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Lévinas e o repensar do estatuto da sensibilidade

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Academic year: 2021

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Paulo Serra

Universidade da Beira Interior

Índice

1 O império do olhar 1

2 O ver como poder 3

3 A sensibilidade em questão 6

4 A sensibilidade como fruição 7

5 A sensibilidade como linguagem

ori-ginal 9

6 A fruição como vulnerabilidade 11 7 Alguns paradoxos levinasianos 14

8 Bibliografia 14

1

O império do olhar

Na tradição filosófica e científica ocidental1, que também aqui segue a doxa mais elemen-tar, a visão tem funcionado não só como me-tonímia dos sentidos - percepcionar é ver - mas também como metáfora do conheci-mento - conhecer é ver - e, por isso mesmo,

1 E também, pelo menos em parte, na tradição religiosa, na medida em que o aparecimento da luz, que permite a superação das trevas cósmicas – e, con-sequentemente, o exercício da visão –, aparece, nas diversas cosmogonias, como um acontecimento mar-cante. Cf., a este respeito: “Génesis”, 1, 1-5, in Bíblia

Sagrada, 1996: 12, para a cosmogonia judaico-cristã;

Hesíodo, “Teogonia”, in Cornford, 1981: 315, para cosmogonia grega; Eliade, 1994: 507, para a cosmo-gonia polinésia.

em última análise como fundamento do pró-prio ser - esse est percipi, segundo o conhe-cido dito de Berkeley.2 Não faltam exemplos ilustrativos deste predomínio epistemológico e ontológico da visão, deste verdadeiro “ocu-locentrismo”.3

No campo científico – reportamo-nos aqui à chamada “ciência moderna”, que se afirma a partir de Galileu -, parece desnecessário in-sistir no facto de que aquilo que aí se chama “observação” e “experimentação” representa sempre, de uma ou outra forma, a mobiliza-ção e a exploramobiliza-ção de um olhar aparelhado, de um olhar que encontra, nos dispositivos técnicos postos à sua disposição, as condi-ções da sua rectificação e da sua amplifica-ção; os casos do telescópio e do microscó-pio são, até pela sua etimologia, exemplos por demais evidentes a que se junta hoje, de

2Cujo “sensualismo idealista”, de que “a fenome-nologia husserliana prolonga até nós as posições vi-gorosas”, conduz a uma afirmação da “coincidência do ser e da sua manifestação, essência do idealismo – o que, sob uma outra forma, se afirma na ontologia contemporânea” (Lévinas, 1994: 103).

3 Retomamos aqui uma expressão de Martin Jay (Jay, 1994). Na mesma linha, Pedro Frade utiliza a expressão “modelo óptico do pensamento” para ca-racterizar a filosofia de Descartes no Discurso do

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forma crescente, o visor do computador. Por outro lado, e prolongando um movimento que se inicia com a fotografia, as socieda-des em que vivemos são sociedasocieda-des em que as tecnologias que permitem a produção, cir-culação e consumo de imagens – o cinema, a televisão, o vídeo, o próprio computador - têm vindo a assumir um papel cada vez mais importante e em que, por conseguinte, as imagens, e o império do olhar em que elas assentam e que elas alimentam, têm vindo a substituir as crenças enquanto elemento cen-tral da própria “noosfera”.4

No campo filosófico, o predomínio da visão, literal ou metafórica, “sensível” ou “racional”, é um dado irrecusável da tra-dição. Ele manifesta-se em filósofos como Empédocles e Demócrito, entre os pré-socráticos5, Platão6, Aristóteles7, Santo Agostinho8, S. Tomás de Aquino9,

Descar-4Como escrevia Barthes há já alguns anos, “o que caracteriza as sociedades ditas avançadas é o facto de essas sociedades consumirem hoje imagens e já não crenças, como as de outrora” (Barthes, 1998: 163).

7No início da sua Metafísica, e para fundamen-tar a supremacia do conhecimento teorético, Aristó-teles acentua o facto de preferirmos a vista aos de-mais sentidos (Aristóteles, 980a21 – 980b21, 1991: 1), enquanto que no De Anima considera que “a vista é o sentido por excelência” (Aristóteles, 429a, 1995b: 78-9).

8Ao referir-se à curiosidade - ao “apetite vão e curioso”, ao apetite “de sentir por meio da experiên-cia da carne” -, Agostinho observa, no Livro X das

Confissões, que as divinas Escrituras lhe chamam “a

concupiscência dos olhos, porque os restantes senti-dos, quando procuram conhecer algum objecto, tam-bém usurpam para si, por analogia, a função de ver, na qual os olhos têm a primazia” (Santo Agostinho, 2001: 272).

9Repetindo Santo Agostinho, na Suma Teológica S. Tomás de Aquino acentua o facto de que, dada a “dignidade” e a “certeza” do sentido da vista”, a palavra “visão” é empregada não só para designar o

tes10- mas também, como ressalta Lévinas, em fenomenólogos críticos daquela tradição como Husserl, e a sua concepção da cons-ciência como “intencionalidade” (Lévinas, 1993a: 449), e Heidegger, e a sua concep-ção da verdade como “desvelamento” (Lé-vinas, 1994b: 327-8). Esta última repre-senta, assim, não a eliminação da “metafí-sica” de raiz platónica mas antes o culmi-nar dessa “metafísica”, a realização do sonho da transparência total do “ser” a si próprio mediante o “ente”, e em que este se revela como o verdadeiro instrumento – ainda que instrumento imprescindível – daquele (Lévi-nas, 1990: 207).

É precisamente o predomínio do olhar nos campos científico e filosófico que faz com que a história ocidental possa ser – e te-nha sido - vista, no seu conjunto, tanto lite-ralmente como metaforicamente, como uma marcha progressiva em direcção à “luz”, “à iluminação”; uma marcha de que, e a acredi-tarmos em McLuhan, a actual “galáxia Mar-coni” representaria o ponto de chegada, o ponto em que triunfam, simultaneamente, a

conhecimento dos sentidos em geral como também do próprio conhecimento intelectual (Aquino, 1997: I Parte, Questão 67, Artigo 1).

10Logo nas Regras para a Direcção do Espírito é evidente o predomínio do paradigma visual. Assim, na Regra III, a intuição é definida (também) como “uma representação inacessível à dúvida”, que “nasce exclusivamente da luz da razão” (Descartes, 1997: 87); também na Regra IX a comparação entre intuição e visão é totalmente explícita (Ibidem: 123). Quanto ao Discurso do Método, desnecessário se torna insis-tir no carácter visual da “clareza” e da “distinção” que constituem os critérios implicados na regra da evidên-cia. Na Carta-Prefácio à edição francesa dos

Princí-pios da Filosofia, Descartes afirma que viver sem

filo-sofar “equivale, verdadeiramente, a ter os olhos fecha-dos, sem nunca procurar abri-los” (Descartes, 1994b : 771).

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electricidade e a razão – e em que, final-mente, o homem se substitui a Deus en-quanto criador da luz.

2

O ver como poder

Que razões presidem a este verdadeiro im-perialismo do olhar que tem caracterizado a tradição científica e filosófica ocidental?

Uma primeira resposta para a questão surge logo em Platão. Em A República, a afirmação de que “o demiurgo que fez os sentidos modelou com muito mais esmero a faculdade de ver e ser visto” é justificada, pelo filósofo, com o facto de que, enquanto que sentidos como a audição e a voz não pre-cisam de um “terceiro factor” para, respecti-vamente, ouvir e ser ouvida, já o ver e o ser visto necessitam de um terceiro factor uni-ficador - a luz (do sol) -, que permite à vi-são ver e às cores (das coisas) serem vistas (Platão, 507c-508a, 1972: 308-9). Assim, enquanto que os outros sentidos fazem su-por uma espécie de fusão ou indistinção en-tre aquele que sente e aquilo que é sentido, a visão, ao exigir a luz como mediação - como algo que, ao mesmo tempo, une e separa – torna visível a diferença entre o ser do ho-mem e o ser das coisas. Se, como o faz o

Teeteto, a sensação em geral pode ser

defi-nida como “qualquer coisa que se produz no intervalo” entre o que sente e a coisa sen-tida (Platão, 153e-154a, 1994: 100), como uma “relação recíproca” entre os dois (Pla-tão, 159b, 1994: 110), então a visão é a mais perfeita das sensações, já que só nela se torna perfeitamente visível esse “intervalo” e essa “relação”. Aristóteles, que define o sentido como “a faculdade apta a receber as formas sensíveis sem a matéria, da mesma forma que a cera recebe a marca do anel sem

re-ceber nem o ferro nem o ouro” (Aristóteles, 424a,1995b: 64-5), aduz, como principal ra-zão para a predominância da vista, o facto de que ela “é, de todos os sentidos, o que melhor nos faz conhecer as coisas e mais diferenças nos descobre” (Aristóteles, 980a21-980b21, 1991: 1) – isto é, a de que a vista tem uma potência cognoscitiva que a destaca, clara-mente, dos restantes sentidos.11 Aceitando a concepção de Aristóteles, Santo Agosti-nho radica, no entanto, o predomínio da vista na “voluptuosidade” que só a luz, “a rainha das cores” (e das próprias formas) nos pro-picia12 - isto é, mais na potência afectiva do que na potência cognoscitiva da visão. Uma alteridade de posições que também podería-mos marcar dizendo que, enquanto Aristóte-les tende a enfatizar a visão como uma acti-vidade de descoberta do mundo, duma pro-cura activa visando a satisfação do “desejo de conhecer” ingénito no homem, já Santo Agostinho – cuja tematização Heidegger re-cuperará, no essencial, muitos séculos mais tarde no §36 de Ser e Tempo - tende a encarar a visão como uma passividade, uma entrega curiosa às coisas do mundo. S. Tomás de Aquino, que retoma a concepção de Aristó-teles do sentido como “uma potência passiva

11 No De Sensu, Aristóteles repete uma formula-ção semelhante, ligando a percepformula-ção das “diferenças” pela vista à percepção dos “sensíveis comuns”, forma, magnitude, movimento e número. (Aristóteles, 436b-437a, 1995a: 217-9). Esta ênfase na visão não obsta a que, no mesmo passo, Aristóteles considere que, “para a mente, e indirectamente, a audição é [de en-tre a vista e a audição] a mais importante”, e a que, também indirectamente, “dá o maior contributo para a sabedoria” – na medida em que se liga ao discurso. Voltaremos, adiante, a esta posição de Aristóteles.

12 Como também diz Santo Agostinho, “os olhos amam as formas belas e variadas, as cores vivas e ale-gres” (Santo Agostinho, 2001: 269-270).

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cuja natureza consiste em poder ser modifi-cada por um objecto sensível exterior”, situa a superioridade da vista no facto de ser este o único sentido em que, no acto da recepção, se dá apenas uma modificação espiritual - ao passo que, nos outros sentidos, a par da mo-dificação espiritual se dá uma momo-dificação física, seja a nível do objecto, como acontece no ouvido e no olfacto, seja a nível do órgão receptor do sujeito, como acontece no tacto e no gosto. Tal situação permite hierarquizar os diversos sentidos em função do seu maior ou menor grau de “espiritualidade”, come-çando pela vista - o sentido “mais espiritual”, “mais perfeito” e “mais universal” -, e pas-sando pelo ouvido, pelo olfacto, até ao tacto e ao gosto, sendo estes dois últimos os senti-dos “mais materiais” (Aquino, 1997: I Parte, Questão 78, Artigo 3).

Apesar da diferença de formulações dos fi-lósofos que acabámos de citar - e talvez com a excepção, parcial, de Agostinho -, é-lhes comum a ideia de que a superioridade da vi-são reside no facto de ela possibilitar a

theo-ria, a contemplação, o conhecimento

“desin-teressado” que permite, ao sujeito, colocar-se à distância das coisas e não colocar-ser, descolocar-se modo, afectado ou subjugado por elas; o que já não acontece, por exemplo, com sentidos como o tacto ou como o gosto em que, e como sublinha Aristóteles no De Anima, o ser vivo está totalmente sujeito às caracterís-ticas do meio, que podem determinar a sua sobrevivência ou a sua aniquilação (Aristó-teles, 434b, 435b, 1995b: 94-5, 96). Re-tomando tais formulações, Lévinas sublinha no entanto o facto de que a supremacia on-tológica e epistemológica atribuída à visão pela tradição ocidental – e, por consequên-cia, ao conhecimento “teórico” que a visão possibilita – tem a ver, essencialmente, com

o poder que ela faculta; que, numa frase, ver é poder (Lévinas, 1994b: 211, 337).Tal deve-se, em primeiro lugar, à relação que se estabelece entre a visão e o tacto, o olhar e a mão – ou, se preferirmos falar em termos mais epistemológicos, entre a theoria e a

te-chnê -, e que faz com que, em última análise,

toda a apreensão visual actual se torne uma preensão manual potencial, ao mesmo tempo que toda a preensão constitui uma verdadeira apreensão (Lévinas, 1994b: 206-8). Prolon-gando a explicação de Lévinas, acrescenta-ríamos que o carácter da visão como domí-nio ou poder radica, provavelmente, nas pró-prias origens do processo da antropogénese. É hoje ponto mais ou menos assente que tal processo teve os seus inícios quando o homi-nídeo começou a andar sobre os pés, isto é, que a posição vertical e a locomoção bípede foram os factores decisivos que possibilita-ram o encurtamento da face, a libertação da mão das funções locomotoras e a fabricação dos utensílios – tendo o aumento do volume e da complexidade do cérebro aparecido de-pois, já como consequência (Leroi-Gourhan, s/d: 26-7 e passim; Edgar Morin, s/d: 54). Ora, em todo este processo a visão assume um papel essencial: na concepção e na exe-cução das estratégias de defesa e de ataque, incluindo a caça, que exigem uma percepção exacta das distâncias e das formas; na fabri-cação e na utilização dos utensílios; na in-venção e no aperfeiçoamento do grafismo e da escrita. E, sobretudo estes dois últimos tipos de actividades – que passam, em úl-tima análise, a definir o homem como “ser cultural”, isto é, como especificamente “hu-mano” -, exigem uma coordenação cada vez mais complexa e cada vez mais perfeita en-tre a visão e a motricidade manual, enen-tre o olho e a mão. Uma tal coordenação significa

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que passa a ser cada vez mais difícil – senão mesmo impossível – desligar o ver do ma-nipular, o contemplar do fazer, a “teoria” da “técnica”.

Sendo um poder do homem sobre as coi-sas, do “sujeito” sobre o “objecto”, o olhar – e a mão que ele mobiliza e que o mobiliza – não pôde deixar de se assumir, também, como um poder do homem sobre o homem, do “sujeito” sobre o “sujeito”.

É precisamente a consciência de um tal facto que está na base do projecto do “panóp-tico” ou “casa de inspecção” proposto, nos finais do século XIX, por Jeremy Bentham - e cuja originalidade reside, segundo o seu autor, em constituir “um novo modo de obter poder da mente sobre a mente, numa quan-tidade até aqui sem exemplo” (Bentham, 1995: 31). Este objectivo é perseguido combinando a “centralidade da localização do inspector” com uma série de artifícios que lhe permitem “ver sem ser visto”, con-figurando uma verdadeira máquina óptica que permite assegurar, simultaneamente, “a aparente omnipresença do inspector” e “a extrema facilidade da sua presença real” (Bentham, 1995: 45) – um autêntico “olho divino”. O panóptico não pode, no entanto, ser confundido com um mero mecanismo de detenção e vigilância; ele é, antes, “um grande e recém inventado instrumento de go-verno” que visa a reforma social a todos os níveis (Bentham, 1995: 93-5). Que o pro-jecto de Bentham seja, no fundo, já a tomada de consciência da natureza da sociedade mo-derna – que seria, assim, na sua essência, uma “sociedade da vigilância” -, é, como se sabe, a hipótese defendida por Foucault (1975) e retomada, hoje em dia, pelos teó-ricos do “panóptico eléctrónico” ou “super-panóptico” (Poster, 1990; Lyon, 1994), que

vêm nas novas tecnologias de informação e comunicação o meio de realização de um pa-noptismo generalizado. A hipótese de Sartre vai ainda mais longe, até ao ponto de pressu-por que a atmosfera de vigilância total, em que todos olham e são olhados13 – atmos-fera de que o Processo de Kafka pode ser visto como uma ilustração superior -, longe de ser característica de um tipo específico de sociedade, será intrínseca à “condição de homem”, estando na origem da própria in-tersubjectividade (Sartre, 1995: 305).14 O olhar aparece, na concepção sartriana, como o meio – o poder - pelo qual um sujeito ob-jectiva um outro que, respondendo com o olhar, objectiva por sua vez aquele que o olha (Sartre, 1995: 305). Esta luta de olha-res, esta versão óptica da dialéctica hegeli-ana do senhor e do escravo faz com que, ex-perimentando perante o que o olha o “sen-timento original” da vergonha e, assim, to-mando consciência de si próprio como um sujeito perante alter, cada um dos sujeitos se constitua como ego (Sartre, 1995: 328). Mas, como o próprio Sartre reconhece de forma mais ou menos implícita, nomeada-mente quando descreve a “vaidade” (Sartre, 1995: 330), o olhar não representa apenas um poder do que olha sobre o que é olhado; ele representa, também, um poder do que é olhado sobre o que o olha – numa espécie de

13 Apesar de, e como é sabido, o olhar propria-mente dito não coincidir com a noção sartriana de “olhar”, o primeiro constitui, no entanto, a compo-nente essencial deste último.

14 E, demarcando-se da interpretação heideggeri-ana do “se” (Man), diz Sartre: “É a esta realidade pré-numérica e concreta, mais do que a um estado de inautenticidade da realidade humana, que convém re-servar a palavra “se”. Perpetuamente, ou enquanto eu for, o “se” olha-me. O “se” nunca é apreendido como objecto, ele desagrega-se desde logo.” (Ibidem: 321).

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inversão do panóptico benthamiano. E, se é verdade que Sartre considera tal poder como uma forma de “má fé” - na medida em que o sujeito, colocando-se na situação de objecto, tenta provocar num outro passivo um senti-mento de admiração ou de amor -, há toda uma sociologia, que tem em Simmel um dos seus iniciadores e, em Goffman, um dos seus representantes mais conhecidos, que encara tal poder, o poder da “apresentação de si”, como um dos aspectos centrais da relação intersubjectiva (Simmel, 1991: 226-7; Goff-man, 1996).

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A sensibilidade em questão

Uma posição como a de Sartre coloca, desde logo, a questão de saber se a relação de saber-poder do homem com as coisas e com os outros homens - ou, em termos levinasi-anos, a anulação do Outro pelo Mesmo, da alteridade pela identidade, da transcendência pela imanência - é a única possível; se será, mesmo, a essencial.

Como ressalta da crítica que, logo na

Fe-nomenologia da Percepção, lhe é endereçada

por Merleau-Ponty, a posição de Sartre re-presenta uma visão parcial e unilateral não só da relação intersubjectiva – reduzida às relações ópticas e assente na vergonha mútua - como da própria subjectividade - reduzida a um cogito ocular e dominador (Merleau-Ponty, 1995: 414).15 Por outro lado, como observa o mesmo Merleau-Ponty noutra das suas obras, a nossa relação com o mundo –

15Uma das implicações fundamentais desta crítica de Merleau-Ponty é a de que, e no que se refere à questão da intersubjectividade e da ultrapassagem do solipsismo, o Sartre de L’Être et le Néant acaba por

retroceder ao Husserl das Meditações Cartesianas

-ao qual se pode fazer, exactamente, a mesma crítica.

logo, também com os outros - é uma relação total e global, em que não tem sentido isolar o tacto, a vista ou qualquer outro dos senti-dos, em que aquilo a que se chama os “dados dos sentidos” é já um derivado, uma constru-ção de um espírito que se coloca à distância (Merleau-Ponty, 1996: 20; e também 63).

Tal como para Merleau-Ponty, também para Lévinas a visão e o saber/poder que ela possibilita não esgota a nossa relação com as coisas e com os outros homens – por-que há, antes e aquém dela, uma relação ética16; razão pela qual, aduz Lévinas, a on-tologia deve lugar à ética como “filosofia pri-meira”.17 Ora, a validade de uma tal res-posta exige uma verdadeira “reconstrução” da sensibilidade, tendente a libertá-la da du-pla redução, oculocentrista e epistemológica, a que a tradição a submeteu.18

16Lévinas entende por tal “uma relação entre dois termos em que um e outro não se encontram unidos nem por uma síntese do entendimento nem pela rela-ção de sujeito a objecto e em que, todavia, um pesa, ou importa, ou é significativo para o outro, em que eles se encontram ligados por uma intriga impossí-vel de esgotar ou desenredar pelo saber” (Lévinas, 1994a : 225, nota de rodapé). Se é certo que, de acordo com a definição consagrada de Kant, a Ética é a parte da filosofia que procura responder à ques-tão “Que devo fazer?”, esta pergunta pressupõe já, de acordo com Lévinas, um Outro ao qual se deve qual-quer coisa; a noção de Outro – individual, face a face - acaba por ser, assim, a noção primordial da Ética, sendo a de dever – universal - já derivada, ainda que não menos essencial. Sobre esta relação entre as éti-cas de Lévinas e Kant, cf.: Beavers, 2001: 285-302; Atterton, 2001: 327-354.

17Cf. por exemplo Lévinas, 1994b: 340.

18 Como sublinha Lévinas – de forma bastante se-melhante, aliás - em pelo menos duas das suas obras, podemos interrogarmo-nos sobre se a natureza da pró-pria visão não foi, desde logo, desvirtuada por essa mesma tradição. Mais concretamente, “se, mesmo na sua função intelectual, a visão perdeu

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completa-Na “reconstrução” da sensibilidade levada a efeito por Lévinas é possível demarcar três momentos fundamentais: um primeiro, cor-respondente a Totalité et Infini, de 1961, em que a sensibilidade é afirmada como “fruição”;19 um segundo, de que é para-digma o ensaio “Langage et proximité”20, em que a sensibilidade é afirmada como “contacto” e “proximidade”, sendo estes, por sua vez, identificados com a “linguagem ori-ginal”; um terceiro, correspondente a

Au-trement qu’être ou au-delà de l’essence, de

1974, em que a sensibilidade é descrita em termos de “fruição” e de “ferida” (ou “so-frimento”), entendidas uma e outra como “termos da proximidade”e constituindo, no seu conjunto, a “vulnerabilidade” (Lévinas, 1990: 102 ss. e passim). Mais do que “eta-pas” entre as quais seria possível marcar de-terminadas “continuidades” e “rupturas”, es-tes três momentos constituem, quanto a nós, três aspectos essenciais – e complementares – da descrição levinasiana da sensibilidade. Seja como fruição, seja como proximidade

mente a sua outra maneira de significar e se, nomea-damente, a expressão ‘comer com os olhos’ deve pas-sar por uma metáfora.” (Lévinas, 1994a: 226), e “se a própria visão se esgota em abertura e em conheci-mento. Expressões como ‘fruir um espectáculo’ ou ‘comer com os olhos’ são puramente metafóricas?” (Lévinas, 1990: 109).

19Segundo o resumo retrospectivo feito por Lévi-nas em Autrement qu’être ou au-delà de l’essence: “Em Totalidade e Infinito o sensível foi interpretado no sentido do consumo e da fruição.” (Lévinas, 1990: 120, nota de rodapé).

20 Este ensaio, publicado como um dos “Rac-courcis” da 2a edição, de 1967, de En Découvrant

l’Existence avec Husserl et Heidgger, tem vindo a ser

visto como um texto de transição entre a primeira e a segunda das obras maiores de Lévinas. (Cf. Bailla-che, 1994: 186 e passim; Ciaramelli, 1989: 94, nota de rodapé).

e contacto, seja ainda como vulnerabilidade, tal descrição encontra sempre, no seu per-curso, o Outro irredutível ao Mesmo - o Pró-ximo.

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A sensibilidade como fruição

A procura, patente em Totalité et Infini, de um estatuto da sensibilidade capaz de rom-per com a tradição filosófica dominante não deixa, no entanto, de passar por uma recu-peração de uma parte dessa tradição; e, se é verdade que, entre os modernos, Descartes21 e Kant22 são duas referências fundamentais, é sobretudo nos antigos em geral23e nas mo-rais hedonistas em particular24, que Lévinas encontra elementos para a construção desse novo estatuto. Esse novo estatuto passa, fun-damentalmente, pela afirmação da sensibili-dade como “modo da fruição”, mais especi-ficamente como “fruição do elemento”– en-tendendo por este último “uma pura quali-dade sem suporte” como a terra, a água, o ar,

21E a sua tese de que as sensações são irredutíveis à “clareza” e à “distinção” e que, como tal, relevam do útil e não do verdadeiro (Lévinas, 1994b: 143-4).

22E as suas afirmações da separação entre sensibi-lidade e entendimento, da independência da “matéria” em relação à “forma” e da incognoscibilidade “em si” da primeira. (Lévinas, 1994b: 144).

23A que Lévinas se refere como “a concepção an-tiga da sensação, em que intervinha, contudo, a afec-tação de um sujeito por um objecto” (Lévinas, 1994b: 206).

24De que a “verdade permanente”, diz Lévinas, re-side no facto de “não procurarem, por detrás da satis-fação da necessidade, uma ordem apenas por relação à qual a satisfação adquiriria um valor, de tomarem por termo a satisfação que é o sentido mesmo do prazer.” (Lévinas, 1994b: 141-142). Note-se que esta descri-ção não dá conta das complexidades de uma ética que, centrando-se no prazer como cânone, acaba por eleger a ataraxia e a aponia como ideais de vida. (Striker, 1996: 196-208).

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etc. -, no qual e do qual vivemos (Lévinas, 1994b: 143).

Ao fazer tal afirmação Lévinas aproxima-se, claramente, da tese heideggeriana de Ser

e Tempo segundo a qual, e ao contrário do

que pretendeu a generalidade da tradição fi-losófica e científica ocidental, o conheci-mento teórico, a contemplação ou theoria – ou, como dirá Lévinas, “um puro ‘olhar”’ – não só não esgota a nossa relação com o mundo como nem é, sequer, o modo originá-rio dessa relação (Lévinas, 1995: 136). No entanto, e ao mesmo tempo, Lévinas afasta-se da teafasta-se heideggeriana de que a nossa re-lação ao mundo é, primariamente, uma rela-ção prática e utilitária - e que, em consequên-cia, o mundo é, primariamente, um conjunto de pragmata, de coisas-utensílios caracteri-zadas pelo “estarem disponíveis” para serem utilizadas na praxis. Não é que tal relação ao mundo e tal mundo não existam – mas ambos existem já como subordinados à frui-ção gratuita (Lévinas, 1994b: 140-1).25 A tese de Heidegger que enfatiza a “utilizabi-lidade” e esquece totalmente a fruição tem subjacente, como Lévinas parece implicitar, a concepção do mundo humano como “um mundo de exploração”, um mundo em que homens são reduzidos, por outros homens, à categoria de meros instrumentos; talvez por isso mesmo “o Dasein, em Heidegger, nunca tem fome” (Lévinas, 1994b: 142). Importa,

25 Um dos indícios fundamentais de que a sensi-bilidade é, primariamente, “fruição” vê-o Lévinas na “orientação estética” que o homem imprime ao seu mundo, e cuja expressão máxima se dá na arte – já que ela representa, “sobre um plano superior, um re-gresso à fruição e ao elemental”; os próprios utensí-lios, como “o belo carro ou “ o belo isqueiro” são, primariamente, “brinquedos”, objectos que nos dão prazer (Lévinas, 1994b: 149).

portanto, contra todas as formas de intelec-tualismo e de instrumentalismo, afirmar que o fruir – a sensibilidade enquanto fruição -não pertence nem à ordem do pensar nem à ordem do produzir, mas à do sentimento, da afectividade, visando o prazer que se sa-tisfaz com a sua própria satisfação (Lévinas, 1994b: 143-4).

Mas a definição da sensibilidade como fruição envolve, desde logo, um ponto

crí-tico que já é, também, o das morais

hedo-nistas da antiguidade26: não estará o homem que frui o “elemento” condenado ao egoísmo do seu prazer solitário - e a negar, assim, não só a “ética”, a relação com o Outro, como a sua própria alteridade, dissolvida no seio do “elemento”?27 A ultrapassagem deste ponto crítico é possível, segundo Lévinas, porque, “na própria sensibilidade, e indepen-dentemente de todo o pensamento, anuncia-se uma inanuncia-segurança que põe em questão esta antiguidade quase-eterna do elemento, que a inquietará como o outro e de que ela se apropriará recolhendo-se numa mo-rada”(Lévinas, 1994b: 145). A insegurança

26 O epicurismo é, a este respeito, paradigmático, na medida em que, quando pretende passar do indi-víduo para a comunidade de amigos, não consegue escapar a uma contradição essencial: ou a amizade é subordinada ao prazer individual, enquanto bem su-premo, e então ela é meramente instrumental, isto é, não é verdadeira amizade; ou, então, ela é valorizada em si própria, como superior ao prazer individual – admitindo-se o risco, o sacrifício ou mesmo a morte pelos amigos -, e aquele deixa de ser o bem supremo. (Erler, Schofield, 1999: 666-9). Nesta impossibili-dade de passar do material e subjectivo ao formal e objectivo, do individual ao universal, reside também, precisamente, o essencial da crítica de Kant às morais hedonistas, em particular ao epicurismo. (Kant, 1989: 29-69).

27O problema é colocado, em termos muito seme-lhantes a estes, por Ciaramelli (1989: 92).

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e a inquietação pelo amanhã, que surgem no seio da fruição, levam, portanto, a que a situação – e a orientação - do homem no “elemento” passe a fazer-se a partir da mo-rada, da habitação - caracterizada pela ambi-guidade que resulta de ser, simultaneamente, abertura para o elemento e separação desse mesmo elemento. É a partir da habitação que surgem o trabalho sobre o elemento – que permanecerá como “fundo” das coisas pro-duzidas - e a posse de um mundo de coisas que se oferecem à fruição. A passagem do “elemento” ao mundo das coisas pressupõe também, como elemento decisivo, a lingua-gem: é a palavra – e não o olhar, ou não só o olhar - que, fixando as coisas, lhes dá identi-dade e estabiliidenti-dade. Ligando-se à morada, à posse, a palavra permite o pôr em comum da “comunicação” (Lévinas, 1994b: 148).

Nas “coisas” que, doravante, ocupam o mundo dos homens podem distinguir-se a matéria e a forma - e elas podem passar de uma forma a outra, dissolverem-se na maté-ria, sem deixarem de ser coisas, o que pos-sibilita uma física matemática no lugar da percepção. Há, no entanto, algo que não tendo nem matéria nem forma, não é no en-tanto informe, significando-se a si próprio, exprimindo-se: o rosto (Lévinas, 1994b: 149). Só o rosto é, de facto, o verdadeira-mente outro para que a sensibilidade é aber-tura. Se é verdade que Outrem surge já, como feminino – como acolhimento – com a e na habitação, é no entanto com a lin-guagem que ele marca a sua entrada efectiva no seio da fruição. O rosto, sendo discurso, interrogação, interpelação, obriga-me a uma resposta – que é, antes de mais, uma respon-sabilidade. E é enquanto responsável, en-quanto aquele que tem de dar uma resposta – e não enquanto “liberdade” ou

“autono-mia” -, que o Eu é verdadeiramente sujeito. A relação entre Eu e o Outro é, assim, uma relação assimétrica: o Outro é o mestre, o dotado de autoridade, aquele cuja palavra é “mandamento” que obriga a “servir” (Lévi-nas, 1994b: 194-5).

Sendo a sensibilidade fruição, a própria “cristalização da consciência” em eu e não-eu, em “sujeito” e “objecto” – ou, se qui-sermos, o conhecimento como olhar - não é a “finalidade última da fruição”, mas tão-só “um momento do seu devir”, ela mesma a interpretar em termos de fruição” (Lévinas, 1994b: 204). O mesmo é dizer que a “concu-piscência dos olhos” de que fala Santo Agos-tinho nas Confissões, ou o “prazer de ver” a que se refere Descartes na Carta-Prefácio dos Princípios da Filosofia, são expressões que devem ser entendidas de forma literal: o olhar e o ver como a concupiscência e o pra-zer que é, originariamente, a sensibilidade.

5

A sensibilidade como

linguagem original

Ao resumir, em Totalité et Infini, os resulta-dos do tratamento da sensibilidade levado a efeito nesta mesma obra, Lévinas, para além de se referir à convicção essencial de que a fruição “não esgota o seu sentido na quali-ficação do objecto visível”, refere-se ainda à ideia de que “a representação não é ape-nas obra do olhar, mas da linguagem” - com o objectivo, diz, de “distinguir olhar e lin-guagem, quer dizer, olhar e acolhimento do rosto que a linguagem pressupõe” (Lévinas, 1994b: 207).Ora, é precisamente esta rela-ção entre sensibilidade e linguagem, já te-matizada em Totalité et Infini, que o ensaio “Langage et proximité” procura aprofundar.

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A tese central de “Language et proximité”, nesta matéria, é a de que aquilo a que se chama “intuição sensível”, longe de ser algo “mudo” e “originário”, é já da ordem da lin-guagem; é esta que, visando qualquer coisa enquanto qualquer coisa, sendo “intenção” e “pretensão”, dá sentido ao que é apreen-dido no acto de o apreender, reconduzindo o particular ao universal. A síntese entre sensibilidade e entendimento, entre “intui-ções” e “conceitos” tematizada por Kant ga-nha, assim, um novo sentido: o entendi-mento é a “faculdade” à qual cabe a função de “entender” – linguisticamente - o sensível como isto ou aquilo; sem tal “entendimento”

a priori – um a priori linguístico - não só

nada poderia ser “entendido” como não po-deria, sequer, ser dado. É a linguagem que – a par do olhar –, aplicada à sensibilidade como fruição, como passividade ou recepti-vidade, permite que esta se transforme em conhecimento; e, reciprocamente, todo o co-nhecimento é linguístico, mais precisamente, é uma “proclamação”, uma “promulgação”, um “dito” - linguagem apofântica (Lévinas, 1994a: 220-1).28

Mas a linguagem não pode, de forma al-guma, ser reduzida à linguagem apofântica

28 Em Autrement qu’être ou au-delà de l’essence, ao remeter em nota de rodapé para “Langage et pro-ximité”, a tese essencial deste ensaio é resumida da seguinte forma: “O saber, a identificação que entende ou pretende isto enquanto aquilo, o entendimento, não permanece, pois, na pura passividade do sensível. O sensível, já enquanto intuição de uma imagem, é “pre-tensão”. A “intenção” que anima a identificação disto enquanto isto ou enquanto aquilo é “proclamação”, “promulgação” e, assim, linguagem, enunciado de um dito. A primeira ruptura com a passividade do sensí-vel é um dizer em correlação com um dito. É por isso que todo o saber é simbólico e se cumpre como fór-mula linguística” (Lévinas, 1990: 101).

que, adstrita ao olhar, “promulga” e “pro-clama” as coisas, reconduzindo-as à univer-salidade. Invertendo de certo modo a con-cepção de Roman Jakobson, caberia aqui di-zer que, para Lévinas, o “fático” – o con-tacto, a proximidade -, longe de ser um ob-jectivo e um efeito perseguido pela lingua-gem, está na origem da própria linguagem e da sua “função fática”.29 O que significa desde logo que, havendo uma sensibilidade – como fruição – de antes da sensibilidade como “intuição sensível” -, não poderá dei-xar de haver uma linguagem – como contacto e proximidade – de antes da linguagem como apofansis. Sendo contacto e proximidade, esta “linguagem original”, “fundamento da outra”, da linguagem apofântica, é ética – no sentido em que, como diz Lévinas, a ética in-dica a viragem de uma subjectividade inten-cional, “aberta sobre os seres”, a uma sub-jectividade que “entra em contacto com uma singularidade que exclui a identificação no ideal, a tematização e a representação, com uma singularidade absoluta e, como tal, não representável” (Lévinas, 1994a: 225).

A sensibilidade é, assim, “acontecimento de proximidade”, que não se limita a abrir-se aos abrir-seres e a tornar-abrir-se saber, mediante a “linguagem kerygmática” (Lévinas, 1994a: 225). E, se é verdade que a sensação gus-tativa, cuja significação consiste em, de al-gum modo, “‘atravessar’ os sabores recolhi-dos para penetrar como que na intimidade

29“Qualquer que seja a mensagem transmitida pelo discurso, o falar é contacto. É preciso, pois, admi-tir no discurso uma relação com uma singularidade colocada fora do tema do discurso e que, pelo dis-curso, não é tematizada, mas aproximada. O discurso e a sua obra lógica manter-se-ia não no conhecimento do interlocutor, mas na sua proximidade.” (Lévinas, 1994a: 224).

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das coisas”, em saborear as coisas, pode ser vista como exemplo da sensibilidade em ge-ral - na medida em que “em todas as formas de sensibilidade se encontra este esquema do consumo e em que sentir o mundo é sem-pre uma forma de dele nos alimentarmos”-, é no entanto o tacto que deve constituir o paradigma da sensibilidade: sentir é tocar, já que, como se disse, o sentir é, a título primor-dial, “aproximação” e “proximidade” (Lévi-nas, 1994a: 227).30 O tacto de que aqui se fala não pode confundir-se, obviamente, com o da mão que tacteia para apreender e agar-rar; ele é, antes, o tacto da carícia: (t)acto gratuito. É precisamente neste sentido – do contacto, da proximidade – que Lévinas in-terpreta o dito husserliano das coisas “em carne e osso” (leib haft gegeben) (Lévinas, 1994a: 227). Aliás, mesmo na visão - na sensibilidade como visão, já derivada -, não deixam de estar presentes o contacto e a pro-ximidade (Lévinas, 1994a: 228); daí, talvez, aquela nossa tendência irresistível para,

so-30 Nesta posição de Lévinas parece ecoar, de al-guma maneira, a posição do De Anima de Aristóte-les. Este, ao mesmo tempo que, como vimos, afirma que “a vista é o sentido por excelência”, não deixa de afirmar que é o tacto – e, por extensão, o gosto, por ele visto como uma modalidade do tacto -, o sentido primário, na medida em que é ele que determina a imersão do ser vivo no mundo e a sua sobrevivência, tanto em termos de procura do útil como de fuga ao nocivo. A vida define-se, assim, primariamente, por esta capacidade de ser afectado pelo que é outro em relação a ela, é neste sentido básico que a vida é sen-sibilidade. Os outros sentidos – o olfacto, a audição, a vista – vêm apenas depois, quando se estabelece a dis-tância entre o ser vivo e o elemento em que se encon-tra imerso; por isso eles exigem um meio que medeie entre o animal e o elemento. São, por assim dizer, um “luxo”, permitido apenas aos seres vivos dotados de locomoção – como é o caso do homem -, visando não a sobrevivência mas o “bem-estar”. (Aristóteles, 434b, 1995b: 94-5).

bretudo na infância, vermos todas as coisas com as nossas próprias mãos.

Mas o contacto e a proximidade, mesmo quando entendidos no seu sentido “físico” ou “matemático”, são-no sempre relativamente a um Próximo, a uma “pele humana”, a um “rosto” (Lévinas, 1994a: 227). Ser próximo é, deste modo, “vir de face, manifestar-se

desfazendo a manifestação. Tal é o rosto,

dissemo-lo, ponto em que a epifania se faz proximidade” (Lévinas, 1994a: 229). Sendo o “próximo” apenas “o que tem um sentido imediatamente, antes que se lhe o atribua”, ele só pode ser “Outrem, aquele que tem um sentido antes que se lhe o dê.” E sendo “entendimento de singularidade a singulari-dade”, “fraternidade com o próximo”, a lin-guagem é “responsabilidade por Outrem”, pela sua “dor” e pela sua “falta” – uma res-ponsabilidade que “não reenvia à minha li-berdade” (Lévinas, 1994a: 233).

6

A fruição como

vulnerabilidade

O facto de Autrement qu’être ou au-delà

de l’essence poder ser visto, no que se

re-fere à descrição da sensibilidade, como uma espécie de síntese entre Totalié et Infini e “Langage et proximité” – na medida em que a sensibilidade é ali descrita, simulta-neamente, em termos de fruição e em ter-mos de contacto e proximidade -, ele intro-duz, no entanto, pelo menos duas novida-des significativas: coloca, ao lado da frui-ção, a “ferida” ou “sofrimento” como um dos termos – e momentos – da sensibilidade, cuja “significação” reafirma ser a proximi-dade; qualifica a sensibilidade – a fruição e a ferida/sofrimento – como

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“vulnerabili-dade”, hiperbolizando, assim, o carácter re-ceptivo ou passivo que aquela assume (Lé-vinas, 1990: 102-3). O que significa, tam-bém, que Autrement qu’être ou au-delà de

l’essence acarreta, em relação a Totalité et Infini, a deslocação do centro de gravidade

do Eu para o Outro, rompendo com um certa simetria da relação entre Eu e Tu que estava presente nesta última obra e, sobretudo, em “Langage et proximité”.31

A ferida introduz, na dialéctica da sensi-bilidade, a ruptura com uma existência en-tregue à fruição – mostrando, dessa forma, a sua própria insuficiência.32 Sem uma tal ruptura, seria difícil entender o aparecimento da habitação e do trabalho, da posse e da linguagem como sequência da própria frui-ção.33 De facto, como Lévinas reconhece, há na sensibilidade uma “ambiguidade inultra-passável”: sendo vulnerabilidade, ela pode ser mera fruição, abandono à animalidade que se compraz em si própria; mas, por isso

31Como diz Ciaramelli, referindo-se ao tratamento da sensibilidade em Autrement qu’être ou au-delà de

l’essence: “Eis a novidade radical em relação a Tota-lité et Infini. A exposição ao outro não se acrescenta

ao um para o levar do interior para o exterior: na sua própria corporeidade, de que os movimentos são fa-diga e a duração envelhecimento, a sensibilidade é vulnerabilidade, quer dizer, arrancamento à fruição, devoção ao outro. A imediatidade da sensibilidade é a exposição a outrem, a proximidade do rosto.” (Cia-ramelli, 1989:94).

32“A imediatidade do sensível, que não se reduz ao papel gnosiológico assumido pela sensação, é exposi-ção à ferida e à fruiexposi-ção – exposiexposi-ção à ferida na fruiexposi-ção – o que permite à ferida atingir a subjectividade do sujeito comprazendo-se em si e afirmando-se para si” (Lévinas, 1990:104).

33 Se é verdade que esse aparecimento era expli-cado, em Totalité et Infini, a partir da “insegurança” que surge no seio da fruição e da “inquietação” sub-sequente, restava a questão de saber a que atribuir tal insegurança e tal inquietação.

mesmo, ela pode também ser para o outro, ser “significação para o outro e não para si” (Lévinas, 1990: 127). Ora, “ser para o ou-tro” não é uma forma de sentido alternativa ao conhecimento, mas o próprio sentido do sentido – só possível, portanto, pela sensibi-lidade como vulnerabisensibi-lidade (Lévinas, 1990: 105). A ruptura introduzida pela ferida só se efectiva, verdadeiramente, quando a dor se transmuta em renúncia e generosidade, quando, e não apenas metaforicamente, se dá ao outro “o pão da sua boca” (Lévinas, 1990: 119-20).A sensibilidade é, assim, contacto, capacidade de ser tocado pelo outro, “expo-sição ao outro”, “ser agarrado” em vez de “agarrar”, “passividade da presa” em vez de “actividade do caçador de imagens”, “obses-são por um outro que não se manifesta” em vez de “acto intelectual de apreensão” (Lé-vinas, 1990: 120-1). No glossário levinasi-ano, “maternidade, vulnerabilidade, respon-sabilidade, proximidade, contacto” não são senão formas diferentes de nos referirmos à sensibilidade (Lévinas, 1990: 122). Aliás, a própria visão, no seu sentido primário, não deixa de ser contacto e proximidade, carícia do “visível” e do “audível”, “exposição ao ser” – que, por assim dizer, se efectuam à distância (Lévinas, 1990: 128).

A proximidade de que aqui se fala não é, obviamente a proximidade física, a con-tiguidade, a ocupação de um mesmo espaço ao alcance do olhar ou da mão - já que, como dissemos, toda a proximidade pressu-põe sempre, de uma forma ou outra, a proxi-midade do Próximo, a “humanidade” (Lévi-nas, 1990: 129). Mas o Próximo não é um outro distante de que, ao aproximar-se, o Eu faria um próximo. Pelo contrário: Próximo é o que permite que o Eu seja Eu, se consti-tua como subjectividade – pelo que “a

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signi-ficação própria da subjectividade é a proxi-midade” (Lévinas, 1990:136). À palavra do Outro que o interpela, o sujeito pode recusar-se a responder, oferecendo o silêncio ou a violência. Mas, ao fazê-lo, o sujeito está a negar-se a si próprio como sujeito, já que só é Eu enquanto resposta a um Tu, enquanto responsabilidade perante e por um Tu. O Tu tem, assim, uma primazia absoluta sobre o Eu; o cogito é já um derivado. A proximi-dade, o contacto com Outrem não é “fusão” entre o Eu e o Outro, antes pressupõe quer a não anulação da alteridade do Outro quer a não supressão do Eu no Outro (Lévinas, 1990:137).

Se a proximidade é “fruir e sofrer pelo ou-tro” (Lévinas, 1990:144), vulnerabilidade e passividade, então “o acto de falar é passivi-dade da passivipassivi-dade”, já que implica “a ve-racidade e a sinceridade que a troca de in-formações – interpretação e descodificação de signos – já supõe” (Lévinas, 1990:147-148). E se é verdade que “a sensibilidade, o sentido enquanto tal, provém do rosto do Outro”, este é, essencialmente, palavra, um rosto que fala mesmo antes de falar (Lévi-nas, 1995:135).34 Compreende-se assim que o que está em jogo, no aceder ao rosto do outro, não é o olhar. Mesmo quando este está em jogo, ele é um olhar “no sentido de, por assim dizer, escutar o rosto” (Lévi-nas, 1995:136); o contacto, a proximidade - o tacto - torna-se ouvido.35 Mas este

fa-34 “Diz-se ‘Bom dia’ antes de se falar um com o outro; é a saudação que provoca esta abertura a. Num certo sentido, o pensamento, o próprio cogito, é sem-pre palavra. Não se trata, aqui, da questão psicológica de saber se pode haver um pensamento sem palavra. Mesmo se isso existe, a pensamento quer ser palavra. E, falando (dirigindo-lhe a palavra) já se encontrou o Outro.” (Lévinas, 1995:135).

35 Assim, observa Bailhache, “contestando o

pri-lar não é uma relação simétrica, entre o um Eu e um Tu, como o pretende Martin Bu-ber (Lévinas, 1995: 142); o Outro – a sua fala – “afirma-se como mandamento” que é “um apelo à responsabilidade”, “que exige não apenas uma resposta mas responsabili-dade” (Lévinas, 1995:137). E responsabi-lidade porque a relação com o Outro “tem como ponto de partida a sua fraqueza. Ela consiste em ser tocado pelo seu ser-exposto-à-morte” (Lévinas, 1995:137).36 Ora, isso é precisamente aquilo a que a tradição, teoló-gica e não só, chama a misericórdia37. É essa

vilégio concedido à visão na nossa tradição, Lévinas desperta a voz e, portanto, a escuta. O sujeito é, aqui, um sujeito obediente, determinado primordialmente pelo ouvido.” (Baillache, 1994: 255). Como referi-mos em nota anterior, a ênfase que Aristóteles dá à visão não obsta a que, ao mesmo tempo, considere que, “para a mente, e indirectamente, a audição é a mais importante [de entre a vista e a audição]”, e a que, também indirectamente, “dá o maior contributo para a sabedoria” – na medida em que tem a ver com o discurso, “que é a causa da aprendizagem”. (Aris-tóteles, 436b-437a, 1995a: 217-9).

36 Uma das melhores ilustrações literárias desta fórmula de Lévinas – mas, ao mesmo tempo, da sua terrível falibilidade em termos práticos - é, sem dú-vida, o seguinte passo de Primo Levi: “A presença, ao vosso lado, de um companheiro mais fraco, ou mais inerme, ou mais velho, ou demasiado jovem, que vos obceca com os seus pedidos de ajuda, ou com o seu simples ‘estar-aí’ que é já, por si próprio, uma súplica, é uma característica da vida no Lager. O pedido de so-lidariedade, de uma palavra humana, de um conselho, tão-só de uma escuta, era persistente e universal, mas satisfeito muito raramente” (Primo Levi, I Sommersi

e i Salvati, apud Ciaramelli, 1989: 28).

37 Cujo sentido S. Tomás de Aquino esclarece da seguinte forma: “‘A misericórdia, diz Santo Agosti-nho, é a compaixão que o nosso coração experimenta em face da miséria de outrem, sentimento que nos im-pele a vir em sua ajuda se o pudermos fazer.’ A pa-lavra misericórdia significa, com efeito, um coração tornado miserável pela miséria de outrem. Ora a mi-séria é o oposto da felicidade (...)” (Aquino, 1997: 2a

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“misericórdia pelo Outro” que, no entender de Lévinas, constitui precisamente o Bem (Lévinas, 1995: 143) – que Platão, tantas ve-zes citado por Lévinas, coloca para além do ser, no limite do mundo inteligível.

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Alguns paradoxos levinasianos

A descrição levinasiana da sensibilidade não é, certamente, isenta de paradoxos. Retere-mos, nesta conclusão, os três que nos pare-cem mais decisivos.

O primeiro, e talvez o maior deles todos, é o de tentar dizer, em linguagem que já é da cultura e da sociedade, uma sensibilidade e uma relação com o Outro que estão antes da linguagem, da cultura e da sociedade. A metáfora, a alegoria, a hipérbole e outros re-cursos estilísticos, mais próprios das lingua-gens poética e religiosa do que da filosófica – pelo menos da forma como a tradição en-tende a filosofia -, representam uma forma de lidar com este paradoxo, intentando que o dizer, mais do que dizer, possa sugerir e dar a entender.

O segundo paradoxo reside no facto de aquilo a que se costuma chamar a “filoso-fia” levinasiana visar, mais do que uma cons-trução, uma destruição - ou “desconstrução” - das categorias, teses e doutrinas filosófi-cas, buscando uma espécie de “grau zero”

Parte da II Parte, Questão 30, Artigo 1). Acrescente-se que S. Tomás considera também que, das virtudes que têm a ver com a nossa relação com o próximo, “em si mesma, a misericórdia é a maior das virtudes, pois que lhe é próprio dar aos outros e, mais impor-tante ainda, aliviar a sua indigência, o que é eminente-mente próprio de um ser superior. Assim, mostrar-se misericordioso é olhado como próprio de Deus, e é por aí que, sobretudo, se manifesta o Ele ser todo po-deroso” (Ibidem, Artigo 4).

do pensamento, de um pensamento “do exte-rior”, que permita, enfim, dar a pensar aquilo que está antes e depois – mas não dentro - do próprio pensamento.

O terceiro e último paradoxo tem a ver com o ponto de chegada da descrição levi-nasiana da sensibilidade - a ética como “filo-sofia primeira”. Com efeito, esta não é uma ética no sentido kantiano do termo - não pro-cura responder à questão “que devo fazer?” -, sendo antes uma ética que, enquanto aber-tura ao Outro como Outro, se situa antes da ética, no ponto em que se decide se se quer ou não ser ético. O paradoxo reside, aqui, no facto de um projecto profundamente ético revelar, de forma clara, a incerteza, a fragi-lidade e, porque não dizê-lo, a

improbabili-dade, de toda a ética.

Mas é o carácter paradoxal de um pen-samento um sinal da sua fraqueza? Pelo contrário; diríamos mesmo que a força de um pensamento se mede, precisamente, pe-los paradoxos que se revela capaz de supor-tar. Pois, como o mostra o desenvolvimento do próprio pensamento lógico-matemático, os paradoxos são, por via de regra, pontos de ruptura que, obrigando o homem a pensar-se a si próprio, o levam a um aprofundamento da sua própria humanidade. Talvez resida aí, precisamente, o fascínio que, leitura após lei-tura, a obra de Lévinas nunca deixa de susci-tar.

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Referências

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