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ECLI:PT:STJ:2007:07B3960.F0

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ECLI:PT:STJ:2007:07B3960.F0

http://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2007:07B3960.F0

Relator Nº do Documento

Salvador Da Costa sj20071115039607

Apenso Data do Acordão

15/11/2007

Data de decisão sumária Votação

unanimidade

Tribunal de recurso Processo de recurso

Data Recurso

Referência de processo de recurso Nivel de acesso

Público

Meio Processual Decisão

Revista negada

Indicações eventuais Área Temática

Referencias Internacionais Jurisprudência Nacional Legislação Comunitária Legislação Estrangeira Descritores

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Sumário:

1. As sociedades não se extinguem automaticamente por via do acto de dissolução, conservando a sua personalidade jurídica até ao momento do registo comercial do encerramento da respectiva liquidação.

2. O capital social, que constitui o valor representativo das entradas dos sócios, é realidade diversa do património da sociedade, porque pressupõe a existência de bens ou direitos avaliáveis em dinheiro.

3. Instaurada acção contra a sociedade para a realização de direitos de crédito depois da inscrição no registo comercial do encerramento da liquidação, impõe-se a sua absolvição da instância. 4. A realização dos referidos direitos de crédito no confronto dos sócios da sociedade por quotas dissolvida depende de eles terem recebido em partilha, na sequência da dissolução, de bens suficientes para o efeito, cujo ónus de prova incumbe aos credores.

5. À extinção das sociedades e à responsabilização dos sócios não é aplicável o disposto no artigo 2071º, nº 2, do Código Civil.

Decisão Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I

AA - com apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo e de patrocínio judiciário por intermédio da advogada BB - e CC, por si e em representação do seu filho, DD intentaram, no dia 11 de Janeiro de 2002, contra EE, Ldª, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a sua condenação a executar as obras necessárias à eliminação dos vícios e defeitos existentes em identificada fracção predial, ou, em alternativa, no pagamento de € 14 963,94 acrescidos de imposto sobre o valor acrescentado e dos juros de mora à taxa legal e a entregar-lhes identificada garagem, ou, em alternativa, no pagamento de € 9 975,96, acrescidos de imposto sobre o valor acrescentados e juros de mora desde a citação e no que viesse a apurar-se em execução de sentença em virtude da afectação do seu direito de propriedade.

Fundamentaram a sua pretensão na aquisição à ré de uma fracção autónoma de prédio por ela construído, nos defeitos nela existentes, na afectação da sua saúde por virtude das humidades deles resultantes e na dimensão da garagem inferior ao convencionado.

AF, que foi sócio da ré, dita dissolvida no dia 29 de Outubro de 2001, afirmou, em contestação, que os autores tomaram posse da fracção predial logo após a escritura de compra e venda, celebrada no dia 21 de Janeiro de 2001, que conheceram logo da área da garagem, terem passado mais de cinco anos, estar caduco o direito de reclamar defeitos, não existirem vícios de construção mas, porventura, derivados do uso.

Os autores replicaram no sentido de terem comunicado à ré os defeitos da construção por carta de 12 de Janeiro de 2001, que ela os reconheceu, só se tendo apercebido da área da garagem em Novembro de 2001, e requereram a intervenção de MR e de AF, sócios da ré, e os respectivos cônjuges, FR e EF, sob o fundamento de a dissolução da ré, na altura com a totalidade do capital social, ter ocorrido por vontade dos sócios que distribuíram entre si aquele capital e outros

elementos do activo.

AF respondeu no sentido de dever ser indeferido o chamamento por virtude de a ré não ter património, não ter havido partilha, não terem os sócios sido liquidatários ou recebido algo em

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distribuição.

Os chamados MR e FR, por um lado, e AFe EF, por outro, afirmaram no instrumento de

contestação deverem, tal como a ré, serem considerados partes ilegítimas, ou, ao entender-se o contrário, der absolvidos do pedido.

Na fase da condensação foi a ré absolvida da instância e relegado para final o conhecimento das demais excepções invocadas, e, realizado o julgamento, foi proferida sentença, no dia 7 de Abril de 2006, por via da qual foi julgada improcedente a excepção de caducidade do direito de denúncia e a acção e os demandados absolvidos do pedido.

Interpuseram os autores recurso de apelação, e a Relação, por acórdão proferido no dia 29 de Maio de 2007, negou-lhe provimento.

Impugnaram os apelantes o acórdão da Relação em recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação:

- o aresto incorreu na nulidade consignada no artigo 668º, nº 1, alínea c), do Código de Processo Civil por admitir na sua fundamentação não ser a garagem adequada ao seu fim e estar a fracção predial abrangida pelo artigo 913º do Código Civil e julgar improcedente a nona conclusão da apelação;

- o processo contém os elementos de facto relevantes para a decisão desta questão, pelo que os recorridos devem ser condenados nessa parte, conforme o pedido, não sendo aplicável o artigo 163º, nº 1, do Código das Sociedades Comerciais, porque não houve liquidação;

- a sociedade tinha, à data da dissolução, activo, pelo menos o capital social de 7 500 000$ e passivo consubstanciado na obrigação de eliminar os defeitos de construção em causa ou de ressarcir os recorrentes dos custos dessa eliminação, incluindo o défice da dimensão da garagem; - por virtude do disposto no artigo 342º, nº 2, do Código Civil, os recorrentes não tinham que provar os montantes recebidos pelos recorridos chamados, por se tratar de facto impeditivo, modificativo ou extintivo do direito de crédito de que os recorrentes se arrogam;

- os sócios omitiram a existência de dívidas passivas e o activo da sociedade, consubstanciado, pelo menos, no capital social, e a sua posição jurídica passou a ser a de sucessores da sociedade - os bens societários, pelo menos o capital social, entraram no património dos sócios, aí se

confundindo com o seu património pessoal, pelo que é aplicável o disposto no artigo 2071º nºs 1 e 2, do Código Civil;

- omitida liquidação da sociedade por facto apenas imputável aos sócios sucessores da sociedade, tinham o ónus de provar não existirem valores suficientes para o cumprimento das dívidas, por aplicação do disposto no artigo 2071º, nº 2, do Código Civil, o que não lograram;

- deve revogar-se o acórdão e condenarem-se os intervenientes no peticionado. Responderam os recorridos, em síntese de conclusão de alegação:

- os fundamentos do acórdão estão logicamente conformes com a decisão, pelo que não está afectado de nulidade;

- é aplicável ao caso o nº 1 do artigo 163º do Código das Sociedades Comerciais visto tratar-se de passivo reconhecido em acção proposta após o registo do encerramento e liquidação da sociedade vendedora;

- encerrada a liquidação e extinta a sociedade, os antigos sócios respondem pelo passivo social não satisfeito ou acautelado até ao montante que receberam na partilha;

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por estes de que a sociedade extinta tinha bens e que os primeiros os partilharam ou deles beneficiaram, o que não fizeram;

- os sócios nunca podem ser considerados sucessores da sociedade, pelo que não é aplicável o disposto no artigo 2071º do Código Civil.

II

É a seguinte a factualidade considerada assente no acórdão recorrido:

1. Os autores são proprietários de uma fracção autónoma designada pelas letras AAAP,

correspondente a uma habitação no rés-do-chão esquerdo, com entrada pelo n.° 00-C, da Rua ..., Rio Tinto, Gondomar, comprada no dia 22 de Janeiro de 1997, cujo prédio foi construído pela ré EE, Ldª.

2. As paredes dos quartos da fracção dos autores, a sala, o corredor e os halls apresentam rachadelas nas paredes, os azulejos das casas de banho e da cozinha estão rachados e

quebrados, as paredes de um dos quartos têm grande teor de infiltração de água, apresentando humidades nas paredes, as quais estão negras, o lamparquet de um dos quartos está levantado, as paredes da garagem têm humidade devido a infiltrações de água provenientes, pelo menos, de uma floreira no exterior do prédio.

3. As anomalias referidas sob 2 foram comunicadas à ré, verbalmente e por escrito, e por ela reconhecidas, designadamente por carta de 12 de Janeiro de 1999, os problemas na fracção têm-se agravado com o decorrer do tempo e as humidades deterioraram o mobiliário com que os autores decoraram a fracção.

4. O lugar de garagem não tem a área de 16 metros quadrados constante do alvará de licença de utilização, tem a área útil de 9,19 metros quadrados, sendo que o veículo dos autores cabe no referido lugar, mas, no caso dos veículos dos lugares contíguos aí se encontrarem, têm grandes dificuldades em sair ou entrar com ele.

5. Os autores aperceberam-se da medida real da garagem, pelo menos, em Junho de 2001, altura em que MF a mediu, e a aquisição de um lugar de garagem equivalente importa em € 6 000, acrescidos de imposto sobre o valor acrescentado.

6. A reparação das anomalias da fracção dos autores terá um custo de cerca de € 5 000, acrescido de imposto sobre o valor acrescentado, e eles têm vivido preocupados com a situação na sua fracção, e evitam receber os seus amigos e familiares em casa, uma vez que se envergonham do estado de degradação e sentem tristeza.

7. A ré foi dissolvida por escritura outorgada, no dia 29 de Outubro de 2001, no Cartório Notarial de Ermezinde, por MR e AF, onde ficou expresso que ela não tinha activo nem passivo.

8. A referida dissolução e encerramento da liquidação foram inscritas no registo comercial no dia 17 de Dezembro de 2001.

III

A questão essencial decidenda é a de saber se os recorrentes têm ou não direito a exigir dos recorridos MR e FR e de AF e EF a reparação da sua fracção predial ou a pagar-lhes € 24 939,90. A resposta à referida questão pressupõe a análise da seguinte problemática:

- delimitação negativa do objecto do recurso;

- está ou não o acórdão recorrido afectado de nulidade? - a acção em causa e a dissolução da ré;

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- tem ou não os recorrentes direito a exigir dos recorridos indemnização lato sensu? - síntese da solução para o caso decorrente da factualidade provada e da lei.

Vejamos, de per se, cada uma das referidas subquestões. 1.

Comecemos pela delimitação negativa do objecto do recurso.

O objecto do recurso é delimitado, face ao conteúdo da decisão recorrida, pelas conclusões de alegação formuladas pelos recorrentes (artigos 684º, nº 3, e 690º, nº 1, do Código de Processo Civil).

Considerando o conteúdo da sentença proferida pelo tribunal da primeira instância, onde se decidiu não ocorrer a caducidade do direito de acção e incumbir à vendedora proceder à reparação dos defeitos apontados, decisão que foi confirmada pela Relação, as conclusões de alegação no recurso de revista não incidem sobre essa problemática.

Quanto ao lugar de estacionamento automóvel na garagem, revogando a sentença proferida pelo tribunal da primeira instância, a Relação entendeu, por um lado, que ele, considerando as

dimensões de um veículo automóvel médio, era inadequado ao seu fim.

E, por outro, que, nessa parte, a fracção predial comprada pelos recorrentes estava abrangida pelo disposto no artigo 913º do Código Civil e, por isso, a sociedade EE, Ldª devia reparar o defeito ou indemnizar os prejudicados recorrentes.

Também esse conteúdo decisório não é posto em causa no recurso de revista, pelo que está fora do respectivo âmbito de apreciação e não tem este Tribunal de se pronunciar sobre ele.

Acresce que também não está em causa no recurso a circunstância de os recorrentes terem

chamado a intervir os sócios da sociedade extinta e não os respectivos liquidatários (artigo 163º, nº 2, do Código das Sociedades Comerciais).

2.

Continuemos com a problemática de saber se o acórdão recorrido está ou não afectado de nulidade.

Os recorrentes imputam ao acórdão da Relação a nulidade sob o argumento da contradição entre os fundamentos e a decisão na medida em que considera a garagem inadequada ao seu fim e a abrangência da situação da fracção predial no artigo 913º do Código Civil e julga improcedente a conclusão nona do recurso de apelação.

A lei estabelece que o acórdão e nulo quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão (artigos 668º, nº 1, alínea c), e 716º, nº 1, do Código de Processo Civil).

Resulta do referido normativo que os fundamentos de facto e de direito utilizados no acórdão da Relação devem ser harmónicos com a pertinente conclusão ou decisão, corolário do princípio de que as decisões judiciais em geral devem ser fundamentadas de facto e de direito.

Com efeito, o referido requisito não se verifica caso ocorra contradição entre os fundamentos de facto e de direito e a decisão nos quais assenta.

Todavia, o erro de interpretação dos factos e ou do direito ou na aplicação deste constitui erro de julgamento, e não o referido vício, certo que ele só ocorre quando os fundamentos de facto e ou de direito invocados no acórdão conduzirem logicamente ao resultado oposto àquele que integra o respectivo segmento decisório.

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lado, que o lugar da garagem, pelo seu próprio fim, face às dimensões de um veículo automóvel médio, não era ao mesmo adequado e, consequentemente, estar a fracção vendida, nessa parte, abrangida pelo disposto no artigo 913º do Código Civil, e que a vendedora estaria, por isso, obrigada a reparar o defeito ou a indemnizar os autores.

E, por outro, invocando o disposto nos artigos 163º, nº 1, do Código das Sociedades Comerciais e 2071º, nº 2, do Código Civil, referiu não terem os recorrentes provado que a sociedade tivesse bens que os sócios tivessem partilhado ou transmitido para algum deles, e que, por isso, não terem os primeiros a direito a exigir dos últimos a reparação ou indemnização pretendidas.

Assim, o acórdão recorrido, partindo dos factos provados e das normas que considerou aplicáveis, concluiu, tal como o tribunal da 1ª instância, no sentido de que os recorrentes não tinham direito a exigir dos recorridos a pretendida indemnização lato sensu.

E tal conclusão, independentemente de resultar ou não de erro de julgamento, é o corolário lógico da interpretação do sentido dos factos provados e das normas jurídicas aplicadas na espécie. Assim, ao invés do que os recorrentes afirmam, a decisão da Relação no sentido de manter a sentença proferida no tribunal da 1ª instância é logicamente harmónica com os fundamentos em que se fundou.

Na realidade, porém, o que resulta neste ponto do alegado pelos recorrentes é a sua discordância do decidido no confronto do quadro de facto provado, o que poderá eventualmente enquadrar o erro de julgamento, mas não o vício de nulidade do acórdão por eles invocado.

Assim, como do contexto do acórdão resulta a conformidade lógica entre a parte da motivação de facto e de direito e a parte decisória, não se verifica, na espécie, o vício de nulidade a que alude a alínea c) do nº 1 do artigo 668º do Código de Processo Civil.

3.

Prossigamos com a subquestão decorrente de a dissolução da ré ser anterior à propositura da acção.

A sociedade dissolve-se, além do mais, por deliberação dos sócios (artigo 141º, nº 1, alínea b), do Código das Sociedades Comerciais).

Foi o que aconteceu no caso vertente, em que, por escritura pública outorgada no dia 29 de Outubro de 2001, os sócios da ré, EE, Ldª, declararam dissolvê-la.

Resulta da lei que, salvo disposição legal em contrário, as sociedades dissolvidas entram imediatamente em liquidação, mantendo, no entanto, a sua personalidade jurídica, continuando, em regra, a ser-lhes aplicáveis, com as necessárias adaptações, as regras relativas às sociedades não dissolvidas (artigo 146º, nº 2, do Código das Sociedades Comerciais).

Operada a dissolução, segue-se a liquidação, salvo, excepcionalmente, se a sociedade não tiver dívidas em geral nem fiscais exigíveis, caso em que se passa logo à fase da partilha (artigo 147º do Código das Sociedades Comerciais).

A operação de liquidação das sociedades, em regra pelos seus gerentes ou administradores visa ultimar os negócios pendentes, satisfação de direitos de créditos de outrem, cobrança de créditos próprios e conversão do património em dinheiro (artigo 151º, nº 1, do Código das Sociedades Comerciais).

Deve ser concluída e a partilha aprovada no prazo de dois anos a contar da data da dissolução, ou no prazo de três anos se tal prorrogação tiver sido deliberada pela sociedade (artigo 150º, nºs 1 e 2, do Código das Sociedades Comerciais).

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contrário do respectivo contrato societário, ou haja deliberação qualificada nesse sentido ou no caso do não encerramento da liquidação extrajudicial nos prazos acima referidos (artigo 150º, nº 3, do Código das Sociedades Comerciais).

Estamos perante uma situação em que a acção declarativa de condenação em causa foi intentada dois meses e doze dias depois da dissolução da ré e vinte e quatro dias depois do referido acto de dissolução e de liquidação haverem sido inscritos no registo comercial.

A referida sociedade não se extinguiu por via da mencionada escritura de dissolução, visto que conservou a sua personalidade jurídica até 17 de Dezembro de 2001, altura em que ocorreu o registo do encerramento da liquidação (artigo 162º, nº 2, do Código das Sociedades Comerciais). Tendo em conta a estrutura e o fim da aludia acção, como se a sociedade em causa ainda existisse ao tempo da sua instauração, a situação configura-se como de constituição de passivo

superveniente

Salvaguarda a lei, além do mais, a situação de haver acções pendentes ou passivo superveniente. No primeiro caso, as acções em que a sociedade seja parte continuam após a sua extinção,

considerando-se, sem habilitação ou suspensão da instância, substituída pela generalidade dos sócios representada pelos liquidatários (artigo 162º do Código das Sociedades Comerciais). No segundo, os antigos sócios que não sejam de responsabilidade ilimitada, respondem pelo passivo social não satisfeito ou acautelado, até ao montante que receberem em partilha (artigo 163º, nº 1, do Código das Sociedades Comerciais).

Nessa hipótese, as acções necessárias para que os credores das sociedades extintas façam valer em juízo os seus direitos de crédito ou de outra natureza devem ser propostas contra a generalidade dos sócios, na pessoa dos respectivos liquidatários que haja (artigo 163º, nº 2, do Código das Sociedades Comerciais).

Ora, no caso vertente, a acção foi intentada contra a sociedade por quotas EE, Ldª depois de ter cessado, em virtude da respectiva extinção, a respectiva personalidade jurídica.

Por isso, na fase da condensação, foi a ré absolvida da instância e admitida a intervenção dos recorridos MR e AF, antigos sócios daquela, e dos respectivos cônjuges, FR e EF, sem que se saiba o motivo por que não foram chamados, em representação daqueles, os liquidatários.

4.

Continuemos com a análise da subquestão do ónus de prova do pressuposto de responsabilização dos sócios pelo passivo superveniente.

Na escritura de dissolução da sociedade EE, Ldª declararam os respectivos sócios, MR e AF, que aquela sociedade não tinha activo nem passivo.

Conforme acima se referiu, dissolvidas as sociedades, entram, em regra, em liquidação (artigo 146º, nº 1, do Código das Sociedades Comerciais).

Não obstante constar do registo comercial o encerramento da liquidação da sociedade EE, Ldª, os recorrentes afirmaram que ela não ocorreu, mas como não provaram essa circunstância, inexiste fundamento legal para que se conclua no sentido da omissão.

Por isso, não tem fundamento legal a alegação dos recorrentes no sentido de que não poderia ser aplicável ao caso-espécie o disposto no artigo 163º, nº 1, do Código das Sociedades Comerciais. Nas instâncias decidiu-se não terem os ora recorrentes provado que a aludida sociedade, ao tempo da sua extinção, tivesse bens e consequentemente que estes tivessem sido partilhados entre os recorridos MR e AFou transmitidos para qualquer deles.

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excepção peremptória, incumbia aos recorridos, e que a sociedade tinha, pelo menos, o património correspondente ao respectivo capital social.

A referida sociedade tinha, como é natural, determinado capital social (artigo 9º, nº 1, do Código das Sociedades Comerciais).

Todavia, o capital social apenas constitui o valor representativo das entradas dos sócios, ou seja, consubstancia-se em factor imaterial, realidade diversa do património societário, líquido ou ilíquido, que pressupõe a existência de bens ou direitos avaliáveis em dinheiro.

Assim, ao invés do que foi alegado pelos recorrentes, o capital social da sociedade em causa não pode ser considerado, para os efeitos aqui em análise, ou seja, face ao disposto no artigo 163º, nº 1, do Código das Sociedades Comerciais, como património societário.

A lei distingue, a propósito, do ónus de prova, entre os factos constitutivos, por um lado, e os factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito alegado, por outro, resolvendo a questão da dúvida sobre a referida qualificação.

A distinção entre os factos constitutivos de direito e os que impedem o funcionamento dos primeiros deve ter em linha de conta a sua conexão com o direito invocado pelo autor ou pelo réu reconvinte. Mas como critério supletivo, para o caso de dúvida sobre a função dos factos em causa, temos que devem ser considerados constitutivos do direito (artigo 342º, nº 3, do Código Civil).

Quanto a estes, o ónus de prova incumbe a quem invocar o direito em juízo, e, quanto aos

impeditivos, modificados ou extintivos daquele direito, o referido ónus incumbe à parte contra quem é invocado o mencionado direito (artigo 342º, nºs 1 e 2, do Código Civil).

O direito que os recorrentes pretendem fazer valer em juízo no confronto dos recorridos depende de estes terem recebido em partilha, na sequência da dissolução da sociedade de que eram sócios, bens suficientes para o efeito.

Não se trata, pois, de factos impeditivos, únicos aqui configuráveis, do direito invocado pelos recorrentes, mas de factos constitutivos desse direito, pelo que o ónus de alegação e de prova incumbia-lhes.

Mas os requerentes também sustentam que os recorridos têm o ónus de prova de que não partilharam bens da sociedade suficientes para a realização do seu direito de crédito por virtude não terem procedido judicialmente à liquidação e à partilha do património da sociedade.

Eles invocaram, para sustentar o seu entendimento, o regime da responsabilidade dos herdeiros pelas dívidas da herança, nas duas espécies de aceitação – a benefício de inventário e pura e simplesmente - a que se reportam os artigos 2052º, nº 1 e 2071º, ambos do Código Civil. Ora, prevê, por um lado, o nº 1 do segundo dos mencionados artigos a primeira das referidas formas de aceitação da herança e estatui que só respondem pelos encargos respectivos os bens inventariados, salvo se os credores ou legatários provarem a existência de outros bens.

E, por outro, o nº 2 do mesmo artigo prevê a segunda das aludidas espécies de aceitação da herança, e estatui não exceder a responsabilidade pelos encargos o valor dos bens herdados e caber aos herdeiros provar que na herança não existem valores suficientes para pagamento dos encargos.

Trata-se, pois, da responsabilidade dos herdeiros pelas dívidas do autor herança, com o limite do acervo patrimonial.

A diferença que ressalta daqueles normativos traduz-se na circunstância de se os herdeiros aceitaram a herança por via de inventário incumbir aos credores a prova de o acervo patrimonial exceder os bens nele relacionados, e se a aceitarem pura e simplesmente, incumbir aos herdeiros a prova de que a herança não engloba bens suficientes para o pagamento das dívidas.

(9)

Ora, a situação da extinção da sociedade e da responsabilização dos sócios pelas dívidas da sociedade na medida dos bens que lhe tenham cabido na partilha está especialmente regulada no artigo 163º, nº 1, do Código das Sociedades Comerciais, pelo que se não trata de lacuna que deva ser preenchida por recurso a analogia.

Acresce que a extinção das pessoas colectivas e a morte das pessoas singulares não assume a similitude susceptível de permitir a aplicação do regime da última à primeira (artigo 10º, nºs 1 e 2, do Código Civil).

De qualquer modo, nunca poderia funcionar no caso espécie o referido regime do direito sucessório visto que os factos provados não revelam terem os recorridos recebido alguns bens ou direitos por virtude da extinção da sociedade EE, Ldª.

A conclusão é, por isso, no sentido de que é inaplicável ao caso-espécie o disposto no artigo 2071º, nº 2, do Código Civil.

5.

Vejamos agora se os recorrentes têm ou não direito a exigir dos recorridos a por aqueles pretendida indemnização lato sensu.

Certo é que os recorrentes tinham um direito de crédito no confronto da sociedade EE, Ldª por virtude dos defeitos de edificação da fracção predial, incluindo a deficiência do lugar de

estacionamento automóvel na garagem do prédio, que àquela adquiriram por contrato de compra e venda celebrado no dia em 22 de Janeiro de 1997 (artigo 1225º, nºs 1 e 4, do Código Civil).

Todavia, conforme já se referiu, os recorrentes não lograram provar terem os recorridos recebido em partilha decorrente da dissolução e liquidação da aludida sociedade alguns bens ou outros direitos avaliáveis em dinheiro.

Em consequência, não podem os recorridos ser responsabilizados pela indemnização, por via de restauração natural ou por equivalente pecuniário, do dano sofrido pelos recorrentes.

6.

Finalmente, a síntese da solução para o caso-espécie decorrente da factualidade provada e da lei. O acórdão recorrido não está afectado de nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão, porque os primeiros são logicamente conformes com a última.

Os recorrentes tinham direito a exigir da sociedade EE, Ldª a reparação dos defeitos de construção da fracção predial que aquela lhes alienou, incluindo o défice de extensão do local de

estacionamento na garagem comum, ou a correspondente indemnização em dinheiro.

Extinta a referida sociedade por dissolução e operado o seu registo comercial e o da liquidação antes da propositura da acção em causa contra ela, a responsabilidade dos recorridos dependia de terem recebido, na partilha, bens suficientes para operarem o mencionado ressarcimento lato sensu.

Não é aplicável na espécie o disposto no nº 2 artigo 2071º do Código Civil, mas o que se prescreve no nº 1 do artigo 163º do Código das Sociedades Comerciais.

Incumbia aos recorrentes o ónus de prova de factos reveladores de que os recorridos receberam bens ou outros direitos na partilha do património societário, o que não lograram, subsistindo o declarado na escritura de dissolução de que ao tempo aquela sociedade não tinha activo. Inexiste, por isso, fundamento legal para que os recorrentes realizem o seu direito de crédito no confronto dos recorridos.

(10)

Improcede, por isso, o recurso.

Vencidos, são os recorrentes responsáveis pelo pagamento das custas respectivas (artigo 446º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).

Todavia, porque o recorrente AA beneficia do apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, considerando o que se

prescreve nos artigos 15º, alínea a), 37º, nº 1, 54º, nºs 1 a 3 da Lei nº 30-E/2000, de 20 de Dezembro, e 51º, nºs 1 e 2, da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, inexiste fundamento para que ele seja condenado no pagamento das custas do processo.

A advogada BB, nomeada no quadro do apoio judiciário para patrocinar o recorrente AA, subscreveu, neste recurso, o instrumento de alegações.

Tem, por isso, direito a honorários, a suportar pelo sucessor do Cofre Geral dos Tribunais (artigos 3º, nº 1, 15º, nº 1, 48º, nº 1, 57º, nº 2, da Lei nº 30-E/2000, de 20 de Dezembro, e 51º, nºs 1 e 2, da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho).

O quantitativo que lhe é devido corresponde, conforme está fixado na lei, independentemente da simplicidade do recurso, ao valor correspondente a 2,25 unidades de conta (1.3.1. da Portaria nº 150/2002, de 19 de Fevereiro).

IV

Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso, condenam-se os recorrentes CC e DD no

pagamento das custas respectivas e fixam-se os honorários devidos à advogada BB no montante de duzentos e dezasseis euros.

15 de Novembro de 2007.

Salvador da Costa (relator)

Ferreira de Sousa Armindo Luis

Referências

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