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Branco mais preto é igual a pardo ou igual a cinzento? Sexo e Cor em Minas Gerais na primeira metade do século XIX

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Branco mais preto é igual a pardo ou igual a

cinzento? Sexo e Cor em Minas Gerais na

primeira metade do século XIX.

Maria do Carmo Salazar MartinsHelenice Carvalho Cruz SilvaMaurício Antônio de Castro Lima2

Palavras-chave: Cor, Chefia feminina, Século XIX

Resumo

A importância da chefia feminina na economia e na sociedade colonial/provincial mineira já foi bastante estudada. Entretanto, são poucos autores que tocam – e quando o fazem é apenas de passagem – em um tipo de problema que trouxe conseqüências graves para a sociedade brasileira atual. É difícil reconhecer que as desigualdades sociais vivenciadas pelos afro-descendentes em todas as esferas da vida social sejam conseqüência de um regime, ou de uma política econômica, imposta por indivíduos da raça branca sobre os negros, e que, no Brasil, há cerca de quinhentos anos, os afro-descendentes vêem seu espaço social limitado por barreiras dificilmente transponíveis e historicamente determinadas. No caso das mulheres então, associe-se uma sociedade patriarcal a um regime escravista e veja-se onde é possível situar a mulher na escala social. Assim, o objetivo desse trabalho é contextualizar a existência da desigualdade social entre raça e sexo e confirmar que a mesma é historicamente determinada.

As fontes de dados a serem trabalhadas serão as listas nominativas de Minas Gerais produzidas em 1818-20 e em 1838-40.

Trabalho apresentado no XIV Encontro Nacional de Estudos Populacionais, ABEP, realizado em Caxambú-

MG – Brasil, de 20- 24 de Setembro de 2004.

CEDEPLAR/UFMG. CEDEPLAR/UFMG.

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Branco mais preto é igual a pardo ou igual a

cinzento? Sexo e Cor em Minas Gerais na

primeira metade do século XIX.

Maria do Carmo Salazar MartinsHelenice Carvalho Cruz SilvaMaurício Antônio de Castro Lima3

Introdução

O interesse acadêmico por estudos sobre a família brasileira e o domicílio como lócus desta renasceu atualmente devido, principalmente, ao lugar de destaque a ela alocada nos objetivos e metas governamentais quanto às políticas socioeconômicas. Assim, as abordagens econômicas e demográficas se inserem na linha de frente com vistas ao conhecimento das mudanças que se operaram no nível da organização/estruturação e sobrevivência dos grupos sociais familiares.

Desde já, convém deixar claro que reconhecemos a complexidade desta temática que envolve aspectos históricos, sociais, econômicos e culturais. Assim, desenvolver um estudo sobre o grupo familiar não constitui tarefa fácil, e há que constar dele um referencial societal mais amplo quanto às relações interpessoais existentes nos seus distintos subsistemas: o conjugal, o parental, o filial. Ou seja, é desejável que o estudo releve, além das interseções no nível macro, também aquelas presentes em uma organização micro configurada na família, na medida que ambos interagem como processos complexos interdependentes e interligados, que se complementam, que se contradizem.

Por outro lado, como nos avisam alguns estudiosos, há que se levar em conta na formação do grupo familiar as crenças, valores, representações e idealizações presentes na realidade cultural e histórica, atentando-se, portanto, para as relações de classe, raça/cor e gênero. (Szymansky, 1995), (Bilac, 1995). Tal cuidado sublima a estigmatização que o paradigma prescrito impõe às famílias organizadas diferentemente dos modelos padronizados conforme a cultura dominante (Sarti, 1995 e 1996)).

Desde a metade do século XX os estudiosos vêm questionando a organização familiar patriarcal da elite – basicamente o modelo de família extensa dos engenhos coloniais da obra de Gilberto Freire. As novas pesquisas encontraram uma grande variedade de organizações familiares, em diversas partes do Brasil, em diferentes períodos de tempo, mostrando que essas organizações eram muito mais diversificadas e a sociedade muito mais dinâmica do que

Trabalho apresentado no XIV Encontro Nacional de Estudos Populacionais, ABEP, realizado em Caxambú-

MG – Brasil, de 20- 24 de Setembro de 2004.

CEDEPLAR/UFMG. CEDEPLAR/UFMG.

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estabelecia o modelo de Freire, principalmente no que dizia respeito às camadas empobrecidas da população

No entanto, é preciso não esquecer que o Brasil herdou de Portugal a estrutura familiar patriarcal com todas suas implicações de subordinação da mulher e restrições, tanto legais como de fato, na atuação do sexo feminino como agente social. Mesmo com as novas análises da historiografia brasileira e portuguesa revelando as diferentes estruturas familiares e a maior liberdade do comportamento feminino nos séculos XVIII e XIX , há que se salientar o fato de que cada sociedade desenvolve e obedece a padrões culturais e a uma dinâmica própria, podendo ou não ocorrer resistências a mudanças na ordem social estabelecida. Porém, na medida em que a mulher é arrolada como chefe de um domicílio no século XIX, ou seja, a figura provedora da família, encontramos aí os primeiros indícios de uma flexibilização nos valores socialmente sedimentados.

A constatação de que a mulher pudesse assumir o papel de provedora familiar numa sociedade patriarcal provocou um rebuliço na historiografia relativa à mulher brasileira, conduzindo ao aprofundamento das pesquisas em acervos históricos em busca de maiores informações e conhecimento que enfocassem a diversidade de aspectos relativos a esta questão.

Vários pesquisadores estudaram essa realidade social, utilizando enfoques diferentes, mas sempre concluindo que era alta a porcentagem de chefia feminina nos domicílios mineiros nos séculos XVIII e XIX. Como esses estudos já são bastante conhecidos nos limitaremos a citar apenas alguns poucos, sem menosprezar a contribuição daqueles não mencionados.

Figueiredo (1997), por exemplo, traça uma linha de causalidade entre o alto número de relações consensuais e de filiações ilegítimas e o evoluir de uma série de valores morais alternativos, onde as noções patriarcais de família, a subordinação da mulher e os ideais morais do casamento e da castidade feminina não tinham tanta importância. O autor argumenta que “a estabilidade nas uniões consensuais instituídas entre as camadas populares possibilitou uma divisão de papéis no domicílio caracterizada por uma maior atuação feminina do que aquela prevista no casamento cristão. O verdadeiro estímulo para a definição de papéis nos domicílios não foi o discurso teológico que fixava a subordinação feminina no casamento, mas as exigências de um cotidiano que era vital para a distribuição de tarefas ou a transferência de papéis para a sobrevivência do grupo doméstico. Encontram-se mulheres ocupadas no pequeno comércio com o que obtêm rendas para a sustentação do parceiro, outras administram a casa e os negócios do companheiro, permanentemente ou quando da sua ausência...” (p. 138). Este contexto social de flexibilidade normativa subentende o aumento gradativo do número de mulheres chefiando domicílios.

Ao mesmo tempo, a Igreja Católica foi bem sucedida na divulgação dos valores da família patriarcal, embora as condições materiais vigentes na época impossibilitassem muita gente de viver de acordo com esses valores. Na interpretação de Vainfas (1989) a Igreja conseguiu com sucesso incutir o sentimento de culpa “... provocando um exame de consciência coletivo e uma prática acusatória capaz de superpor a moral católica às moralidades coloniais...” (p.52-60).

Pesquisadores alinhados à demografia histórica se empenharam em demonstrar que já neste período era alta a porcentagem de domicílios chefiados pelas mulheres. Ramos (1978), Costa (1981), Marcílio (1986), podem ser considerados pioneiros no estudo desse tema.

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Samara (1993) ao fazer um estudo comparativo sobre a chefia feminina no Brasil encontrou os seguintes resultados: na província de São Paulo em 1827 29,26% das mulheres eram chefes de família e em 1836 a porcentagem se elevou para 36,8%; em Goiás, no ano de 1818 encontrou 17% de mulheres chefes e na Bahia em 1835 a porcentagem era de 33%. Esses estudos também revelaram a diversidade de atividades desempenhadas pelas mulheres que assumiam o papel de provedoras no sustento de suas famílias.

Adotando focos de análise específicos, alguns pesquisadores procuram mostrar as diferenças existentes na organização das famílias mineiras em diferentes setores da sociedade, principalmente entre as áreas urbanas e rurais. Segundo Faria (1998), a formalização da união conjugal nas áreas rurais era importante, senão fundamental enquanto estratégia de sobrevivência: “Casar na Igreja ou, em outras palavras, casar segundo os padrões dominantes na sociedade escravista colonial, significava garantir o mínimo das condições de sobrevivência, em áreas agrárias ...” (p. 58-95).

Além disso, o mercado de casamento se fazia complicado para as mulheres devido ao déficit de companheiros potenciais como apontam Martins et alli (2002) e Lewkowicz (1992). Esta última autora, em seu estudo sobre a família na cidade de Mariana, conclui que casar não foi coisa fácil para os mineiros naquela época, ainda mais quando as oportunidades de casamento se efetivavam mais para os homens do que para as mulheres, principalmente nas áreas de menor concentração de riqueza, quando o número de mulheres solteiras excedia o dos homens disponíveis para o casamento.

A literatura já estabelecida nos informa que estado não opcional de “solteirice” se estabeleceu, preferencialmente, em terras urbanas mineiras e não se constituiu em empecilho para que estas mulheres constituíssem suas famílias, ainda que ilicitamente: “Os fogos chefiados por mulheres, na Vila [de São João del Rei], o eram, na maioria dos casos, por solteiras (58,57%). Nos demais distritos, as [mulheres] chefes de domicílio eram, principalmente, viúvas (54,71%) e apenas 36,47% eram solteiras. [Esses números] indicam que era na área urbana que as mulheres solteiras encontravam meio mais propício para garantir sua sobrevivência ou que, ali, talvez o casamento fosse menos necessário para seus projetos de vida”.(Brüger, 2000, p.49).

Ramos (1975) encontra nos primeiros anos do século XIX, em Ouro Preto, uma atuação feminina marcante na chefia dos domicílios. De todos os fogos arrolados, 45% eram chefiados por mulheres, sendo que em 83% desses casos, elas eram solteiras. Na sua maioria eram negras ou mestiças pobres, uma vez que poucas, cerca de 5,2%, eram chamadas de senhoras ou donas, tratamento esse dirigido apenas à camada superior da população. (p.200).

Especificamente sobre a conjugalidade mineira, Ramos (1978) trabalha com três linhas básicas de investigação. Primeira, a grande família patriarcal, vista tão freqüentemente como o tipo familiar predominante da Colônia, existiu apenas para um punhado de pessoas. Segunda, tomando o município de Vila Rica pré-industrial como exemplo significativo para os primeiros anos do século XIX, verifica-se à época uma ampla categoria de tipos de família, com a predominância das nucleares e matrifocais. Terceira, para o autor o casamento não foi um meio de integração da sociedade, servindo, pelo contrário, para diferenciar segmentos da população.. Diante deste fato o autor assume uma explicação na linha da evolução histórica dos costumes: “... os costumes que governaram o comportamento das mulheres em Portugal foram modificados no Brasil (...) As mulheres brasileiras não podiam ser obrigadas a permanecer na reclusão com a qual estavam acostumadas suas irmãs portuguesas...”, (p.225).

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Assim, embora elegessem focos de análise diferenciados, os autores supra citados caminham para um ponto comum, ou seja, apesar das diferenças e hierarquias sociais, as uniões consensuais em Minas Gerais eram mais a regra do que a exceção quando se tratava das camadas mais pobres da população. Ao mesmo tempo argumentam que o casamento e o patriarcado constituíam instituições fundamentais para todas as classes; entretanto, os valores dessas instituições diferiam em gênero e grau e não eram de fundo moral, mas econômico.

É necessário ainda considerar que os casamentos eram dificultados por uma série de obstáculos de ordem econômica – o alto preço do sacramento4 – e religiosa – as limitações impostas pela Igreja segundo as normas do Concílio Tridentino. Não é de se admirar, dada a parca situação econômica da maioria indistinta da população mineira, a vigência de uma porcentagem significativa de mulheres solteiras chefes de domicílio e o estabelecimento de famílias vivendo de modo “irregular” e ilegítimo.

Os estudos referenciados acabaram por revelar um universo onde o “jeitinho brasileiro” (no nosso caso mineiro) prevaleceu sobre as Ordenações da Coroa Portuguesa e sobre a vigilância da Igreja. O confronto entre o discurso moralista da ética católica e os rearranjos mediados pelo cotidiano tornava cada ação (norma) passível de ser questionada, mas impossível de ser controlada, contextualizando assim um “viver” normativamente flexível, passível de relações conjugais ilícitas entre os sexos, seja entre os pobres (maioria), seja entre os abastados. Revelaram também a inserção das mulheres na economia mineira como agentes produtivas, seja através da produção doméstica, seja trabalhando fora de suas casas.

A associação do trabalho produtivo feminino doméstico e mercantil torna-se evidente quando se percebe que além de administrar o domicílio, as mulheres também atuavam no pequeno comércio. Esse pequeno comércio variava desde a venda de produtos “in natura” até bens manufaturados na forma de quitandas e quitutes ou na forma de panos de algodão, não se excluindo o “comércio da carne”, ou seja, a prostituição.

Entretanto, não foi só a historiografia brasileira que tratou este tema. Não podemos deixar de levar em conta as pesquisas que implicaram na renovação da historiografia portuguesa nas últimas décadas do século XX, e que têm demonstrado que a mulher lusa nem sempre pautava seu comportamento pelas Ordenações Filipinas e pelas Constituições dos Bispados. São desta ordem os achados de Sobral Neto (2001): “Ao longo da época moderna, enquanto os modelos de comportamento e as estratégias de diferenciação e promoção social confinavam algumas mulheres, nobres e burguesas5, às paredes do lar ou aos muros do convento, a maioria, nos campos e nas cidades, desempenhava múltiplas tarefas necessárias ao desenrolar da vida quotidiana, assegurando uma parte essencial da reprodução da vida familiar, mas também nas comunidades onde estavam inseridas ... Nas cidades, as vendedeiras com seus cantares, pregões, gritos e insultos faziam o bulício das ruas citadinas. Com efeito, as mulheres asseguravam o abastecimento quotidiano das cidades em bens alimentares essenciais [...] desempenhavam ainda um papel fundamental no artesanato urbano, intervindo no fabrico do vestuário, calçado e no fabrico de rendas ou de cera. As mulheres camponesas, com mais freqüência do que os homens, ganhavam o dinheiro complementar que assegurava a sobrevivência da família à medida que se desenvolvia a nova economia comercial ...” (p.29-31).

4 Segundo Saint-Hilaire (1975, p.84) o custo de um casamento podia alcançar 50$000 réis ou mais. 5 Grifo nosso.

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Outro ponto a ser considerado é a “transposição” das quitandeiras africanas para o outro lado do Atlântico. Segundo Pantoja (2001) “O pequeno comércio de gêneros alimentícios nas cidades das regiões do Atlântico, do século XVII ao XIX, foi uma atividade à sombra do grande tráfico de escravos que mobilizava os interesses dos mercadores, administradores e soberanos. Esse comércio de caráter secundário era essencial na distribuição dos alimentos para as cidades e portos. A venda de gêneros básicos foi uma das tarefas das mulheres que garantiam o feijão, a farinha, a carne e o peixe seco para a própria continuidade do tráfico de escravos. Os navios negreiros precisavam da farinha e do peixe seco para a alimentação dos escravos ... Para a região da África Central Ocidental, as quitandeiras são o exemplo de como atuava essa rede comercial de gêneros de primeira necessidade, registrando-se, também, como as migrações transatlânticas trouxeram para as cidades coloniais brasileiras essas comerciantes.”6 (p. 45-67).

Não foi, portanto, só a herança portuguesa, quiçá européia, que trouxe para Minas e para o Brasil mulheres ativas e empreendedoras, capazes de gerir suas próprias vidas. As africanas também carregavam na sua bagagem cultural o gene do comércio e a fusão dessas duas culturas foi em grande parte responsável pela chamada peculiaridade do comportamento do sexo feminino na colônia/província mineira.

Embora os esses autores ressaltem o importante papel da mulher na economia e na sobrevivência do grupo familiar na Colônia e Província mineira, poucos são aqueles que tocam, e quando o fazem é apenas de passagem, em um tipo de problema que trouxe conseqüências graves para a sociedade brasileira atual.

Até hoje o mito da democracia racial é alardeado e a discussão política concernente ao tema incomoda sobremaneira a sociedade brasileira. Isto porque é difícil reconhecer que as desigualdades vivenciadas pelo afro-descendentes em todas as esferas da vida social resultem, ao fim e ao cabo, de uma cultura social e de uma política econômica imposta por indivíduos brancos (supostamente caucasianos) sobre os negros. Assim, por quinhentos anos, os afro-descendentes brasileiros vêem seu espaço socioeconômico limitado e delimitado por barreiras historicamente determinadas e dificilmente transponíveis. No caso das mulheres negras ou pardas então, associe-se ainda o peso de uma sociedade patriarcal e um regime escravista e veja-se onde é possível situar a mulher na escala social.

Na década de 1960 um grupo de pesquisadores empenhou-se em desmistificar a tal alardeada democracia racial brasileira. Autores como Roger Bastide, Florestan Fernandes, Otavio Ianni e Fernando Henrique Cardoso, entre outros, chegaram à conclusão de que a democracia racial brasileira existia apenas em um plano horizontal. Ou seja, os “contatos” entre as raças eram permissíveis e mesmo incentivados desde que cada um, nesse caso preferencialmente os negros e os pardos, se submetesse às regras hierarquicamente determinadas pela camada social dominante – os brancos – e não se aventurasse no campo da mobilidade social.

Atualmente, os estudos socioeconômicos de Martins (2003) e de Telles (2003) revelaram que a enorme desigualdade social existente no país é, principalmente, uma

desigualdade racial: o abismo existente entre as camadas superiores da sociedade, onde estão situados os indivíduos de cor branca, e a grande massa da população pobre, na sua maioria pardos e negros, em vez de diminuir, vem aumentando com o passar do tempo. Esses estudos

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também revelaram que, em termos de renda, a mulher negra está posicionada no nível mais baixo da escala social. Em outras palavras, o Brasil era, e ainda é, uma sociedade altamente hierarquizada, onde os indivíduos se posicionavam economicamente segundo seu biotipo - raça, ou cor – determinando esta inter-relação a possibilidade/concretude de mobilidade social.

Concluindo esta breve introdução, ressaltamos que é neste contexto de idéias e reflexões que pretendemos desenvolver nosso artigo propriamente dito. Nele, utilizando a categoria chefe de domicílio, pretendemos mostrar como as mulheres mineiras, apesar de toda a estrutura de sanção e coerção pretendida culturalmente pelo patriarcalismo importado pelos colonizadores, agenciaram a sobrevivência de um número significativo de famílias, pobres e abastadas, na primeira metade do século XIX. Como a desigualdade social associada à questão da democracia racial no Brasil se constitui o objetivo analítico principal deste artigo, a contextualização histórica da chefia domiciliar feminina na Província mineira será organizada/pontuada pela categoria cor, aqui considerada proxy da variável raça. Para tanto, utilizaremos como fonte de dados as listas nominativas da província de Minas Gerais referentes aos anos de 1818-1820 e 1838-1840.

Metodologia e análise dos dados

As listas nominativas da Província de Minas Gerais são relações nominais da população mineira. Ainda não sabemos exatamente por que elas foram elaboradas; talvez para recrutamento militar, talvez para controle do fisco, talvez para conhecer a população, talvez para formular uma divisão administrativa da Província, ou talvez por todos esses motivos conjugados. Para nós, o que interessa, na verdade, é que nos foi legado um material precioso, uma fonte inesgotável de informação para conhecer a sociedade mineira no Oitocentos.

As listas nominativas foram elaboradas por domicílios, ou fogos, e nos registros constam, além do nome de cada indivíduo pertencente ao fogo, sua idade, seu estado civil, sua qualidade (raça ou cor), sua condição (livre, escrava ou forra), sua ocupação, e, em alguns casos sua posição na estrutura familiar. As listas de 1838-40 apresentam um quesito a mais que se refere à alfabetização, ou não, do indivíduo arrolado. Infelizmente as listas mineiras não apresentam a riqueza de informações fornecidas pelas listas da Província de São Paulo, que além de serem praticamente anuais e cobrirem um período de cerca de 50 anos, fornecem dados mais completos sobre a produção econômica e estrutura familiar de cada domicílio.

Os dois conjuntos de listas foram coletados e transformados em banco de dados entre os anos de 1998 e 2001 por uma equipe do Centro de Estudos Mineiros da Universidade Federal de Minas Gerais7 financiada com recursos do Programa Nacional de Pesquisas Econômicas (PNPE) do IPEA. A maioria das listas nominativas de 1818-20 faz parte do acervo do Arquivo da Câmara Municipal de Mariana (ACMM) e foi coletada “in loco”. O restante das listas foi coletada no Arquivo Público Mineiro (APM).

Para 1818-20 foram encontradas 38 listas nominativas referentes a distritos dos municípios de Mariana, Ouro Preto, Pitangui, Curvelo, Paracatu e Sabará, compreendendo um total de 5.552 fogos. Para 1838-40 o conjunto de listas nominativas é maior, perfazendo um total de 159 distritos, distribuídos por 27 municípios: Aiuruoca, Araxá, Baependi, Caldas,

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Campanha, Diamantina, Itabira, Jacuí, Januária, Mariana, Minas Novas, Montes Claros, Ouro Preto, Paracatu, Pitangui, Pouso Alegre, Queluz (atual Conselheiro Lafaiete), Rio Pardo, Rio Pomba, Sabará, Santa Bárbara, São João del Rei, São José del Rei (atual Tiradentes), São Romão, Tamanduá (atual Itapecerica), Uberaba e Vila do Príncipe (atual Serro). Nestes distritos foi encontrado um total de 45.972 fogos.

Embora a base de dados de 1838-40 apresente uma maior cobertura do território mineiro tanto em termos geográfico como populacional, a análise unilateral nos permite estudar a Província mineira em dois períodos de tempo. Assim, selecionamos nestas listas todos aqueles fogos em que a relação familiar foi devidamente explicitada pelo recenseador e neles concentramos a nossa análise. Nossa variável de controle será o chefe do domicílio, o que implica em trabalhar exclusivamente com os indivíduos livres ou libertos8.

Há também que se explicitar o porque da opção por se trabalhar com a categoria chefe de domicílio e não chefe de família. Como já esclarecemos, algumas listas nominativas fornecem a relação entre os membros da família residentes em um determinado domicílio. Tomamos como pressuposto que o recenseador, subjetivamente imerso nas normas/crenças vigentes em uma sociedade patriarcal, não relacionaria no topo de sua lista o nome da mulher, esposa, mãe e em seguida o do marido caso este fosse o provedor, e por extensão o chefe da família. Tal comportamento sublimaria, talvez, os reais impedimentos, que se observam até os dias de hoje, devidos à cor ou raça dos indivíduos. Assim, sendo a mulher arrolada em primeiro lugar, assumimos que ela exercia um tipo de chefia sobre os demais componentes do domicílio. E por que não uma chefia de família? Porque ela teria que ter legitimidade, interna e externamente ao domicílio, para ser depositária das normas de comportamento enquanto regulamentações e agências nos níveis grupal e individual. Para que isso ocorresse, em primeiro lugar a mulher teria que ter legitimada sua condição individual de cidadania, o que pressupõe o usufruto de condições democráticas em todos os níveis da vida social. Esta condição não era associada ao indivíduo do sexo feminino no século XIX. Entretanto, é possível pensar que o recenseador não tivesse “pudores sociais/culturais” para arrolar a mulher, esposa e mãe, em primeiro lugar quando a mesma fosse realmente a provedora da sobrevivência material da família, o que assumimos como característica da posição chefe do domicílio. Quando o companheiro inexistia porque a mulher era solteira ou viúva, certamente a chefia domiciliar era por ela exercida.

Precisamos tecer ainda algumas considerações sobre a variável cor. Sabemos que a cor, ou “qualidade” segundo o manuscrito original de onde foram retirados os dados, é, em tempos modernos, uma variável declaratória, ou seja, é o indivíduo declarante que afirma seu pertencimento a determinado grupo de cor. É possível que no censo em questão a etnia do indivíduo não fosse considerada tão importante quanto sua condição livre ou escrava. É de se pressupor porém, que quem determinava a cor do indivíduo arrolado era o recenseador. Ou seja, a subjetividade do recenseador contemporâneo atribuía a cor do indivíduo relacionando-a com surelacionando-a condição livre ou escrrelacionando-avrelacionando-a e, possivelmente, trelacionando-ambém, com surelacionando-a siturelacionando-ação econômicrelacionando-a. Assim, uma grande variedade de “tons de pele” decorrentes da mestiçagem de raças foi encontrado nas listas nominativas (pardo, mulato, cabra, mestiço, caboclo, etc.).Sabemos que cada uma dessas nuances era considerada como resultado de um tipo de miscigenação diferente, variando a rotulação de região para região. Entretanto, para efeito de nosso trabalho, decidimos agrupar todas essas declarações sob uma única classificação: pardo. Mantivemos

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os crioulos (negros nascidos no Brasil) distinguindo-os dos negros africanos porque a aferição conjunta mascararia interpretações no nível da desigualdade social.

Finalmente, embora nossa fonte de dados não se estabeleça como uma série histórica mas sim como informações pontuais no tempo, em alguns momentos da análise assumimos a pressuposição de que os resultados quantitativos e analíticos a que chegamos se coloquem como uma tendência presente temporalmente entre os anos recenseados.

Podemos, agora, passar aos dados. A tabela abaixo mostra o total de indivíduos arrolados nos dois conjuntos de listas nominativas da Província de Minas Gerais para os anos de 1818 e 1838.

TABELA 1

POPULAÇÃO DA PROVÍNCIA DE MINAS GERAIS SEGUNDO SEXO E CONDIÇÃO / 1818 - 1838

1818 1838

Livre Escravo Forro Total Livre Escravo Forro Total

Homem 11.503 6.872 225 18.600 93.662 51.355 3.927 148.944

Mulher 12.377 4.072 232 16.681 95.661 34.912 4.056 134.629

s/inf. 17 493 1 511 89 89

Total 23.897 11.437 458 35.792 189.323 86.356 7.983 283.662

Fonte: APM, MP várias caixas e SP PP1/10 várias caixas. ACMM, vários códices

Os dados relacionados acima nos mostram que, relevando os problemas de amostragem já contextualizados, a distribuição da população mostra porcentagem semelhante nos dois anos, no que se refere ao sexo e à condição dos indivíduos. Ao mesmo tempo percebemos um déficit crônico dos homens livres e forros em relação às mulheres da mesma condição. Tal constatação, como já adiantamos, se reflete na conjugalidade, podendo resultar no impedimento de casamento das mulheres livres. Este assunto será aprofundado mais adiante.

Dentre todos os fogos arrolados trabalharemos com 58,75% dos domicílios que compõem a população listada em 1818 e 61,67% em 1838 uma vez que são esses os fogos onde a relação familiar foi declarada. As proporções de indivíduos chefes de domicílio classificados segundo sua condição e sexo estão discriminadas na tabela abaixo.

Segundo uma perspectiva de gênero, resultados interessantes foram produzidos quando é possível a observação também da chefia domiciliar segundo a raça deste chefe e a tabela abaixo mostra como as mudanças se processaram no período analisado.

TABELA 2

DISTRIBUIÇÃO PERCENTUAL DOS CHEFES DE DOMÍCILIO SEGUNDO SEXO E RAÇA PROVÍNCIA DE MINAS GERAIS / 1818 – 1838

1818 1838

RAÇA MULHERES % HOMENS % TOTAL MULHERES % HOMENS % TOTAL

BRANCOS 230 7,05 889 27,25 1.126 2.214 7,81 10.540 37,17 12.754 PARDOS 522 16,00 1.212 37,16 1.734 3.145 11,09 8.936 31,52 12.081 CRIOULOS 134 4,11 115 3,53 253 710 2,50 1.138 4,01 1.848 AFRICANOS 18 0,55 4 0,12 23 215 0,76 526 1,86 741 ÍNDIOS 11 0,34 95 2,91 116 24 0,08 80 0,28 104 S/INFORM 4 0,12 28 0,86 32 245 0,86 581 2,05 826 TOTAL 919 28,17 2.343 71,83 3.262 6.553 23,11 21.801 76,89 28.354 Fonte: APM, MP várias caixas e SP PP1/10 várias caixas. ACMM, vários códices

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Como a variável chefe de domicilio foi aqui estabelecida como variável-controle, cabe esclarecer que 71,8% dos fogos onde a relação familiar foi relatada em 1818 eram chefiados por homens. Em 1838-40 a porcentagem deste tipo de chefia elevou-se para 76,9% enquanto os domicílios chefiados por mulheres mostraram tendência oposta: 28,2% e 23,1% nos anos respectivos. Essa tendência também pode ser verificada quando percebemos que, de acordo com as listas nominativas de 1831-32, os fogos chefiados por mulheres representavam 26,3% da amostra, o que significa uma queda de 2 pontos percentuais em relação a 18189.

É interessante notar que embora os africanos de ambos os sexos apresentem um ligeiro aumento na chefia domiciliar entre os anos estudados, o aumento na chefia domiciliar dos homens brancos é significativo, sinalizando a “preferência” pela formalização dos casamentos entre os da “elite”10, fato este que, de alguma forma, demonstra a necessidade de perpetuação do status social, e por associação, a legitimidade da dominação.

Existem algumas discussões em torno desse tema. Figueiredo argumenta que a tendência a ruralização motivada pela crise da mineração determinou a domesticação da mulher no século XIX, soterrando a vida familiar típica do século XVIII. Com a expansão da agricultura “...surge a idéia da Tradicional Família Mineira, como exemplo de papéis conservadores associados ao modelo patriarcal. Desde então, supõe-se equivocadamente, mas de maneira cômoda, que esse foi o mais autêntico modelo da família mineira...”11 .

É inquestionável que com o esgotamento do ouro de aluvião e das grupiaras os desclassificados do ouro se viram obrigados a prover sua subsistência adotando formas alternativas de sobrevivência, seja através de uma atividade voltada para a produção agrícola seja engajando na prestação de serviços, incluindo aí o pequeno comércio. Como a Província mineira era farta em terras ainda inapropriadas, nada impedia o deslocamento dessa população para as áreas rurais. Ao se fixar na terra, a necessidade de constituir uma família se fazia sentir. As tarefas agrícolas necessitavam de braços e na impossibilidade de se adquirir escravos devido ao seu alto custo, a população menos favorecida economicamente gerava filhos. Para isso era preciso que a mulher permanecesse em casa, unida pelo casamento ou pelo concubinato ao parceiro, realizando as tarefas tradicionalmente femininas. É claro que aí também estavam incluídas as tarefas agrícolas mais leves.

As nossas listas nominativas não nos permitem fazer a separação entre urbano e rural. Se de fato a ruralização foi responsável pela diminuição do número de domicílios chefiados por mulheres devemos acatar as conclusões de Figueiredo (1997), Brüger (2000) e Faria (1998), que compararam as famílias residentes em áreas rurais e urbanas e observaram que a chefia feminina era maior nas cidades.

Entretanto, é interessante observar como se distribuía essa população por condição livre ou liberta.

9 Queiroz et alli, (2000). p. 22.

10 Lembramos que elite está aqui sendo considerada em relação à estratificação social (política) associada à cor dos indivíduos. Desconsiderando o status econômico, os brancos, pobres ou abastados, seriam os cidadãos de primeira classe.

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TABELA 3

DISTRIBUIÇÃO PERCENTUAL DOS CHEFES DE DOMÍCILIO SEGUNDO SEXO, RAÇA E CONDIÇÃO: PROVÍNCIA DE MINAS GERAIS / 1818 – 1838

1818 1838

HOMENS MULHERES HOMENS MULHERES

RAÇA

livres forros livres forras livres forros livres forras

BRANCO 38,4 25,6 50,1 35,8 AFRICANO 0 78,6 76,0 67,8 59,2 CRIOULO 4,7 21,4 14,3 20,0 4,8 16,0 10,1 23,6 PARDO 52,4 58,4 4,0 41,9 16,1 49,8 17,2 ÍNDIO 4,1 1,2 0,4 0,4 SEM DECL. 0,4 0,4 2,8 0,1 3,9 TOTAL 100 100 100 100 100 100 100 100

Fonte: APM, MP várias caixas e SP PP1/10 várias caixas. ACMM, vários códices

Como podemos ver, o percentual de africanos forros , tanto homens como mulheres, na chefia dos domicílios é menor em 1838. Ao mesmo tempo, registrou-se um aumento considerável das chefes libertas pardas em 1838 embora tenha ocorrido uma queda percentual na chefia masculina e feminina de cor parda. Entre os brancos também se verificou uma elevação do número de chefes de domicílio, tanto homens como mulheres , nos dois anos considerados.Será que podemos aqui levantar nossa suspeita anterior no que se refere à cor do indivíduo e dizer que eles foram embranquecidos pelo recenseador uma vez que agora são livres e chefes de domicílio? É pergunta que só pode ser respondida por trabalho futuro, quando fogo a fogo for estudado numa seqüência temporal.

No entanto, faz-se necessário conhecer uma outra faceta relacionada aos chefes de fogo, principalmente no que diz respeito às mulheres. Relacioná-los por estado civil é elucidativo para o tema em questão. Antes porém, devemos salientar que foram excluídos dessa amostra os índios devido à porcentagem insignificante desses indivíduos que declararam o estado civil: 1,8% em 1818 e 0,4% em 1838. Além disso, os chefes pardos forros (homens e mulheres) não forneceram informação sobre seu estado civil em 1818.

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TABELA 4

CHEFES DE DOMICILIO SEGUNDO CONDIÇÃO, RAÇA, SEXO E ESTADO CIVIL PROVINCIA DE MINAS GERAIS / 1818 – 1838

1818 1838

Condição Cor Estado civil

mulheres homens mulheres homens

solteiro 42,7 13,0 30,0 7,7 casado 6,8 83,3 9,0 87,7 viúvo 50,5 3,7 61,0 4,6 Brancos total 100,0 100,0 100,0 100,0 solteiro 55,5 8,0 49,5 6,5 casado 6,0 87,6 9,3 88,9 viúvo 38,4 4,4 41,2 4,5 Pardos total 100,0 100,0 100,0 100,0 solteiro 67,6 9,7 63,2 9,1 casado 5,9 84,5 8,1 85,5 viúvo 26,5 5,8 28,8 5,4 Livres Crioulos total 100,0 100,0 100,0 100,0 solteiro 0,0 0,0 55,4 7,3 casado 0,0 0,0 14,3 90,2 viúvo 0,0 0,0 30,4 2,4 Pardos total 0,0 0,0 100,0 100,0 solteiro 66,7 16,7 63,6 11,9 casado 0,0 83,3 5,2 84,7 viúvo 33,3 0,0 31,2 3,4 Crioulos total 100,0 100,0 100,0 100,0 solteiro 71,4 25,0 57,2 8,8 casado 14,3 75,0 7,7 89,1 viúvo 14,3 0,0 35,1 2,1 Forros Africanos total 100,0 100,0 100,0 100,0

Fonte: APM, MP várias caixas e SP PP1/10 várias caixas. ACMM, vários códices

.

O exame dos dados acima expostos nos leva a alongar nossa visão no sentido da localização histórica da desigualdade racial. Podemos fazer isso através da análise do estado civil. Em primeiro lugar o que mais nos chama a atenção é a porcentagem de homens chefes de domicílio casados, independentemente da condição e da cor. No que se refere às mulheres, percebemos a disparidade entre as brancas solteiras e as não brancas solteiras independentemente da condição.

Em outras palavras, nossos dados/resultados nos alinham aos resultados dos trabalhos dos autores citados no que diz respeito ao fato de que o percentual de mulheres chefes de família era consideravelmente alto. No entanto, o que queremos ressaltar é que a grande maioria dessas chefes de domicílio, eram pardas ou negras e, além disso, eram solteiras e com filhos bastardos (como veremos a seguir), o que lhes dava um status negativo numa sociedade escravocrata de rígidos padrões morais ditados pela igreja católica e hierarquia econômica dominada pelos brancos.

Precisamos, também, salientar um ponto muito importante que essa tabela esconde. Quando consideramos apenas os chefes de domicílio libertos verificamos que em 1818 eles

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representavam apenas 0,6% da população amostrada. Em 1838 a porcentagem de forros chefes de domicílios é de 4,1%, sendo que desses 1,3% são mulheres.

Com referência aos libertos, queremos tecer algumas considerações. A primeira delas diz respeito a uma discussão presente nos debates entre pesquisadores sobre a concessão de alforrias em Minas Gerais. Alguns argumentam que,com a diminuição da exploração do ouro, as cartas de alforria proliferaram na Província enquanto outros alegam que tal não aconteceu. Se houve aumento das manumissões, podemos conjeturar que, embora livres, os ex-escravos não tinham condições, fossem elas econômicas ou psicológicas, de se tornarem cidadãos. Ou seja, apenas uma parcela insignificante foi capaz de constituir uma família no sentido amplo de reunir parentes consangüíneos sob o mesmo teto, ou mesmo de colocar um teto sobre sua própria cabeça. Enquanto escravo ele poderia ser até um trabalhador altamente especializado, mas capacitação no trabalho não infere a capacitação para se tomar as rédeas da vida, na medida que, até então, sua alimentação, sua vestimenta e sua cama eram determinadas e providas pelo seu senhor. A sua experiência de vida limitava-se, quase unicamente, à obediência total e irrestrita.

Nesse caso, tendemos a acreditar que o liberto não foi encontrado como chefe de domicílio porque lhe faltavam as condições sociais, econômicas e psíquicas para se estabelecer independentemente. Isso porque é difícil conceber que o liberto pudesse ocultar do recenseador a sua condição de alforriado. As vilas e distritos eram ainda muito pequenos para que essa situação pudesse passar despercebida pelo pároco, pelo juiz de paz ou por seus auxiliares.

Numa sociedade escravocrata, o escravo que ganhou sua liberdade devia ser considerado um ser humano anômico, pois não pertencia a nenhum dos dois grupos que dividiam a sociedade. Ele não tinha nascido livre e nem pertencia mais ao meio em que tinha nascido. E, diferentemente dos Estados Unidos, no Brasil não existia uma região, ou um grupo de apoio, para onde ele pudesse se dirigir e aprender a viver como homem livre. Ou seja, a alforria, semelhantemente à Lei Áurea jogou o liberto aos leões: “estão livres, se virem, não temos nada com isso”.

“O negro cidadão não é o escravo transformado em trabalhador livre. O negro cidadão é apenas o negro que não é mais juridicamente escravo. Ele foi posto na condição de trabalhador livre, mas nem é aceito plenamente ao lado de outros trabalhadores livres, brancos, nem ainda se modificou substancialmente em seu ser social original. É o escravo que ganhou a liberdade de não ter segurança; nem econômica, nem social, nem psíquica. O cativo que sai da casa do senhor ou da fazenda, de um dia para o outro, sem ter sido preparado ou ter-se apropriado dos meios sócio-culturais necessários à vida nas novas condições, não é ainda um homem livre. (...) É que o negro cidadão é o escravo a que se deu liberdade; é o negro no qual persiste o escravo, ainda que em apenas alguns de seus atributos psíquicos e sócio-culturais. Por isso a primeira e a segunda geração de negros livres serão essencialmente gerações de ex-escravos. Tanto as pessoas como os sistemas econômico e sócio-culturais estarão profundamente impregnados dos componentes engendrados no mundo escravocrata”12.

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A colocação acima é válida tanto para homens como para mulheres. Mas no caso da mulher forra, dificilmente ela poderia escapar do destino da “Chapeuzinho Vermelho”: enquanto escrava o lobo já havia devorado sua vida, embora ela ainda pudesse contar com certa proteção do senhor pois era uma mercadoria valiosa. Alcançando sua liberdade, passava a ser disputada pela alcatéia. Chica da Silva foi apenas uma entre milhares que conseguiu acertar os números sorteados pela loteria acumulada.

Uma sociedade escravocrata não está dividida apenas em livres e escravos. Em uma sociedade escravocrata em que a classe dominante, são os livres brancos e os escravos são negros ou pardos, a cor da pele, mais que o status sócio-econômico, tem importância fundamental no posicionamento do indivíduo na hierarquia social. Além disso, o pardo e o negro, mesmo nascendo livre, não podia esconder a sua descendência direta ou indireta. Sua aparência física tornava evidente que sua origem era africana.

Os gráficos abaixo revelam como a cor da pele comprometia o status social das mulheres. De acordo com as leis da Igreja apenas a mulher casada deveria ter filhos. Entretanto os números revelam que a bastardia proliferava entre os filhos de mães não brancas.

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GRÁFICO I

Porcentagem de mulheres chefes de domicílio com filhos, 1818

48 93 77 100 100 100 85 80 83 89 97 86

solteiras casadas viúvas

Brancas Africanas Crioulas Pardas

Fonte: APM, MP várias caixas e SP PP1/10 várias caixas. ACMM, vários códices

GRÁFICO II

Porcentagem de mulheres chefes de domicílio com filhos, 1838

50 76 69 87 81 77 82 80 81 83 82 82

solteiras casadas viúvas

Brancas Africanas Crioulas Pardas

Fonte: APM, MP várias caixas e SP PP1/10 várias caixas. ACMM, vários códices

Esses gráficos demonstram claramente que é maior o número de mulheres solteiras não brancas que declararam que tinham filhos morando no mesmo domicílio. É preciso salientar que esses resultados mostram apenas o número de filhos sobreviventes e residentes

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no domicílio na data do arrolamento e não o número total de filhos que a mulher possa ter tido. Devemos também acrescentar que as mulheres índias foram desconsideradas nesses gráficos devido à porcentagem insignificante de mães nessa categoria: 1,2% em 1818 e 0,2% em 1838.

Devido ao escopo desse trabalho, não é possível nos determos aqui na análise da taxa de fecundidade das mulheres chefes. O nosso propósito é apenas observar as diferenças no estado civil segundo a condição de cor/raça das mulheres chefes. E isso os dois gráficos nos revelam claramente: enquanto as mulheres casadas e viúvas com filhos residentes no mesmo domicílio, independentemente da cor, mostram uma distribuição percentual mais equilibrada, a disparidade entre as solteiras brancas e as não brancas é eloqüente.

Alguns pesquisadores já estudaram a incidência de filhos ilegítimos durante os séculos XVIII e XIX e chegaram à conclusão que a geração de filhos bastardos encontrava campo fértil entre as mães não brancas solteiras. Venâncio (2000,p.198-199) chega à conclusão de que era alto o índice de ilegitimidade quando estuda a maternidade no período colonial, embora seu enfoque não priorize a raça. “O mundo colonial conviveu com índices de 30% a 60% de bastardia entre os livres e de 50% a 100% entre os escravos. A mãe solteira ou concubina acabou sendo um personagem aceito nas cidades e vilas do século XVIII. Na capital baiana os censos do século XIX indicam que de cada três mães brancas uma havia tido filho fora das fronteiras matrimoniais. O levantamento da população carioca em1799 arrolou cerca de oitocentas mulheres brancas chefiando domicílios. O modelo patriarcal que contrapõe o recato da mulher branca à promiscuidade das escravas é uma grosseira simplificação da realidade” O mesmo autor também enfatiza que “a mulher branca que assumisse o filho ilegítimo ficava sujeita à condenação moral, enquanto as negras e mestiças não estavam sujeitas aos preconceitos sociais como as brancas de posição [...] modesta. Um filho ilegítimo [de mulheres negras e mestiças] não desonrava a mãe no mesmo grau de uma mulher branca”.

Ainda em relação ao mito da castidade, nas pesquisas realizadas em São Paulo no censo de 1836, foram encontradas muitas mulheres casadas que tiveram filhos quando solteiras.”A incidência de ilegitimidade pode ser constatada pela cifra de que em 503 mulheres solteiras, 140 tinham em média até 4 filhos naturais”13.

Entretanto, o que é ainda mais importante é que essas mulheres, que mantinham relações ilícitas e tinham filhos ilegítimos, eram impedidas pela Igreja de participar da desobriga, pois viviam em pecado. Isso as deslocava ainda mais para baixo na hierarquia social. Além do mais, o conceito de honra feminina aplicava-se principalmente às mulheres brancas porque elas faziam parte da camada dominante de uma sociedade hierarquizada pela cor do indivíduo. Ou seja, as mulheres brancas ficavam desonradas mas as não brancas nem ao menos podiam reivindicar essa condição pois a posição que ocupavam na escala social era baixa demais para ser considerada. Na verdade, podemos nos aventurar a dizer que segundo as concepções morais da época, ser negra ou mestiça equivalia a ser promíscua.

Outro ponto a ser considerado é o levantado por Caulfield (2000).Tanto na América espanhola quanto na portuguesa, a preocupação da Coroa com a honra aparentemente cresceu no final do período colonial.”O aumento da mobilidade social e de casamentos entre pessoas de condições sociais diferentes ameaçava a lógica corporativa própria da Monarquia. As

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duas Coroas reagiram a esse abalo na ordem social fortalecendo o direito dos pais de impedir o casamento dos filhos e até mesmo proibindo o casamento entre pessoas desiguais”14

De certa forma, o aforismo que até hoje ainda encontra adeptos entre a população brasileira, devia retratar a realidade social no século XIX: “branca é para casar, mulata para copular e negra para trabalhar”.

TABELA 5

CONJUGALIDADE: CASAMENTOS INTER-RACIAIS PROVÍNCIA DE MINAS GERAIS/ 1818 - 1838

1818 1838

RAÇA BRANCO AFRICANO CRIOULO PARDO ÍNDIO BRANCO AFRICANO CRIOULO PARDO ÍNDIO

BRANCO 98,0 5,9 7,3 96,7 4,1 1,3 4,7 3,1 AFRICANO 88,2 2,4 0,2 0,1 80,2 9,0 0,4 CRIOULO 78,3 0,5 7,4 76,8 2,2 1,5 PARDO 2,0 5,9 19,3 92,0 3,2 8,3 12,9 92,6 10,8 ÍNDIO 100,0 0,1 84,6 TOTAL 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

Fonte: APM, MP várias caixas e SP PP1/10 várias caixas. ACMM, vários códices

Essa tabela, embora restrita aos dados encontrados para a Província mineira, é reveladora da sociedade escravocrata brasileira. A grande falácia da democracia racial brasileira que se apoiava no reconhecimento de uma sociedade formada por contingentes raciais distintos e miscigenados interagindo pacificamente, só pode ter surgido na cabeça do dominador. Pois, enquanto dominador – branco - ele impunha sua força para subjugar as escravas ou as libertas e produzir o grande número de mestiços, um degradê de cores, que caracterizou o país desde que os portugueses aqui puseram os pés.

Casar era financeiramente caro logo restrito às elites. Casamentos inter-raciais eram mal vistos e, no período colonial desaconselhados pela Coroa portuguesa. As uniões consensuais, embora fossem consideradas como “viver em pecado” pela Igreja, eram aceitas pela sociedade desde que se conservassem restritas as camadas populares.

Casar, de papel passado, obedecendo as normas da igreja católica e da sociedade, só mesmo com os da mesma raça ou cor. É preciso observar que esses dados foram obtidos quando consideramos apenas aqueles indivíduos onde existe a declaração de que o chefe e o cônjuge são casados. Mesmo quando existe uma família, em que o chefe se declara casado e reconhece os filhos como seus, mas que a mulher ou o homem não declara seu estado civil essa família não foi computada. Isso porque não podemos afirmar que ali existia um casamento formal.

Mas, da mesma forma que prevalecia no dominador a ideologia de que ele tinha o direito de usar seus dominados como melhor lhe conviesse, o dominado também estava imbuído dessa ideologia, principalmente porque não conhecia outra, e, de certa forma, apropriou-se da que existia. No caso da mulher, se escrava, podia ter esperança de libertação

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ou da libertação de seus filhos ou então de alguns privilégios que suavizassem seu cativeiro. Se livre poderia almejar um pouco mais. Se negra, a geração de um filho com um tom de pele mais claro poderia ajudar a sua inserção social ou a de seu filho. Ou seja, a ela também convinha a ideologia do “embranquecimento”.

A miscigenação da população mineira, tendo ela ocorrido fora das normas da vida social ou através do casamento abençoado pela Igreja, foi responsável pela superioridade numérica dos pardos. Entretanto, essa massa de indivíduos pardos, composta de homens e mulheres livres ou libertos, trazia a herança de seu “sangue impuro”, de sua ilegitimidade e de sua associação com o trabalho braçal. Numa sociedade escravista de origem portuguesa, onde ter que trabalhar significava desonra e onde a cor da pele determinava sua posição na escala social, o futuro que lhes era reservado era, e até hoje continua sendo, cinzento.

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