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A investigação sobre rádios comunitárias e a resistência em estudar o desconhecido

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A investigação sobre

rádios comunitárias

e a resistência em estudar

o desconhecido

journal on semiotics and culture ISSN 2183-6426 DOI 10.20287/eikon

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Em alguns países, como Portugal, o conceito de “rádio comunitária” está longe de ser conhecido. A Lei da Rá-dio, de 2010, continua a definir apenas quatro tipos de rádios quanto à cobertura geográfica: internacional, na-cional, regional ou local. As rádios comunitárias desti-nam-se à produção de conteúdos, através de emissores de baixa potência, para zonas geograficamente restritas e para comunidades com fins e interesses específicos, num espírito colaborativo e sem fins lucrativos (Foxwell et al., 2008).

Este desconhecimento (ou negligência) a nível legal co-incide igualmente com um número praticamente resid-ual de trabalhos académicos sobre rádios comunitárias em Portugal (Ribeiro, 2014), ao contrário de outras dinâmicas internacionais, na academia e na sociedade civil, que procuram refletir e organizar diversas prob-lemáticas a estes meios de comunicação (Meda, 2015). Partindo desta premissa, que incide sobre a pouca produção científica sobre o tema, pretendeu-se analisar parte da investigação científica sobre rádios comunitári-as, na área das Ciências da Comunicação. Deste modo, numa análise realizada a 91 trabalhos apresentados so-bre este tema, em congressos (67) ou revistas científi-cas (24), concluiu-se que os autores procuram estudar a realidade dos países em que se inserem, com uma preo-cupação de estudar fundamentalmente a emancipação social promovida pelas rádios comunitárias, as impli-cações legais e gestão financeira destas emissoras. Palavras-chave

rádio, comunitária, investigação, congressos, artigos, DOI 10.20287/eikon-n04-a02 Received / Recebido 01 03 2018 Accepted / Aceite 26 04 2018 Author / Autor

Fábio Ribeiro

Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) / Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade (CECS) - Universidade do Minho

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O terreno do desconhecido das rádios comunitárias

Num artigo de opinião publicado no jornal espanhol El País, Diego Beas defendeu que “a esfera pública já não é o que era”. O analista político e autor do livro La re-invención de la política defendia que “em menos de 25 anos passámos de uma utopia da Internet como força libertadora a uma rede privatizada e desenhada para beneficiar um punhado de grandes empresas tecnológi-cas”. Beas citava, neste texto de janeiro de 2018, um es-tudo do Reuters Institute for the Study of Journalism, da Universidade de Oxford, que denunciava que a maioria das pessoas inquiridas não se recordava concretamente das fontes de informação a que tinha acedido: “mais de metade da cidadania informa-se hoje através das redes sociais”, concluía.

O sentimento de uma esfera pública pouco vibrante, condicionada por interesses empresariais e mediáticos de larga escala, onde a possibilidade de auscultação de grupos e indivíduos particulares não aparece com a regu-laridade pretendida por muitos, resultou na emergência de projetos como os meios comunitários de comunicação (Lopez, 1995; Vazquez, 2001). Com efeito, apesar de mui-tos países desconhecerem exemplos concremui-tos de eman-cipação social através dos média comunitários, a verdade é que, um pouco por todo o mundo, têm surgido exem-plos de dinamização de órgãos de comunicação geridos por cidadãos comuns, numa lógica sem fins lucrativos, numa tentativa de dar voz a quem normalmente não tem acesso ao microfone mediático, numa escala geográfica diminuta. Neste sentido, televisões e jornais comunitári-os têm aparecido, no entanto a experiência mais comum e mais antiga relaciona-se com o meio radiofónico e as rá-dios comunitárias, que, segundo alguns especialistas, terá tido a primeira experiência na sequência de uma greve de mineiros na Bolívia, nos anos 70 do século XX (Peruzzo, 1998).

Do ponto de vista conceptual e teórico, a intervenção do público neste tipo de emissoras retoma considerações genéricas sobre a teoria dos movimentos sociais, que, grosso modo, sugerem a apetência de alguns grupos, co-munidades ou indivíduos de percorrerem diversas esferas da vida social, normalmente organizadas, para intervir e participar. Embora diversos sociólogos, desde meados do século passado, tenham apontado o narcisismo e o indi-vidualismo como os maiores entraves à mobilização so-cial e coletiva (Alonso, 2009), as ideologias marxistas de promoção da luta de classes sinalizaram esta ambição de reivindicar um papel mais ativo dos cidadãos no espaço público. No entanto, nem todo o paradigma marxista clássico aponta para a mobilização social. Segundo Gohn, a primeira corrente destes movimentos estava ligada “ao jovem Marx e a seus estudos sobre a consciência, a alien-ação e a ideologia etc., e que criou uma tradição histórica humanista que teve continuidade nos trabalhos de Rosa Luxemburgo, Gramsci, Lukács, e da Escola de Frankfurt após a Segunda Guerra Mundial. Será esta leitura do marxismo que alimentará as análises contemporâneas sobre os movimentos sociais” (1997, p. 172).

Neste contexto, McCarthy e Zald (1977) propõem a Teo-ria de Mobilização de Recursos (TMR), definindo a iden-tificação com uma causa comum, a racionalidade e uma forte dimensão sentimental como justificações plausíveis para a inscrição de um indivíduo em organizações da

sociedade civil. Esta inspiração, enquadrada por exem-plo numa Sociologia das Organizações, levanta questões relacionadas com a motivação individual, mas com a lon-gevidade dos próprios processos sociais. Para Alonso (2009), as estruturas organizadas no espaço público pre-cisam de ultrapassar a concorrência – entendida neste âmbito de um ponto de vista que excede a redutora lógi-ca comercial – para garantir a sua permanência no tempo e no mercado das próprias dinâmicas sociais, levando à existência de diversos conflitos internos o que no limita resulta na dissolução de alguns movimentos sociais. Esta teoria seria contestada por movimentos de esquer-da, que a acusavam de ser simplista, de aplicabilidade duvidosa “igualando-a a um fenômeno social como out-ro qualquer, dotado das mesmas características que os partidos políticos, por exemplo. A explicação privilegia a racionalidade e a organização e nega relevo a ideologias e valores na conformação das mobilizações coletivas” (Alonso, 2009, p. 53).

Com efeito, este trabalho não pretende, de momento, exibir o complexo debate conceptual e epistemológico que orientou grande parte das interpretações sobre movimentos sociais. No entanto, e para o caso das rádios comunitárias, tidas neste artigo como o protagonista de reflexão, podemos assumir que a emotividade, a racion-alidade e a identificação com projetos comuns podem configurar motivações para a participação neste proje-tos mediáticos comunitários. Pelo menos na dimensão emocional poderá existir um significativo apelo, tal como demonstrou Stefania Milan (2008) em que, através de inúmeras entrevistas a voluntários e participantes em rá-dios comunitárias, identificou alguns dos traços basilares da intervenção cidadã nestes espaços: o divertimento inerente às relações sociais estabelecidas na rádio, como espaços de expressão e afirmação pessoal; o entendi-mento de que o contacto direto com ouvintes poderia desencadear alterações comportamentais no público; uma experiência coletiva que reanima comunidades com pouca projeção comunicativa. Provavelmente um dos as-petos mais salientes destas entrevistas terá sido a defesa de um instrumento mediático que promove “mudanças sociais”, como sintetizou Milan.

A mobilização social em torno das comunitárias não pode ocorrer, porém, num quadro de absoluto desconhecimen-to do público sobre esta realidade. Para além do fraco conhecimento que ainda subsiste sobre a natureza con-creta destes projetos, a verdade é que os entendimentos díspares da legislação sobre o chamado Terceiro Setor in-fluenciam a criação de uma zona muito nebulosa sobre o tema, atraindo por vezes a desconfiança e a pouca credi-bilidade na dinamização destas iniciativas (Meda, 2015). Tal como refere López (1995), as rádios comunitárias não se limitam a projetos para emissões de “baixa potência”, nem tampouco se destinam “apenas para as áreas rurais, longe dos centros urbanos, onde não chegam as verda-deiras rádios” (2005: 51).

A investigação sobre rádios comunitárias parece ainda não estar devidamente sistematizada pelos académicos. No entanto, uma análise superficial e pouco apurada permite-nos sugerir que, de algum modo, os investiga-dores que têm vindo a trabalhar sobre este tema abor-dam problemáticas diversas que podem variar desde a implicação dos diferentes governos em regulamentar o setor, estudos sobre a dimensão voluntária inerente ao

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Figura 1 — Nuvem de palavras relativas aos vocábulos utilizados

nos títulos dos trabalhos sobre rádios comunitárias, utilizando a ferramenta Word Cloud (www.jasondavies.com)

A identificação de 67 trabalhos académicos sobre rádios comunitárias em congressos determinou, ainda assim, uma diferença substancial. Com efeito, aparentemente será no congresso da IAMCR que se verifica um maior interesse por esta temática. A avaliar pelas últimas três edições, as emissoras comunitárias reúnem o interesse de um número equilibrado de trabalhos, entre 14 e 24 (Gráfico 1).

Gráfico 1 — Comunicações sobre rádios comunitárias nos três

congressos da IAMCR considerados

No que diz respeito aos congressos da ECREA, ao con-trário do que sucede na IAMCR, existe uma secção es-pecífica para estudos de rádio – Radio Research Section. No entanto, o interesse pela temática parece diminuir de forma quase residual. Apenas uma comunicação e um máximo de cinco, em 2014, curiosamente no ano em que o congresso decorreu em Portugal, país que, curiosa-mente, não contempla qualquer instrumento legal para a promoção destes meios.

funcionamento destes projetos, a promoção de projetos sociais através da rádio, a construção da paz em zonas de conflito, entre tantos outros aspetos. Partindo desta perceção, que encerra provavelmente uma questão epis-temológica importante a reter, torna-se fundamental conhecer as movimentações dos investigadores junto da compreensão do fenómeno comunicativo das rádios co-munitárias.

Metodologia e discussão dos resultados

Tendo por base algumas das sugestões avançadas ante-riormente, este estudo partiu para a pesquisa concreta da representatividade das rádios comunitárias na inves-tigação científica em dois grandes grupos de análise: congressos internacionais na área das Ciências da Co-municação e revistas científicas no campo específico do estudo da rádio e meios sonoros. Relativamente ao primeiro, circunscrevemo-nos aos últimos três congres-sos – à data da redação deste artigo – da IAMCR (Inter-national Association for Media and Communication) e da ECREA (European Communication Research and Educa-tion), selecionadas para esta amostra não-probabilística, de natureza acidental, pela sua expressividade mundial, como eventos aglutinadores de grande interesse a nível internacional, de investigadores das mais variadas lati-tudes geográficas1. No que se refere às revistas

cientí-ficas, selecionaram-se as seguintes: Journal of Radio & Audio Media, editada pela Taylor & Francis Group, e a Radio Journal: International Studies in Broadcast & Audio Media, da Intellect. A trajetória já longa destas duas pub-licações e o grau de reconhecimento junto dos académi-cos determinaram esta escolha. Através da pesquisa atu-rada de todos as comunicações (no caso dos congressos) e todos artigos científicos (no caso das revistas) que de algum modo tenham problematizado questões relaciona-das com rádios comunitárias, definiu-se um conjunto de 91 objetos de estudo, divididos entre 67 pelos congres-sos e 24 nas publicações científicas consideradas. Embora não seja objeto primordial de pesquisa, os idi-omas dos trabalhos considerados variam entre o inglês, o mais expressivo, o castelhano e o português. Na seguinte imagem, sistematiza-se, através de uma nuvem de pala-vras, o conjunto de expressões e vocábulos mais utiliza-dos nos títulos utiliza-dos trabalhos pesquisautiliza-dos. Como seria natural, os termos “rádio” e “comunidade” destacam-se de sobremaneira.

Contudo, num segundo nível de destaque constam al-gumas expressões que podem ensaiar alal-gumas das con-clusões de em seguida se apresentam. Com efeito, os termos “participativa”, “tecnologia”, “investigação”, “voz”, público” ou “desenvolvimento” surgem com algum relevo, o que faz indiciar algum protagonismo destas dimensões neste quadro de investigação.

1 Foram considerados os seguintes eventos: IAMCR 2015, no

Québec (Canáda); IAMCR 2016, em Dublin (Irlanda); IAMCR 2017, em Cartagena das Índias (Colômbia). ECREA 2012, em Istambul (Turquia), ECREA 2014, em Lisboa (Portugal); ECREA 2016, em Praga (República Checa). Note-se que os congressos da ECREA se realizam apenas bianualmente.

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Gráfico 1 — Comunicações sobre rádios comunitárias nos três

congressos da IAMCR considerados

Relativamente às publicações científicas, convém antes de mais sublinhar que Journal of Radio & Audio Media foi criado em 1992, com o nome de Radio Studies. Radio Journal apenas foi fundado em 2003, pelo que se decidiu abordar e comparar a produção científica entre estes dois periódicos a partir desta data até 2017, data em que são coincidentes temporalmente. Contudo, não são propria-mente muito expressivos os resultados neste contexto, em que se registaram apenas 24 artigos científicos sobre rádios comunitárias, nos últimos 14 anos. Não se pode in-clusive sugerir um interesse exponencial pelo tema, com um caráter mais recente, uma vez que nos últimos seis anos apenas foram publicados dois artigos. O nível mais elevado fixa-se nos três artigos, curiosamente o máximo registado por edição, em ambas revistas.

Gráfico 3 — Artigos em revistas científicas sobre rádios

comunitárias

Considerando novamente os 91 objetos de estudo, na sua globalidade, verificou-se uma multiplicidade de na-cionalidades relativamente à autoria dos trabalhos. Dos 31 países registados, num total de 95 autores, são países anglo-saxónicos que surgem com mais frequência, dos EUA (16 autores), Reino Unido (10), Brasil e Índia (am-bos com 8) e Austrália (7). Do ponto de vista da repre-sentação dos autores por continente, observamos uma predominância dos continentes americano (37 autores) e europeu (27), seguidos da Ásia (19), Oceânia (7) e África, com cinco.

Uma das dimensões mais importantes deste trabalho consistiu em identificar o eixo temático dos 91 trabalhos que se predispuseram a analisar a atividade radiofónica neste segmento. A Tabela 1 refere justamente a categori-zação genérica dos temas abordados:

Tabela 1 — Comunicações sobre rádios comunitárias nos três

congressos da IAMCR considerados

Três grandes categorias dominam o interesse dos investi-gadores pela reflexão em torno das rádios comunitárias. A mais expressiva concretiza-se na dimensão social des-tas emissoras, com 29 dos 91 objetos de estudo consid-erados, em que se apresenta a ligação à sociedade, aspe-tos relacionados com a cidadania e emancipação social. A promoção do envolvimento cívico a partir da rádio surge como principal foco de estudo nesta dimensão em particular, com cinco trabalhos. Outros confluem para o mesmo sentido, entre a dinamização de campanhas de saúde pública, a promoção da identidade de uma comu-nidade ou ainda projetos de paz no México, todos com dois casos cada.

A gestão económica e o financiamento desta atividade, uma das questões mais pragmáticas que pode ser avan-çada neste contexto, acaba também por motivar o in-teresse dos investigadores, neste caso em 19 trabalhos. Tendo em conta a multiplicidade de entendimentos que se verificam sobre o tema, entre as próprias possibili-dades regulatórias que ora permitem/reprimem o finan-ciamento das comunitárias pela publicidade, é ainda assim relativamente consensual admitir que a maior parte des-tas emissoras procura, por filosofia própria, alternativas confortáveis à utilização de software dispendioso, recor-rendo à lógica natural destes projetos, que se apoiam na contribuição de específica de determinados grupos para a aquisição de material e de outras despesas. Neste sen-tido, não é de estranhar que a terceira categoria temática mais assinalada seja a dimensão legal, com 15 estudos, na medida em que as assimetrias que se verificam rela-tivamente às diferentes perceções sobre o que deve ser legalizado, e o que continua a marcar interesse, intrigam os investigadores. Na Europa, apenas para citar um ex-emplo, pode observar-se de que modo países com fron-teiras bem próximas entendem a Lei da Rádio de forma tão díspar a este respeito, com aquele que sucede com os países vizinhos França, onde esta atividade está regulada e em franca expansão, e Espanha, onde, apesar da legis-lação vigente, os atores locais não têm capacidade para desenvolver a atividade por falta de abertura de concur-sos e correta implementação da lei (Meda, 2015). Ainda assim, neste ponto destacam-se sobretudo estudos que abordam a evolução da regulamentação legal em diver-sos países (8 cadiver-sos), que vão desde a Bolívia, ao Chile, passando pela Índia igualmente. Regista-se ainda quatro estudos que destacaram que a aplicação concreta de uma lei reguladora desencadeou situações pouco proveitosas

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para as comunidades, obstando as emissoras ao cumpri-mento competente da sua missão.

Nos restantes aspetos temáticos, convém precisar algu-mas situações e que variam entre questões clássicas no estudo dos meios de comunicação do Terceiro Setor e outras possivelmente mais intrigantes. Por um lado, os estudos de caso, de abordagem de uma situação particu-lar, com sete trabalhos, embora não configurem o tema mais recorrente nesta investigação, tornam-se num ter-reno particularmente interessante para investigadores que, por algum motivo, procuram demonstrar um caso específico (e legítimo) para estudo. Entre as situações apresentadas nesta amostra constam, entre outros ex-emplos, o da implementação de duas rádios comunitárias no Zimbabwe, o impacto de emissoras desta natureza em Melbourne, na Austrália, e ainda a perceção que os vol-untários de uma rádio comunitária irlandesa manifesta-vam sobre a sua participação neste segmento.

No entanto, verificamos que, numa época de alguma profusão de estudos sobre o impacto das tecnologias no universo da comunicação, num sentido lato e abrangente, parece que as comunitárias não parecem um território propício para o estudo sobre a eventual integração de de-terminadas ferramentas digitais neste quadro, na medida em que apenas seis em 91 estudos procurou abordar esta questão. Da mesma forma parece algo surpreendente que o estudo sobre os conteúdos que são efetivamente transmitidos nas emissoras comunitárias fiquem longe de um plano de relevo para os investigadores, com apenas cinco trabalhos desenvolvidos sobre este assunto. Procurando conhecer um pouco melhor o âmbito destes estudos, a Tabela 2 determina o número de emissoras comunitárias que estiveram na base dos trabalhos ana-lisados:

Tabela 2 — Número de rádios comunitárias estudadas em cada

objeto de estudo considerado na amostra

Dos 91 trabalhos apresentados, em revistas e congres-sos, 59 não fez qualquer referência a uma emissora radi-ofónica comunitária em particular, o que está em sintonia com a sugestão anteriormente referida de poucos estu-dos de caso desenvolviestu-dos neste contexto. De qualquer modo, a tentativa de elucidar alguma questão relaciona-da com este universo comunicativo passou pela apresen-tação de, na maioria da situações (23 em 32), apenas um caso de uma rádio comunitária. Pontualmente outros es-tudos apresentaram outros casos (2 e 3, principalmente), registando-se ainda um trabalho que abordou seis emis-soras na análise.

Um dos pontos principais da leitura destes dados passa igualmente por tentar compreender quais as figuras,

per-sonalidades ou dimensões concretas de referência, abor-dadas ao longo das diversas investigações sobre rádios comunitárias. Variando, sobretudo, entre personalidades e contextos relativamente abstratos, ainda que concre-tos, a Tabela 3 identifica o protagonismo que se pode en-contrar ao longo destes trabalhos:

Tabela 3 — Figuras visadas nos estudos sobre rádios comunitárias De facto, parece consensual admitir um equilíbrio neste ponto entre aquela que será uma perceção relativamente de senso comum e os dados empiricamente extraídos. Tendo em conta a forte componente social, comunitária, destas emissoras, os trabalhos analisados focam sobretu-do a sociedade, em 49 de 91 das situações estudadas. De qualquer modo, o protagonismo isolado às comunitárias também se verifica em 25 casos, enquanto o Governo, como entidade promotora/repressora de políticas de comunicação para a área, também surge visado em 12 estudos.

Transitando para uma abordagem de natureza me-todológica, foi igualmente importante identificar o conjunto de técnicas de investigação utilizadas pelos autores. Na maioria dos casos (53), os investigadores se-lecionaram apenas uma técnica de análise, ao contrário de 38 que compatibilizaram a utilização de mais que um instrumento. Conforme sugere a Tabela 4:

Tabela 4 — Número de rádios comunitárias estudadas em cada

objeto de estudo considerado na amostra

A análise documental, utilizada preferencial pelos investi-gadores que e debruçaram sobre a evolução dos mecan-ismos legais relacionados com as rádios comunitárias, emerge como técnica de investigação mais frequente a partir desta amostra, bem como a observação não-par-ticipante, dedicada à atividade radiofónica comunitária, do ponto de vista da ausência de integração do investi-gador nas rotinas próprias destas emissoras. Registe-se ainda a utilização de sete estudos com entrevistas e, num polo oposto, apenas um trabalho destinado a fornecer elementos interpretativos sobre esta área a partir da produção científica neste segmento.

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Para finalizar esta observação, determinou-se o conjunto de países que foram, preferencialmente, objeto de estu-do, a que pertencem as emissoras radiofónicas analisa-das. Nos dez países mais assinalados, constam Brasil (9), Colômbia e EUA (ambos com 6), Austrália e Índia (ambos com 5), Bangladesh e Reino Unido (ambos com 4) e ainda Reino Unido, Canadá, Sri Lanka e África do Sul, com três estudos cada. Uma análise superficial indica não só a dis-persão geográfica destes países, ainda que focalizados sobretudo no continente americano e africano.

Apontamentos finais

Este estudo procurou, de forma exploratória, desen-volver alguma reflexão em torno de uma análise relativa à meta investigação sobre rádios comunitárias. A partir de uma amostra que contempla revistas e eventos cientí-ficos, procurou-se determinar opções preferenciais de investigação nesta área. Em ambos os objetos de análise, embora apontem ao mesmo universo, ocupam diferentes posicionamentos. Dada o enquadramento internacional da IAMCR, que supera a dimensão europeia (mas não ex-clusiva) da ECREA, leva a que, tipicamente, possamos en-contrar aqui um número mais elevado de comunicações sobre rádios comunitárias. Do mesmo modo, uma das revistas consideradas - Journal of Radio & Audio Media – apresenta uma trajetória mais consolidada do que a re-vista Radio Journal: International Studies in Broadcast & Audio Media. Importa ainda esclarecer que, para efeitos metodológicos, optou-se por excluir, no caso dos con-gressos, as sessões plenárias que pontualmente se dedi-caram à reflexão sobre meios comunitários, centrando o debate sobre rádio, exclusivamente. Note-se que, com menor expressão, existem relatos sobre televisões e jor-nais de natureza comunitária, no entanto não se consid-eraram para esta análise.

Embora parte do discurso da investigação aponte para a multiplicação do número de rádios comunitárias no es-paço europeu, pese as já referidas idiossincrasias legais distintas em vários países, parece ainda existir um terre-no pouco fértil de uma investigação académica que ainda se encontra timidamente preocupada a refletir sobre esta área. O centralismo americano e europeu também se ver-ifica neste contexto, na medida em se regista um maior número de autores de estudos desta áreas continentais, ao contrário de África ou da Ásia onde a importância prolixa das rádios comunitárias no espaço público não se traduzirá ainda numa investigação científica plural, multidisciplinar e com uma presença alargada em revis-tas e congressos. Do ponto de vista da autoria, parece certo admitir que os investigadores tendem a estudar a realidade concreta dos seus países, negligenciando pos-sibilidades de estudos comparativos ou até mesmo de colaborações na autoria do próprio trabalho, como se verificou em 58 dos 95 casos estudados. Numa apre-ciação global, constatou-se, portanto, que as dimensões de investigação mais analisadas tendem a enquadrar as rádios comunitárias numa perspetiva de emancipação so-cial, das circunstâncias inerentes ao próprio processo de regulação do setor e da gestão financeira destes projetos. Em termos de investigação que futuramente se poderá realizar, existe desde logo um número alargado de países que carecem de um estudo mais aprofundado, naquilo que se refere às dinâmicas eventualmente estabelecidas

entre a sociedade e este tipo de experiências. Muitos dos países que não contemplam qualquer instrumento legal para as comunitárias precisam ainda de um estudo apro-fundado. Paradoxalmente, nos países em que as emis-soras comunitárias dispõem de mecanismos legais, falta ainda compreender a natureza dos programas emitidos, a intervenção que a tecnologia desempenha neste con-texto ou mesmo os processos levados a cabo para o re-crutamento de voluntários e outros participantes para as emissões regulares das rádios comunitárias.

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Gráfico 1 — Comunicações sobre rádios comunitárias nos três  congressos da IAMCR considerados
Tabela 1 —  Comunicações  sobre  rádios  comunitárias  nos  três  congressos da IAMCR considerados
Tabela 4 — Número de rádios comunitárias estudadas em cada  objeto de estudo considerado na amostra

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