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Pesquisa narrativa: Uma metodologia para compreender experiências formativas / Narrative research: A methodology to understand formative experiences

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Academic year: 2020

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Pesquisa narrativa: Uma metodologia para compreender experiências

formativas

Narrative research: A methodology to understand formative experiences

DOI:10.34117/bjdv6n9-180

Recebimento dos originais: 05/08/2020 Aceitação para publicação: 09/09/2020

Sones Lei Aparecida Domingues Cintra

Sones Lei Aparecida Domingues Cintra.Mestranda em Letras pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS – Campo Grande); Professora da rede pública de ensino. Colaboradora no

projeto de pesquisa “Memorias de professores: diálogos sobre o letramento e o ensino de língua portuguesa-Etapa II”

e-mail: sonesley.sedms@gmail.com Léia Bernal Sanches Correia

1 Leia Bernal Sanches Correia. Mestranda em Letras pela Universidade Estadual de Mato Grosso do

Sul (UEMS – Campo Grande); Professora da rede pública de ensino. Colaboradora no projeto de pesquisa “Memorias de professores: diálogos sobre o letramento e o ensino de língua

portuguesa-Etapa II”

e-mail: leiabernal@gmail.com Neide Araújo Castilho Teno

Doutora em Educação. Docente Sênior do Programa de Mestrado Profissional em Letras– PROFLETRAS, e do Programa de Mestrado Acadêmico em Letras da Universidade Estadual

de Mato Grosso do Sul - UEMS/Dourados/Campo Grande. Linha de pesquisa Linguagem e Ensino. Coordenadora do projeto de pesquisa “Memorias de professores: diálogos sobre o letramento e o ensino de língua portuguesa-Etapa II”. Colaboradora do projeto de pesquisa “Apoio à Qualificação Docente: Profletras em Mato Grosso do Sul” financiado com recurso da

FUNDECT e-mail: cteno@uol.com.br RESUMO

O presente estudo perpassa as pesquisas com narrativas, quer de formação e leitura, quer o de relato de experiências de formação. Dentre as diversas metodologias de estudo encontramos nas narrativas um meio propicio para o sujeito falar de si e de suas experiências vivenciadas ao longo de sua docência. A finalidade do presente texto é refletir acerca de alguns aspectos da metodologia das narrativas no contexto da pesquisa qualitativa e sua contribuição para compreender práticas pedagógicas. Trata de um recorte de uma pesquisa de Mestrado em andamento, vinculado ao Programa de Mestrado em Letras, Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), que tem por temática “Prática de leitura de professores das escolas de educação em tempo integral - Escolas da Autoria: crenças reveladas nas narrativas orais”. Estudiosos como: Bueno; (2002), Teno (2013), Passeggi e Souza (2010), Clandinin & Connelly (2011); entre outros, subsidiaram o estudo. Consiste em um estudo teórico bibliográfico cujo corpus teórico dialoga com a concepção de pesquisa. As construções de narrativas em situações do cotidiano profissional, se apresentam com potencialidades para o desenvolvimento pessoal e profissional, pois tal modo de investigar busca apreender o sentido da experiência dos sujeitos.

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Palavras-chave: Pesquisas Narrativas; Metodologia de estudos; Experiências formativas. ABSTRACT

The present study runs through the research with narratives, both in training and reading, and in the report of training experiences. Among the various study methodologies, we find in the narratives a propitious way for the subject to talk about themselves and their experiences during their teaching. The purpose of this text is to reflect on some aspects of the narrative methodology in the context of qualitative research and its contribution to understanding pedagogical practices. It is an excerpt from an ongoing Master's research, linked to the Master's Program in Letters, State University of Mato Grosso do Sul (UEMS), which has the theme “Practice of reading teachers from schools of full-time education - Schools Authorship: beliefs revealed in oral narratives ”. Scholars such as: Bueno; (2002), Teno (2013), Passeggi and Souza (2010), Clandinin & Connelly (2011); among others, supported the study. It consists of a theoretical bibliographic study whose theoretical corpus dialogues with the research concept. The construction of narratives in everyday professional situations presents potentialities for personal and professional development, as this way of investigating seeks to apprehend the meaning of the subjects' experience.

Keywords: Narrative Research; Study methodology; Formative experiences. INTRODUÇÃO

O interesse pelos estudos com a Pesquisa Narrativa deu se por ocasião de leituras de textos ligados a formação docente e as questões relacionadas a leitura do professor. Enquanto professoras de língua portuguesa em instituições públicas entendemos que ouvir o que o professor tem a dizer sobre suas experiências, certamente é uma forma de pensar e refletir sobre a formação docente. Assim, a finalidade do presente texto é refletir acerca a formação de professores por meio de narrativas para compreender o exercício da docência. Trata de um recorte de uma pesquisa maior em andamento, vinculado ao Programa de Mestrado em Letras, Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), que tem por temática “Prática de leitura de professores das escolas de educação em tempo integral - Escolas da Autoria: crenças reveladas nas narrativas orais”.

Algumas leituras foram essências para compreender o recorte desse estudo: Bueno (2002), Passeggi e Souza (2010), Teno ( 2013), Clandinin e Connelly (2011), entre outros, que trazem suas experiências como um aparato para falar de si , de suas trajetórias de vida em formas de narrativas.

Iniciamos nossa reflexão com uma indagação pertinente ao estudo: é possível falar de formação docente por meio de experiências de professor ao longo de sua profissão? Para responder nossa indagação fomos buscar na literatura alguns movimentos e publicações acerca dessa temática, aliados aos ensinamentos da história de vida na constituição de discursos e de narrativas.

A publicação do livro O professor é uma pessoa, de Ada Abraham (1984) foi o ponto alto para os estudos com saberes e narrativas autobiográficas. Este livro trouxe destaques para textos que focam sobre a vida dos professores, as experiências profissionais, os percursos profissionais, ou seja,

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como uma maneira de “recolocar os professores no centro dos debates educativos e das problemáticas de investigação”. Nóvoa (1992 p. 15).

Explicita este estudioso que este período foi bastante promissor para os estudos que vinculavam a carreira, a vida profissional e pessoal dos professores, dada o caráter do método investigativo e a chamada virada da narrativa. Essa virada abriu espaço para dar voz ao professor, pois o que antes se mostrava esquecido e relegado “ passou a se mostrar promissor para realimentar novos desenvolvimentos teóricos na área” (BUENO, 2002, p. 13).

Essa ideia da virada para o viés da narrativa é corroborada por Clandinin e Connelly (2011), quando explicam que as narrativas tornam uma maneira alternativa e fecundo, para aqueles que fala da vida por meio de fragmentos narrativos, em seus diferentes momentos da vida. Sob essa ótica, entendemos ser uma virada, mesmo nos estudos autobiográficos, pois dar voz ao professor para falar das suas experiências, não seria um caminho melhor, para compreender a formação docente.

Os estudiosos chamam a atenção para as pesquisas narrativas e sua distinção entre fenômeno (que é a história) e a investigação (que é a narrativa). Para desfazer a dúvida trouxemos os ensinamentos de Clandinin e Connelly (1995), arguindo que as narrativas tanto podem ser um fenômeno, como um método de investigação e assim explica:

É igualmente correto dizer “investigação na narrativa”, pois é “investigação narrativa”. Com isso queremos dizer que narrativa é fenômeno e método. A narrativa nomeia a qualidade estruturada da experiência a ser estudada e nomeia os padrões de investigação para seu estudo. Para preservar essa distinção, usamos o dispositivo razoavelmente bem estabelecido de chamar o fenômeno de “história” e a investigação de “narrativa”. Assim, dizemos que as pessoas, por natureza, levam vidas contadas e contam histórias dessas vidas, enquanto os pesquisadores narrativos descrevem tais vidas, coletam e contam histórias delas e escrevem narrativas de experiências. Clandinin e Connelly (1995, p. 2)1, tradução nossa.

Nesse sentido, podemos inferir que com narrativas podemos tanto descrever fenômenos como coletar dados, pois a ideia de narrar está relacionada não só para área da educação, outras áreas do conhecimento atravessam o conceito de narrativas como, a literatura, a história, a psicologia, a linguística entre outras.

Outros estudiosos comungam com a tese de a narrativa constituir fenômeno e método. Encontramos na literatura Elizeu de Souza (2006b, p. 139), pontuando que as narrativas são fortes aliadas tanto para a investigação como para a formação, pois enquanto investigação “vincula à produção de conhecimentos experienciais dos sujeitos adultos em formação” e, enquanto formação

1 Texto original; It is equally correct to say “inquiry into narrative” as it is “narrative inquiry”. By this we mean that

narrative is both phenomenon and method. Narrative names the structured quality of experience to be studied, and it names the patterns of inquiry for its study. To preserve this distinction we use the reasonably well-established device of calling the phenomenon “story” and the inquiry “narrative”. Thus, we say that people by nature lead storied lives and tell stories of those lives, where as narrative researchers describe such lives, collect and tell stories of them, and write narratives of experience.

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parte do princípio “de que o sujeito toma consciência de si e de suas aprendizagens experienciais quando vive, simultaneamente, os papéis de ator e investigador da sua própria história”.

A formação enquanto processo de conhecimento são discussões recorrentes nos estudos de Elizeu de Souza (2006, 2008, 2011), mormente, porque este pesquisador considera que a investigação de formação docente, por meio de narrativas, além de envolver a construção de saberes submerge para os saberes da própria vida do sujeito. Segundo este estudioso em contexto de estagio supervisionado “a organização e a construção da narrativa de si implicam colocar o sujeito em contato com suas experiências formadoras, as quais são perspectivadas a partir daquilo que cada um viveu [...]” (SOUZA,2008, p. 92).

Implica dizer que para construção de sentidos, o que o sujeito conta de si, são escolhas que ele faz a partir das vivencias sociais e históricas no decorrer de sua vida e formação, por isso implica na valorização. Defendemos o uso das narrativas dos professores como um espaço de defesa e partilha de conhecimentos experienciais, diferente dos métodos denominados de racionalidade técnica, que mesmo olhando para o professor como centro do processo formativo, não propicia meios de se recriar e nem possibilitava a reorganização profissional.

Nas palavras de Souza (2006a p. 136) em seu texto Pesquisa narrativa e escrita (auto) biográfica: interfaces metodológicas e formativas, “ a narrativa de si e das experiências vividas ao longo da vida caracterizam-se como processo de formação e de conhecimento”. Isto posto, podemos relacionar a importância dos recursos da experiência acumuladas ao longo da vida como fatores preponderantes no processo de formação docente.

As relações de vida, profissão e narrativa, de certo modo, são para Elizeu de Souza (2011) a tessitura que constrói as relações territoriais, à medida que tratam da formação de professor, dada as caraterísticas do sujeito em vivenciar o papel de ator e autor na construção do conhecimento de si. Buscamos nesse estudo refletir sobre as aproximações dessas relações a partir de entrevistas narrativas e a influência desse instrumento como um aporte teórico-metodológicos.

A estudiosa Moraes (2000) traz para discussão o termo empoderamento, enquanto coparticipação entre aquele que narra e aquele que investiga para as narrativas produzirem sentidos. Por isso, considera que as histórias narradas podem ser (re) significadas a partir da própria experiência, até porque, narrar não se restringi a contar o que ocorreu, à medida que o sujeito conta sua história ele o faz de maneira reflexiva, identificando acontecimentos que foram importantes na sua formação.

O professor que socializa suas experiências, ele avalia e pondera o que foi construtivo e o que não foi considerando os percalços como um caminho percorrido. São momentos considerados cruzamentos de histórias, pois quem lê a narrativa percebe claramente que algumas são carregadas

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de sentido mais que as outras e ao “entrecruzar de alguma forma (ou em algum sentido/lugar) [...] abre a possibilidade de aprender com as experiências que constituem não somente uma história, mas o cruzamento de umas com as outras” (MORAES, 2000, p. 81).

Quando falamos de narrativas lembramos de falar de experiências. Essa concepção está ligada a outros conceitos ligados a temporalidade e continuidade, termos muito bem lembrados por Larrosa2,( 2004, p. 17) apud Abrahão, (2004). Para Larrosa, a experiência é aquilo que se passa

com o sujeito, e o que se passa, pode ter a ideia de ter sido agora ou a de já ter ocorrido. Por isso:

O ritmo de nossas vidas é constituído pela passagem do que nos acontece, por nossa experiência. E, como interpretada, a experiência também pressupõe uma articulação temporal. O que acontece não é um evento entre uma série discreta de eventos, mas um evento no curso de uma vida. O que acontece como experiência só pode ser interpretado, então, narrativamente (LARROSA,2004, p. 17, apud ABRAHÃO, 2004).

Caminhando a reflexão mais para a contemporaneidade Passeggi e Souza (2017) em artigo intitulado “O Movimento (Auto) Biográfico no Brasil: esboço de suas configurações no campo educacional” faz uma reflexão sobre experiências narradas e realiza um mapeamento do período de 1990 a 2016 dos estudos e seus principais enfoques da pesquisa qualitativa no Brasil o que assegura afirmar a relevância dos estudos que acerca os conhecimentos humanos e sociais, pois:

As narrativas propõem uma nova episteme, um novo tipo de conhecimento, que emerge não na busca de uma verdade, mas de uma reflexão sobre a experiência narrada, assegurando um novo posicionamento político em ciência, que implica princípios e métodos legitimadores da palavra do sujeito [...] (PASSEGGI; SOUZA 2017, p. 11).

Voltamos a década de 1990 e aos projetos coordenados por pesquisadores da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo – USP, na área da Educação que envolvem a pesquisa (auto) biográfica, as histórias de vida, narrativas formativas, como método de pesquisa. Nesse interim, a abordagem da história oral, da memória e narrativas também ganham espaço, como bem explicam esses estudiosos:

[...] o estímulo à construção de narrativas autobiográficas que favoreçam a explicação das formas pelas quais se vivencia e se concebe a própria história de formação e suas múltiplas relações com as pessoas e os espaços que a conformaram pode constituir um recurso inestimável às reflexões acerca da natureza dos processos formadores e das intervenções que neles se fazem (CATANI, BUENO E SOUZA, 2000, p. 169).

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Texto original: El tempo de nuestras vidas está constituido por el pasar de lo que nos pasa, por nuestra experiencia. Y, en tanto que interpretada, la experiencia presupone también una articulación temporal. Lo que acontece no es un acontecimiento entre una serie discreta de acontecimientos, sino un acontecimiento en el curso de una vida. Lo que acontece como experiencia sólo puede ser interpretado, entonces, narrativamente. Tradução nossa,

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A década de 1990 pode ser considerada o momento de expansão das pesquisas autobiográfico e das histórias de vida em Educação, e a década de 2000 fixa a marca de ampliação dos estudos e a diversificação dos temas de pesquisa. Toda contribuição e fontes bibliográficas realizadas nessas décadas foram registradas em Congressos Internacionais de pesquisa (auto) biográfica, denominadas de CIPA - Congresso Internacional de Pesquisa (Auto) biográfica e o que caracteriza a prática atual desse movimento é o envolvimento de diversas áreas de conhecimento dedicando a esse tipo de pesquisa: a História da Educação, História Oral, Sociologia, Filosofia, Psicologia, Linguagens, Literatura.

Dentre tantos estudiosos, acerca da formação e prática docente incluímos (TENO, 2013) que alia seus estudos às experiências de professores e sua prática de leitura na crença de que para se constituir professor, a formação, as histórias de vida, a família, escola, as convivências sociais, são espaços, historicamente marcados, pois;

No momento em que se coloca na condição de narrador, personagem para escrever seu memorial, de certa forma vai buscar nas suas referências informações sobre a sua história de vida e formação. Por meio da sua escrita e da seleção do que vai escrever, o sujeito vai assumindo o papel de protagonista da sua própria narrativa, encontrando os significados das trajetórias vividas, e reconstruindo a compreensão que tem da formação (TENO, 2013, p. 39).

As narrativas além de carregar o caráter de protagonista da sua própria experiência, ela possibilita a reconstrução dessa prática em outros espaços e, assim a formação profissional vai se reconstruindo junto, uma vez que a “ aprendizagem da leitura, por exemplo, pode contribuir para satisfação pessoal, dando sentido às práticas, pois cada exercício realizado na trajetória de vida é impulsionado por sentidos diferentes,[...] (TENO, 2013 p.109) , e podem tornar marcas históricas na questão da aprendizagem da leitura e da escrita para fins de independência do sujeito .

Narrar é não ficar indiferente ao exercício de lembrar acerca de acontecimentos aos quais atribuímos alguma importância. É escrever para que a lembrança se torne mais presente, pois “ao escrever nos colocamos em uma dimensão de escuta, como sujeito que tem uma história carregada de experiências e aprendizagens construídas ao longo da vida e formação” (TENO, 2013, p. 23). Esta experiência vem acompanhada por momentos de nostalgia, em outros de empolgações e, ainda outros de saudosismo. E só assim podemos perceber o quanto é possível relembrar de tudo que vivemos em nossa história e as relações que estabelecemos ao longo do tempo com o aprendizado e experiência da formação leitora.

Em formato de acontecimentos de filme os fatos vão avançando em nossa memória, e as lembranças da infância, das brincadeiras, do grupo escolar, dos amigos, da primeira cartilha, tornam cenas de um determinado tempo. Assim, as lembranças são organizadas pelos valores do presente,

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podendo buscar no passado verdades que agora é possível construir a nossa identidade e definir as relações sociais e nossas convivências com o outro no decorrer da vida.

A metodologia com narrativas faz trabalhar a memória na relação da distância das leituras desenvolvidas no passado e no presente, lembranças de maior reflexão, lembrança de uma adolescência ou juventude que não pode ser desprezada. Aquelas primeiras letras, as primeiras imagens, talvez o primeiro livro ou, ainda, a leitura de um certo livro. São lembranças importantes na constituição da história do leitor.

O professor ao longo da sua profissão constrói saberes e práticas, que não raras vezes são estratégias de formação, e podem ser reveladas por meio de narrativas orais ou escritas. Neste estudo utilizamos o método das narrativas como um instrumento de conhecimento profissional. Estudiosos como Clandinin e Connelly (1995) defendem a potencialidade das narrativas como uma maneira de os professores contar suas experiências e produzirem significados, pois ao narrarem tornam-se autores, narradores e protagonista principal de um tempo e lugar.

Bueno e Teno (2016, p. 251-252) contribui com essas potencialidades revelando que quando o professor narra acerca do seu próprio trabalho ele traz para o interior de suas narrativas não só as dificuldades como os dilemas, os sucessos e revelam seus saberes da prática. Estas estudiosas consideram o memorial, no espaço da formação de professores, “como uma maneira de narrar as histórias” até porque “contar e narrar são modos de dizer enunciados discursivos com finalidades comunicativas”, por isso a importância da linguística textual nesse tipo de pesquisa para revelar o dito e o não dito.

As Narrativas chamam atenção do interlocutor pois no envolvimento do ouvir e contar as experiências vividas, acaba selando um contrato entre o pesquisador e o participante de forma profícua. Esse método de pesquisa com narrativas orais coloca em evidência a voz de quem fala diferente dos métodos tradicionais de pesquisa, o que de certa maneira abre espaço para a subjetividade, uma habilidade que “aos olhos dos pesquisadores se mostrou esquecido ou mesmo relegado nos tratamentos anteriores, e que por isso passou a se mostrar promissor para realimentar novos desenvolvimentos teóricos na área” (BUENO, 2002, p. 13).

Esse viés de falar de si, de sua prática de leitura, da disciplina que ministra, na formação dos alunos, ao longo da vida depende da nossa abordagem experiencial, uma vez que a “maneira como cada de um nós ensina está diretamente dependente daquilo que somos como pessoa quando exercemos o ensino” (NOVOA, 1992. p.15). Este estudioso posiciona a favor das narrativas orais e encontra significado no dizer pois a “pessoa que mais sabe de uma dada trajetória profissional é a pessoa que a viveu” (p.55)

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Para falar da vivencia cotidiana, das experiências da vida e da profissão, o recurso de entrevistas, de certo modo, encoraja e estimula o sujeito a contar fatos sobre algum acontecimento de sua vida e ou do contexto social, pois as entrevistas se diferenciam de outros instrumentos por não serem estruturadas, e com possibilidade de retomadas com o entrevistado a partir do que emerge no momento. Minayo (2012) considera a entrevista como uma estratégia de pesquisa para fornecer dados de uma determinada situação, por meio de mediações entre experiências e linguagem. Nessa ótica, a narrativa não deixa de ser uma maneira do sujeito repensar e refletir continuamente as significações que as cercam.

Nas narrativas construídas a partir das entrevistas, o autor informa sobre as experiências realizadas como uma oportunidade de repensar como fez e como pode fazer, para construir outros saberes, por meio de sentimentos e reconhecimentos. Nessa direção, podemos pensar que o ato narrar movimenta outros atos como: as emoções, o imaginário, sensações de tristezas, alegrias saudosismos tessituras importantes no momento de quem narra.

Por isso, consideramos as entrevistas narrativas, como temporal, e a denominamos de memória seletiva, porque podemos lembrar alguns fatos, outros eventos podemos deixar de falar, ou seja, são esquecidos. Jacques Le Goff, (1990) em “História e Memória”, refere se a memória coletiva como uma apropriação seletiva de vestígios podendo eles serem bloqueados a qualquer momento:

De fato, o que sobrevive não é o conjunto daquilo que existiu no passado, mas uma escolha

efetuada quer pelas forças que operam no desenvolvimento temporal do mundo e da

humanidade, quer pelos que se dedicam à ciência do passado e do tempo que passa, os historiadores (LE GOFF, 1990, p.535), grifo nosso.

Ao elegermos os professores como sujeitos do estudo, que ora desenvolvemos estamos endossando a sua história de vida e formação, como narrativas importantes, que mesmo de maneira parcial, que mesmo em face dos esquecimentos e silêncios, o narrado são representações do mundo e do momento que está sendo vivenciado. As entrevistas narrativas, enquanto técnicas para gerar corpus, tem a palavra e a enunciação como elementos importantes e responsáveis pela produção de sentidos. Características como (as pausas, o tom da voz, os silêncios, traços fisionômicos, mudanças na entonação) pode ser analisada como narrativas não ouvidas, mas necessárias para compreender o não dito.

Rodrigues e Gonçalves (2014) ao discutir a formação docente por meio de narrativas digitais, exemplifica o não dito com a seguinte expressão “basta o professor acabar o medo de errar”. Nessa pressuposição de existir o medo encontramos o não dito, mesmo que a narrativa não diz com palavras. O fato de ter medo e ser professor está inscrito na passagem do fragmento da narrativa, pois o enunciado discursivo é o que vai “induzir à produção de um sentido “não dito” de que ele (o autor)

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tem medo de errar diante do novo trazido pelas tecnologias” (RODRIGUES E GONCALVES, 2014, p. 233).

Discutir narrativas como metodologia de pesquisa é ponderar que dentre as muitas vantagens, esse tipo de investigação propõe ouvir o professor e reconhecer que o que ele fala da vida e de projetos pessoais, culturais, econômicos são relevantes pois são dados que influenciam na constituição do profissional. Nesse aspecto, as narrativas caminham para historicizar o sujeito, no sentido de olhar para si num processo de reflexivo. Abrahão; Passeggi (2012) contribuem com tais postulados à medida que ancoram seus estudos no uso de narrativas, pois consideram:

[...] o ato de explicitar para si mesmo e para o outro os processos de aprendizagem, adotando-se um posicionamento crítico, é suscetível de conduzir a pessoa que narra à compreensão da historicidade de suas aprendizagens e, portanto, de autorregular seus modos de aprender num direcionamento emancipador (ABRAHÃO; PASSEGGI (2012, p. 61).

Face ao exposto, podemos concluir que na essência dessa discussão sobre o papel das narrativas como metodologia para compreender experiências, quer profissional ou de vida, este estudo que ora desenvolvemos propõe, fazer uso de narrativas de professores para conhecer práticas profissionais, de leitura, de pandemia construídas ao longo da vida. Diante deste intento, importante compreender que as narrativas constituem estratégias fundamentais para estudos de diferentes áreas do conhecimento, pois como estão envolvidas com aparatos vinculados com a sociedade, a escola, a cultura, esta metodologia autoriza compreender a dimensão complexa da sociedade.

Pesquisas que tem as narrativas como metodologia de estudo, o sujeito desvela crenças, alegrias, decepções, conquistas, valores, e se aventura em construir sua identidade, ou faz um balanço de vida conforme expressa Nóvoa (1992), de maneira crítica para compreender tudo que construiu ao longo de sua trajetória.

Com o advento da internet, e a possibilidade de se conectar e reunir professores, alunos, coordenadores ao mesmo tempo, nesse momento de pandemia, obrigou o mundo acadêmico e profissional a serem narradores de histórias. Se por um lado, os professores inseriram dentro de uma cena de globalização, por outros, foram forçados ao compartilhamento de informações explicita do que estavam fazendo remotamente.

Nessas idas e vindas podemos encontrar na metodologia das narrativas relatos de experiências, sentimentos, angustias, excesso de trabalho, adoecimento, do que está sendo experienciado pelos educadores. O COVID -19, trouxe impacto no cenário social sobremaneira na necessidade de qualificação de profissionais nas diferentes áreas.

Já encontramos iniciativas de pesquisadores que estão se dedicando na metodologia de narrativas por meio de entrevistas em tempo de pandemia. O foco nas narrativas, nesse contexto, é

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variável pois estamos vivenciando momentos culturalmente desestruturados, com aulas remotas e isso reflete no modo de vida da sociedade. Segundo Seiji ( 2020)3:

Todas as iniciativas de ensino remoto utilizadas durante a luta contra a Covid-19 podem ser sementes para a transformação digital e cultural tão necessária no ensino, unindo práticas pedagógicas inovadoras, como o aprendizado híbrido e metodologias ativas, com tecnologias educacionais inteligentes, que potencializam as capacidades do aluno aprender e do professor inovar (SEIJI, 2020, s/p).

As narrativas, nesse contexto remoto trata de um método de coleta de informações importante e necessária para o conhecimento de práticas pedagógicas hibridas e a oportunidade de experimentar novas maneira de ensinar e aprender.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este texto disseminou conhecimento sobre alguns aspectos da metodologia enquanto narrativa de experiências de formação e de vida. Denominamos de considerações finais, porque as discussões que balizaram essas reflexões acerca das narrativas foram resultadas de leituras em teóricos que vinculam em diferentes grupos de pesquisa e que já tem uma longa caminhada de estudo. Conclusões finais porque para este decurso de tempo entendemos ser razoável o que construímos, porem outros grupos de estudos, outras teorias podem ter ficado alheia as nossas reflexões.

Construir sentidos sobre a formação docente e das práticas pedagógicas são possibilidades que estão ligadas tanto ao pesquisador, como quem produz as narrativas, e as habilidades de quem olha os sentidos que os sujeitos atribuem a si e às coisas quer as envolvem. Por isso, o não falar nas narrativas pode ser um caminho para olhar para o professor, no não dito. O não narrar pode estar vinculado ao receio da exposição e de possíveis julgamentos, pelos órgãos superiores, neles vinculados.

O lugar social de onde fala os sujeitos podem justificar as pausas, as interlocuções nas narrativas. Em tempo de pandemia as experiências pedagógicas são outras, os efeitos da aprendizagem são outras, e as experiências de criar modelos de aulas remotas a partir dos recursos digitais, certamente significa desenvolver atividades nunca antes experienciadas.

As narrativas podem constituir tanto um método como uma metodologia de estudo pois por meio do narrado as pessoas podem falar de sua profissão, de sua prática, porque fazem da forma que

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Um guia para sobreviver à pandemia do ensino remoto. Evento da série de webinários Educação no mundo 4.0, organizada pelo Ministério da Educação.Dia 7 de maio de 2020.Seiji Isotomi –palestrante da Universidade de São Paulo (USP) Informações capturada no site http://www.saocarlos.usp.br/um-guia-para-sobreviver-a-pandemia-do-ensino-remoto/

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fazem e como pensam. Compreendemos com o estudo que determinadas áreas do conhecimento, as linguagens por exemplo beneficiam dessa metodologia pela compreensão da subjetividade, o principal elemento de inovação das informações.

As leituras proporcionaram ainda conhecimentos de produções sobre formação de professores por meio de histórias de vida, realizadas ao longo dos últimos anos, conforme os relatos dos Congresso Internacional de Pesquisa (Auto) biográfica (CIPA), que reúne significados trabalhos de pesquisadores nacionais e internacionais, nas diversas áreas do conhecimento e os desafios futuro nesta linha de pesquisa.

Compreendemos que a temática que nos propomos estudar ainda é um desafio enquanto entender a metodologia de narrativas em pesquisas de práticas pedagógicas, mesmo tendo produções cientificas que tratam diretamente dessa temática. Por isso exploramos os referenciais epistemológicos, teóricos e metodológicos sobre as Histórias de vida, do (auto) biográfico, narrativas formativas. Caminhamos por diferentes leituras que tratam dos mais variados instrumentos de estudo, e ficamos como instrumento as narrativas experienciais com o fito de alargar a relação entre a educação, a linguagem e a prática pedagógica.

Na iminência de uma reabertura das escolas no Brasil, no ano de 2020, já entendemos que novas aprendizagens serão necessárias para compreender o novo modelo de escola que se desenha num futuro próximo. A exigência de protocolos como: mascaras, distanciamento, número reduzido de alunos em sala, novas configurações de ensinar e aprender estão por repensar a formação de professor.

REFERÊNCIAS

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Referências

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