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Análise de redes sociais e as conexões territoriais da migração no Brasil: padrões estruturais da migração interna entre 1980 e 2000

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Análise de redes sociais e as conexões territoriais da migração no Brasil:

padrões estruturais da migração interna entre 1980 e 2000

Fernando Braga1 Dimitri Fazito2

Resumo

A partir da aplicação de modelos da Análise de Redes Sociais (ARS) às matrizes de trocas migratórias entre as microrregiões brasileiras – elaboradas com os dados dos Censos Demográficos de 1980, 1991 e 2000 – foi possível caracterizar estruturalmente um sistema de trocas populacionais entre microrregiões de maneira a identificar padrões estruturais da migração interna entre 1980 e 2000. Os fluxos migratórios entre as microrregiões foram considerados como um indicador das relações sociais duradouras estabelecidas entre os lugares, permitindo uma análise do processo de integração do território brasileiro a partir do acompanhamento da evolução da rede migratória interna ao longo destes trinta anos. Os resultados apontam para uma dinâmica de reestruturação da rede de trocas migratórias no período como um reflexo dos novos processos de integração territorial, no qual as diferentes regiões do país começam a desempenhar novos papéis no contexto da desconcentração produtiva e demográfica e do desenvolvimento fragmentado. Os resultados alcançados mostram que o arcabouço teórico-metodológico da análise de redes sociais oferece um rico instrumental para a descrição das características estruturais de organizações sociais em rede, permitindo avançar na discussão sobre as relações entre migração e desenvolvimento territorial. A visão de que os lugares da migração estão, assim como os migrantes, articulados por redes sociais de natureza variada abre a possibilidade de compreender o processo de expansão do tecido social a luz das conexões visíveis entre os espaços e como um reflexo da interação entre as regiões e os fluxos.

1 Professor do Instituto Federal de Minas Gerais. Doutorando em Demografia pelo Cedeplar/UFMG. 2 Professor adjunto do Cedeplar/UFMG. Doutor em Demografia.

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Análise de redes sociais e as conexões territoriais da migração no Brasil:

padrões estruturais da migração interna entre 1980 e 2000

Fernando Braga Dimitri Fazito

Introdução

Os movimentos internos da população brasileira durante o século XX se estabeleceram como um dos fenômenos sociais indispensáveis nas sucessivas reconfigurações do território nacional, seja na construção ou reconstrução dos espaços econômicos, seja na expansão do tecido social em suas múltiplas representações (manifestações culturais, movimentos sociais, espaços de vida, redes de sociabilidade, etc.). O quase esgotamento dos fluxos internacionais em meados do século, em conjunto com o processo de queda da fecundidade, tornaram os migrantes protagonistas da expansão demográfica e territorial que se manifestava, sobretudo, em duas frentes: a expansão da fronteira agrícola e a rápida metropolização de alguns aglomerados urbanos. Assim, pode-se afirmar que o mapa do Brasil urbano-industrial e moderno sobrepõe-se a uma rede complexa e diversificada de fluxos populacionais, que, acompanhando as macrotendências econômicas, também foi capaz de influenciar o comportamento e traçar os rumos da história recente do país, considerando o poder que tem as migrações de construir vínculos duradouros entre os lugares e entre as pessoas.

Ao longo das últimas décadas muito esforço foi empreendido na tentativa de compreender quais mecanismos sociais atuam para estimular a migração, assim como milhares de páginas foram escritas sobre os determinantes e as conseqüências da gigantesca “diáspora” que foram migrações internas brasileiras durante o século XX. Não obstante, restam campos de análise inexplorados e perguntas sem resposta, fato não surpreendente, já que a migração é um fenômeno dinâmico no tempo e multiescalar no espaço. Prova disto é que, há muito, os autores já abandonaram a tarefa de tentar estabelecer leis gerais que governem o fenômeno migratório, já que os determinantes do mesmo, ainda que semelhantes em muitos aspectos, divirjam em sua natureza ao longo do tempo como resultado da interação entre fatores dinâmicos: sistemas políticos, variáveis demográficas, modo de produção econômico, valores e costumes, entre outros. Quanto ao fator escalar, boa parte das divergências teóricas lida com este aspecto do fenômeno: se o mesmo teria origens no comportamento individual ou então na estrutura social em que as pessoas vivem imersas. Tais elementos são fonte de intermináveis debates em que se vê a ascenção, queda e a insurreição de novas e velhas tendências de pensamento.

Tendo em conta esse efervescente ambiente intelectual no qual interagem perspectivas teóricas opostas e complementares, este trabalho busca estabelecer um diálogo entre o arcabouço teórico e metodológico da Análise de Redes Sociais e a dinâmica das migrações internas no Brasil nas décadas de 1970, 1980 e 1990. A utilização da perspectiva das redes sociais para os estudos migratórios tem ganhando força no cenário acadêmico internacional e brasileiro nos últimos anos, abrindo um campo novo para formulação de hipóteses e aplicação de metodologias. Por uma série de razões que serão debatidas ao longo deste trabalho, a visão de que as migrações internas dão origem a uma rede de relações entre os lugares, que pode ser investigada na sua estrutura e composição, torna-se particularmente útil no estudo dos processos de integração territorial recente no Brasil.

Neste artigo serão conduzidas análises de três redes de relações sociais, construídas a partir dos dados de trocas migratórias entre as microrregiões brasileiras, oriundos dos

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microdados dos Censos Demográficos de 1980, 1991 e 2000. Optou-se, neste trabalho, por concentrar as discussões e análises no aspecto da “coesão” das redes, que compreende um conjunto de conceitos e medidas que descrevem as diferentes formas de conectividade entre os lugares e as “distâncias” que separam os mesmos. Essa breve incursão nos métodos de análise mostrou que a rede migratória brasileira passa por importantes modificações, sendo que a descrição mais precisa dos padrões observáveis pode lançar luz tanto sobre a dinâmica da migração interna como também sobre as perspectivas de conexões entre os lugares.

1) Discussão teórica

1.1) Migração interna e integração territorial no Brasil: velhas e novas questões

A idéia de integração territorial explorada neste trabalho faz referência à existência de conexões duradouras entre os lugares, conexões estas que facilitam o trânsito de informações e recursos em meio ao território. A compressão espaço-temporal produzida pela explosão tecnológica moderna, sem dúvida, criou novas condições de acessibilidade e conectividade entre os lugares, permitindo afirmar que superfície terrestre, na sua sobreposição de esferas naturais, é hoje também recoberta por uma tecnosfera, expressão do que Santos (2001) denomina de meio técnico-científico-informacional. Assim, a integração territorial se faz possível, a princípio, através da existência de objetos técnicos que, ao interligarem os espaços, promovem a mobilidade das pessoas e dos recursos entre os mesmos. Em função disto Santos (2002) ressalta que o conceito moderno de região precisa incorporar a noção de que ela é composta de fixos e fluxos.

A mera existência de objetos técnicos, contudo, não explica de forma independente a necessidade de estabelecer conexões territoriais, sendo necessário considerar as pessoas envolvidas no processo. A intensa discussão recente em torno da flexibilização do conceito de território (Haesbaert, 2004) ainda não consagrou nenhuma idéia de território “desabitado”, dado que as relações que constituiriam qualquer tipo de território flexível são, eminentemente, relações humanas. Neste sentido percebe-se a importância dos movimentos migratórios na compreensão das formas de conexão territorial, já que a razão fundamental da existência destas conexões é interligar as pessoas. Colocar as pessoas em movimento é, então, fator essencial para produzir a integração dos espaços, mesmo em tempos de conexões virtuais.

A história humana está marcada por vários eventos nos quais o desenvolvimento foi o resultado da interação entre comunidades através da migração. Manning (2005) destaca que a migração exerce um poder similar ao da linguagem na difusão de inovações. Os processos de inovação catalisados pela migração mostram-se contínuos no tempo, provocando avanços e recuos na capacidade de convergência das comunidades humanas, ou seja, ao mesmo tempo que a migração integra diferentes comunidades, levando a maior convergência, a inovação e as transformações por ela engendradas aprofundam os processos de diferenciação, fazendo crescer a diversidade cultural e as diferenças no processo de desenvolvimento.

O conjunto de teorias que explicam os determinantes e conseqüências dos movimentos migratórios sempre fizeram menção a essa relação entre a migração e o desenvolvimento. Desde a primeira sistematização, proposta por Ravenstein ao analisar os movimentos da população inglesa durante o século XIX3, que a mobilidade populacional tem sido pensada como um reflexo do processo de diferenciação regional, na sua interação com a

3 O trabalho de Ravenstein (1885) foi o precursor dos estudos científicos sobre a migração. Ao realizar uma minuciosa investigação

empírica das características dos migrantes residentes na Inglaterra com os dados dos Censos Demográficos, o autor enuncia um conjunto de leis gerais que governariam o fenômeno.

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livre decisão e capacidade dos trabalhadores de procurar melhores condições de sobrevivência em outros lugares. A migração moderna é, assim, um pano de fundo do desenvolvimento, sobretudo o desenvolvimento capitalista desigual, podendo operar tanto como causa ou conseqüência do mesmo (Skeldon, 2008).

No caso brasileiro, tanto a migração interna como a migração internacional tiveram papel fundamental na configuração do território nacional e na constituição dos mercados de trabalho urbano e rural ao longo do século XX4. Em fins do século XIX os movimentos de expansão da economia cafeeira e os primeiros surtos industriais cooperaram para o início da integração do mercado nacional que até o momento existia fragmentado em arquipélagos regionais. Neste momento as migrações internas não possuíam grande importância em função das expressivas remessas de imigrantes estrangeiros que vieram para o Brasil até as primeiras décadas do século XX. Não obstante, a migração interna foi um dos vetores mais importantes da reestruturação da economia brasileira da sua base agrário-exportadora para a urbano-industrial. Entre 1960 e 1980 os movimentos das áreas rurais para as cidades envolveram algo em torno de 43 milhões de pessoas. As principais direções dos movimentos obedeceram a concentração espacial do crescimento econômico, ditado pela industrialização no Rio de Janeiro e em São Paulo. A demanda das economias industriais mais importantes do país redistribuíram a população entre estados e regiões, reconfigurando as características da população, que passou a viver predominantemente em cidades de porte médio e grande (Brito, 2006).

A partir dos anos 70 o Brasil começa a dar os primeiros sinais de um processo de desconcentração espacial, irradiado a partir dos centros da Região Sudeste (Diniz, 1993). Neste quadro as migrações internas deixam de ser predominantemente de tipo rural-urbano e os movimentos urbano-urbano crescem até se tornarem predominantes em quase todo o território. Essa alteração no padrão dos movimentos altera também o perfil dos imigrantes, que, na maioria das vezes, eram considerados como um peso negativo para economia em função da baixa qualificação e do volume de movimentos serem maiores que a demanda dos mercados (Matos, 2002).

Assim, fatores associados à reestruturação do espaço econômico nas três últimas décadas do século XX trouxeram um esgotamento ao modelo de migração rural-urbano. Isso não significa, contudo, que os movimentos já foram encerrados, tendo em conta que efeitos de inércia ainda são importantes e os vínculos criados pelas migrações de retorno funcionam como canais permanentes de relação entre lugares historicamente ligados pela migração (Brito, 2006). De fato, os especialistas no tema discutem que a interação entre as velhas e novas tendências da mobilidade populacional vêm estabelecendo os contornos de um novo padrão nas trocas migratórias internas, ou mesmo de novos padrões, já que a característica essencial dos movimentos populacionais na virada do século é a multiplicidade de contextos, como explicam Pacheco e Patarra (1997):

“As características desses movimentos, a partir dos anos 80, justificam a afirmação de estarmos diante de novos padrões migratórios. Ou estar-se-ia diante de resultantes de efeitos conjunturais das oscilações entre momentos de crescimento e momentos de crise e estagnação que se desenrolam ao longo da década passada? Seriam esses efeitos determinados por processos anteriores de desconcentração industrial, os quais, com certa defasagem, influenciaram os novos fluxos? Estariam essas novas características migratórias já refletindo o novo contexto internacional, com perversas conseqüências em níveis crescentes de desemprego, subemprego e informalidade nas relações de

4 Em função da temática aqui trabalhada será conferida especial atenção a migração interna. Não obstante, os fluxos internacionais também

desempenharam papel fundamental na configuração do espaço econômico brasileiro. Entre meados do século XIX até as primeiras décadas do século XX o Brasil participou de um dos maiores movimentos migratórios da história, recebendo principalmente indivíduos de origem Européia e Asiática, que tiveram participação fundamental na estruturação da mão de obra nacional (Balan, 1973; Brito, 1995). Atualmente, a migração internacional ganha novamente destaque no cenário nacional, desde que o Brasil começou a apresentar saldo migratório negativo, enviando milhares de pessoas para as nações desenvolvidas nas duas últimas décadas (Soares, 2002).

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trabalho, reforçada por políticas sócias deficitárias e insuficientes, poderiam ser percebidas e orientadoras de buscas de alternativas distintas para determinados grupos de migrantes? A diversidade de movimentos e de grupos sociais envolvidos poderia estar refletindo, também, a desigualdade social acirrada, influenciando a decisão de “fuga” das metrópoles por parte crescente de setores de classe média? Finalmente, no conjunto – algo semelhante ao que acontece com as demais dimensões da dinâmica demográfica -, também neste caso estar-se-ia frente à concomitância de movimentos típicos de etapas anteriores do desenvolvimento industrial com movimentos típicos da atual fase de internacionalização da economia?” (Pacheco e Patarra, 1997:458)

Assim, a produção científica recente direcionada ao entendimento das migrações internas vem buscando compreender quais elementos seriam determinantes da identificação e explicação destes “novos padrões”. As investigações tratam de temas como: a influência da migração no processo de metropolização (Brito, 2006), mobilidade e fixação nas cidades médias (Rigotti e Campos, 2009), migração e transformações no mundo do trabalho (Ferreira e Matos, 2008), a relação entre migração e o meio ambiente (Hogan, 2005), a mobilidade pendular (Lobo et al, 2008), a circularidade e rotatividade dos movimentos (Baeninger, 2008), entre muitos outros temas.

Neste contexto de reestruturação dos paradigmas dominantes, a Análise de Redes Sociais (ARS) pode contribuir decisivamente para a compreensão dos padrões estruturais que dão forma as redes de relações desenvolvidas pela migração, sejam aquelas construídas entre as pessoas envolvidas nos movimentos, sejam aquelas estabelecidas entre os lugares que recebem ou enviam migrantes. O aparato teórico-metodológico da ARS proporciona uma visão diferenciada dos fenômenos sociais ao focalizar seus recursos analíticos na compreensão das propriedades do conjunto de relações estabelecidas entre os atores nas redes, abrindo novas possibilidades de investigação.

1.2) Análise de Redes Sociais (ARS): possibilidades de investigação

A gênese da sistematização teórica e metodológica da Análise de Redes Sociais não pode ser atribuída a algum grupo específico ou mesmo a um campo do conhecimento. Na verdade, a ARS é o resultado do desenvolvimento de um grande conjunto de tradições de pesquisa, que, ao longo do tempo, foram se entrecruzando até dar origem a um corpo sistemático de teorias e métodos. Não obstante, Scott (1991) ressalta três grandes tradições, fundamentais para a sistematização atual deste campo: i) as análises sociométricas, nos seus trabalhos com pequenos grupos, que produziram importantes avanços metodológicos na teoria dos grafos, em especial os estudos conduzidos na década de 1930, inspirados na “gestalt theory” de Wolfgang Köhler. ii) os pesquisadores de Harvard , também da década de 1930, que exploraram padrões de inter-relação pessoal e a formação de cliques (facções, grupos). iii) os antropólogos de Manchester, que trabalharam em ambas as tendências nos estudos de identificação de estruturas nas relações comunitárias em aldeias e sociedades tribais. O autor ressalta que essas tradições conviveram separadamente até que, nas décadas de 1960 e 1970, consolida-se o modelo contemporâneo de Análise de Redes Sociais através da associação entre a produção destes e de outros grupos.

Assim, a ARS nasce da interação entre desenvolvimentos das ciências exatas - especialmente, a teoria dos grafos e a álgebra de matrizes - e as ciências sociais que buscavam compreender as regularidades estruturais presentes nas relações sociais. Esse diálogo entre os campos de conhecimento tem produzido uma série de novas perspectivas sobre o poder explicativo das conexões entre os indivíduos, os grupos sociais, os lugares, e até mesmo, as tecnologias. Novas linhas de pesquisa vêm se multiplicando nas últimas décadas em decorrência do reconhecimento do potencial explicativo das redes para a compreensão de eventos entrelaçados a dinâmica social: transações econômicas, difusão de

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comportamento, ações solidárias, criminalidade e terrorismo, expansão de doenças, migrações, entre outros (Barabási, 2002).

A ARS tem significado um importante avanço na forma de perceber a organização das sociedades, já que introduz novas formas de compreender uma velha questão. Barabási (2002) ressalta que a capacidade de obter sucesso na disseminação de idéias ou valores em meio às organizações sociais relaciona-se ao quanto os protagonistas são bem sucedidos na exploração do potencial das redes, se os mesmos navegam com facilidade em meio ao conjunto de relações. Isto sugere que o conhecimento da estrutura e da organização das redes sociais pode ser valioso para interagir com as mesmas, explorar o seu potencial ou mesmo planejar o seu desenvolvimento.

Desta forma, estudar as redes demanda um esforço de conhecimento dos elementos que a compõe a fim de que as abordagens não sobrevalorizem algum aspecto já consagrado das análises sociais convencionais. Sobre essa questão, o trabalho de Soares (2002) esclarece que o tratamento dado as redes na maioria dos trabalhos em ciências sociais ainda lida com uma visão “metafórica” das mesmas, já que os estudos contentam-se em sugerir a existência das redes sem, efetivamente, empreender investigações sobre a natureza e composição das mesmas. Essa deficiência seria reflexo da perspectiva de análise adotada, que, ao invés de trabalhar com os componentes básicos de uma rede, ou seja, atores e relações, focaliza as conclusões apenas nos atores e seus atributos individuais.

Os estudos de atributos constituem a forma de abordagem mais comum em meio às ciências sociais. A construção de bancos de dados de atributos, nos quais as observações (linhas) são os atores e as variáveis (colunas) são as características individuais de cada ator já contam com uma longa história de análises estatísticas sobre informações sociais. Esta formatação de dados é particularmente útil porque se adéqua a maioria dos modelos estatísticos já desenvolvidos e mais facilmente cumpre o princípio de independência estatística dos dados, já que permite a exclusão de colunas que sejam altamente correlacionadas com outras. Estudos de atributos individuais permitem sugerir a existência de redes conectando os atores, analisar a hierarquia destas redes através de alguma variável que indique poder de influência dos atores, entre outras possibilidades. Contudo não é possível, através destes bancos de dados, apresentar as redes nos seus diferentes formatos e tirar conclusões sobre os efeitos das regularidades estruturais existentes nas mesmas (Soares, 2002).

Para representar uma rede qualquer, os bancos de dados necessitam ser diferentes deste formato tradicional. Assim, as redes são efetivamente representadas pelos grafos e pelas matrizes. Os grafos são representações geométricas que mostram as conexões a partir de uma projeção das mesmas em um desenho gráfico nos quais uma série de pontos ligam-se por linhas, podendo essas linhas apresentar direção (setas) e/ou intensidade (cor, espessura ou estilo), assim como os pontos também podem representar valores das relações ou mesmo atributos (cor, tamanho, estilo) (Hanneman e Riddle, 2005). A “teoria dos grafos” trouxe importantes avanços para a análise de redes, tendo em conta que as regularidades matemáticas perceptíveis na estrutura das conexões entre os pontos indicam uma série de aspectos sobre o funcionamento destas redes, permitindo conhecer limitações e potencialidades. É interessante destacar que essas aplicações têm utilidade quase universal, ou seja, qualquer informação que possa ser representada em grafos (que contenha atores e relações) é passível da aplicação de métodos de análise de redes.

Em redes de grande tamanho os grafos perdem em eficiência pela impossibilidade de visualizar todas as relações. Neste caso a representação das informações em matrizes torna-se a forma mais fácil de se trabalhar com os dados. Nas matrizes os atores são os identificadores das linhas e colunas e as relações preenchem as células da tabela. Neste formato é possível aplicar uma série de cálculos matriciais que permitam extrair medidas sintéticas que

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descrevem as regularidades estruturais da rede a partir da mensuração de padrões específicos, comparação de formatos, identificação de sub-grupos, modelagem estatística, entre outros recursos (Hanneman e Riddle, 2005).

Tendo em conta essa discussão percebe-se que, em termos operacionais, a ARS oferece um conjunto novo de ferramentas sofisticadas para compreensão das estruturas sociais reticulares. Em termos teóricos, essa abordagem chama a atenção para o fato de que os fenômenos sociais podem ser compreendidos de forma integradora em uma perspectiva que trabalhe simultaneamente nas escalas macro e micro (ferramenta holística). As formas de integração de cada ator na sua vizinhança imediata e na rede como um todo (análises egocentradas) permitem uma avaliação dos efeitos e determinantes da participação de cada personagem da rede. Por outro lado, as abordagens que sintetizam todas as conexões (análises de rede total) fornecem uma idéia geral de como a rede funciona, das possibilidades e limitações de uma estrutura em particular (Wasserman e Faust, 1994; Hanneman e Riddle, 2005).

Com relação às conexões territoriais construídas ou reforçadas pela migração interna, a análise de redes sociais pode também oferecer contribuições importantes. Como já exposto anteriormente, o conjunto de objetos técnicos que recobre os espaços e liga os mesmos (rodovias, ferrovias, linhas de transmissão, rotas aéreas, marítimas e fluviais, sinais de satélite, etc) são apenas reflexo das conexões entre os grupos sociais, ou seja, as redes de cidades, de transportes, de comunicação, de comércio, entre outras, são um rebatimento no território dos vínculos duradouros estabelecidos entre as comunidades e instituições. Neste sentido parece razoável discorrer sobre uma “identidade” dos lugares, tendo em conta que os mesmos estão mergulhados em uma multiplicidade de relações sociais, relações estas que, não raro, as pessoas transferem para o lugar. É como se Nova Iorque, Tóquio ou São Paulo, fossem entidades com as quais se deseja estabelecer relações, e as mesmas respondem positivamente ou negativamente a essas tentativas de criar laços, de formar redes.

1.3) Coesão das redes sociais e conexões territoriais

O desenvolvimento de teorias sobre organizações sociais reticulares, não obstante os grandes avanços já alcançados em temas como a migração (especialmente a migração internacional) ainda estão em débito com a formulação de um conjunto de conceitos e definições interterpretativas que auxiliem a compreender as redes sociais formadas no espaço. Discussões teóricas recentes na ciência geográfica vêm ressaltando que as noções espaciais baseadas em zonas e recortes físicos fixos precisam ser relativizadas a favor de lógicas complexas em que os domínios do espaço-tempo se entrecruzam em redes que homogeneízam e fragmentam, que inserem e discriminam (Castells, 1996). As redes geográficas, ao caracterizar as novas formas de organização social e produtiva da modernidade contemporânea (ou pós-modernidade), marginalizam atores e distribuem novos poderes. No lugar da rigidez espacial emergem os movimentos, perpassando horizontalidades e verticalidades (Santos, 2002), tornando a compreensão desta dualidade um exercício novo, já que além dos processos internos aos territórios, as relações assumem caráter central na análise.

Segundo Raffestin (1993) o espaço converte-se em território quando é repartido por atores que possuem diferentes intencionalidades. Os atores e suas intenções são o fundamento das relações entre os locais e formam o chamado sistema territorial, onde ganham espaço os mecanismos de controle dos processos de produção, distribuição e consumo, impondo uma ou várias ordens que constituem as relações de poder na sociedade. A territorialidade, nesta perspectiva, é compreendida como um conjunto de relações. Partindo destes vínculos é que se formam as estruturas de poder. A cristalização do poder se dá no âmbito do local, formando,

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assim, espaços de centralidade, que se opõe aos espaços da marginalidade. Em cada território a centralidade é definida pela capacidade de circulação (de pessoas e coisas) e de comunicação (informação) dentro das redes, desta maneira o poder remete ao controle das redes, e o controle das redes é realizado a partir das relações.

Segundo Ramires (1989) a expansão do capitalismo em escala planetária é uma necessidade intrínseca da reprodução deste sistema, mas, paradoxalmente, a mundialização que suprime muitos particularismos atua também na acentuação das diferenças. A expansão das exportações transnacionais obedece à lógica das perspectivas redutoras de custos, dadas pela distribuição desigual no planeta de vantagens comparativas. A divisão espacial resultante deste processo é fruto de um movimento de “concentração-dispersão, diferenciação-integração” que une e confronta o local às redes globais. Neste contexto, evidencia-se a presença de variadas redes organizando a produção e a circulação. Entretanto, assim como os lugares não são iguais, as redes que neles se instalam são marcadas pela heterogeneidade, tanto na forma como na composição, permitindo a constituição de categorias diferenciadas de fluxos e de usos do tempo. Em cada uma das escalas em que as redes tornam-se perceptíveis revelam-se níveis de coesão diferenciados, bem como distintos níveis de centralização e poder dos atores envolvidos. Desta maneira, os espaços são cada vez mais caracterizados pela fluidez, e a capacidade de produção torna-se subordinada à possibilidade de transformar as mercadorias em fluxos (Santos, 2002).

Se as visões recentes sobre a organização dos territórios sistematicamente apontam para um padrão reticular e para importância do conhecimento e controle destas redes nas relações de poder estabelecidas, então a ciência geográfica e os estudos regionais carecem, com urgência, de ferramentas que permitam compreender as redes sob a ótica das relações entre os lugares, que decifrem as estruturas por trás das conexões, que encontrem os padrões e regularidades que governam as interações espaciais. Novas abordagens descrevendo as redes territoriais a luz das possibilidades de interpretação da ARS pode ser revolucionário para o conhecimento e as ações de intervenção no espaço geográfico.

Uma das dificuldades atualmente existentes para a disseminação da Análise de Redes Sociais nas pesquisas acadêmicas refere-se à disponibilidade de bases de dados matriciais, além é óbvio, do acesso e conhecimento das ferramentas de análise. Em função disto a migração interna apresenta uma série de vantagens que justificam seu uso em estudos sobre as redes de conexão territorial no Brasil. Desde o Censo Demográfico de 1980 que as migrações são investigadas controlando a procedência dos migrantes na escala municipal. A manipulação destas variáveis permite, então, a construção de matrizes de origem/destino para quase todas as subdivisões territoriais, com abrangência amostral confiável para todo o país.

Além da relativa facilidade de obtenção dos dados censitários, a migração interna é particularmente vantajosa para compreender as conexões do território porque elas sintetizam boa parte destas conexões, a saber: i) as migrações refletem a dinâmica do prolongamento do tecido urbano, bem como os rumos da expansão da fronteira agrícola; ii) as migrações indicam as direções nas quais o mercado de trabalho cresce e se especializa, determinando a demanda por mão de obra qualificada ou desqualificada; iii) as migrações sinalizam para o dinamismo econômico dos espaços, refletidos na atração ou repulsão populacional; iv) as migrações sugerem o nível de centralidade exercido pelos lugares nas redes territoriais, expresso nos volumes populacionais atraídos por cada lugar e na quantidade de lugares com os quais se trocam migrantes; v) as migrações sintetizam as redes sociais estabelecidas entre as pessoas e instituições, expressos nos caminhos preferenciais desenhados pela estrutura de fluxos. Tendo em conta esses elementos, pretende-se, com este trabalho, explorar o potencial explicativo da Análise de Redes Sociais para decifrar as conexões existentes no território brasileiro. Além disso, as conclusões também permitirão fazer considerações sobre os novos padrões da migração interna, trazendo aspectos novos para esta discussão a partir da

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descrição das estruturas presentes nas redes migratórias analisadas e das transformações das mesmas ao longo do tempo.

2) Metodologia

As matrizes de trocas migratórias entre as microrregiões brasileiras nos períodos 1975-1980, 1986-1991 e 1995-2000 foram aqui utilizadas para aplicação dos métodos de Análise de Redes Sociais. O banco de dados foi estruturado a partir da manipulação dos microdados dos Censos Demográficos do IBGE dos anos de 1980, 1991 e 2000.

De acordo com as definições conceituais norteadoras dos questionários do Censo são considerados migrantes todos aqueles que, no período intercensitário, realizaram alguma mudança de residência permanente entre municípios. Com relação ao controle da procedência destes migrantes é importante destacar que os três Censos apresentam configurações diferenciadas. Nos dados de 1980 só é possível construir as matrizes para os migrantes de

última etapa, ou seja, aqueles que declararam como etapa migratória anterior (procedência) o

último município de residência. Já no caso do Censo de 2000 só é possível construir as matrizes para os migrantes de data fixa, quais sejam, aqueles que declararam como etapa migratória anterior o município de residência há exatamente cinco anos antes da data de referência do Censo. O Censo de 1991 é único que apresenta tanto as variáveis de última

etapa como as de data fixa5. Tendo em conta que a última etapa traduz melhor a idéia de relações diretas entre os lugares, definiu-se por construir as matrizes de 1991 com estes dados.

As unidades territoriais escolhidas para representar os pontos (atores) das redes migratórias foram às microrregiões geográficas. Esse recorte espacial foi definido pelo IBGE por ocasião do Censo de 1991, substituindo as antigas microrregiões homogêneas. A proposta de regionalização trabalha com o conceito de Localidades Centrais, definindo as áreas de influência de cidades pólo. Ao todo são 558 micros, cujo recorte espacial manteve-se inalterado nos Censos de 1991 e 2000, mesmo com as emancipações municipais. No caso de 1980 foi necessário reconstituir as microrregiões geográficas, dado que tal recorte não existia neste período. A dificuldade metodológica encontrada nesta tarefa foi realizar a compatibilização tendo em conta os municípios que seriam emancipados até 1991 e que pertenciam a uma microrregião diferente daquela do seu município de origem. Neste caso considerou-se mais importante manter os recortes originais em 1991 e 2000 e, por isso, a regionalização de 1980 ficou ligeiramente diferente, já que os municípios emancipados ficaram nas microrregiões dos municípios de origem. Além disso, é impossível quebrar os municípios apenas com a informação disponível nos microdados da amostra. Assim, a rede migratória de 1980 conta com apenas 549 microrregiões, já que nove destes subespaços eram constituídos de municípios ainda não existentes neste ano.

As matrizes de trocas migratórias entre as microrregiões são um cruzamento de duas informações: nas linhas aparecem as microrregiões de origem, ou seja, os espaços que foram declarados como procedência dos migrantes e, nas colunas, aparecem as mesmas

5 Para obter as informações dos migrantes de última etapa o questionário deve incluir uma pergunta que identifique o último município de

residência dos migrantes. Neste caso, capta-se o conjunto das trocas entre os municípios no período intercensitário sem o estabelecimento de um marco temporal, o que impede, por exemplo, o cálculo de medidas sintéticas como o saldo migratório, que prescinde da definição de um período inicial e final. Não obstante, as informações de última etapa fornecem uma idéia mais precisa de trocas diretas. No caso da data fixa a pergunta trata de identificar o município de residência há exatamente cinco anos antes da data de referência da pesquisa. Essa forma de medir o fenômeno é mais usual internacionalmente pela conveniência em construir medidas e interpretações do fenômeno estabelecendo um período inicial e final. Contudo, a data fixa contém algumas limitações que levam a perda de informação: i) perdem-se as etapas migratórias que podem ter ocorrido entre o período final e inicial; ii) não são considerados migrantes aqueles indivíduos que realizaram alguma etapa migratória no período, mas nas datas inicial e final declaram residir no mesmo município, iii) não são considerados migrantes todos os indivíduos com menos de 5 anos de idade.

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microrregiões, agora como destino, ou seja, os espaços em que os indivíduos residiam na data de referência do Censo.

Grande parte das estimativas que descrevem a estrutura das redes sociais é aplicável apenas a dados dicotomizados, ou seja, a matrizes que indicam somente a existência ou ausência de relações entre os atores (utilizando 1 ou 0, respectivamente). Em função disto as três matrizes construídas foram dicotomizadas, tendo a sua diagonal anulada6. Tendo em conta a supressão de informações provocada pela dicotomização dos dados considerou-se relevante estabelecer um ponto de corte que mantivesse apenas relações mais fortes entre as microrregiões. Após realização de uma análise estatística descritiva das três matrizes conclui-se que o melhor ponto de corte conclui-seria o valor 30, número próximo da média aritmética das medianas de cada matriz. Desta maneira, as relações descritas pelas matrizes podem ser interpretadas da seguinte forma: i) o valor “0” representa a ausência de relações e foi atribuído a cada par ordenado da matriz em que não houve troca de migrantes ou que trocaram menos de 30 migrantes no período analisado; ii) o valor “1” representa a existência de relações e foi atribuído a cada par ordenado nos quais trocaram-se mais de 30 migrantes;

iii) os dados são direcionados, ou seja, a existência de relação no par ordenado AB não

implica necessariamente relação em BA; iv) os atores não possuem relações consigo mesmo, ou seja, a diagonal da matriz não é validada para efeito das análises.

As informações foram processadas em um software especializado para a Análise de Redes, denominado UCINET (Borgatti, Everett e Freeman, 2002), no qual foram calculadas as estimativas apresentadas na próxima seção. Como já indicado anteriormente, privilegiou-se neste trabalho a descrição dos padrões de coesão entre os atores, repreprivilegiou-sentados em medidas como: densidade, reciprocidade, transitividade, coeficiente de cluster, distâncias geodésicas, diâmetro da rede, caminhos geodésicos, entre outras. Aspectos como a centralidade dos atores ou a similaridade estrutural dos mesmos também podem trazer contribuições importantes para essa análise, o que indica a necessidade de maiores investimentos neste campo.

3) Análise estrutural das trocas populacionais entre as microrregiões

Nesta seção serão apresentados os resultados da análise estrutural realizada com as matrizes de trocas migratórias entre as microrregiões brasileiras. Como os atores desta rede em estudo são unidades territoriais que se articulam através dos fluxos migratórios é importante destacar que este trabalho não trata das redes sociais entre os migrantes, mas sim entre os lugares. Todavia, não é exagero presumir que as relações entre os lugares refletem os laços entre os indivíduos. De modo geral, as pessoas escolhem mudar de residência para um determinado lugar porque já estabeleceram alguma relação com pessoas ou instituições no destino: reunião familiar, oportunidade de emprego, vínculo com alguma instituição de ensino, entre outras. Não obstante, há uma infinidade de outras relações que os lugares estabelecem entre si, parcialmente refletidas pela migração, que permitem especular sobre a identidade, a centralidade e a seletividade das relações entre os espaços de forma similar as relações entre as pessoas, pressuposto que justifica a presente incursão7.

A Tabela 1 apresenta valores descritivos das três matrizes migratórias, com dados ainda não dicotomizados. Uma avaliação preliminar dos contingentes envolvidos nas trocas

6 A diagonal mostra os valores de trocas migratórias entre os municípios que compõe uma mesma microrregião. Tendo em conta que a

unidade básica de análise foram às micros esses valores precisam ser desprezados.

7 Mesmo que isso seja verdade, é fundamental não desconsiderar que a visão das redes territoriais como redes sociais ainda necessita de

avanços no campo teórico, para que a apropriação de estimativas originalmente formuladas para interpretar relações entre pessoas não conduza a erros conceituais. Não obstante, vale destacar que a “nova ciência das redes” vem mostrando que a organização topológica de estruturas reticulares segue determinadas leis fundamentais observáveis em organizações de qualquer natureza (Barabási, 2002). Assim, trabalha-se com o fato de que as redes possuem propriedades universais e capazes de ser descritas através dos métodos da ARS.

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populacionais em cada um dos períodos analisados traz indicações de que estaria em curso uma mudança nos padrões da migração interna, evidente na redução absoluta e relativa dos estoques envolvidos no processo. Em 1980 cerca de 11,8 milhões de pessoas se deslocaram ente as micros, montante que representava 9,74% dos cerca de 120 milhões de habitantes. Nos dois momentos subseqüentes a população de migrantes diminui enquanto ocorre aumento da população total. Em 1991 as mesmas trocas reuniram cerca de 7,79% da população, já em 2000, os cerca de 10,8 milhões de migrantes eram apenas 6,39% dos brasileiros8. A quantidade de pessoas trocadas, na maioria dos casos, foi bem pequena, como mostram os valores da moda e da mediana. A média, o desvio padrão e o coeficiente de variação trazem indicações da diversidade de situações na rede: de casos onde apenas uma pessoa foi recebida ou enviada até casos de trocas envolvendo mais de 80 mil indivíduos.

Tabela 1: Estatística Descritiva das matrizes de trocas migratórias

Descrição Matrizes 1980 1991 2000 Número de microrregiões 549 558 558 Total de migrantes 11.803.505 11.438.184 10.854.138 Mínimo* 1 1 1 Máximo 83.378 85.835 87.660 Média* 186,1 205,3 168,2 Desvio Padrão* 1.023,4 996,0 924,5

Coeficiente de variação de Pearson* 550,0 485,2 549,7

Mediana* 21 35 28

Moda* 4 6 10

Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 1980, 1991 e 2000. * Medidas calculadas desprezando-se os valores iguais a zero.

Esses dados parecem confirmar que determinadas correntes migratórias tem perdido a sua força ao longo das últimas décadas. Tendo em conta que os especialistas já destacavam o surgimento dos “novos padrões” desde meados da década de 1980, é possível afirmar que uma das características destas modificações é a redução relativa do número de pessoas em movimento. Esse fato é fundamental para a compreensão das conexões entre os lugares, dado que pode-se sugerir que a redução das correntes migratórias entre pontos da rede poderia ser um indicativo do rompimento de laços estabelecidos entre certos lugares, levando a progressiva deterioração dos canais de transmissão de capital humano e social, tão importantes para o desenvolvimento.

Por outro lado, pode-se concluir que o esgotamento de determinados fenômenos migratórios, como o êxodo-rural, encerram um ciclo de redistribuição populacional permeado por situações perversas (pressão nos serviços de utilidade pública, na infra-estrutura urbana, favelização, desemprego, esvaziamento de áreas rurais, etc.) e que a nova estrutura de trocas populacionais, agora com contingentes reduzidos, estabelece relações mais sólidas entre os lugares, já que a migração provocaria menos pressão nos investimentos em infra-estrutura e os migrantes, ao invés de engrossar o exercito industrial de reserva, se realocam no espaço contribuindo com o processo de desenvolvimento, já que são mais qualificados que seus antecessores. Encontrar as respostas para verificar qual destas visões é mais adequada ao caso brasileiro configura-se entre os maiores desafios para os estudiosos do tema. Neste sentido, a

8 Na verdade, a redução mais acentuada do número absoluto de migrantes em 2000 deve-se as diferenças na metodologia de obtenção dos

dados. Os migrantes de data-fixa são menores do que os de última etapa em qualquer período já que, como explicado na seção anterior, não são contabilizados os indivíduos com menos de 5 anos de idade, nem as pessoas que residiam no mesmo município no início do período.

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análise estrutural dos vínculos entre os lugares pode mostrar o quanto às modificações no volume dos fluxos têm afetado as conexões territoriais.

Para dar início a esta discussão a Tabela 2 apresenta uma descrição geral das relações entre as microrregiões geográficas. Como já explicado na seção de metodologia, as análises de rede foram conduzidas com as matrizes dicotomizadas, tendo o valor de 30 migrantes como ponto de corte. A tabela apresenta os valores de quatro medidas básicas de rede aplicadas para estas matrizes: o Tamanho, o Número de Laços, a Densidade e o Coeficiente

de Cluster. O Tamanho da rede representa a quantidade de relações possíveis de serem

estabelecidas no sistema. Assim, com n atores, o Tamanho é dado por n(n-1). Os valores diferem entre 1980 e os períodos restantes em função do menor número de microrregiões neste primeiro (ver metodologia). O Número de Laços mostra a quantidade de relações que efetivamente aconteceu na rede, neste caso, indica os pares de microrregiões que trocaram mais de 30 migrantes nos períodos 1975-80; 1986-91 e 1995-2000.

A Densidade, por sua vez, é uma medida relativa que associa as duas anteriores mostrando a proporção de laços existentes na rede. É possível notar que, a despeito da redução relativa na quantidade de migrantes ao longo do período, a densidade da rede vem aumentando: de 8,7% de laços possíveis e existentes no início do período analisado para 9,8% em 2000. A diferença de cerca de 1% entre 1980 e 2000 não permite falar sobre grandes mudanças, tendo em conta que a Densidade é uma medida global e muito sintética. Contudo, surpreende o fato de que a topologia da rede parece estar tomando um caminho diferente do que seria esperado com a redução do volume dos fluxos. Ao mesmo tempo em que os migrantes tornam-se uma parcela cada vez menor da população brasileira, eles vêm conectando um número maior de subespaços, provavelmente como resultado da emergência dos “novos padrões”.

Tabela 2: Descrição geral das conexões da rede migratória entre as microrregiões brasileiras

Descrição Matrizes 1980 1991 2000 Tamanho 300.852 310.806 310.806 Número de Laços 26.252 29.952 30.606 Densidade Geral 0,0873 0,0964 0,0985 Coeficiente de Cluster 0,2830 0,2810 0,2840

Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 1980, 1991 e 2000.

Outra forma de trabalhar com a densidade dos laços é focalizar a análise em cada ego (ator) da rede, já que considerar a totalidade das conexões, especialmente em redes de grande tamanho, pode subestimar a conectividade efetiva, tendo em conta que cada ator se relaciona mais fortemente com a sua vizinhança9. Assim, é razoável pensar que um grupo de microrregiões que se relacionam diretamente com outra micro estabeleçam mais laços entre si do que com o restante da rede. Essa propriedade é denominada de clusterização e a sua mensuração reflete uma importante característica das redes: se as mesmas têm tendência de construir densos relacionamentos locais (por vezes, em detrimento das conexões com a rede total). De fato, as teorizações sobre o “mundo pequeno” mostram que as redes se conectam por um número pequeno de passos em função da existência de uns poucos atores centrais que, por estarem conectados com quase toda a rede, estabelecem as pontes entre vizinhanças densamente conectadas. O Coeficiente de Cluster apresenta uma média dos valores de densidade calculados para todas as vizinhanças dos egos. A comparação deste valor com a

Densidade geral permite avaliar o quanto os arranjos locais são mais conectados do que a

rede completa. Os valores, apresentados na Tabela 2, permitem três considerações

9 Em análise de redes, o conceito de vizinhança faz referência ao grupo de atores com os quais um ator mantém laços diretos ou próximos.

No caso da rede em estudo, a vizinhança de uma microrregião seriam as microrregiões das quais a mesma recebeu ou enviou migrantes diretamente.

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importantes: i) a densidade das vizinhanças é significativamente maior do que a densidade geral, enquanto a primeira tem valores em torno de 10% a segunda apresenta estimativas acima de 30%, ou seja, no caso das vizinhanças, algo próximo de 1/3 dos laços possíveis é concretizado. ii) a variação na densidade das vizinhanças é bem pequena, com uma leve redução em 1991 e aumento em 2000, indicando que a coesão das vizinhanças na rede migratória praticamente não se altera no período, fato importante diante da já mencionada redução relativa dos migrantes. iii) a irrelevante modificação do Coeficiente de Cluster no período conduz a especular sobre quais foram às transformações que levaram ao aumento observado da densidade geral. Uma possível explicação seria o surgimento de mais microrregiões interligando as vizinhanças, ou seja, diminuindo os graus de separação entre os espaços. Tendo em conta que o aumento da densidade geral também foi pequeno, isso reforça a hipótese de que algumas microrregiões “chave” tornaram-se melhor conectadas na rede durante o período. Tais conclusões parecem se ajustar as características do fenômeno migratório, tendo em conta a tendência dos migrantes de preferir as curtas distâncias geográficas, fato também observado no Brasil. Mesmo que o Coeficiente de Cluster não faça relação entre vizinhança e distância geográfica, é de se esperar que os clusters se formem guardando relações com a distribuição espacial das regiões. Assim, para avançar na análise das conexões destas redes migratórias é fundamental reconhecer aspectos da distribuição espacial das propriedades estruturais da rede.

Uma das formas mais usuais de analisar a coesão das redes sociais é através da análise das suas díades. As díades constituem os pares ordenados de atores das matrizes (i,j), que podem, em dados direcionados, estabelecer quatro tipos de relações: 1º) Xij > 0 e Xji > 0; 2º)

Xij = 0 e Xji > 0; 3º) Xij > 0 e Xji = 0; 4º) Xij = 0 e Xji = 0. Assim, as redes podem se

organizar com ausência de laços, laços uni-direcionados ou então laços recíprocos. Alguns autores argumentam que a existência da reciprocidade é um bom indicativo de estabilidade da estrutura, já que significa conexões mais estáveis. Na análise matricial, a medida de reciprocidade (ou simetria) fornece a proporção de díades que possuem laços bidirecionais, medida que pode ser calculada para toda a rede ou para cada ator. As estimativas de rede total revelam um aumento da reciprocidade entre as microrregiões, à rede de 1980 apresentou 40,61% de díades simétricas, valor que sobe para 41,72% em 1991 e 43,68% em 2000. Mais uma vez as medidas de rede indicam que a emergência de “novos padrões” na migração interna possivelmente está associada com o aumento da coesão entre os lugares e as medidas egocentradas podem ajudar a reconhecer a existência de um padrão espacial para essa expansão. O percentual de laços recíprocos de cada uma das microrregiões pode ser observado na Figura 1. O conjunto de mapas apresenta as unidades territoriais agrupadas em classes de acordo com a proporção de laços recíprocos.

Os valores mais baixos de reciprocidade apresentados nos mapas10 (menos de 33% de laços recíprocos) reuniram 150 microrregiões em 1980, contra apenas 112 em 2000, concentrando-se especialmente nas regiões Norte, Centro-Oeste, norte de Minas, Sul da Bahia e sertão nordestino. Interessante notar que a redução destes subespaços ao longo do tempo foi mais intensa na região Centro-Oeste e no sertão nordestino. Alguns elementos podem ser elencados como prováveis explicações: i) o aumento já documentado da migração de retorno no Nordeste, ii) a consolidação do espaço econômico do Centro-Oeste, fazendo com que a região deixe de ser apenas locus da expansão da fronteira agrícola, mas se consolide como rota permanente de migrações, estabelecendo fluxos e refluxos contínuos no tempo.

10 As classes dos mapas foram definidas pelo método quartil, aplicado a todo o conjunto de dados, oferecendo quatro classes que apresentam

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Figura 1

Proporção de díades nas redes migratórias que estabeleceram laços recíprocos segundo microrregiões geográficas – Brasil 1980, 1991 e 2000

Quanto aos valores mais elevados de reciprocidade (microrregiões com mais de 45,7% de laços simétricos) destaca-se a aglomeração dos mesmos em São Paulo, Estados da região Sul e litoral nordestino. A análise temporal indica um interessante retrocesso da reciprocidade nas microrregiões de Goiás de 1980 para 1991, com retomada em 2000, fato que indica o surgimento de novos padrões e demanda maiores investigações. De modo

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similar, houve redução da “alta” reciprocidade em 1991 relativamente aos outros dois períodos, dado a diminuição de microrregiões neste grupo também no Espírito Santo, Minas Gerais e na Região Nordeste. O reaparecimento destes lugares – melhor conectados – em 2000 sugere novos eixos de ligação, provavelmente mais estáveis, como o alinhamento de microrregiões de alta reciprocidade que se nota no sentido leste-oeste, formando um arco entre a Amazônia e Nordeste.

A reciprocidade certamente possui relações com a migração e o desenvolvimento territorial. Na medida em que aumenta a simetria das matrizes de trocas migratórias, pode-se inferir que o fenômeno ganha novos contornos nos quais os lugares se polarizam menos como centros de atração ou repulsão populacional. O aumento das trocas cruzadas de migrantes pode indicar a existência de mais amenidades em ambos os lugares, fator que estimularia a circularidade, em lugar da formação de grandes correntes migratórias destinadas a um determinado centro. Tal fenômeno, como se sabe, gera inúmeras pressões nos fatores de desenvolvimento. O aumento da reciprocidade pode, então, ser considerado como um indicativo de que as relações no território tornam-se mais estáveis, já que provavelmente criam menos desigualdades. Para afirmações mais conclusivas, contudo, seria necessário investigar a força dos laços recíprocos, já que, em dados dicotomizados despreza-se o volume das trocas. O alcance da estabilidade estaria, sem dúvida, relacionado a trocas proporcionais entre os lugares, e não a simples existência de um contra-fluxo migratório nos moldes daquele observado por Ravenstein.

Outra forma de avaliar a coesão das redes, complementar a análise das díades, é o estudo das tríades. Assim como no caso anterior, as tríades permitem fazer considerações sobre a estabilidade das redes pois constituem o núcleo fundamental da formação de grupos (clusters) de atores. Em dados direcionados podem-se encontrar 16 diferentes formas de conexão de tríades (Wasserman e Faust, 1994) sendo de especial interesse as tríades transitivas. O conceito de transitividade faz referência a uma propriedade das redes sociais que estabelece que se A tem relação com B e B tem relação com C, então provavelmente A tem relações com C. As tríades transitivas são aquelas em que efetivamente se observa essa condição. Nos casos em que a maioria das tríades de uma rede são transitivas pode-se considerar que as relações são mais fortes e que existem menos buracos estruturais11 nas redes.

A medição da transitividade da rede de trocas migratórias pode ser observada na Tabela 3. Os resultados mostram tendências semelhantes daquelas apontadas pelas medidas de reciprocidade. Os valores absolutos do censo geral de tríades mostra que ocorreu aumento tanto no número absoluto de tríades transitivas (de 748 mil em 1980 para quase 1 milhão em 2000) quanto também na quantidade de tríades com dois atores conectados (a-->b e b-->c). Quando confrontados com todos os tipos de tríades presentes nas redes nota-se que os trios transitivos representaram cerca de 0,5% do total em todos os períodos, fator que aumenta ao longo do tempo. Quanto ao indicador de Transitividade, que mede a proporção de tríades com três atores conectados sob o total das que possuem, pelo menos, dois atores conectados, nota-se uma diminuição no valor do indicador. A transitividade era observada em 35% destas tríades em 1980 contra cerca de 32% das mesmas em 2000. A diminuição deste indicador, contudo, não indica redução na coesão da rede, ao contrário, apenas mostra que o crescimento das tríades transitivas ocorreu em ritmo menor do que o crescimento das tríades com pelos menos dois atores conectados.

11 Os “Buracos Estruturais” consistem nos espaços existentes na topologia das redes marcados pela ausência de relações. Assim, se existe o

par ordenado AB e BC, a ausência do par ordenado AC configura um vazio no sistema de relações que pode impedir a ampliação da difusão dos valores em circulação nas redes (Hanneman e Riddle, 2005).

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Tabela 3: Medidas de transitividade para a rede migratória das microrregiões brasileiras

Descrição Matrizes

1980 1991 2000

Número de tríades transitivas 748.118 895.713 995.769 Numero de tríades de todos os tipos 164.566.044 172.808.136 172.808.136 Numero de tríades com a-->b e b-->c 2.126.320 2.737.994 3.076.228

Percentual de tríades transitivas 0,45% 0,52% 0,58%

Transitividade* 35,18% 32,71% 32,37%

* % das triades que tem a-->b e b-->c e que são transitivas (a-->c)

Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 1980, 1991 e 2000.

Os resultados permitem concluir que houve uma ampliação da coesão na rede através do aumento das tríades com mais conexões e dos casos em que se fecharam grupos de três microrregiões conectadas, facilitando o preenchimento dos buracos estruturais. Esse fenômeno provavelmente coopera para o aumento da circularidade da população pelas unidades espaciais. A ampliação das tríades transitivas, em termos da conexão territorial, pode ser interpretada como indicativo do acirramento dos vínculos entre os lugares, já que reduz a hierarquização das redes de localidades, abrindo espaço para novas lógicas de ocupação, permeadas por uma maior homogeneidade das regiões em termos da capacidade de atrair contingentes populacionais. A supressão dos abismos existentes entre as unidades territoriais é fundamental para evitar fenômenos com a macrocefalia urbana12, que criam desigualdades perversas entre os espaços e privam as populações do acesso a serviços básicos para o cumprimento da cidadania.

Finalmente, outra maneira de descrever a coesão das redes sociais está na avaliação das distâncias que separam os atores. Na ARS o conceito de distância faz referência a quantidade de laços (passos) que separam os atores, assim, se A tem relações com B e B tem relações com C, a distância que separa A de C é igual a 2. Em redes com muitos atores e relações é possível que existam vários caminhos ligando dois atores, o que estimula a formulação de métodos para definir quais seriam os caminhos mais eficientes conectando os membros das redes. Uma das definições possíveis é o conceito de distância geodésica, que considera, para as redes direcionadas e não valoradas, que o caminho mais eficiente conectando dois atores é aquele com a menor quantidade de passos (menor distância).

A Tabela 4 apresenta algumas estimativas de distâncias geodésicas aplicadas para as matrizes de fluxos migratórios. O algoritmo que estima as distâncias geodésicas gera uma matriz, de mesmo tamanho da original, preenchida com o menor número de passos conectando cada ator ao outro. Se todos os atores da rede têm, pelo menos uma relação, então a matriz de distâncias só terá valores maiores que zero. O valor da Distância média apresenta a média aritmética de todos os valores da matriz de distâncias geodésicas. Confirmando as tendências observadas anteriormente, o valor médio das distâncias que separam os atores na rede diminui a cada período, com valores orbitando em torno de dois passos. É interessante notar que a diminuição do desvio padrão indica ainda uma redução da variabilidade desta estimativa, especialmente tendo em conta que o desvio é bem menor que a média. O

Diâmetro, por sua vez, é a distância geodésica de maior valor na rede, ou seja, os passos que

separam os atores mais opostos na topologia. Mostrando a relativa eficiência das conexões destas redes, os valores do Diâmetro ficaram sempre abaixo de 613, sendo 4 em 1980 e 1991 e

12 A macrocefalia urbana consiste na formação de um aglomerado cujo tamanho é proporcionalmente mais elevado do que as localidades no

entorno. A formação deste tipo de rede urbana foi muito comum nos países subdesenvolvidos, cuja má distribuição da infra-estrutura e a concentração das atividades econômicas cooperaram para a concentração da população e serviços em gigantescos aglomerados.

13 O diâmetro de 6 é uma das distâncias geodésicas mais citadas pelos analistas de rede em função das teorias do mundo pequeno, que

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3 em 2000. Essa redução de um grau no valor do Diâmetro certamente tem muito significado para estimativas do tamanho da rede. Muitos desenhos de pesquisa tomam o diâmetro como referência para estabelecer os contornos de uma rede social qualquer (Hanneman e Riddle, 2005). No caso da rede de trocas migratórias percebe-se que um migrante interno poderia acessar qualquer outra microrregião brasileira aproveitando-se dos fluxos já existentes entre outras duas micros. Ao que parece, as modificações no padrão da mobilidade populacional estão tornando a rede de lugares mais compacta.

Tabela 4: Distancias geodésicas nas trocas migratórias entre as microrregiões brasileiras

Descrição Matrizes

1980 1991 2000

Distância média 2,029 1,980 1,963

Desvio padrão 0,451 0,416 0,398

Diâmetro 4 4 3

Média de caminhos geodésicos 9,37 10,63 11,35

Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 1980, 1991 e 2000.

Além da Distância média e do Diâmetro, é possível pensar na conectividade entre os atores pela avaliação da quantidade de caminhos eficientes ligando dois pontos. Em determinados contextos de relações sociais pode ser interessante para os atores possuir mais de um caminho eficiente para alcançar seus pares, dado que eventos exógenos ao contexto das relações podem preencher alguns laços de constrangimentos formais. Assim, se há poucos caminhos ligando dois atores é provável que a coesão entre os mesmos seja comprometida. Em redes territoriais, especialmente no caso das migrações, é fácil perceber esse efeito: em muitos casos pode ocorrer um aumento dos custos sociais para os migrantes se aproveitarem de um determinado fluxo entre dois ou mais lugares, contudo, se houverem múltiplas alternativas de acessar alguma localidade, cresce a probabilidade da conexão se fortalecer, lembrado que a migração por etapas é uma das características básicas do fenômeno. Tendo em conta que os fluxos migratórios são tomados como indicativo da integração territorial, a existência de vários caminhos eficientes ligando os lugares provavelmente irá conferir maior estabilidade ao sistema territorial. Assim, uma das ferramentas usadas pela ARS é a contagem do número de caminhos geodésicos ligando dois pontos nas redes, assim como na medida anterior, é possível gerar uma matriz que apresente todos esses valores para cada díade da rede.

A Média de caminhos geodésicos, então, apresenta a média aritmética desta matriz de caminhos geodésicos, fornecendo uma visão global das opções de conexão. Ao longo do período analisado nota-se que os caminhos geodésicos se ampliaram de uma média de 9,37 em 1980 para 11,35 em 2000. Neste sentido, é possível afirmar que os migrantes vêm encontrando mais caminhos alternativos abertos para ingressar em fluxos migratórios. A ampliação destes caminhos, ao que tudo indica, conecta melhor os lugares já bem articulados, bem como insere outras localidades no rol das territorialidades centrais para a coesão das redes. Mais uma vez, tais hipóteses podem ser mais bem verificadas através da espacialização deste fenômeno. As Figuras 2 e 3 apresentam um conjunto de mapas que representam a quantidade média de caminhos geodésicos disponíveis para cada microrregião no acesso aos seus pares, tanto na saída de migrantes (Figura 2) como na entrada dos mesmos (Figura 3) 14. A análise dos mapas mostra a existência de um padrão espacial para este fenômeno, diferenciado para saídas e entradas de migrantes, pelo menos no início do período.

14 Esta medida foi obtida a partir do cálculo das médias aritméticas das linhas (saídas) e das colunas (entradas) das matrizes de número de

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Figura 2

Média de caminhos geodésicos existentes nas trocas migratórias entre as microrregiões na saída de populações (emigração) – Brasil 1980, 1991 e 2000

A distribuição das microrregiões em 1980 segundo as classes estabelecidas (pelo mesmo método dos mapas da Figura 1) mostra padrões bem diferenciados segundo saída e entrada. As 291 microrregiões que possuem menos opções de entrada (1,7 a 7,4 caminhos geodésicos) se concentravam especialmente no interior nordestino, porção norte de Minas Gerais e na Região Sul, enquanto os subespaços com mais caminhos para entrada

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localizavam-se em São Paulo e também em um arco formado entre o Amazonas e o Rio Grande do Norte. Quanto as opções de saída nota-se que os 137 menores valores (2,9 a 7,4) encontram-se mais concentrados apenas na Região Sul e nas microrregiões do Maranhão, Piauí e Ceará, enquanto os maiores valores estendem-se no eixo Nordeste-Sudeste e também no Mato Grosso e Amazonas. Tais diferenças de padrão sugerem que as redes migratórias para saída e entrada de migrantes organizavam-se em torno de diferentes localidades.

Figura 3

Média de caminhos geodésicos existentes nas trocas migratórias entre as microrregiões na entrada de população (imigração) – Brasil 1980, 1991 e 2000

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