrua-se e amplie, por

conseguinte, a sua cultura. E, para isso, a Educação tem papel fundamental.

A demokratia é o governo do cidadão, estando, por conseguinte, diretamente relacionada com a cidadania e o seu exercício.

Partindo das conotações antigas de democracia e cidadania, dos sentidos

medievais até as aplicações conceituais cotidianas desses institutos, o presente artigo

propõe-se a analisar a evolução do sentimento popular acerca do governo por ele

emanado e, a partir do estudo da democracia representativa ou indireta, com a

compreensão dos sistemas eleitorais e sintetizar as formas de participação popular no

(3)

O artigo propõe-se, numa conotação pedagógica, a dividir o parágrafo único do

art. 1º, da Constituição da República em três seguimentos, para análise das formas de

participação no Poder:

Constituição Federal de 1988

Art. 1º....

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente nos termos desta Constituição.

1ª parte 2ª parte 3ª parte

Todo o poder emana do povo que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente

Democracia democracia indireta/representativa democracia direta

Democracia semidireta/participativa

Figura 1 – Democracia semidireta/participativa.

Para tanto, mister o estudo inicial do “Poder”, seus fundamentos, titularidade e

sistema de freios e contrapesos, a análise das concepções de democracia e seus desafios

modernos, da semântica da expressão “cidadão”, aquele cuja democracia se destina e,

finalmente, dos mecanismos de participação no Poder, de forma indireta ou direta.

2.

O PODER

O Estado, instituição organizada política, social e juridicamente, é o ente político executor

do poder, o qual, na democracia, é de titularidade do povo.

O poder estatal confunde-se com o dever do Estado em estabelecer um governo

de pacificação social, e é o próprio Estado soberano para estabelecer a forma de exercício

desse poder de governar.

Enquanto uns mandam, muitos obedecem. Essa é a essência do poder. Vários são

os institutos que justificam esse poder, dentre os quais:

• O temor.

• A fé.

• A legalidade.

• A legitimidade.

Para Nicolau Maquiavel, o detentor do poder deveria “ser ao mesmo tempo

amado e temido, mas que, como tal combinação é difícil, é muito mais seguro ser temido,

(4)

O elemento “fé” justifica o poder dos governos teocráticos, no qual o poder

emana de Deus, que concede ao rei o direito de governar.

A legalidade e a legitimidade são institutos que não se confundem. Como

assevera Ivo Dantas,

[...] o conceito de legalidade é um conceito jurídico-formal, ou seja, considera-se o que está determinado na Lei, a legitimidade, pelo contrário, é um conceito sociológico-político, interessando-lhe os valores e ideais do grupo, ou seja, legítimo é aquele poder que, mesmo à margem da Lei, se exerce atendendo aos interesses da sociedade para a qual se destina (DANTAS, 2008, p. 47).

Quando o poder estatal está concentrado numa única pessoa ou órgão, enseja-se

o surgimento do absolutismo, e por decorrência, a inexistência da democracia e dos

direitos fundamentais (as liberdades públicas), que são verdadeiros limites à atuação do

Estado.

Contrapondo-se à concentração de poder, a doutrina da Separação dos Poderes

ganhou maior relevo com a Revolução Francesa, no século XVIII, quando a França vivia

sob um regime absolutista, em que o monarca governava com poderes absolutos, ditando

as normas que regiam a vida social. A sociedade era hierarquizada, dividida em três

níveis, conhecidos como primeiro estado – formado pelos clérigos da Igreja, segundo estado – composto pela nobreza francesa e terceiro estado – no qual figurava a classe formada por

operários, camponeses e comerciantes, a única, inclusive, que pagava impostos.

O “terceiro estado” - o povo – não suportava mais o regime de governo imposto.

O cotidiano dos cidadãos franceses da terceira classe era marcado pela miséria e pela

penúria na qualidade de vida. Em busca de melhorias e de poder participar da vida

política do Estado Francês, o movimento social iniciado na segunda metade do século

XVIII foi tão intenso, que ficou conhecido como “revolução”.

Com a derrubada do absolutismo, os cidadãos franceses conquistaram o direito

de participar do Governo, sob o lema da “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”.

A Revolução Francesa que culminou com a Declaração dos Direitos do Homem e

do Cidadão, de 1789, introduziu significativos avanços sociais, garantindo direitos iguais

aos cidadãos, além de maior participação política para o povo.

A partir da Revolução, muitos institutos começaram a ganhar maior relevo,

dentre os quais, o fenômeno denominado Constitucionalismo e o anti-absolutismo

conhecido por doutrina da Separação dos Poderes, introduzindo-se nas bases do novo

Estado, os mecanismos de freios e contrapesos.

Inicialmente formulado por Aristóteles, o princípio da Separação dos Poderes foi,

(5)

vez na Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, quando em seu art. 16 estabelece

que “toda a sociedade em que a garantia dos direitos não se ache assegurada, nem a

separação dos poderes determinada, não possui Constituição”.

Aponta Walber de Moura Agra que:

Em Atenas havia diversos órgãos, como a Assembléia Popular, um Senado, um Areópago. Era uma divisão incipiente, em que os poderes não estavam devidamente definidos. Para Locke haveria três Poderes: o Legislativo, o Executivo e o Confederativo; os dois primeiros executariam funções internas e o terceiro cuidaria de assuntos externos, atuando de forma livre, sem se subordinar a leis internas, para se adequar a situações internacionais (para ele o Poder Judiciário não estava adstrito a um órgão específico) (AGRA, 2009, p.122).

No Brasil, a Constituição do Império de 1824, adepta ao princípio separatista,

estatuía que “A divisão, e harmonia dos Poderes Políticos é o princípio conservador dos

Direitos dos Cidadãos, e o mais seguro meio de fazer efetivas as garantias, que a

Constituição oferece” (art. 9) e reconhecia quatro Poderes Políticos: o Poder Legislativo, o

Poder Moderador, o Poder Executivo, e o Poder Judicial (art. 10).

Hodiernamente, a Separação dos Poderes está contemplada como princípio

basilar do Estado brasileiro, prescrita no art. 2º, da Constituição Federal, onde “São

Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o

Judiciário”.

Poder Legislativo

Poder Judiciário

Poder Executivo

Funções Típicas: - Legislativa

- Fiscalizatória: Fiscalizar e controlar os atos do Executivo

Funções Atípicas:

- Administrativa (art. 49, XIII, CF) - Julgatória (art. 55, § 2º, CF)

Função Típica:

- Administração do Estado

Funções Atípicas:

- Legislativa (art. 62, CF) - Julgatória (art. 41, II, CF)

Função Típica:

- Prestação da tutela jurisdicional

Funções Atípicas:

- Administrativa (art. 96, I, “b”, CF) - Legislativa (art. 96, I, “a”, CF)

Poder Legislativo

Poder Judiciário

Poder Executivo

Funções Típicas:

- Legislativa

- Fiscalizatória: Fiscalizar e controlar os atos do Executivo

Funções Atípicas:

- Administrativa (art. 49, XIII, CF) - Julgatória (art. 55, § 2º, CF)

Poder Legislativo

Poder Judiciário

Poder Executivo

Funções Típicas:

- Legislativa

- Fiscalizatória: Fiscalizar e controlar os atos do Executivo

Funções Atípicas:

- Administrativa (art. 49, XIII, CF) - Julgatória (art. 55, § 2º, CF)

Função Típica:

- Administração do Estado

Funções Atípicas:

- Legislativa (art. 62, CF) - Julgatória (art. 41, II, CF)

Função Típica:

- Prestação da tutela jurisdicional

Funções Atípicas:

- Administrativa (art. 96, I, “b”, CF) - Legislativa (art. 96, I, “a”, CF)

(6)

O Título IV da Constituição Federal de 1988 trata da Organização dos Poderes e

estabelece a forma de ingresso nos cargos políticos. Os representantes do povo nos

Poderes Legislativo e Executivo são diretamente eleitos, enquanto que os membros

exercentes da função judiciária não são escolhidos pelo voto universal.

3.

DEMOCRACIA

Todo o Poder emana do povo. Esse é o princípio básico do sistema democrático.

Na definição de Antonio Carlos Silva Ribeiro, democracia é o

[...] regime político, ou forma de governo, em que a soberania reside no povo que, por sua maioria, mas sempre indiretamente, representado por uma elite reduzida de seus delegados, exerce o poder, sob o princípio da absoluta igualdade de direitos entre os cidadãos, do governo do povo, pelo povo e para o povo (RIBEIRO, 2008, p. 216).

Na antiguidade, a democracia, do grego demokratia – governo do povo -, era exercida diretamente, reservado o direito de participação política a apenas um grupo dos

habitantes atenienses.

A Democracia moderna, por sua vez, surge a partir das idéias filosóficas do

Iluminismo e tem seu fundamento na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão,

de 1789, onde:

Art. 3.º O princípio de toda a soberania reside essencialmente na nação. Nenhuma corporação, nenhum indivíduo pode exercer autoridade que dela não emane expressamente.

Art. 6.º A lei é a expressão da vontade geral. Todos os cidadãos têm o direito de concorrer pessoalmente, ou por meio de representantes, à sua formação. Ela deve ser a mesma para todos, quer proteja, quer puna. Todos os cidadãos, sendo iguais a seus olhos, são igualmente admissíveis a todas as dignidades, cargos e empregos públicos, segundo a sua capacidade e sem outra distinção a não ser a de suas virtudes e seus talentos. (COMPARATO, 2008, p. 158-159).

A democracia, todavia, pode ser caracterizada sob várias formas, tais como: a

direta, a indireta (representativa; pebliscitária ou cesarista) e a semidireta ou participativa.

Independentemente das formas, o regime democrático em vigor em determinado

Estado pode ser considerado, quanto à real efetividade do sistema, como substantiva ou

material ou como formal. A primeira corresponde à democracia de fato, enquanto que a

segunda limita-se à aparência, quando o Estado não se efetiva na plenitude do império da

lei. Na democracia substantiva e ideal, as liberdades públicas, a participação popular e os

direitos das minorias não são apenas aparentes, mas efetivos.

Para Reis Friede, são características básicas da democracia (FRIEDE, 2010, p. 243):

• Efetiva participação dos nacionais na atividade estatal;

• Legitimidade do exercício do Poder no governo e nas decisões políticas;

(7)

• Amplas liberdades, asseguradas, em última análise, pelo Estado;

• Império da lei e da ordem constitucional vigente.

Historicamente, o Brasil passou por algumas “ondas democráticas” (períodos de

transição de um regime não-democrático para um democrático), oscilando entre regimes

populares e regimes autoritários.

De acordo com Huntington (1993 e1994), teriam ocorridos três “ondas” democráticas e duas autoritárias ao longo dos dois últimos séculos, mas com durações diferentes. A primeira onda democrática foi a mais longa, durou 99 anos e abrangeu o período compreendido entre 1828 e 1926. A segunda e mais curta durou apenas 20 anos, tendo iniciado em 1943 e terminado em 1962. A terceira e última começou em 1974 e ainda não se extinguiu. A primeira onda autoritária começou em 1922 e terminou em 1942, ou seja, abrangeu um período de 21 anos. A segunda durou 18 anos, tendo iniciado em 1958 e terminado em 1975 (HUNTINGTON apud JORGE, 2009, p. 221).

Muito se comemora pela maturidade atual do regime democrático em voga no

Brasil, instituído, segundo o preâmbulo da Constituição de 1988, com o fim de assegurar o

exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o

desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade

fraterna, pluralista e sem preconceito, fundada na harmonia social e comprometida, na

ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias. Entretanto,

muitos são os desafios que o regime de governo brasileiro ainda deve superar para se

transformar numa democracia que represente de forma legítima a vontade geral,

evoluindo-se, destarte, para a almeja democracia substancial.

3.1. Desafios da democracia

“A democracia é a pior forma de governo, exceto todas as outras que têm sido tentadas de

tempos em tempos” (Winston Churchill).

Vários são os desafios da democracia. Grandes pensadores políticos, em épocas

díspares, apresentaram e continuam buscando situações ideais para que se implemente,

com efetividade, o regime de governo do povo.

Para Jean-Jacques Rousseau, o governo democrático somente seria perfeito

(democracia substantiva) em um pequeno Estado, com condições sociais igualitárias e

costumes idênticos (ROUSSEAU, 2008, p. 67).

Desde as históricas considerações de Aristóteles, o que deve pautar a forma de se

governar é a ética do governante. Seja qual for a forma, sistema ou regime de governo, se

houver corrupção, deixa de ser um bom governo, transmudando-se para um governo

desvirtuado. “Também uma democracia pode-se corromper e então fazer despontar uma

(8)

Quadro 1 – Formas de governo bom e de governo desvirtuado.

Governo BOM Governo DESVIRTUADO

Monarquia Tirania

Aristocracia Oligarquia

Democracia Demagogia

Robert Dahl elencou oito garantias ou condições necessárias para haver

democracia: (1) liberdade de formular e aderir a organizações; (2) liberdade de expressão;

(3) direito de voto; (4) elegibilidade para cargos públicos; (5) direito de líderes políticos

disputarem apoio/voto; (6) fontes alternativas de informação; (7) eleições livres e idôneas

e (8) instituições para fazer com que as políticas governamentais dependam das eleições e

de outras manifestações de preferência (DAHL apud JORGE, 2009, p. 213).

Norberto Bobbio, entretanto, apresenta um desafio complexo para a real

existência da democracia. “Enquanto um Estado Democrático viver em uma comunidade

à qual pertencem Estados não-democráticos, e ela própria não é democrática, o regime

dos Estados democráticos também será apenas uma democracia incompleta” (BOBBIO,

2000, p. 384).

Outro desafio significativo para o regime democrático é, indubitavelmente, a

total transparência na gestão pública. No Brasil v.g. somente em 2000 foi promulgada a Lei de Responsabilidade Fiscal, que exige maior respeito do gestor com relação ao

dinheiro público. Quase dez anos depois, novo passo foi dado para romper o desfio da

transparência da gestão pública. O Congresso Nacional editou a Lei Complementar nº.

131, chamada de “Lei da Transparência”, que assegura, dentre outros, a transparência da

gestão fiscal mediante liberação ao pleno conhecimento e acompanhamento da sociedade,

em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e

financeira, em meios eletrônicos de acesso público. À tal regra submetem-se todos os

Entes da Federação.

As desigualdades sociais, que têm sua gênese nos baixos índices de renda per capta, na miserabilidade, no déficit da educação e nos altos níveis de desemprego, em direta ofensa à dignidade da pessoa humana, também são obstáculos agudos ao império

da democracia.

Assim, é dever impostergável da “classe” política nos países subdesenvolvidos lutar incessantemente pela melhora das condições sociais do povo, investindo em educação, saúde, saneamento, transporte coletivo, etc. Não há democracia com fome, com ausência de preparo educacional, com os atores do jogo democrático alijados do processo. Ter-se-á sim a democracia formal, nunca a substancial. (FIGUEIREDO, 2009, p. 73).

Mais um desafio a ser proposto ao sistema democrático corresponde à

(9)

pebliscitária, em que as ações dos representantes políticos devem ser submetidas à

aprovação do povo antes de serem concretizadas.

Quanto à possibilidade, os recursos eletrônicos existentes na atualidade, no seio

da sociedade da informação, seriam capazes de condicionar tal sistema. No que diz

respeito à viabilidade, já em meados do século XX, apesar de impossível na sociedade de

massa da época, sem os hodiernos recursos da informatização, Carl Schmitt defendia a

importância da identidade entre governados e governantes, para que a real ideologia da

vontade geral rousseauniana se tornasse efetiva. Para o jurista alemão, a democracia

pebliscitária aparece, então, como a forma adequada de manifestação e expressão vitais da

vontade geral (SCHMITT apud ARAÚJO; SANTOS, 2009, p. 393).

Vários são os desafios da democracia, como se denota. Todavia, para a

concretização daquilo que melhor se coaduna com os anseios populares, a educação é

requisito primordial. Quanto maior a cultura da nação, naturalmente maior será a efetiva

participação popular no poder.

4.

CIDADANIA

A palavra cidadania tem origem na Antiguidade. Entendia-se, àquela época, que

cidadania era uma qualidade intrínseca apenas do cidadão das Polis (cidades gregas) e das

Civitas (cidades romanas). Nos dizeres de Sahid Maluf, os privilégios de cidadania se resumiam em apenas alguns princípios de liberdade política. “Os cidadãos eram uma

pequena minoria, enquanto a grande maioria era formada pelos escravos, plebeus ou

párias, desassistidos de qualquer direito” (MALUF, 1995, p. 210).

Esse significado, porém, vem sofrendo alterações com o passar dos tempos.

Atualmente, de maneira sucinta, o dicionário traz o significado de cidadania, como

“qualidade de cidadão” e define cidadão como “habitante da cidade; aquele que está no

gozo dos direitos civis e políticos de um Estado” (FERNANDES; GUIMARÃES; LUFT,

1997).

Com atual variedade semântica, cidadania não se resume apenas à conotação

política. A própria Constituição Federal de 1988 diferencia as terminologias, quando em

seu art. 62, § 1º, I, “a”, descreve cidadania ao lado de direitos políticos, o que se repete nos

art. 68, § 1º, II. Pode-se concluir, portanto, que além de cidadania política, existem as

semânticas de cidadania urbana, rural, cultural, ambiental, social, econômica, etc..

O marco histórico que revolucionou o conceito de cidadão foi a “Declaração dos

(10)

Declaração estão contidos alguns direitos inerentes à condição de ser humano e cidadão.

Cidadão deixou de ser compreendido apenas como aquele que vive na cidade e tomou

amplitude vigorosa, passando a ser um sujeito de deveres e direitos, que lhes serviam

como garantias frente à atuação do Estado (Poder Público).

Os representantes do Povo Francês, constituídos em Assembléia Nacional, considerando que a ignorância, o descuido ou o desprezo dos direitos humanos são as únicas causas das desgraças públicas e da corrupção dos governos, resolveram expor, numa Declaração solene, os direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem, a fim de que essa Declaração, constantemente presente a todos os membros do corpo social, possa lembrar-lhes se cessar seus direitos e seus deveres; a fim de que os atos do poder legislativo e os do poder executivo, podendo ser a todo instante comparados com a finalidade de toda instituição política, sejam por isso mais respeitados; a fim de que as reclamações dos cidadãos, fundadas Doravante em princípios simples e incontestáveis, redundem sempre na manutenção da Constituição e na felicidade de todos. (Preâmbulo da Declaração) (COMPARATO, 2008, p. 158).

A Revolução Francesa que culminou com a Declaração dos Direitos do Homem e

do Cidadão, introduziu significativos avanços sociais, garantindo direitos iguais aos

cidadãos, além de maior participação política para o povo.

Com a evolução dos Direitos Humanos, cidadania, de modo geral, passou a ser

entendida como um conjunto de regras – deveres e direitos – a que todos estão

submetidos. As Cartas e Declarações Internacionais e Regionais começaram a proteger o

ser humano frente à atuação do Poder Público que, à época, não tinha qualquer limite e

ditava as regras de procedimento de acordo com a vontade absoluta do Governante.

Após conquistar alguns direitos inerentes ao ser humano, os cidadãos buscaram

garantias desses direitos declarados, e cidadania tornou-se uma expressão ainda mais

abrangente, pois além de significar um conjunto ou complexo de deveres e direitos dos

cidadãos, inseriu em seu contexto mecanismos de proteção aos direitos – as garantias.

Na atual conjuntura de um Estado Democrático de Direito, cidadania não se

restringe a direitos e garantias jurídicas assegurados aos cidadãos. Possui um significado

mais ativo. Cidadão é aquele que participa efetivamente da política do local onde está

inserido e que, além de votar, participa diretamente do poder e fiscaliza a atuação do

administrador público. Para José Luiz Quadros de Magalhães,

[...] cidadania é a condição de acesso aos direitos sociais (educação, saúde, segurança, previdência) e econômicos (salário justo, emprego) que permite que o cidadão possa desenvolver todas as suas potencialidades, incluindo a de participar de forma ativa, organizada e consciente, da construção da vida coletiva no Estado democrático (MAGALHÃES, 2009, p. 19).

Destarte, a evolução da conotação de cidadania se expressa, sucintamente da

seguinte forma:

(11)

Após a Declaração Francesa de 1789: Um conjunto de deveres e direitos de todas as pessoas, nas bases da gênese do Princípio da Igualdade.

Atualmente: Um conjunto de deveres, direitos e garantias que permitem que o cidadão participe efetivamente da vida pública, como um todo.

No Brasil, a Lei nº. 9.265/96, estabelece que são considerados atos necessários ao

exercício da cidadania: I - os que capacitam o cidadão ao exercício da soberania popular, a

que se reporta o art. 14 da Constituição; II - aqueles referentes ao alistamento militar; III -

os pedidos de informações ao poder público, em todos os seus âmbitos, objetivando a

instrução de defesa ou a denúncia de irregularidades administrativas na órbita pública; IV

- as ações de impugnação de mandato eletivo por abuso do poder econômico, corrupção

ou fraude; V - quaisquer requerimentos ou petições que visem as garantias individuais e a

defesa do interesse público.

A história conduz a semântica de cidadania para um aspecto mais amplo e

igualitário, diretamente interligado com a relação de poder. Destarte, à guisa de

conclusão, pode-se afirmar que quanto mais efetivo for o regime democrático, maiores

expressão e significado terá o termo cidadão.

5.

PARTICIPAÇÃO NO PODER

O que diferencia os tipos de democracia são exatamente as formas e mecanismos de

participação popular no poder.

A Constituição Federal assim preceitua no parágrafo único de seu art. 1º: “Todo o

poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente,

nos termos desta Constituição” (grifos nossos).

Dessa forma, o Estado brasileiro adotou o regime democrático semidireto ou

participativo, tendo por base a democracia representativa e, em harmonia, instrumentos

de participação direta.

5.1. Democracia Representativa e Sistemas Eleitorais

A participação indireta resume-se no direito do cidadão em escolher os seus

representantes. O instrumento utilizado para se eleger os representantes do povo é o voto,

que é universal, deve ser exercido diretamente e tem como características a personalidade,

obrigatoriedade, liberdade, sigilosidade, periodicidade e igualdade.

O resultado da representatividade é a eleição, que, de maneira geral ocorre

(12)

Poderes Legislativo e Executivo. Há, porém, permissivo constitucional da

representatividade mitigada, quando os representantes do povo podem ser escolhidos

indiretamente, isto é, não pelos próprios cidadãos, mas por aqueles que já foram eleitos

por estes. Como exemplo pode ser citada a chamada eleição indireta, que consiste na

hipótese de vacância dos cargos de chefe do Executivo e vice nos últimos dois anos do

mandato, quando o novo chefe será eleito pelo parlamento e não diretamente pelo povo.

O Quadro 2 representa a regra que está prevista no art. 81, § 1º, da CF:

Quadro 2 – Eleição indireta.

Vacância no cargo de Presidente e Vice-Presidente

1º e 2º anos 3º e 4º anos

Nova eleição direta Eleição Indireta

Em 90 dias Em 30 dias

O eleito completará o tempo de mandato O eleito completará o tempo de mandato

Para serem eleitos, no que tange à eleição direta, que é a regra da

representatividade pátria, os representantes do povo submetem-se aos sistemas eleitorais

em vigor no Brasil, quais sejam, o majoritário e o proporcional.

Pelo sistema majoritário, elegem-se aqueles que obtiverem o maior número de votos válidos. Tal sistema subdivide-se em absoluto e relativo.

No sistema majoritário absoluto, será eleito o candidato que obtiver mais da

metade dos votos válidos (50% + 1). Tal sistema é aplicado para eleições dos chefes do

Poder Executivo – Presidente da República, Governadores dos Estados e do Distrito

Federal e Prefeitos -, com exceção da eleição para Prefeito em Municípios com menos de

200 mil eleitores. Assim, v.g., concorrendo três candidatos, num total de dez milhões de

votos válidos, será eleito aquele que obtiver, ao menos, cinco milhões e um votos.

Já no relativo, considera-se eleito aquele que computar a maioria simples dos votos válidos, ou seja, dentre todos os candidatos concorrentes à vaga, aquele que obtiver

o maior número de votos válidos, independentemente de ser mais da metade, será eleito.

Regra para as eleições do chefe do Executivo municipal em Municípios com menos de 200

mil eleitores e de Senadores. Aproveitando o exemplo supradescrito, se o candidato “A”

for contemplado com quatro milhões de votos, o candidato “B”, com três milhões e meio e

o candidato “C”, por derradeiro, obtiver dois milhões e meio de votos, eleger-se-á o

primeiro, mesmo sem ter alcançado a maioria absoluta dos votos válidos (50% + 1), que

(13)

O sistema proporcional, típico das eleições para cargos do Poder Legislativo, exceto para o cargo de Senador, apesar de o eleitor votar no candidato de sua preferência (mas

também tem a opção de votar somente no partido), leva-se em consideração o voto na

legenda – partido político., para a apuração das vagas de cada partido na Casa

Legislativa. A partir de então, será obtido o chamado quociente eleitoral. Após a apuração

do quociente eleitoral, chega-se ao quociente partidário, ou seja, o total de cadeiras que

cada partido terá para ocupar e, somente depois da definição deste último é que serão

considerados os votos individuais dos candidatos, para se saber a ordem de classificação.

Exemplo de apuração no Sistema Proporcional (SILVA, 2008, p. 373),

considerando:

a) Votos válidos: 8.000.000;

b) Cadeiras a preencher: 42;

c) Quociente eleitoral: 8.000.000 ÷ 42 = 190.476;

d) Quociente partidário: supondo-se que 06 partidos concorreram às eleições:

Quadro 3 – Exemplo apuração de mandato no Sistema Proporcional.

Partido Votos Quociente eleitoral Quociente partidário Sobras

A 3.000.000 190.476 15 cadeiras 142.860 votos

B 2.200.000 190.476 11 cadeiras 104.764 votos

C 1.600.000 190.476 8 cadeiras 76.192 votos

D 800.000 190.476 4 cadeiras 38.096 votos

E 300.000 190.476 1 cadeiras 109.524 votos

F 100.000 190.476 nenhuma cadeira Não se computa

Total de cadeiras preenchidas: 39

Total de cadeiras restantes: 03

Quadro 4 – Exemplo apuração de mandato no Sistema Proporcional – cálculo das sobras.

Partido Votos Quociente partidário (+1) Médias

A 3.000.000 16 (15+1) 187.500

B 2.200.000 12 (11+1) 183.333

C 1.600.000 9 (8+1) 177.777

D 800.000 5 (4+1) 160.000

E 300.000 2 (1+1) 150.000

F Já está fora por falta de Q. E. - -

Aplica-se, como se vê, a regra da Maior Média para a apuração das sobras. Logo, o

(14)

Chegando-se ao número de cadeiras na Casa Legislativa para cada partido, serão

chamados para os cargos, os candidatos mais bem votados do partido, até completar as

vagas conquistadas (quociente partidário). Como se denota do exemplo acima, o partido

“A” ficou com dezesseis cadeiras. Logo, os dezesseis candidatos mais votados do partido

ocuparão as vagas.

Além dos sistemas majoritário e proporcional, os quais são adotados no Brasil,

outros existem nos sistemas eleitorais internacionais, como o Distrital e o Misto.

No sistema distrital, para alguns também chamado de sistema distrital puro, divide-se o ente federativo em distritos, no total correspondente ao número de cadeiras

reservadas no parlamento para o respectivo ente federado, sendo que cada distrito elegerá

um parlamentar.

Considerando que a Constituição Federal de 1988 estabelece que a Câmara dos

Deputados terá o número de cadeiras estabelecida nos termos da lei complementar, no

limite mínimo de oito e máximo de setenta deputados para cada Estado-membro e

Distrito Federal; que a Lei Complementar nº. 78/93 fixou em quinhentos e treze o número

máximo de Deputados Federais, atribuindo ao Tribunal Superior Eleitoral a fixação do

número de vagas a serem disputadas por cada Estado-membro e Distrito Federal e; que a

Resolução nº. 23.220, de 02 de março de 2010, do TSE, que dispõe sobre o número de

membros da Câmara dos Deputados e das Assembléias e Câmara Legislativa para as

eleições de 2010, fixou em oito deputados federais a representação do Estado do Acre, a

eleição desses parlamentares pelo sistema distrital ocorreria da seguinte forma:

dividir-se-ia o Estado do Acre em oito distritos e cada qual elegerdividir-se-ia um deputado.

Figura 3 – Exemplo de divisão do Estado do Acre em distritos – Eleição para Deputados Federais.

O mesmo ocorreria nas eleições para a Assembléia Legislativa do Estado do Acre,

que teria vinte e quatro deputados estaduais. Pelo sistema distrital, far-se-ia a divisão do

Estado em vinte e quatro distritos e de cada um deles, seria eleito um parlamentar, para o

(15)

O sistema eleitoral misto, também conhecido como sistema distrital misto, é modelo em vigor na Alemanha e se baseia na mesma regra de divisão do sistema distrital.

A diferença está na quantidade de votos de cada eleitor. Enquanto que no distrital, cada

eleitor vota em apenas um candidato do distrito, no sistema misto lhe é dado o direito de

dois votos, um para a escolha de um deputado do distrito (pelo sistema majoritário, ou

seja, vence o candidato com maior número de votos) e outro voto em uma lista partidária

fechada, elaborada pelos partidos.

Mauro Petersem Domingues apresenta elucidativo exemplo de como ocorre nas

eleições na Alemanha.

Para efeito das eleições para o Parlamento, o território alemão é dividido em 299 distritos uninominais, ou seja, com direito a eleger apenas um representante. Os partidos apresentam candidatos em cada um desses distritos e o candidato mais votado é eleito. Paralelamente, o eleitor vota também na lista partidária de sua preferência, e esses votos, uma vez computados, vão definir o número de cadeiras que cada partido receberá no Parlamento (...)

Assim, por exemplo, se um partido obtiver 40% dos votos dados às listas, ele terá o direito de eleger 40% dos membros do Parlamento. Digamos que esses 40% dos votos nas listas signifiquem o direito de eleger 240 parlamentares. Ora, nas eleições majoritárias deve ter elegido alguns parlamentares. Digamos que tenham sido 150. Para que o partido alcance as 240 cadeiras que lhe cabem no Parlamento serão considerados eleitos mais 90 candidatos, selecionados conforme a ordem das listas apresentadas nas eleições proporcionais (DOMINGUES, 2009, p. 309).

Chama-se misto, porque parte dos candidatos é eleita pelo sistema majoritário e

parte pelo sistema proporcional.

5.2. Democracia Participativa e Mecanismos de Participação

A participação popular no poder não se limita ao direito de voto, ou seja, de o povo

escolher seus representantes. A constituição de 1988 estatui que a soberania popular será

exercida pelo sufrágio universal e, nos termos da lei, mediante plebiscito, referendo e

iniciativa popular.

Além dos três mecanismos descritos na Carta Magna, outras formas de

participação direta estão previstas no sistema político brasileiro, abaixo descritas:

a) Manifestação direta da vontade geral acerca de matéria a ser definida através de lei: É uma forma direta de participação no Poder. Antes dos representantes eleitos tomarem

alguma decisão sobre assunto de relevância geral, o povo manifesta diretamente a sua

opinião. Isso se procede mediante plebiscito. Convocado com anterioridade a ato legislativo ou administrativo, cabendo ao povo, pelo voto, aprovar ou denegar o que lhe

tenha sido submetido, o plebiscito é excelente mecanismo para demonstrar o que pensa o

cidadão acerca da problemática e qual é a sua vontade. Foi através desse instrumento que

(16)

serem adotados pelo Brasil a partir de então. Entre a República e a Monarquia, o povo

optou pela República e entre o Presidencialismo e o Parlamentarismo, escolheu-se o

primeiro.

b) Manifestação direta da vontade geral acerca de matéria já definida através de lei:

Diferentemente do que ocorre com o plebiscito, os cidadãos vão dizer se concordam ou

não com a norma já elaborada. Primeiramente, o legislador elabora a norma e depois

indaga ao povo se há ou não anuência da sociedade sobre o que foi elaborado. Isso se faz

mediante referendo. Para a Lei nº. 9.709/98, o referendo é convocado com posterioridade

a ato legislativo ou administrativo, cumprindo ao povo a respectiva ratificação ou rejeição.

Como exemplo, pode ser citado o ocorrido em 2005 sobre tema do desarmamento. A Lei

10.826/2003 criou o Estatuto do Desarmamento. A referida Lei proibia, em seu art. 35, a

comercialização de arma de fogo e munição em todo território nacional, com algumas

exceções. Entretanto, o legislador preferiu saber a opinião popular antes de dar eficácia ao

dispositivo legal e remeteu o assunto a referendo, autorizado pelo Decreto Legislativo nº.

780/05. Pelo Decreto Legislativo, portanto, foi autorizado referendo de âmbito nacional,

para consultar o eleitorado sobre a comercialização de armas de fogo e munição no

território nacional, realizado no primeiro domingo do mês de outubro de 2005, e consistiu

na seguinte questão: “o comércio de armas de fogo e munição deve ser proibido no

Brasil?”. Se a maioria simples do eleitorado nacional se manifestasse afirmativamente à

questão proposta, a vedação constante do Estatuto do Desarmamento entraria em vigor

na data de publicação do resultado do referendo pelo Tribunal Superior Eleitoral. Os

cidadãos brasileiros, no entanto, decidiram que o artigo mencionado não deveria vigorar.

A sociedade, portanto, não acatou a proibição da comercialização de arma de fogo e

munição, ficando inoperante o dispositivo legal.

c) Elaboração de projetos de lei: É direito dos cidadãos, assegurado constitucionalmente, criar projetos de lei de interesse coletivo. Também conhecido como

Iniciativa Popular, é mais um instrumento de participação direta no Poder. Para se elaborar um projeto de lei de âmbito federal, é preciso que um por cento do eleitorado nacional

assine a proposta. Além disso, essa porcentagem precisa estar distribuída em pelo menos

cinco Estados-membros e a distribuição corresponder a três décimo por cento do

eleitorado de cada Estado. A iniciativa popular também está prevista para as outras

esferas de governo. No âmbito municipal, basta que cinco por cento do eleitorado do

Município assine o projeto. Já no âmbito estadual, cabe à Constituição do Estado

disciplinar a matéria. No Estado de São Paulo, por exemplo, a Constituição estadual

poderá ser emendada mediante assinatura de, no mínimo, um por cento dos eleitores (art.

(17)

apresentação de projeto de lei subscrito por, no mínimo, cinco décimos de unidade por

cento do eleitorado do Estado (art. 24, § 3º, I). Assim, o povo manifesta o seu interesse e

caberá ao Poder Legislativo deliberar sobre a proposta popular apresentada, para que seja

convertida em lei.

d) Fiscalização dos atos da Administração Pública: O cidadão, além de ter o direito de ser um administrador público (quando eleito pelos seus pares) também tem o poder de

fiscalizar os atos da Administração Pública. Um dos princípios constitucionais, sob o qual

a Administração Pública deve obediência, denomina-se “Princípio da Publicidade”.

Segundo esse princípio, os atos administrativos não podem ser omitidos da sociedade,

devem, pois ser públicos. Todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de

seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral (art. 5º, XXXIII, CF). A

participação do cidadão na Administração Pública pode ser realizada mediante

reclamações relativas às prestações de serviços públicos em geral; acesso a registros administrativos e a informações sobre atos de governo e; representação contra o exercício negligente ou abusivo de cargo, emprego ou função na Administração Pública.

e) Anulação de ato lesivo ao patrimônio público, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural: De nada adiantaria o direito à fiscalização, sem que houvesse mecanismos que possibilitassem a anulação do ato lesivo e certa punição ao

agente culpado. Para garantir a fiscalização dos atos do Poder público, a Constituição

Federal assegurou aos cidadãos um instrumento capaz de anular os chamados atos

lesivos. Esse instrumento denomina-se Ação Popular. Através dela, o cidadão pode ingressar em juízo, sem custas processuais, buscando anular ato lesivo ao patrimônio

público, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e

cultural.

f) Participação no Conselho da República: O Conselho da República é órgão superior de consulta do Presidente da República, e dele participam, além de outros, seis cidadãos

brasileiros natos, com mais de trinta e cinco anos de idade, sendo dois eleitos pelo

Presidente da República, dois pelo Senado Federal e dois eleitos pela Câmara dos

Deputados. O Conselho tem competência para se pronunciar sobre intervenção federal,

estado de defesa, estado de sítio e sobre as questões relevantes para a estabilidade das

instituições democráticas.

g) Expressão da vontade social direta e presencialmente aos agentes públicos: O

instrumento pelo qual se expressa essa forma de participação política é a chamada

(18)

maioria das vezes, a audiência pública é uma faculdade do Ente Público, ou seja, está sob

o critério do agente público convocá-la ou não (juízo de oportunidade e conveniência). Já

em outros casos, há imposição legal da necessidade de se realizar esse instrumento de

participação social no Governo (ato vinculado). Vários são os exemplos. Na esfera

legislativa, os parlamentares têm a faculdade de, se acharem benéfico, convocar

audiências públicas, nos termos do Regimento Interno da Câmara dos deputados,

aprovado pela Resolução nº. 17/89: “Art. 255. Cada Comissão poderá realizar reunião de

audiência pública com entidade da sociedade civil para instruir matéria legislativa em

trâmite, bem como para tratar de assuntos de interesse público relevante, atinentes à sua

área de atuação, mediante proposta de qualquer membro ou a pedido de entidade

interessada”.

Por outro lado, como exemplo de imposição legal, tem-se a necessidade de se

realizar a audiência pública para a elaboração do plano diretor. O plano diretor, aprovado

por lei municipal, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão

urbana, que deverá englobar o território do Município como um todo. Segundo o art. 40, §

4º, I, da Lei nº. 10.257/01 – Estatuto da Cidade, no processo de elaboração do plano

diretor e na fiscalização de sua implementação, os Poderes Legislativo e Executivo

municipais garantirão a promoção de audiências públicas e debates com a participação da

população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade.

Já na esfera administrativa, a Lei nº. 11.105/05, que dispõe sobre a Política

Nacional de Biossegurança – PNB e reestrutura a Comissão Técnica Nacional de

Biossegurança – CTNBio, faculta em seu art. 15 à CTNBio, a possibilidade de se realizar

audiências públicas, garantida participação da sociedade civil. Assim, havendo qualquer

discussão sobre atividades que envolvam organismos geneticamente modificados, a

CTNBio poderá realizar audiência pública e se inteirar do ponto de vista da sociedade.

Há, ainda, possibilidade de realização de audiência pública até mesmo no âmbito

do Poder Judiciário. A Lei nº. 9.868/99, que dispõe sobre o processo e julgamento da ação

direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade perante o

Supremo Tribunal Federal, admite no art. 9º, § 1º, em caso de necessidade de

esclarecimento de matéria ou circunstância de fato ou de notória insuficiência das

informações existentes nos autos, a possibilidade de o relator requisitar informações

adicionais, designar perito ou comissão de peritos para que emita parecer sobre a questão,

ou fixar data para, em audiência pública, ouvir depoimentos de pessoas com experiência e

(19)

h) Participação como membro de órgãos deliberativos e controladores das ações específicas da política pública de cada seguimento, com poder de voto: O instrumento pelo qual se expressa essa forma de participação política é ser Conselheiro dosConselhos Municipais, Estaduais

ou Federais. Vários são os conselhos nas esferas de governos: do idoso, da pessoa

portadora de deficiência, do esporte, da assistência social, da saúde, dos direitos da

criança e do adolescente etc. Como exemplo, o Estatuto da Criança e do Adolescente –

ECA dispõe em seu art. 88, que são diretrizes da política de atendimento, dentre outras, a

criação de conselhos municipais, estaduais e nacional dos direitos da criança e do

adolescente, órgãos deliberativos e controladores das ações em todos os níveis,

assegurada a participação popular paritária por meio de organizações representativas,

segundo leis federal, estaduais e municipais.

Como se denota, várias são as formas e mecanismos de participação direta no

poder, as quais seguem sistematizadas no Quadro 5.

Quadro 5 – Sistematização das formas e mecanismos de participação no poder.

Direito dos cidadãos de participar do governo

Formas de particpação Mecanismo disponível

Eleição de Representantes Voto

Manifestação direta da vontade geral acerca de matéria a ser definida através de lei

Plebiscito

Manifestação direta da vontade geral acerca de matéria já definida através de lei

Referendo

Elaboração de projetos de lei Iniciativa Popular de Lei

Fiscalização dos atos da Administração Pública Reclamações relativas às prestações de serviços públicos em geral;

Acesso a registros administrativos e a informações

sobre atos de governo e;

Representação contra o exercício negligente ou

abusivo de cargo, emprego ou função na Administração Pública

Anulação de ato lesivo ao patrimônio público, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural

Ação Popular

Pronunciamento sobre matérias de interesse nacional, como intervenção federal, estado de defesa, estado de sítio e sobre as questões relevantes para a estabilidade das instituições democráticas

Participação no Conselho da República

Expressão da vontade social direta e presencialmente aos agentes públicos

Audiência Pública

Manifestação de opinião, com poder de voto, em órgãos deliberativos e controladores das ações específicas de cada seguimento.

(20)

6.

CONCLUSÃO

A garantia dos direitos fundamentais e a separação dos poderes são vigas mestras do

regime democrático em contraposição aos Estados de exceção, como o autoritarismo.

Com a maturidade da democracia, seja direta, indireta, semidireta, a gestão

pública depara-se com mecanismos cada vez mais eficientes de participação popular no

poder. Tais mecanismos participativos estão em processo de ampliação na democracia

brasileira, mas ainda depende muito da efetividade dos direitos humanos básicos, para

que o cidadão se transforme em consciente sujeito da democracia.

O regime democrático possui vários desafios, como implementar formas que

assegurem a expressão da vontade geral, o que legitimaria de fato o sistema e,

principalmente, o embate em instituir completa transparência na gestão pública.

Liberdade e consciência políticas são requisitos fundamentais para se consagrar a

desejada democracia substantiva, sob o império da ética do gestor da res publica e total ausência de corrupção no governo. O Estado brasileiro galgou passos relevantes na

garantia dos direitos fundamentais, primeiro requisito do regime democrático. Cumpre,

agora, concretizar as ações sociais para redução das desigualdades e majoração da

capacidade intelectual dos seus cidadãos, pois, sabe-se, quanto mais incultos são os

súditos, mais fácil se torna qualquer processo de manipulação social. Outrossim, quanto

maior a cultura do cidadão, mais eficiente será o governo do povo.

Para se chegar ao sistema atual de participação popular na gestão pública,

diversos foram os conflitos populares. Revoluções, ondas democráticas e ondas

autoritárias, efetivação das liberdades públicas, políticas públicas de melhorias sociais são

os baluartes da afirmação do regime democrático no Brasil, que a passos razoáveis, vem

sedimentando o governo do povo em sua cultura política, com a ampliação das vias de

participação direta no Poder.

Sintetizamos, no presente artigo, algumas dessas vias derivadas da democracia

participativa, mas, não obstante, muitas outras formas receberão contornos importantes

no decurso do tempo, para que os atuais desafios democráticos sejam integralizados e, de

fato, impere a expressão da legítima vontade geral.

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ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social. Tradução: Pietro Nassetti. 3. ed. São Paulo: Martin Claret, 2008.

Imagem

Figura 2 – Separação dos Poderes.
Figura 3 – Exemplo de divisão do Estado do Acre em distritos – Eleição para Deputados Federais

Referências

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