ATAS
I CONGRESSO DE
HISTÓRIA
CONTEMPORANEA
Coordenação
Maria Fernanda Rollo (IHC)
Maria Manuela Tavares Ribeiro (CEIS20) Ana Paula Pires (IHC)
ORGANIZAÇÃO
Rede de História
Contemporânea
Instituto de História Contemporânea
da Universidade Nova de Lisboa –
IHC
Centro de
EstudosInterdisciplinares
doSéculo XX da Universidade
de Coimbra - CEIS20
COORDENAÇÃO GERAL DA OBRA
Maria Fernanda Rollo
Ficha técnica
Revisão e Design:
Cristina Luisa Sizifredo
ISBN: 978-989-98388-0-2
Comissão científica
António Matos Ferreira, CEHR, Universidade Católica Portuguesa
António Pedro Pita, CEIS20, Universidade de Coimbra
António Pedro Vicente, IHC e FCSH da Universidade Nova de
Lisboa
António Ventura, FL da Universidade de Lisboa
Carlos Cordeiro, Universidade dos Açores
Fátima Nunes, CEHFCi e Universidade de Évora
Fernando Catroga, FL da Universidade de Coimbra
Fernando Rosas, IHC e FCSH da Universidade Nova de Lisboa
Gaspar Martins Pereira, FL da Universidade do Porto
Helder Adegar Fonseca, Universidade de Évora
Joaquim Romero Magalhães, FE da Universidade de Coimbra
Jorge Alves, FL da Universidade do Porto
José Viriato Capela, Universidade do Minho
Luís Reis Torgal, CEIS20, Universidade de Coimbra
Magda Pinheiro, CEHCP do Instituto Universitário de Lisboa
Maria Fernanda Rollo, IHC e FCSH da Universidade Nova de
Lisboa
Maria Manuela Tavares Ribeiro, CEIS20 e FL da Universidade de
Coimbra
Miriam Halpern Pereira, Instituto Universitário de Lisboa
Norberto Cunha, Universidade do Minho
Nuno Valério, ISEG, Universidade Técnica de Lisboa
Índice
Introdução...11
FAZER HISTÓRIA
Historiografia e nacionalismo no Portugal Contemporâneo
Sérgio Campos Matos...14 Pesquisando a história contemporânea no Brasil: a experiência do CPDOC
Celso Castro...23 Defesa, recuperação e valorização do património artístico e cultural como processo de “construção” e afirmação identitárias: o exemplo dos Açores
Carmen Ponte...31 Fazer História do Desporto
Francisco Pinheiro...46
SOCIEDADE E TRABALHO
As políticas sociais em Portugal (1910-‐1926)
David Pereira...59 O “entusiasmo” pela organização científica do trabalho do pós II Guerra aos anos 70
Ana Carina Azevedo...67
ECONOMIA: AGENTES E ACTIVIDADES
Expositions in the contemporary age: the case of Galicia
Margarita Barral Martinez...77 José Frederico Laranjo: economista, filósofo social, político,
historiador
O poder em estado de ignorância: rochas e ostras no século XIX, recursos a descobrir
Cristina Joanaz de Melo...101 Os empresários da sub-‐região da ria de Aveiro, 1864-‐1931
Manuel Ferreira Rodrigues...121 Palmela: chão que dá uvas (1945-‐1958)
Cristina Prata...132 O património industrial da moagem portuguesa do século XX
Rui Maneira Cunha...141
CIÊNCIA E HISTÓRIA DA MEDICINA
Poliomielitis y movimento antivacunacionista en España (1955-‐1963) Juan Antonio Rodríguez Sánchez...154 História oral e fotografia: construindo a História da Poliomielite em Portugal
Inês Guerra Santos...169 O processo de afirmação da psiquiatria em Portugal na transição do século XIX para o século XX
Ana Maria Pina...180 Júlio Augusto Henriques (1838-‐1928): introdutor de Darwin na ciência portuguesa e cultor do evolucionismo em Portugal Pedro Ricardo Fonseca
Ana Leonor Pereira
João Rui Pita...190 Procurando uma Ciência Nova ?
A atividade científica nos laboratórios universitários portugueses no pós I Guerra Mundial
Ângela Salgueiro...203 As reformas impossíveis do marcelismo: o caso Veiga Simão
Ana Paula Rias...213
HISTÓRIA & TERRITÓRIO
Fatores estruturantes da rede ferroviária portuguesa (1845-‐1892) Hugo Silveira Pereira...224 Novas paisagens urbanas em Portugal e as políticas urbanas oitocentistas
Margarida Relvão...234
LIBERALISMO
O liberalismo do século XIX tem ainda atualidade ? O caso de José Luciano de Castro (1834-‐1914)
Manuel M. Cardoso Leal...247 Liberalismo y Democracia en la España del siglo XIX: una relación conflictiva
Francisco Coma Vives...256 O Botequim do Vago-‐Mestre – Um clube liberal na Guimarães do século XIX (1816-‐1836)
Francisco Brito...265 A população do Porto na instauração do liberalismo em Portugal – episódios e comportamentos (1820-‐1826)
José António Oliveira...277 A contenda entre o poder central e a sociedade: a reforma
administrativa de 1867 no desabrochar do movimento da “Janeirinha”
Jorge Manuel Fernandes...288
REPÚBLICA E REPUBLICANISMO
O PRP em Braga na 1.ª República: sucesso eleitoral num ambiente adverso
Amadeu José Campos d Sousa...300
A Acão e influência de Antão de Carvalho no republicanismo duriense Carla Sequeira...309
Cunha Leal e o regime republicano nos primórdios da década de 30 (1930-‐1933)
Júlio Rodrigues da Silva...317 O Partido Republicano Nacionalista e o Clientelismo (1923-‐1935) Manuel Baiôa...326
GUERRA
L’incongruité de la coexistence des activités musicales avec la violence des combats au front durant la Grande Guerre
Éric Sauda...340 Portugal, durante a II Guerra Mundial, e o Holocausto
Irene Pimentel...348
DIPLOMACIA E RELAÇÕES INTERNACIONAIS
A ideia de hispanismo
Paulo Rodrigues Ferreira...355
O Estado Novo de além e aquém-‐mar: as relações luso-‐brasileiras e a participação do Brasil nas comemorações cívicas da Fundação e Restauração de Portugal em 1940
Sarah Luna de Oliveira...364 Os valores europeus de Calvet de Magalhães – breve esboço Isabel Maria Freitas Valente...373
RELIGIÃO
A emancipação dos judeus portugueses: de Pombal à República Jorge Martins...382
A política de desdobramento da imprensa católica: o caso do Diário do Minho, na década de 1920
Paulo Bruno Alves...392
Anticlericalismo e laicismo na formulação da política religiosa de Salazar
Duncan A. H. Simpson...403
De fascista a “eminente pensador cristão”: Plínio Salgado no jornal Novidades (1943-‐1946)
Gilberto Calil...411
REGIMES, PODER E PROPAGANDA
Periódicos militares, políticos de propaganda e agitação:
apontamentos para o estudo do seu contributo na implantação da República
José Luís Assis...421
Lorsque le marechal Pétain se fantasmait en “Salazar à la française” Cécile Gonçalves...433
Atrás da máquina de filmar
A propaganda política da DC e do Pci na Itália dos anos Cinquenta Elisabetta Girotto...443
O poder local do Estado Novo à Democracia: presidentes das câmaras e governadores civis, 1936-‐2012
Maria Antónia Pires de Almeida...457
RESISTÊNCIA E OPOSIÇÃO
Casa dos Estudantes do Império: pelo regime e contra o regime Pedro Ferreira...468
Os intelectuais do Porto. Resistência cultural e oposição ao regime (1958-‐1974)
Cátia Pereira...479
REVOLUÇÃO E DEMOCRACIA
Socialismo democrático e social-‐democracia: entre o discurso e a prática de Mário Soares – 1964/1979
Os saneamentos políticos no Diário de Notícias no “Verão Quente” de 1975
Pedro Marques Gomes...499 “Vocês ocupam e a lei há-‐de vir”. Poder militar na revolução portuguesa (1974-‐1975)
Maria Inácia Rezola...509
VIOLÊNCIA POLÍTICA
O discurso ideológico: inconformismo, violência e conflitualidade na sociedade italiana (1968-‐1978)
Marco Gomes...525
A problemática sobre o recurso à luta armada e o aparecimento FAP Ana Sofia Ferreira...536
CULTURA
Progresso, velocidade, indústria
Nuno Pinheiro...548 Vinho, café, chá...e cinema !
Cláudia Pinto Ribeiro ...555 Cultura Popular em Portugal: De Almeida Garrette a António Ferro Carla Ribeiro...564
Para uma história da edição no Portugal contemporânea: estudo de caso das Edições Romano Torres
Daniel Melo...574
ARTE,CULTURA E POLÍTICA CULTURAL
Relações sul-‐americanas na arte moderna no Brasil: a trajetória do abstracionismo geométrico através do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro
Elizabeth Catoia Varela...586
COLÓNIAS E COLONIALISMO
Macau no seu contexto diplomático: a visão dos deputados (1885-‐ 1910)
Célia Reis...597 “Lusitaníssimas no seu todo”. Histórias do luso-‐tropicalismo na cultura de massas
Marcos Cardão...606
Uma abordagem do problema colonial pela oposição antisalazarista: a “questão indiana” e os exilados no Brasil
Heloísa Paulo...615
DESCOLONIZAÇÃO E PÓS-‐COLONIALISMO
Marcello, Spínola e Cabral: as missões do fim – 1968-‐74 Márcio Barbosa...624 The “Atlantic Factor”: the United States and the Portuguese surrender to decolonization, 1973-‐1975
António Peciccia...627
Introdução
the analysis of contemporary events requires “depth” no less-perhaps, indeed, a good deal more-than any other kind of history; our only hope of discerning the forces actually operative in the word around us is to range them firmly against the past.
(Geoffrey Barraclough, An Introduction to Contemporary
History, New York, Basic Books, 1964, p.8.)
Quando falamos de História é sempre à memória colectiva de um Estado, de uma Nação, de um Império que nos estamos a referir. É a história que nos dá um sentido de pertença, a um País, um local ou uma família. A reflexão de Geoffrey Barraclough que serve de ponto de partida a esta breve introdução mostra a importância da história contemporânea e serve de elo de ligação para o seu papel na construção e afirmação da identidade nacional. Essa dimensão “local” permite-nos encontrar elos comuns – económicos, políticos ou culturais – e identificar interdependências num quadro mais geral de mundialização do conhecimento. A História, e o seu estudo, surgem assim como um património singular que importa preservar e divulgar, não só interna mas também externamente.
O I Congresso Anual de História Contemporânea realizado nos dias 18 e 19 de Maio de 2012 na Reitoria da Universidade Nova de Lisboa foi a primeira iniciativa pública da Rede de
História Contemporânea. No ano anterior as unidades de investigação portuguesas, tendo
como principal área de trabalho a história contemporêna, entenderam associar-se no sentido de constituírem uma plataforma de partilha, colaboração e diálogo permanente, tendo em vista o aprofundamento de estudos e o desenvolvimento de iniciativas, conjuntas, em contexto nacional e internacional.
O I Congresso Anual de História Contemporêna organizado pelo Instituto de História Contemporêna da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e pelo CEIS20 – Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX - da Universidade de Coimbra reuniu intervenções proferidas por conferencistas convidados e comunicações submetidas através de call for papers. A organização do encontro esteve a cargo de Maria Fernanda Rollo (Instituto de História Contemporânea, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa), Maria Manuela Tavares Ribeiro (CEIS20, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra), Ana Paula Pires, (Instituto de História Contemporânea, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa) e João Paulo Avelãs Nunes (CEIS20, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra).
O encontro reuniu mais de uma centena de conferencistas, de formações académicas diversas que, ao longo de dois dias de trabalho intenso apresentaram e debateram trabalhos sobre temáticas variadas, tendo apenas como principal dominador comum e elo agregador o estudo, a compreensão e a reflexão da contemporaneidade. As comunicações foram divididas em 18 sessões temáticas, cuja organização se reflecte nas actas que agora se publicam:
1. Fazer História; 2. Sociedade e Trabalho;
3. Economia: Agentes e Actividades; 4. Ciência e História da Medicina; 5. História & Território;
6. Liberalismo;
7. República e Republicanismo; 8. Guerra;
9. Diplomacia e Relações Internacionais; 10. Religião;
11. Regimes, Poder e Propaganda; 12. Resistência e Oposição; 13. Revolução e Democracia; 14. Violência Política; 15. Cultura;
16. Arte, Cultura e Política Cultural; 17. Colónias e Colonialismo;
18. Descolonização e pós-colonialismo.
Os textos, e as apresentações que estiveram na sua base, contribuem para o balanço do caminho percorrido e a percepção do rumo actual da historiografia contemporânea, assumindo, em alguns casos, um papel activo na crítica e análise do tempo presente, onde as incertezas relativamente ao futuro se tornam cada vez mais prementes. Na verdade, se a capacidade humana para inovar e aperfeiçoar é infinita, esta terá que assentar, sempre, como sabemos, na compreensão da história e do seu progresso. A história surge assim como um instrumento de identidade e, muitas vezes, legitimador de poder1.
A organização do primeiro I Encontro Anual de História Contemporânea não teria sido possível sem o envolvimento da Universidade Nova de Lisboa. Uma palavra de sentido agradecimento ao Magnífico Reitor da UNL, Professor Doutor António Rendas, que acolheu esta iniciativa no espaço da Reitoria. Agredecemos o apoio e a ajuda que nos concederam a Dr.ª Joana Táboas do Gabinete de Comunicação da Reitoria da Universidade Nova de Lisboa, a Dr.ª Maria Inês Queiroz do Instituto de História Contemporânea e a Mafalda Jardim, do Centro República da FCSH.
O e-book que agora se edita deve muito ainda à colaboração empenhada da Dr.ª Cristina Sizifredo do Instituto de História Contemporânea.
A todos o nosso agradecimento sentido.
Muitos foram os autores que responderam ao nosso desafio e acederam enviar os seus textos para publicação, a todos o nosso manifesto reconhecimento pela qualidade e pelo prestígio que as suas reflexões concedem a esta obra.
Lisboa, Maio de 2013 Maria Fernanda Rollo Pela Comissão Organizadora
1Luís Reis Torgal (Coord.), Estudos do Século XX n.º11. Fazer História Contemporânea, Coimbra,
FAZER HISTÓRIA
Historiografia e nacionalismo no Portugal Contemporâneo
Sérgio Campos Matos
Faculdade de Letras de Lisboa
Aprendemos há muito que há diferenças fundamentais entre ciência e ideologia. Enquanto a primeira se constitui num discurso analítico e reflexivo, a segunda exprime-se, não raro, em discursos doutrinários de carácter maniqueísta, que incitam à acção. É certo que ao longo dos dois últimos séculos, a par de dinâmicas relacionadas mas não coincidentes de laicização e de profissionalização dos historiadores, se foi afirmando uma tendência no sentido da autonomização da história em relação aos poderes instituidos e às ideologias. Todavia, sempre houve usos políticos do passado. Pretende-se traçar uma breve perspectiva crítica sobre as complexas relações entre a escrita da história e os nacionalismos num tempo longo, marcado por processos de nacionalização com características diversas (das revoluções liberais ao final do Estado Novo), procurando responder a duas perguntas: que posições críticas contribuiram decisivamente no sentido da autonomização do campo da história em relação aos ideários nacionalistas e ao campo do poder? Qual o lugar da historiografia como possível instrumento de nacionalização? Importa considerar diversos momentos na afirmação da centralidade do conceito de nação no discurso historiográfico e na relação deste último com os nacionalismos.
Na fundação da Academia Real das Ciências, no final do século XVIII , delineia-se um programa pragmático de cultivo da história. Aposta-se nas ciências da natureza mas também na economia e nas ciências do homem. O Abade Correia da Serra, um dos seus fundadores, homem cosmopolita e viajado, exprime a intenção de aprofundar o conhecimento da nação, com um propósito utilitário: “O conhecimento do que uma nação é, e do que pode ser, pelo que tem sido, é dos mais úteis para a sua felicidade, e só pode esperar-se dos esforços unidos de um corpo tal, como a Academia” (Serra, 2006 [1789], p.214) .
Longe de pretender romper com a tradição histórica, no primeiro liberalismo português - que se difunde na imprensa periódica de Londres ainda antes da revolução de 1820 – pode notar-se um modo de conciliação entre presente e passado, entre nação e monarquia, entre nação e religião católica. O nacionalismo liberal, que nasce no confronto com o expansionismo napoleónico e depois com a tutela britânica sobre Portugal, legitima-se enraizando-se numa teoria de constitucionalismo histórico que invoca instituições originárias na Idade Média (daí a relevância de conceitos como cortes, leis fundamentais, constituição, entre outras), em autores como Hipólito José da Costa, Rocha Loureiro ou José Liberato Freire de Carvalho – todos eles jornalistas exilados em Londres. Neste último encontra-se aliás uma posição muito crítica em relação à dependência de Portugal para com a Inglaterra.
O interesse pragmático pela história prossegue nos anos 30 e 40 quando se desenvolve a polémica internacional acerca da prioridade dos descobrimentos na costa ocidental africana. Nela tem papel destacado o Visconde de Santarém (mas não se esqueça o Cardeal Saraiva) na argumentação histórica contra a tese francesa. Estavam em causa interesses coloniais portugueses em África. Na obra de Santarém é muito evidente a relação entre história e diplomacia (a primeira so serviço da segunda) para demonstrar os direitos históricos do estado português a pontos da costa africana como Molembo, Cabinda e Ambriz. Uma revista como os
Anais Marítimos e Coloniais difunde a posição portuguesa (1840-46). Santarém era adepto do
antigo regime político, o que não comprometeu de modo algum o seu envolvimento na defesa dos interesses do Estado liberal na sua política externa (Protásio, 2009).
Alexandre Herculano não terá estabelecido uma ruptura com a história que se praticava antes dele na Academia das Ciências (Macedo, 1980, pp.14-16). Mas tendo começado pelo jornalismo e pelo romance histórico no início do decénio de 1840, marcou de um modo muito claro a distanciação crítica em relação ao que designava de história fabulosa – isto é uma história que aceitava tradições míticas como a que identificava Portugueses com Lusitanos, o milagre de Ourique nas origens da independência de Portugal, ou as supostas Cortes de Lamego – para não aludir à velha tradição de uma linhagem de reis mitológicos iniciada com Túbal. Para Herculano, o valor da verdade em história – basilar na construção científica - sobrepunha-se ao culto de qualquer alegada tradição gloriosa, não fundamentada históricamente em evidência documental. O historiador acentuava decisivamente a distinção história-mito. Reconhecendo o sentimento de lealdade patriótica como uma virtude, não deixava contudo de se precaver contra os seus efeitos nocivos na escrita da história:
“O patriotismo pode inspirara poesia; pode aviventar o estilo; mas é péssimo conselheiro do historiador. Quantas vezes, levado de tão mau guia, ele vê os factos atrvés do prisma das preocupações nacionais, e nem sequer suspeita que o mundo se rirá, não só dele, o que pouco importará, mas tanbém da credulidade e ignorância do seu país, o qual desonrou, querendo exaltá-lo!” (Herculano, 1846, I, p.16)
Note-se, no entanto, que Herculano sempre valorizou o sentimento de lealdade patriótica e defendeu a independência nacional em termos inequívocos, chegando até a posicionar-se em termos adversos em relação ao progresso material. Alguns exemplos: quando em 1838 não põe em causa o valor instrumental da tradição da Padeira de Aljubarrota, subalternizando o problema da sua autenticidade; quando, em 1853, em polémica acerca da centralização, advertia dos riscos que poderia ter a construção do caminho de ferro do leste, que ligaria Lisboa a Madrid; ou já em 1861, ao subscrever um manifesto nacionalista da Comissão 1º de Dezembro (Matos, 1998).
A Regeneração corresponde a um tempo de transformação do Estado e de introdução em Portugal de inovações tecnológicas. De reacção nacionalista à difusão de projectos iberistas, unitários ou federalistas. Vulgarizaram-se então centenas de artigos de imprensa periódica,
manifestos, panfletos, livros de história, romances e dramas históricos contra a ameaça iberista (Catroga, 1984, Pereira, 1996). Em muitos destes textos afirma-se uma intencionalidade de enraizamento histórico em que domina uma teoria teleológica de progresso e de sucesso da nação que viria a ser parodiada por Eça de Queiroz.
Oliveira Martins herda a atitude crítica de Herculano em relação às tradições míticas mas vai mais longe, tornando-se o mais fundamentado crítico do comemorativismo histórico que então se pratica. Num tempo europeu marcado pela unificação política da Itália, a emergência do II Império alemão e a derrota militar da França, Martins constrói a contra-narrativa mais convincente de denúncia da “decadência” a que chegara a nação, nos antípodas do paradigma dominante da narrativa de sucessos, triunfalista, comandada por uma noção linear de progresso. Não surpreende pois que essa sua narrativa trágica da deriva nacional tenha sido apropriada como arma política pelos republicanos contra a monarquia constitucional.
O autor do Portugal Contemporâneo é o mais eloquente crítico do modelo de desenvolvimento fontista e, por outro lado, o crítico mais mordaz do comemorativismo histórico que o regime constitucional não consegue capitalizar a seu favor:
“Não se vive de glórias passadas, existe-se por via de forças actuais. Arremeter com foguetes no 1º de Dezembro de cada ano, parece caricato quando em toda a gente há a consciência da nossa fraqueza militar. Solenizar em navios de papelão dourado as
esquadras passadas, de uma nação que deixou de ter marinha. Não será burlesco?
Não levará a reduzir o patriotismo a um sentimento de teatro, e avida nacional a uma ópera?” ( Martins, s.d., I, [1880], 225).
Martins punha em causa um patriotismo retrospectivo e retórico que encontrava os seus modelos no passado, como se este fosse uma Idade de Ouro sempre superior ao presente – um antigo regime de historicidade, para empregarmos o conceito de F.Hartog (Hartog, 2003). Cerca de sessenta anos depois, nos primórdios da II Guerra Mundial, Fernando Piteira Santos retomaria esta atitude anti-historicista e anti-passadista de culto de glórias “irremediavelmente passadas”, apelando à luta quotidiana “por um presente melhor” (cit. em Neves, 2007, 305).
Voltando a 1880: na polémica entre Eça de Queiroz, e Pinheiro Chagas nota-se um duplo equívoco (Eça baseava-se na visão crítica de Oliveira Martins acerca do império português oriental e não lera a História de Portugal de Pinheiro Chagas). Mas a intervenção de Eça nesta polémica é extremamente significativa pois nela distingue dois tipos de patriotismo: o patriotismo retórico “patriotaça” e o patriotismo construtivo, voltado para a acção no presente. Evidentemente, patriotismo não é sinónimo de nacionalismo, pois este, além de sentimento e consciência nacional, envolve movimento e doutrina política. Mas o que importa sublinhar é que no quadro do nacionalismo liberal se estabeleciam relações muito diversas com o tempo: de passadismo e continuidade ou, ao invés, uma atitude prospectiva e futurante.
No contexto de uma teoria positivista e étnica da nação em que valoriza o papel do povo, Teófilo Braga dissocia nação e monarquia (dinastia de Bragança), vendo esta como um “corpo estranho”. E acentua a oposição entre o pensamento federal – que via como ideia força da história nacional – e a unificação num grande estado que se afirmou na história moderna (Braga, 1894, X e 153). Aliás, os republicanos, com os seus centros e clubes de bairro, formas de contacto directo com as camadas populares e a relevância que concederam a todo um argumentário historicista contribuiram indiscutivelmente para a nacionalização dos portugueses, especialmente nos centros urbanos (Catroga, 1991).
Os eruditos de finais do século XIX e princípios do séc. XX, adoptam um registo de história positiva, aparentemente distanciada em relação às questões doutrinárias (A.Braamcamp Freire, Gama Barros, Cristovão Aires, entre outros). Todavia, o conceito étnico de nação teorizado por Teófilo Braga faz o seu caminho simultaneamente entre historiadores republicanos e entre tradicionalistas, defensores de uma monarquia orgânica. Entre estes ganha destaque o grupo do Integralismo Luistano, que revê o percurso histórico nacional à luz do conceito de raça, substituindo a narrativa liberal e republicana de decadência (projectando-a agora sobretudo no século XIX e responsabilizando a revolução liberal, a maçonaria e o judaísmo por esse declínio). Em oposição à I República constrói um conceito tradicionalista e orgânico de nação. Por outro lado, os historiadores republicanos, herdeiros da narrativa liberal valorizavam conceitos como povo, revolução, progresso, decadência e burguesia. Mas também raça. E é a I República que institui, entre outros dias feriados, o 1º de Dezembro – aliás considerado festa da bandeira. A primeira experiência republicana é em Portugal marcada por intensos debates políticos. E a experiência histórica não deixa de ser assiduamente convocada.
A este nacionalismo étnico e conservador opõe-se um universalismo humanista – o da
Seara Nova - que não enjeita um patriotismo prospectivo e um nacionalismo ecuménico,
entendido como “legítimo nacionalismo”, isto é, “estudo e elaboração das realidades nacionais e na perspectiva universalista” (Sérgio, 1980 [1920], 64). Posição universalista que , no caso de António Sérgio, se fundamenta numa teoria europeísta da independência de Portugal. Por seu lado, Jaime Cortesão desenvolve uma tese que, colocando em evidência o condicionalismo geográfico, valoriza o factor democrático – a participação popular em momentos decisivos do percurso histórico nacional como a revolução de 1383.
Tal posição crítica vai enfrentar o nacionalismo exclusivista do Estado Novo que no plano da história ensinada adopta, em Abril de 1932 (Gustavo Cordeiro Ramos), um rígido programa estatal de instrumentalização da memória da nação: identificavam-se os princípios que deviam ser glorificados (família, fé, autoridade, firmeza do governo, respeito da hierarquia) e os que deviam ser censurados (enfraquecimento da confiança no futuro, ausência de culto dos heróis). Era todo um programa de doutrinação nacionalista que se alargará em termos sistemáticos a partir de 1936, com Carneiro Pacheco no Ministério da Educação. Mas esse
programa não foi totalmente unânime, entre os apoiantes do regime houve divergências significativas (Matos, 1990, 129-131), como de resto sucedeu em Espanha (Saz, 2006, 152-164). Este nacionalismo retrospectivo e historicista valorizava como tópicos-chave a missão evangélica da nação e do seu império, a civilização lusíada, o mito da cruzada na resistência ao Islão, tradições míticas como a da identificação entre Portugueses e Lusitanos (e até, em certos casos ainda o milagre de Ourique) e heróis-tipo como Nuno Álvares e o Infante D. Henrique. Tais tópicos cristalizam ainda no V centenário da morte do Infante D.Henrique, em 1960 (Matos, 2008). Mas por essa época que já era de crise do regime (campanha presidencial de 1958, tentativas de golpes militares em 1959 e 1961, início da guerra colonial, 1961, crise académica de 1962) notava-se já a erosão desta cultura histórica nacionalista e imperial. No Estado Novo domina um nacionalismo defensivo (embora no plano da linguagem possa por vezes parecer o contrário), um nacionalismo que não caminhava no sentido do alargamento do espaço público de cidadania antes na mobilização ideológica e sectária no sentido da ideologia dominante. A par da desvalorização da política como exercício de direitos cívicos, incentivava-se a desmobilização e o refluxo no espaço privado (lembrem-incentivava-se os quadros afixados nas escolas com as mensagens de Salazar, “A lição de Salazar”). Historiadores universitários e eruditos que deram relavantes contributos para a historiografia portuguesa – caso de Paulo Merêa em 1940 ou de Torcato de Sousa Soares em 1962 – consideravam que o patriotismo não era incompatível com a objectividade em história (Oliveira, 2011, 46). Dentro de certas condições: aquando do Congresso do Mundo Português (1940), afirmava Paulo Merêa: “A verdade histórica e o sentimento patriótico não colidem, desde que este não seja uma contemplação saudosista das glórias passadas, nem uma exacerbação megalómana do orgulho colectivo, mas sim ma consciência serena e legitimamente entusiástica do nosso valor, do nosso papel e do nosso ideal”. Valorizava a história como instrumento de consciência de si de um povo, sob a condição indispensável de “não a deformar”. E retomando Oliveira Martins (sem o citar), considerava que as comemorações do duplo centenário de 1940, então a decorrer, deveriam ter a “a profundidade e a gravidade dum exame de consciência” (Merea, 1941, p.338).
Desde os anos 40 difundiam-se as contra-culturas neo-realista e por outro lado a surrealista. Afirmava-se, na Universidade e à margem dela – em associações culturais como o Ateneu Comercial de Lisboa ou em passeios informais como os realizados a Vila-Franca de Xira - um pensamento crítico que herdara a narrativa republicana e laica do percurso histórico nacional. A nova geração que se afirma nesses anos no campos da história e do ensaio - V.Magalhães Godinho, A.José Saraiva, Óscar Lopes, Joel Serrão, Fernando Piteira Santos, Barradas de Carvalho, Jorge Borges de Macedo, Armando Castro para só citarmos historiadores - animada pela derrota dos regimes totalitários de direita, procede à crítica do ambiente cultural que então se vive (caso do comemorativismo histórico do Estado Novo como expressão de um nacionalismo estéril) (Godinho, 1947). Vitorino Magalhães Godinho identifica os factores de
crise da historiografia e inicia uma renovação de perspectivas e problemas. Esta geração viveu um exílio cultural – e territorial pois alguns tiveram que se expatriar – e foi construindo uma contra-narrativa, claramente divergente em relação à narrativa tradicionalista, étnica e conservadora do Estado Novo. Entre os intelectuais que então se afirmaram ganhou destaque, no domínio da história, o conceito de classe. Refiram-se, entre outros, os historiadores ligados ao Partido Comunista Português: Costa Dias, Flausino Torres, Victor de Sá, Fernando Piteira Santos, Joaquim Barradas de Carvalho, Armando de Castro, António Borges Coelho, José Tengarrinha (Neves, 2010 e Madeira 2007), todos eles herdeiros do pensamento histórico liberal-radical, republicano e socialista.
Entre os problemas que então se discutiam na historiografia portuguesa dos anos 60, já muito marcada pela corrente dos Annales e pelo marxismo (só mais tarde pelo estruturalismo), encontravam-se o conceito de revolução, o carácter social das revoluções liberais, o alegado fracasso da revolução industrial e da construção de uma sociedade burguesa, as limitações das reformas sociais e económicas empreendidas pelas elites, as relações com o Brasil colonial e pós-colonial, a dependência em relação à Inglaterra e, naturalmente, problema dos problemas, o atraso económico – visto sobretudo em comparação com a Inglaterra, considerada caso padrão (mas já também com a França e a Espanha). Note-se que o alegado fracasso das revolução industrial e da persistência de estruturas sociais e económicas do Antigo Regime são teses também muito em voga na historiografia espanhola da época (caso de Jose Maria Jover ou de Tuñon de Lara).
Afirmava-se o interesse pelo século XIX (só depois pela I República), esquecido nas universidades porquanto confundido com jornalismo, política e sociologia e assim sendo, a evitar pelo poder. Já em plena década de 1960, Silva Dias e Jorge Borges de Macedo eram excepções na orientação de teses de licenciatura de temas oitocentistas.
Como lidaram os historiadores marxistas com os conceitos de classe e nação? Poder-se-ia pensar que em nome do internacionalismo comunista rejeitarPoder-se-iam um ponto de vista nacionalista. Nada mais equívoco. Na verdade, como mostrou José Neves, a historiografia marxista valorizou o ponto de vista nacional. E não raro identificou os inimigos da nação – por exemplo, em 1383 e em 1580 fracções dos grupos sociais possidentes - com os interesses castelhanos. Por exemplo, Álvaro Cunhal foi um dos autores que difundiu a tese segundo a qual as classes possidentes sempre preferiram o domínio estrangeiro à tomada do poder pelas forças progressistas e revolucionárias. E considerou que foi a “revolução burguesa” dos finais do século XIV que levou Portugal a realizar os “a epopeia dos descobrimentos” (Cunhal, 1975, pp. 66 e 97). E Victor de Sá valorizou o proteccionismo económico que o liberalismo radical setembrista defendeu – ou seja um nacionalismo económico, associando-o ao empenho nas actividades produtivas (indústria, agricultura).
Do lado da narrativa conservadora, católica e estadonovista poder-se-iam convocar numerosos casos reveladores de intromissão de um nacionalismo exclusivista e de preconceitos políticos na escrita da história. Refira-se, a título de exemplo, a tese segundo a qual a expansão ultramarina era um serviço de Deus, comandado pelo espírito de cruzada. Ou, nos livros escolares, a explicação segundo a qual a não entrada de Portugal na II Guerra Mundial ter-se-ia ficado a dever a Salazar, que assim salvou a nação.
Poder-se-á contudo considerar que houve em Portugal, nos séculos XIX e XX, um programa sistemático de nacionalização dos portugueses – ou seja de formação de cidadãos imbuídos de uma consciência nacional – através da historiografia? Empregamos aqui o conceito de nacionalização num sentido amplo “de qualquer tipo de proceso cuyo resultado fuera la identifcación de la mayor parte de la población de un ‘Estado territorial’ con un Estado nacional’ y en definitiva, con una determinada idea de nación” (Torres, P. R. 2012, p.16) É um problema que, ao invés do que sucede em Espanha nas últimas décadas (Archiles, 2011), carece de uma investigação aprofundada.
Ao longo do século XIX, a acreditar nos testemunhos de muitos intelectuais, de Garrett e Herculano a Basílio Teles, passando por Oliveira Martins e Ramalho Ortigão, a sociedade portuguesa, predominantemente rural e dominada pelo analfabetismo, foi marcada pela ausência de espírito de cidadania e pela indiferença em relação à política. Mas implicaria este alheamento em relação à res publica que tão bem documentado foi por Rafael Bordalo Pinheiro ausência de consciência nacional? À primeira vista, seriamos levados a crer que o processo de nacionalização se acentuou no período inicial do Estado Novo, sobretudo a partir de 1936, com recurso à “política do espírito”. Mas uma vez que o regime de Salazar promoveu a desmobilização dos cidadãos do espaço público – e exclusão de grande parte dos portugueses, os que não se reviam no Estado Novo e na sua propaganda - é discutível, em rigor falar-se de
nacionalização para este período. Por outro lado, no campo da memória nacional, até mesmo na
vigência da ditadura coexistiram múltiplas narrativas do passado, não coincidentes nas suas intencionalidades e interpretações: podemos distinguir uma narrativa laica e liberal do passado (que se prolonga com novos desenvolvimentos entre os historiadores republicanos já no século XX), muito centrada no conceito de nação, de uma narrativa tradicionalista e católica difundida pelo Estado Novo. Se esta última foi largamente difundida pelo Estado e pelas instituições dele dependentes durante mais de quarenta anos, também é verdade que desde os anos sessenta ela sofreu acentuada erosão, com a larga difusão que foi adquirindo a narrativa republicana. Toda uma contra-cultura crítica em relação aos excessos de um nacionalismo retórico e passadista foi alastrando entre as elites e a juventude dos anos 50 a 70. No seio de cada uma destas grandes narrativas encontramos aliás estratégias bem diversas. Um exemplo apenas: historiadores como Herculano, Oliveira Martins, Teófilo Braga e Jaime Cortesão constroem teorias da nação portuguesa muito diferentes - embora neles se possam naturalmente encontrar pontos de
contacto – ora sublinhando a componente da vontade política das elites ora valorizando um determinismo étnico.
Note-se ainda que no seio da narrativa laica da história nacional delineia-se um atitude crítica em relação às intromissões do patriotismo na operação historiográfica, de Herculano a Vitorino Magalhães Godinho (de 1846 a 2011). No interior desta genealogia historiográfica, afirma-se também uma posição crítica em relação às ritualizações da história que dominaram de cerca de 1861 até aos últimos anos e que se estrutura de Oliveira Martins a Godinho para, mais recentemente, se esbater. Sempre establecendo uma conexão íntima entre um conceito de história-crítica e o imperativo de cidadania. Não se pode pois dizer que este conceito de história envolvesse um programa unitário e indiferenciado de nacionalização dos portugueses.
Mas muitos outros historiadores e divulgadores da história, de Pinheiro Chagas a José Hermano Saraiva passando por João Ameal e tantos outros, foram comandados, nas suas obras, por ideários nacionalistas de diversos matizes. Indiscutível é que até finais do século XX a afirmação da história como disciplina autónoma em relação aos poderes instituidos se processou num movimento de distanciação crítica em relação às intromissões destes nacionalismos.
Por último, não pode esquecer-se que a historiografia teve um eco limitado a uma elite Outras géneros ou suportes de expressão como o romance histórico, o teatro, a poesia, a oratória e até as artes plásticas terão porventura alcançado maior eficácia na socialização política dos portugueses. Todavia, é inegável que os historiadores tiveram uma acção directa no processo de nacionalização no século XIX, mais nesta centúria do que no século XX, acção que importa conhecer melhor, sobretudo no que respeita ao século passado. Muitos deles exerceram cargos públicos e mantiveram estreito contacto com os seus leitores através dos meios de comunicação social. Mas hoje em dia, no tempo em que se multiplicam as solicitações tecnológicas e a sociedade da informação e do espectáculo domina – com raras excepções- o lugar dos historiadores tende a restringir-se a uma margem.
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Pesquisando a história contemporânea no Brasil: a experiência do CPDOC
Celso Castro
CPDOC-Fundação Getúlio Vargas
O Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC) da Fundação Getulio Vargas foi criado em 1973 com o objetivo de abrigar conjuntos documentais relevantes para a história recente do país e desenvolver pesquisas em sua área de atuação. Mais recentemente (a partir de 2003) incorporou a atividade de ensino, passando também a oferecer cursos de graduação (em Ciências Sociais e em História) e de pós-graduação (mestrados profissional e acadêmico e doutorado, reunidos no Programa de Pós-Graduação em História, Política e Bens Culturais).
Ao longo de sua existência, o CPDOC constituiu o mais importante acervo de arquivos pessoais de homens públicos do país, integrado por aproximadamente 200 fundos documentais, totalizando cerca de 1,3 milhão de documentos, criou um Programa de História Oral que possui cerca de 1.000 entrevistas e 6.000 horas de entrevistas e lançou o Dicionário
Histórico-Biográfico Brasileiro, única obra de referência de seu tipo no país.2
Desde o início, a instituição tornou-se a “unidade de Ciências Sociais e História” da FGV, como seu regimento afirma desde então. Unia-se também pesquisa e documentação no próprio nome da instituição. Nesse espírito, formou-se uma equipe multidisciplinar que reunia pessoas formadas ou pós-graduadas numa das Ciências Sociais3ou em História, além de pessoal técnico com experiência na área de documentação. Essa equipe atuou, ao longo desses 40 anos, numa perspectiva interdisciplinar.
Uma história do tempo recente
“História contemporânea do Brasil” referia-se originalmente ao período iniciado com a Revolução de 1930.4 Além disso, havia uma ênfase no estudo da história política e, em particular, das elites políticas. Não foi simples a tarefa de criar e afirmar uma instituição com essas características, no Brasil dos anos 1970 e 1980. É interessante observar que, se o estudo da história política era então marginalizado nos estudos históricos, a história especificamente
2 Para mais informações sobre a instituição, ver o Portal CPDOC: http://www.fgv.br/cpdoc.
3 No Brasil, tradicionalmente entende-se por Ciências Sociais as áreas de Antropologia, Ciência Política e
Sociologia, geralmente reunidas num único curso de licenciatura ou bacharelado e, mais recentemente, Relações Internacionais.
4 Na prática do CPDOC, no entanto, muitas vezes esse marco tem sido ampliado para todo o período
das elites ou grupos sociais “dominantes” era, por sua vez, duplamente marginalizada em relação ao estudo da ação política de grupos socialmente “dominados”.
A História Oral, método no qual o CPDOC foi pioneiro no Brasil era à época uma novidade em termos de pesquisa, mas terminou por contribuir muito para a renovação dos estudos históricos. A História Oral foi implantada no CPDOC com um projeto amplo intitulado “Trajetória e desempenho das elites políticas brasileiras de 1930 até os dias de hoje”. Os “dias de hoje” eram a segunda metade dos anos 1970. Entendia-se “elites políticas” ou “classe política” num sentido lato, como “o conjunto de indivíduos que ocupa posições de mando na sociedade, e que exerce influência direta sobre as decisões centrais que afetam a comunidade em seu conjunto.” Desse conjunto faziam parte não apenas pessoas que ocuparam cargos formais no Estado, mas também aqueles que, “situando-se fora dele, cooperam com ele ou o hostilizam, constituindo, eventualmente, uma ‘contra-elite’ ou classe política potencial, passível de converter-se — em momentos históricos de ruptura — em futura classe política.”5
Por “trajetória e desempenho” dessa elite política entendia-se: “sua inserção social, influências intelectuais e políticas, os subgrupos que os compõem, suas respectivas funções, desempenho, conflitos e clivagens, visão de mundo, projetos específicos, visão retrospectiva de sua atuação e reavaliação do período etc.”6 Alguns eventos históricos brasileiros serviam como marcos referenciais: 1922, 1930, 1946 e 1964.
Para compreendermos o que significava criar uma instituição voltada para a história contemporânea nesse período, em particular em sua dimensão política, é importante observar o contexto da disciplina histórica da época, tanto no Brasil quanto no exterior. Havia, em geral, no Brasil, pouco interesse pela história mais recente em detrimento de períodos anteriores (no Brasil o maior interesse era pelo séc. XIX, inclusive devido à existência de acervos documentais sobre esse período abertos à consulta). No plano internacional, para além da historiografia mais factual e tradicional, a história social inglesa e a dos Annales também não se interessavam muito, nesse momento, pela história política. No plano teórico e metodológico, o desafio era fazer uma história política que não fosse a história tradicional, factual; uma história política que fosse além do fato e capturasse a estrutura da conjuntura política e a lógica dos atores que construíram um determinado processo político. Como fazer isso?
No final dos anos 1980 e principalmente ao longo da década de 1990 vivemos o processo que René Remond chamou de “renascimento da história política”.7 É importante destacar que o “retorno” da história política ao centro dos interesses da disciplina histórica não se fez nos moldes da história política criticada pela “Nova História”. Ou seja, não era a história
5 ALBERTI, Verena. (1998) História oral: a experiência do CPDOC. Rio de Janeiro, FGV, p. 2.
6Idem.
política do culto dos grandes homens e da descrição dos acontecimentos restrita ao episódico, ao individual, ao factual. Tratava-se de uma história política por sua vez também “nova”, posterior ao desenvolvimento da história social e da história das mentalidades e profundamente influenciada por outras disciplinas, como a Antropologia, a Sociologia e a Ciência Política, apenas para mencionar algumas. Essas influências de outras áreas possibilitaram o surgimento de problemáticas inovadoras e a utilização de novas técnicas pela história política. Isso, por sua vez, colocou algumas questões também novas para a discussão sobre as fontes para a pesquisa de história política.
A chamada “nova história política” passou a dar grande importância à dimensão social e cultural dos eventos e da ação dos atores políticos. O papel do ator político pode então ser colocado em bases muito diferentes daquelas em que se situava não só a história política “antiga”, como também um tipo de “nova história” que valorizava apenas o estudo das “estruturas” de mais longa duração temporal, desprezando a ação individual. Os indivíduos puderam passar a ser vistos, por exemplo, como possuindo uma relativa autonomia para formular projetos de ação que estão sempre referidos - dialogam e eventualmente conflitam - com outros projetos. Daí a valorização da noção de subjetividade. Como todo projeto tem uma dimensão consciente e pública, e portanto estabelece relações de poder com outros projetos, fica aberta a possibilidade da existência de projetos coletivos, comuns a um determinado círculo social. Sendo assim, todo projeto tem um caráter eminentemente político. Existe, entretanto, um campo de possibilidades para a formulação de projetos e para a ação que é limitado historica e culturalmente. Daí a importância de se estudar as formas de socialização intelectual e profissional, as redes de relações pessoais e a cultura política na qual esses membros da elite viveram.8
Mudanças de perspectiva como esta alteraram o uso que os pesquisadores de história política faziam das fontes documentais. Como consequência, algumas fontes documentais passaram a receber uma atenção toda especial e a possuir um estatuto diferente do que tinham antes. Dentre elas, a meu ver, três se destacam no estudo das elites políticas: os arquivos privados pessoais, os depoimentos orais e as biografias de grupos de indivíduos.
No caso dos arquivos privados pessoais, além da óbvia importância da existência de informações secretas e confidenciais, cria-se a possibilidade de estudar, através deles, mentalidades políticas9, especialmente através de documentos preciosos como séries de correspondência privada, não-oficial. Além disso, só os arquivos privados possuem documentos
8Para as noções de projeto e campo de possibilidades, ver VELHO, Gilberto. (1981) “Projeto, emoção e
orientação em sociedades complexas”, em: Individualismo e Cultura,Rio de Janeiro, Zahar, p. 13-37.
9Esse ponto foi destacado por FERREIRA, Marieta de Moraes. (1987) Mentalidades políticas, discurso
como diários, versões preliminares de documentos posteriormente tornados públicos e outros tipos de documentos que registram momentos essenciais da trajetória pessoal de determinado indivíduo.
A história oral tem a especificidade de ser um método de pesquisa que gera documentos, as entrevistas. Utilizamos extensamente, na história oral feita no CPDOC, a história de vida. No caso do estudo de elites, o objetivo principal da história de vida não é, como muitas vezes ocorre nos estudos com camadas populares, obter dados sobre datas e acontecimentos, e sim compreender o significado da ação. Ou seja, explorar uma vivência específica, a subjetividade de um ator, construída a partir de sua trajetória específica através de diferentes círculos sociais. Além disso, muitas vezes, apenas fontes desse tipo nos permitem compreender o “clima” de épocas, instituições e eventos, entender uma determinada cultura política a partir do ponto de vista de seus participantes e ter uma visão global de períodos e processos históricos longos10.
Finalmente, temos uma terceira fonte, embora não primária, mas que passa a receber um estatuto especial com o advento da “nova” história política: os estudos biográficos de séries de indivíduos. É neles que se baseiam perspectivas como a da prosopografia - abordagem que teve como campo de aplicação privilegiado o estudo das elites romanas e que posteriormente foi aplicada a outros contextos11. A prosopografia consiste basicamente em estabelecer notas biográficas de um conjunto de indivíduos que compartilham algo em comum (p. ex., o pertencimento a determinado grupo de elite) e, a partir daí, através do exame comparativo e relacional dessa série biográfica, construir uma espécie de gramática das relações sociais. No caso do CPDOC, a experiência do Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro, foi a base informacional, até então inédita em relação à história contemporânea do Brasil, que permitiu esse esforço.
Não poderei deter-me aqui, por razões de espaço, na renovação temática que marcou a pesquisa no CPDOC na última década. O estudo da história política, em particular das elites, embora continue sendo um tema central, abriu espaço para o estudo de outros temas e atores. Ganharam espaço temas ligados à cultura, à sociedade e às relações internacionais, e um amplo espectro de atores que não pertenceram à elite passaram a frequentar assiduamente nossas pesquisas, publicações, exposições. A centralidade do estudo da história, da sociedade e da
10Ver, a respeito, ALBERTI, Verena. (1990) História Oral: a experiência do CPDOC ,Rio de Janeiro,
Editora da Fundação Getúlio Vargas e CAMARGO, Aspásia. (1984) “Os usos da história oral e da história de vida: trabalhando com elites políticas.” Dados, Rio de Janeiro, vol. 27, nº 1, p. 5 a 28.
11Sobre a prosopografia, ver, entre outros, NICOLET, Claude. (1970) “Prosopographie et histoire sociale:
Rome et l'Italie”. Annales E.S.C., 25, nº5, set.-out., p. 1209-28; e ROUSSEAU, Isabelle. (1990) “La prosopografía: ¿un método idóneo para el estudio del Estado?”, Revista Mexicana de Sociología nº 3/90, jul.-set, p. 237-47.
cultura brasileiras passaram também a ser crescentemente vistas numa perspectiva mais mundializada – o Brasil no mundo. Apesar disso, ou talvez justamente por causa desse alargamento temático e dessa ampliação de horizontes, as características fundamentais da instituição puderam ser preservadas: o valor da interdisciplinaridade, a preocupação com métodos de pesquisa e o cuidado com as fontes.
Destacarei a seguir mais dois dos principais problemas enfrentados pelo CPDOC ao longo de sua história, com atenção especial aos atuais desafios que se apresentam para a instituição: a preservação do caráter interdisciplinar que é uma de suas marcas características e a manutenção de seu acervo documental-informativo.
Uma instituição interdisciplinar
Sem entrar em longas discussões conceituais, por interdisciplinaridade temos entendido a prática de pesquisa que privilegia a utilização do instrumental teórico e metodológico de várias disciplinas, sempre que forem relevantes para a melhor compreensão de um determinado assunto, não se restringindo aos quadros de uma única disciplina. Neste sentido, o mais importante é buscar estimular aquilo que o sociólogo americano C. Wright Mills chamou de "imaginação sociológica", que:
“[...] consiste em parte considerável na capacidade de passar de uma perspectiva para outra, e, nesse processo, consolidar uma visão adequada de uma sociedade total e de seus componentes. É essa imaginação, é claro, que distingue o cientista social do mero técnico. Técnicos adequados podem ser instruídos em poucos anos. A imaginação sociológica também pode ser cultivada; por certo ela raramente ocorre sem muito de trabalho, muitas vezes rotineiro. Há no entanto uma qualidade inesperada em relação a ela, talvez porque sua essência seja a combinação de ideias que ninguém supunha que fossem combináveis – digamos, uma mistura de ideias da ?loso?a alemã e da economia britânica. Há um estado de espírito lúdico por trás desse tipo de combinação, bem como um esforço verdadeiramente intenso para compreender o mundo, que em geral falta ao técnico como tal.” 12
12MILLS, C. Wright. (2009) Sobre o artesanato intelectual e outros ensaios. Seleção e introdução de
É óbvio que existem diferentes disciplinas acadêmicas, do ponto de vista institucional: há placas que demarcam qual é o nome do departamento, diferentes cátedras, revistas que assumem o nome de uma determinada disciplinas etc. Se isso é explicado historicamente pelo processo de crescente divisão do trabalho e institucionalização e especialização das ciências em geral, o fato é que vivemos um certo paradoxo intelectual: somos formados lendo grandes clássicos – como Marx, Weber, Simmel etc. – que não se encaixam com facilidade em fronteiras disciplinares, mas somos treinados a enquadrar cotidianamente nossas práticas em rótulos específicos. Por outro lado, exalta-se sempre a importância da interdisciplinaridade, sem que isso esteja acompanhado, muitas vezes, de reflexão sobre suas possibilidades e condições.
No caso do CPDOC, em que contexto institucional específico essa discussão se coloca? Creio ser fundamental ressaltar que, durante os 30 primeiros anos de sua existência, o CPDOC não desenvolveu atividades de ensino. Por um lado, o terreno da pesquisa e da produção do conhecimento é o que mais possibilita a prática da interdisciplinaridade. Por outro, isso permitiu evitar a criação de departamentos disciplinarizados, movimento comum na quase totalidade das faculdades.
Nesse campo, um grande desafio, a partir do início das atividades de ensino, foi manter a inexistência de “departamentos” ou de rígidas fronteiras disciplinares, e concentrar nossos investimentos em inovações curriculares e de prática didática. No caso do ensino de graduação, em que pesem exigências legais da separação dos cursos (devido ao diploma que conferirão), mantivemos um ciclo básico comum nos dois primeiros anos, e instituímos a prática de discussões coletivas, antes do início de cada semestre letivo, com todos os professores, de modo a que pudessem socializar seus objetivos didáticos e conteúdos disciplinares. No caso da pós-graduação, criamos um Programa de Pós-Graduação em História, Política e Bens Culturais que, como o próprio título deixa claro, abarca todo o espectro multidisciplinar da formação acadêmica dos professores do CPDOC. O projeto foi originalmente enviado para o comitê disciplinar da agência governamental responsável pela regulação da pós-graduação no Brasil, porém veio a ser por ela enquadrada no comitê de História para efeitos de avaliação. Apesar disso, ao longo de uma década de existência da pós-graduação, conseguimos preservar nossa identidade institucional interdisciplinar, evitando sujeitá-la a eventuais orientações disciplinarizantes externas. Outra experiência interessante tem sido o desenvolvimento de cursos de pós-graduação lato sensu, que fazem com que professores do CPDOC interajam com profissionais de outras áreas, como cineastas documentaristas, jornalistas, gestores e produtores culturais.