• Nenhum resultado encontrado

Efeitos indiretos da migração: a segunda geração de bolivianos na RMSP1

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Efeitos indiretos da migração: a segunda geração de bolivianos na RMSP1"

Copied!
15
0
0

Texto

(1)

“Efeitos indiretos da migração: a segunda geração de bolivianos na RMSP

1

Gabriela C. de Oliveira

Palavras-chaves: filhos de imigrantes; segunda geração; imigração; bolivianos.

“Efeitos indiretos da migração: a segunda geração de bolivianos na RMSP”

1

Trabalho apresentado no XVIII Encontro Nacional de Estudos Populacionais, ABEP, realizado em Águas de Lindóia/SP – Brasil, de 19 a 23 de novembro de 2012.

Doutoranda em Demografia pelo Instituto de Filosofia e Ciências Humanas/IFCH da Universidade Estadual de Campinas/Unicamp – Campinas/SP/Brasil. Estudo realizado no âmbito do projeto de mestrado FAPESP: A segunda geração de latino-americanos na RMSP de São Paulo. Email: gabi.co@hotmail.com

(2)

Gabriela Camargo de Oliveira Rosana Baeninger

Desde os anos 1950, São Paulo passou a receber fluxos imigratórios distintos daqueles vinculados à imigração em massa na virada do século 19 para o século 20 (Levy, 1974; Bassanezi, 1996) e em volumes bem menores. O cenário da imigração internacional paulista, em especial a partir dos anos 70, caracterizou-se por imigrantes provenientes da América Latina – principalmente de países como Argentina, Bolívia, Chile, Paraguai, Peru, Uruguai (Paiva, 2007; Baeninger, 2010).

No caso de São Paulo, Silva (2008) afirma que estes novos processos imigratórios tiveram início a partir da década de 1950, com a entrada de estudantes bolivianos e peruanos que vieram se especializar no país, por meio de acordos bilaterais entre o Brasil e esses países; nas décadas de 1960 e, principalmente, a partir da década de 1970, a imigração intra-regional começaria a se intensificar, tanto por razões políticas quanto por razões econômicas.

Essa mudança no fluxo imigratório pode ser atribuída, entre outras razões, à presença maciça de regimes militares na região e ao bom desenvolvimento da economia brasileira em relação aos outros países da América Latina (Silva, 2008). Esses fluxos imigratórios latino-americanos se destinaram, principalmente, para duas áreas: as regiões de fronteiras e as regiões metropolitanas (Patarra, 2002), em especial São Paulo e Rio de Janeiro.

A criação do Mercosul, aliado a outros fatores, foi fundamental para o incremento da imigração de latino-americanos para o Brasil. No período de 1990 a 2000, o Mercosul Ampliado correspondeu a 40% dos imigrantes internacionais legais que chegaram ao Brasil (Patarra e Baeninger, 2005). Em 1991, o Brasil apresentava 1,1 milhões de estrangeiros, que correspondiam a 6,2% da população total. A América do Sul foi responsável por 44% do total de estrangeiros no Brasil, de acordo com o Censo de 1991, e o estado de São Paulo foi o principal receptor de imigrantes, principalmente os latino-americanos (Antico, 1998).

No país em seu conjunto, e especialmente no contexto paulista, houve um aumento do fluxo de imigrantes latino-americanos a partir dos anos 70 e desde então o fluxo vem aumentando (Paiva, 2007). Embora São Paulo receba imigrantes provenientes de todo o mundo e principalmente da América Latina, o maior fluxo de entrada é de bolivianos. Para Silva (2008), a maior parte dos imigrantes latino-americanos em São Paulo veio com o objetivo de trabalhar nos ramos de confecções, comércio e serviços.

Embora as estimativas sobre o volume de imigrantes residentes em São Paulo venham aumentando ao longo dos anos, os dados da Polícia Federal e do Ministério do Trabalho demonstram uma diminuição nos pedidos de autorização de trabalho, o que evidencia o aumento dos estrangeiros indocumentados (Baeninger, Leoncy, 2001).

Independente das diferenças entre os números oficiais e os estimados, é fato que a comunidade boliviana na Região Metropolitana de São Paulo é grande e vem crescendo cada vez mais, demonstrando um movimento imigratório de fluxo constante. Comunidade essa que se estabeleceu ao longo dos últimos 40 anos e é presença marcante nos bairros centrais da cidade de São Paulo (Projeto URB-AL, 2007).

(3)

Destaca-se também que o movimento recente dessa imigração indica o incremento de retorno aos países de origem, porém como elemento de espaço de vida (Courgeau, 1985); nesse sentido, os imigrantes bolivianos têm construído parte de suas vidas em São Paulo, permanecendo, indo e voltando e constituindo famílias e filhos no Brasil. Filhos estes que nos levam a problemática da chamada ‘segunda geração de imigrantes’.

A segunda geração: definições conceituais

A segunda geração pode ser definida como a geração de filhos dos imigrantes adultos, que nasceram ou chegaram ainda novos ao país receptor. Conforme definido por Waters, Kasinitz, Mollenkopf (2004),

“[…] a segunda geração – e a geração 1.5 – gerações imigrantes... ou seja, pessoas cujos pais são imigrantes, mas eles mesmos eram nascidos ou foram substancialmente criados nos Estados Unidos”2

Portes (1996), no seu estudo sobre imigrantes latino-americanos nos Estados Unidos da América, distingue três categorias. As “crianças imigrantes” seriam jovens que nasceram no exterior, mas que imigraram para os Estados Unidos logo após a infância para serem criados no país; as “crianças de imigrantes” – a segunda geração – inclui as crianças de pais imigrantes que nasceram no país receptor, bem como as crianças que nasceram no exterior e que imigraram ainda bem novos, também chamados de geração 1.5; e as crianças nativas de pais nativos, ou seja, as crianças que nasceram nos Estados Unidos da América e eram filhos de norte-americanos. Segundo o autor,

(KAZINITZ; MOLLENKOPF; WATERS, 2004, p. 1)

“[…] três categorias distintas: crianças imigrantes, crianças de imigrantes e crianças nativas de pais nativos. A primeira categoria inclui jovens que nasceram no exterior e vieram para os Estados Unidos após a infância para serem criados aqui. A segunda inclui as crianças nascidas nos Estados Unidos de pais imigrantes e as crianças nascidas no exterior mas que vieram ainda muito novos (algumas vezes chamados de geração 1.5). A terceira categoria, crianças nativas de pais nativos, representam a vasta maioria do total da população e da população adolescente.”3

Portes et alli (2008) consideram a segunda geração de imigrantes em seus estudos, pois (PORTES, 1996, p. ix)

2

Tradução livre do trecho: “(...) second- and ‘1.5’ – generation immigrants... that is, people whose parents were

immigrants but who themselves were born or substantially raised in United States.” (KAZINITZ; MOLLENKOPF;

WATERS, 2004, p. 1) 3

Tradução livre da autora: “(...) three distinct categories: immigrant children, children of immigrants, and

native-born children of native parentage. The first category includes youth who are native-born abroad and come to the United States after early infancy to be raised here. The second includes native-born children of immigrant parents and children born abroad who came at very early age (sometimes called the 1.5 generation). The third, native-born children of native parentage, represents the vest majority of both the total and adolescent populations.” (PORTES,

(4)

“O motivo que nos levou a voltar nossa atenção para os filhos foi a constatação de que os efeitos de longo prazo da imigração na sociedade norte-americana seriam determinados menos pela primeira do que pela segunda geração...” (PORTES, HALLES, FERNANDEZ-KELLY, 2008, p. 13)

Para esses autores, os imigrantes de primeira geração seriam flutuantes, ora no país receptor ora no país de origem, estariam na sociedade, mas não fariam parte dela; já os filhos desses imigrantes ficariam no país, como cidadãos. Além disso, seria a segunda geração que a determinar a manutenção ou não de práticas culturais originárias. Portanto, estudar a segunda geração de imigrantes seria tão importante quanto estudar a primeira geração. Ademais, seria preciso compreender como a segunda geração tem se inserido na sociedade receptora e que relações mantêm com a comunidade local para entender os efeitos da imigração para a sociedade. Portes et all (2008, p.13) afirmam

“Imigrantes de primeira geração sempre foram um grupo muito flutuante, hoje aqui e amanhã já de partida, na sociedade, porém não ainda parte dela. Em contraste, seus filhos nascidos e criados nos Estados Unidos estão nesse país, sem a menor dúvida, para ficar e, como cidadãos, estão inteiramente habilitados a ter ‘voz’ no sistema político norte-americano (no sentido do termo utilizado em Hirschman [1970]). Portanto, o decurso de sua adaptação determinará, mais do que outros fatores, no longo prazo, o destino dos grupos étnicos gerado pelos imigrantes de hoje.”

Além disso, segundo Portes et alli (2008), seria preciso entender o processo de assimilação da segunda geração de imigrantes na sociedade receptora. Para os autores, no caso dos Estados Unidos da América a hipótese da assimilação uniforme não se aplicaria totalmente a “nova segunda geração”4

“(...) a imagem de uma trajetória de assimilação uniforme não dava conta do que efetivamente estava ocorrendo. Em vez disso, o processo havia se tornado segmentado em vários percursos distintos, alguns levando a trajetórias ascendentes, outros, a trajetórias descendentes.” (Portes, Halles, Fernandez-Kelly, 2008, p. 14)

, uma vez que a assimilação não estaria ocorrendo nos mesmos moldes da assimilação das correntes imigratórias anteriores. Logo, teria havido mudanças nas formas de assimilação desde os primeiros estudos sobre assimilação de imigrantes e ao contrário do aconteceu com a segunda geração de imigrantes do pós- Primeira e Segunda Guerra Mundial, a “nova segunda geração” não estaria sendo assimilada ao mainstream de forma uniforme como foi a segunda geração do fluxo imigratório europeu.

Segundo os autores, esse fato se deve a uma variedade de fatores na sociedade que são diferentes hoje do que eram anteriormente e as diferenças étnico-culturais dos novos imigrantes. Fatores como o contexto social da sociedade receptora, composição familiar, preconceito, barreiras educacionais, características fenotípicas, políticas públicas para imigrantes e outros, fazem que a assimilação ocorra de forma “segmentada”.

A “assimilação segmentada” (Kazinitz, Mollenkopf; Waters, 2004) pode ser definida como assimilação em alguns setores específicos da sociedade, como em setores minoritários e não em sua totalidade.

4

O termo “nova segunda geração” se refere à segunda geração do fluxo migratório pós-1965 para os Estados Unidos, que é predominantemente latino e asiático. Diferenciando-se do termo segunda geração, muitas vezes associado ao fluxo imigratório europeu do começo do século 20 para os Estados Unidos.

(5)

“(…) Assimilação segmentada descreve os vários resultados de diferentes grupos de jovens de segunda geração e argumenta que o modo de incorporação da primeira geração é responsável pelos diferentes acessos da segunda geração as oportunidades e redes sociais.” 5

“Ao em vez da uniformidade relativa da sociedade, que ditam os caminhos comuns de integração por meio dos costumes e preconceitos, hoje em dia nós observamos diversas formas de adaptação. Uma delas replica o retrato honorável do crescimento da aculturação e da paralela integração dentro da classe média branca; a segunda leva diretamente para o caminho oposto em direção a pobreza permanente e assimilação nos segmentos minoritários da sociedade; ainda, a terceira associa rápido avanço econômico com preservação deliberada dos valores e laços de solidariedade da comunidade imigrante”.

(Kaninitz; Mollenkopf; Waters, 2004, p. 7)

6

Para Porte e Zhou (2005), a “nova segunda geração” estaria vivendo um conflito de adaptação tanto de ordem cultural como social; entre a pressão dos pais para que mantenham laços fortes com a comunidade étnica e os desafios de ingressar num mundo não-familiar e frequentemente hostil. Segundo os autores, as condições econômicas e sociais na época dos fluxos imigratórios do pós-Primeira e Segunda Guerra Mundial eram bem diferentes das confrontadas pelos imigrantes atuais. Esse processo, nos EUA, teria deixado para os novos imigrantes uma lacuna entre as atividades de baixa remuneração geralmente exercida por eles e as atividades profissionais bem remuneradas que requerem ensino superior, geralmente exercida pelas elites nativas (Portes e Zhou, 2005).

(Portes; Zhou, 2005, p. 90)

Portanto, hoje, os novos imigrantes teriam menos chances de mobilidade na sociedade receptora dos que tinham os imigrantes dos fluxos anteriores. Esse fator, associado a outros, como preconceito e falta de oportunidades educacionais, poderiam estar resultando em uma “assimilação descendente”, ou seja, nos grupos minoritários do mainstream, dentro das subculturas; ao contrário ao que ocorreu aos descendentes dos imigrantes europeus tiveram uma “assimilação ascendente”. Mas segundo Portes e Zhou (2005) na realidade a situação ainda não se tornou tão polarizada, logo, seria possível observar a assimilação em diversos segmentos da sociedade. Mas mesmo assim seria necessário compreender as trajetórias que resultam em assimilações tão distintas, compreender como e o porquê dessas distintas assimilações para entender os resultados da integração da segunda geração na sociedade receptora.

No Brasil, também temos uma “nova segunda geração”, ou seja, os descendentes da nova corrente imigratória recente para o país. Mas apesar de muitos estudos (Silva, 2008; Paiva, 2007) já terem sido realizados sobre a primeira geração desses imigrantes, pouco se conhece sobre a realidade da segunda geração. No entanto, conhecer a segunda geração de imigrantes se faz importante para a compreensão do fenômeno migratório em suas diversas faces e suas consequências a longo prazo para a sociedade receptora.

5 Tradução livre da autora: “(...) segmented assimilation describes the various outcomes of different groups of second-generation youth and argues that the mode of incorporation for the first generation gives the second generation access to different types of opportunities and social networks” (KAZINITZ; MOLLENKOPF; WATERS, 2004, p. 7)

6

Tradução livre da autora: “Instead of a relatively uniform mainstream whose mores and prejudice dictate a common path of integration, we observe today several distinct forms of adaptation. One of the replicates the time-honored portrayal of growing acculturation and parallel integration into the white middle-class; a second leads straight in the opposite direction to permanent poverty and assimilation into the underclass; still a third associates rapid economic advancement with deliberate preservation of immigrant community’s values and tight solidarity” (PORTES; ZHOU, 2005, p. 90)

(6)

Segunda Geração: o caso paulista

No Brasil, também temos uma “nova segunda geração”, ou seja, os descendentes da nova corrente imigratória de latino-americanos para o país. Mas apesar de muitos estudos (Silva, 2008; Paiva, 2007) já terem sido realizados sobre a primeira geração desses imigrantes, pouco se conhece sobre a realidade da segunda geração. O fluxo imigratório latino-americano para o São Paulo data de pelo menos 40 anos atrás e um contingente expressivo de famílias imigrantes se formou na Região Metropolitana de São Paulo, fato associado ao próprio fenômeno migratório em si, ao processo de reunificação familiar e formação de novas famílias.

Na Região Metropolitana de São Paulo, a segunda geração da corrente imigratória de bolivianos para o país é presença marcante nas regiões centrais da cidade de São Paulo, principalmente nas escolas públicas. Apesar disso, pouco se sabe sobre essas crianças e adolescentes, tanto em termo quantitativos como em termos qualitativos. Assim como para a primeira geração, a qual o exato número de estrangeiros bolivianos na Região Metropolitana de São Paulo ainda permanece desconhecido e divergente entre as fontes oficiais e as provenientes de instituições de apoio aos migrantes, para a segunda geração o cenário é bastante parecido. Decorrente disso, a mensuração do tamanho da segunda geração também se faz ainda mais difícil, resultado tanto da indocumentação característica do fluxo, como falta de dados confiáveis a respeito do volume do grupo. Fato ainda mais agravado, uma vez que parte da segunda geração é brasileira, e, portanto, nas fontes oficiais são consideradas como tal, mascarando a origem familiar estrangeira.

No entanto, apesar da pouca visibilidade da comunidade boliviana na metrópole paulista, a formação da segunda geração de imigrantes latino-americanos pode ser observada a partir das análises dos micro-dados do Censo Demográfico. Portanto o objetivo desse trabalho é demonstrar e descrever a presença da segunda geração boliviana na Região Metropolitana de São Paulo, a partir dos dados do Censo Demográfico 2010.

Metodologia

Com objetivo de observar a presença da segunda geração bolivianos na RMSP, a metodologia adotada foi a análise dos micro-dados do Censo Demográfico 20107

A seleção dessas pessoas no banco de dados foi realizada a partir da variável “responsável pelo domicílio” ou “cônjuge”, logo, os indivíduos que residiam em domicílios que tinham como responsável ou cônjuge uma pessoa de origem boliviana. Portanto, as análises aqui realizadas são respectivas às pessoas . Para análise dessa segunda geração foi realizada a reconstituição domiciliar desses imigrantes com o objetivo de captar, a partir do Censo Demográfico 2010, os domicílios com presenças de filhos nascidos no país estrangeiro e filhos nascidos no Brasil. Para tanto as gerações foram diferenciadas em primeira geração, para estrangeiros que chegaram já adultos no Brasil e segunda geração para estrangeiros que chegaram ainda crianças ou adolescentes – geração 1.5 – ou pessoas que nasceram no Brasil mais tinham ao menos um dos pais de nacionalidade boliviana (a mesma adotada por Portes [1996] e Kanzintz, Mollenkopf, Waters [2004]).

7

(7)

que foram declaradas nos domicílios que tinha como responsável ou cônjuge uma pessoa de nacionalidade boliviana e apenas esses domicílios. Excluindo, portanto, os bolivianos que residiam em domicílios que não tinham como responsável ou cônjuge uma pessoa de nacionalidade boliviana. Nessa seleção foi possível captar nos domicílios selecionados 96,5% dos indivíduos bolivianos presentes no Censo Demográfico 2010 para Região Metropolitana de São Paulo.

Para a análise da segunda geração, os indivíduos presentes nos domicílios foram separados também por sua relação com o responsável pelo domicílio, sendo, portanto considerados como segunda geração os indivíduos que foram declarados como filhos ou enteados. Dentre a segunda geração, os indivíduos foram diferenciados entre a geração 1.5 e a segunda geração de fato. A segunda geração corresponde às pessoas de nacionalidade brasileira e que tinham ao menos um dos pais de origem boliviana, independente da idade; enquanto a geração 1.5 corresponde às pessoas declaradas como filho ou enteado e que chegaram ao Brasil com 17 anos ou menos. Os estrangeiros bolivianos que chegaram com 18 anos ou mais foram considerados como considerados como primeira geração. Essa separação foi possível ser realizada pela intersecção entre a variável “ano de chegada ao Brasil” e “idade declarada em anos”.

Portanto, a partir da reconstituição dos domicílios que tinham como responsável ou cônjuge uma pessoa de nacionalidade boliviana foi possível observar a presença da segunda geração e suas características. Mas, é preciso levar em consideração que o volume e as informações sobre a segunda geração de bolivianos são aquelas presentes nos domicílios captados a partir desse recorte e, portanto, ainda residiam nesses domicílios e não da totalidade da segunda geração. Ademais também é preciso levar em consideração as restrições da própria fonte de dados, o Censo Demográfico. O Censo Demográfico não capta a totalidade dos imigrantes, tanto em decorrência da indocumentação como também uma vez que uma coorte migratória não pode ser captada pelo Censo correspondente ao período de sua entrada no país e sim no Censo Demográfico seguinte.

Primeiras análises

Ao analisarmos as informações das pessoas presentes nos domicílios que tinham como responsável ou cônjuge uma pessoa de nacionalidade boliviana8 podemos observar a presença de 37.855 pessoas para o ano de 2010, ou seja, quase o dobro de indivíduos captados em 2000, no qual foi possível observar a presença de 18.156, conforme podemos observar no gráfico um a seguir. Destas 37.885 pessoas presentes nos domicílios selecionados, 68% eram estrangeiros e 32% eram brasileiros; enquanto para o ano de 2000, 49% dos indivíduos eram estrangeiros. Demonstrando que os domicílios de origem boliviana em 2010 eram compostos majoritariamente por estrangeiros, diferentemente da situação para o ano de 2000 quando os domicílios estavam igualitariamente distribuídos entre brasileiros e estrangeiros. Além disso, podemos observar que a segunda geração compunha 31,5% dos domicílios para o ano de 2010. No entanto, embora em 2010 a segunda geração ainda componha parte significativa da composição do domicílio, seu peso relativo é menor quando comparado ao ano de 2000, no qual a segunda geração compunha 40,7% do domicílio.

8

(8)

Gráfico 1

População presente nos domicílios com responsável ou cônjuge de origem boliviana RMSP

2000/2010

Fonte: Fundação IBGE, Censos Demográficos 2000 e 2010 – Amostra expandida – tabulações especiais.

Em relação a segunda geração, para o ano de 2000, na Região Metropolitana de São Paulo, foi possível observar a presença 7.382 filhos/enteados nos domicílios de origem boliviana; destes, 7.301 eram da segunda geração e 81 eram da primeira geração. Dentre os 7.301, 6.266 eram brasileiros e 1.035 estrangeiros. Para o ano de 2010, foi possível observar a presença de 11.945 filhos/enteados9 nos domicílios, destes 11.852 eram da segunda geração e 93 da primeira geração. Dentre os indivíduos da segunda geração, 8607 eram brasileiros e 3245 eram estrangeiros, conforme é possível observar no gráfico 2.

Gráfico 2

Segunda geração presente nos domicílios com responsável ou cônjuge de origem boliviana RMSP

2000/2010

9

Com objetivo de compatibilizar os dados do Censo Demográfico 2000 e 2010 as categorias filho (a) do responsável e do cônjuge, filho (a) somente do responsável e enteado – relacionadas à variável relação com o responsável pelo domicílio – foram agrupadas em filhos/enteados.

(9)

Fonte: Fundação IBGE, Censos Demográficos 2000 e 2010 – Amostra expandida – tabulações especiais.

Dentre a segunda geração de bolivianos a idade média para o ano de 2010 foi de 9,9 anos enquanto para 2000 foi de 12,4 anos. Demonstrando que a maior parte da segunda geração ainda era composta de crianças tanto em 2000 como em 2010. Crianças essas em idade escolar, que podem ou não estar inseridas no sistema de ensino.

Conforme podemos observar no gráfico 3, para o ano de 2000, 23% da segunda geração nunca tinha frequentado escola ou creche, 17,9% não frequentava a escola, mas já tinha frequentado e 59,1% cursava escola ou creche; já para o ano de 2010, 60,3% frequentava a escola ou creche enquanto 13,7% não frequentava mas já tinha frequentado e 23% nunca tinha frequentado. Dentre os frequentavam a escola 80% estavam na rede pública em 2010 enquanto 61% para o ano de 2000; demonstrando um aumento da presença da segunda geração de bolivianos nas escolas públicas.

Gráfico 3

Segunda geração segundo inserção na rede de ensino RMSP

(10)

Fonte: Fundação IBGE, Censos Demográficos 2000 e 2010 – Amostra expandida – tabulações especiais.

Em relação à série de ensino no qual a segunda geração estava inserida é possível observar tanto para o ano de 2010 como para o ano de 2000, a inserção é bastante similar embora o volume seja diferente. Logo tanto para o ano de 2010 como para o ano de 2000 a maioria da segunda geração de bolivianos frequentava o ensino fundamental, seguindo em volume significativamente menor pela pré-escola, ensino médio e creche, conforme podemos observar no gráfico 5. Além disso, é possível observar que 6% frequentava o ensino superior em 2000, enquanto 3,6% em 2010. No entanto, é preciso ressaltar que inserção na série de ensino da segunda geração de bolivianos está estritamente ligada à estrutura etária da mesma, logo, a distribuição por série é resultado dessa estrutura.

Gráfico 4

Segunda geração segundo inserção na rede de ensino RMSP

(11)

Fonte: Fundação IBGE, Censos Demográficos 2000 e 2010 – Amostra expandida – tabulações especiais.

Observadas algumas particularidades da segunda geração de bolivianos na Região Metropolitana de São Paulo, outra importante característica a ser observada é sua estrutura etária da segunda geração e a estrutura etária do domicílio. Analisar a estrutura etária é importante não apenas porque possibilita observar a evolução da população ao longo de mais de 70 anos, não somente porque possibilita constatar a presença e o fluxo dos imigrantes, mas principalmente porque a partir da estrutura etária podemos observar a dinâmica das trajetórias, o ciclo de vida das famílias e a formação, ao longo de pelo menos duas décadas da segunda geração de migrantes. Portanto, observar a estrutura etária do domicílio é fundamental porque possibilita ir além de entender a dinâmica da evolução etária da população imigrante em si, a primeira geração, mas compreender a reprodução do grupo em questão e sua perpetuação por meio das novas gerações, considerando o grupo como um todo e não em sua parte. Logo, se faz fundamental para o entendimento da segunda geração.

Gráfico 5

População presente nos domicílios com responsável ou cônjuge de origem boliviana, segundo sexo e idade

(12)

2010

Fonte: Fundação IBGE, Censos Demográficos 2000 e 2010 – Amostra expandida – tabulações especiais.

Ao analisarmos a estrutura etária da população residente em domicílios com responsável ou cônjuge ao menos uma pessoa de nacionalidade boliviana em Região Metropolitana de São Paulo, é possível observar uma estrutura com grande volume de adultos e volume reduzido de crianças e idosos, característica de uma pirâmide etária de uma população migrante de fluxo recente, embora o fluxo boliviano para o São Paulo tenha se intensificado a partir dos anos 70. No entanto, ao observarmos a estrutura etária das gerações em conjunto, é possível observar uma pirâmide etária com uma presença significativa de crianças e jovens, sendo a segunda geração responsável por compor a maior parte da base da pirâmide até os 15 anos e metade das pessoas na faixa etária de 15 a 19 anos. Sendo, portanto, a segunda geração responsável por grande parte da manutenção da base da pirâmide etária nos domicílios de origem boliviana. Logo, é possível constatar a importância de entender melhor a segunda geração ao analisarmos o fluxo migratório boliviano para São Paulo.

(13)

Esse artigo teve como objetivo principal demonstrar a importância da presença da segunda geração de bolivianos na Região Metropolitana de São Paulo e para tal buscou descrever o volume e a composição do grupo em questão a partir dos dados do Censo Demográfico de 2010.

Logo, ao levarmos em conta a questão dos filhos dos imigrantes, ou seja, não apenas a geração 1.5 mas também a segunda geração podemos observar que o volume da população de imigrantes bolivianos mencionada foi grandemente ampliado, demonstrando a importância da segunda geração para entender a dinâmica do grupo em questão. Portanto, podemos perceber que ao restringirmos os estudos migratórios apenas as questões relacionadas à primeira geração, empobrecemos o entendimento das comunidades migrantes e do fenômeno migratório em si.

Ademais, ao analisarmos a estrutura etária dessa população foi possível observar, no geral, para toda a primeira geração uma estrutura etária adulta com pequena presença de crianças e jovens. No entanto, ao observamos a estrutura etária da primeira e segunda geração em conjunto foi possível notar um rejuvenescimento da estrutura, com importante presença de crianças e jovens. Demonstrando assim a importância da segunda geração ao analisarmos as populações imigrantes na Região Metropolitana de São Paulo e na composição desses domicílios. Evidenciando que para além dos impactos da primeira geração de bolivianos em São Paulo, também devemos buscar entender a questão de um ponto de vista mais amplo, levando em consideração ambas as gerações.

Além disso, outra questão a ser pensada é a questão da integração dessas crianças e adolescentes na sociedade receptora, no caso São Paulo. Supondo que a maior parte dessas crianças não retorne ao país de origem, elas realizarão sua socialização no Brasil. Todavia, por se tratar de uma população de origem estrangeira, principalmente em relações as raízes culturais e embora a maior parte tenha nacionalidade brasileira, estas crianças e adolescentes poderão enfrentar problemas de inserção na sociedade brasileira. Problemas esses que merecem devida atenção tanto por parte dos estudos migratórios, como por parte das ações de políticas públicas.

Independentemente dos motivos pelos quais essas crianças e adolescentes migram com suas famílias para o Brasil, fato é que elas são presença marcante nas escolas de São Paulo. Isto nos leva a pensar que a questão imigratória vai muito além de se compreender a inserção dos imigrantes em si, mas também a integração de seus descendentes brasileiros e bem como as consequências dessa imigração para a sociedade brasileira.

Referências Bibliográficas

ANTICO, C. “Imigração internacional no Brasil durante a década de 80: explorando alguns dados do Censo de 1991”. In: Anais XI Encontro Nacional de Estudos de População da ABEP, 1998, Caxambu: ABEP, 1998.

BAENINGER, R.; LEONCY, C. “Perfil dos estrangeiros no Brasil segundo autorizações de trabalho (Ministério do Trabalho e Emprego) e registro de entradas e saídas na polícia federal” In: CNPD. Migrações internacionais – Contribuições para políticas. Brasília, DF: 2001. p. 187-242.

(14)

BASSANEZI, M. S. C. B. “Imigrações internacionais no Brasil: um panorama histórico”. In: PATARRA, N. Emigração e imigração internacionais no Brasil contemporâneo. São Paulo: FNUAP/NESUR/NEPO, 1996.

BATISTA JR, P. N. A América do Sul em movimento. Revista de Economia Política, vol. 28, nº 2 (110), pp. 226-238 abril-junho/2008.

CYMBALISTA, R.; XAVIER, I. R. A comunidade boliviana em São Paulo: definindo padrões de territorialidade. São Paulo: ANPOCS, 2007. (Paper Anpocs).

COURGEAU, D. “Interaction between spatial mobility, family and career life cycle: A French survey”. Sociological Review 1: 2. 139-162, 1985.

DOMENACH, H.; PICOUET, M. Les migrations. Paris: Presses Universitaires de France, 1995.

______. El caráter de reversibilidad en el estudio de la. migración. Notas de Población, Santiago de Chile, CELADE, n.49, 1990.

FAZITO, D. Análise de Redes Sociais e a Migração: Mito e realidade. Anais Encontro Nacional de Estudos Populacionais. ABEP, Ouro Preto, 2002.

FAUSTO, B. Historiografia da imigração para São Paulo. São Paulo: Editora Sumaré: FAPESP, 1991. FIORI, José L. “Ajustes e milagres latino-americanos” In: Os Moedeiros Falsos. Rio de Janeiro: Petrópolis, 1997.

PROJETO URB-AL rede 10. A imigração na cidade de São Paulo: integração dos imigrantes como forma de combate à pobreza. Prefeitura da cidade de São Paulo, Instituto UNIEMP, Coordenado por KADLUBA, R. F. C. São Paulo, 2007. Disponível na internet em formato PDF. Site:http://www.projetofabrica.com.br/i-migrantes/noticias/imgracao_em_sao_paulo.pdf

Acesso em setembro de 2009.

KASINITZ , P; MOLLENKOPF, J. H.; WATERS, M. C. “Worlds of the second generation” In: KASINITZ , P; MOLLENKOPF, J. H.; WATERS, M. C. Becoming New Yorkers: ethnographies of the new second generation. New York: Russell Sage Foundation, 2004.

MEDEIROS, Carlos A. “Globalização e a inserção internacional diferenciada da Ásia e da América Latina” In: FIORI, J. L., CONCEIÇÃO, M. T. Poder e dinheiro: uma economia política da globalização. Rio de Janeiro: Vozes, 1997.

PAIVA, O. C. “A imigração de latino-americanos para São Paulo (Brasil): dois tempos de uma mesma história.” São Paulo, Pastoral do Imigrante, 2007. Disponível na internet

www.memorialdoimigrante.org.br/arquivos/artigofranca.pdf Acesso em setembro de 2009.

PATARRA, N. L.; BAENINGER, R. Mobilidade espacial da população no Mercosul: metrópoles e fronteiras. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v.21, n.60, fev./2006.

____________ Migrações internacionais de e para o Brasil contemporâneo volumes, fluxos, significados e políticas. São Paulo em perspectiva, v. 19, n. 3, p. 23-33, jul./set. 2005, formato PDF.

PATARRA, N. “Migrações internacionais e integração econômica no cone Sul: notas para discussão” In: SALES, T.; SALLES, M. do R. R. (orgs). Políticas migratórias: América Latina, Brasil e brasileiros no exterior. São Carlos: EdUFSCar, Editora Sumaré, 2002.

PATARRA, N. “Principais fluxos migratórios entre os países da América do Sul ” In: SEMINÁRIO: Migrações na América do Sul. Secretaria de Acompanhamento e Estudos Institucionais, Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. Brasília, 2009. Disponível na internet:

https://sistema.planalto.gov.br/.../exec/.../ApresentacaoProfNeide.pdf Acesso em setembro de 2009.

PORTES, Alejandro. "Preface". In: PORTES, Alejandro. The New Second Generation. New York: Russel Sage Foundation, 1996.

(15)

________________ "Introduction: Immigration and its Aftermath". In: PORTES, Alejandro. The New Second Generation. New York: Russel Sage Foundation, 1996.

PORTES, A.; Zhou, M. “The new second generation: segmented assimilation and its variants” In: SUÁREZ-OROZCO, M; SUÁREZ-OROZCO, C; QIN, D. B. The new immigration: an interdisciplinary reader. New York: Taylor & Francis Group, 2005.

PORTES, A; HALLEY, W; FERNANDEZ-KELLY, P. “Filhos de imigrantes nos Estados Unidos”. Tempo Social – Revista de Sociologia da USP, v. 20, n. 1, São Paulo, 2008.

SILVA, Sidney A. Costurando sonhos: trajetória de um grupo de imigrantes bolivianos em São Paulo. São Paulo: Paulinas, 1997.

_____________ “Latino-americanos em São Paulo: aspectos de sua reprodução social e perspectivas” In: XXII Encontro Anual da ANPOCS, 1998. Caxambu: Anais, 1998.

http://www.anpocs.org.br/encontro/1998/1998.htm Acesso em setembro de 2009.

_____________“Faces da latinidade: Hispano-americanos em São Paulo” In: Textos NEPO 55, Campinas/UNICAMP, 2008.

SALES, T. “A organização dos imigrantes brasileiros em Boston, EUA”. In: São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v.19, n.3, jul./set.2005.

_______________ Brasileiros longe de casa. São Paulo: Cortez, 1999.

SALES, T; LOUREIRO, M. “Imigrantes brasileiros adolescentes e de segunda geração em Massachusetts, EUA.” In: XIV Encontro Nacional de Estudos Populacionais, ABEP, 2004. Caxambu: ABEP, 2004. Formato PDF.

Referências

Documentos relacionados

Após análise e interpretação dos resultados através dos instrumentos de coleta de dados, pôde-se perceber que os procedimentos metodológicos adotados ocasionaram mudanças

O objetivo do curso foi oportunizar aos participantes, um contato direto com as plantas nativas do Cerrado para identificação de espécies com potencial

Triagem da infecção pelo HCV por meio de testes rápidos em indivíduos maiores de 18 meses.. Fonte: Manual Técnico para o Diagnóstico das

De maneira geral, o apoio, a valorização e os investimentos são os fatores que mais contribuem para o crescimento e desenvolvimento do paradesporto nacional,

Capitalismo Sindical” e consiste basicamente em dizer que processos políticos podem ter o seu princípio alterado em detrimento de uma outra classe social. No caso das Primaveras

Tabela 3 - Duração do ciclo após a germinação, produtividade, eficiência no uso da água em cenários climáticos futuros RCP4.5 para o milho semeado em 10 de outubro.. Já para

Segundo Brown (2004), apoiado principalmente no trabalho de Warren e Nisbet (1999), é possível conceber que os indivíduos, quer sejam professores ou estudantes, geralmente

Como prenuncia o próprio título do texto, O pensamento cria, embora fique evidente que aí se trata da relação entre música e artes visuais, não deixamos de notar que o foco