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Memórias e escrita de si: uma viagem formativa pelo curso de pedagogia / Memories and self-writing: a formative journey through the pedagogy course

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Academic year: 2020

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Memórias e escrita de si: uma viagem formativa pelo curso de pedagogia

Memories and self-writing: a formative journey through the pedagogy course

DOI:10.34117/bjdv6n6-585

Recebimento dos originais: 18/05/2020 Aceitação para publicação: 26/06/2020

Ghislaine Dias da Costa Bastos

Doutora em Educação pela Universidade Ferderal do Pará Instituição: Universidade federal do Pará (UFPA)

E-mail: ghiscosta@gmail.com

Tatiana Duarte de Souza

Mestranda em Educação e Cultura (UFPA/CUNTINS)

Instituição: Univeridade Federal do Pará (UFPA/CUNTINS/PPGEDUC E-mail: duarte.tati10@gmail.com

RESUMO

O Trabalho intitulado “Memórias e Escrita de si - uma viagem formativa pelo curso de Pedagogia” desenvolve uma interlocução dentro do campo das pesquisas sobre Currículo, Memórias, Escritas de si e Formação Docente, e apresenta alguns dos resultados do Trabalho de Conclusão de Curso finalizado no ano de 2017, no âmbito do curso de pedagogia da Universidade Federal do Pará, Campus do Tocantins. O texto problematiza os modos como vem se tecendo a formação do pedagogo utilizando como corpus analítico as memórias, compreendidas como escrita de si - colhidas ao longo da viagem formativa pelo curso de Pedagogia. Como movimento teórico-metodológico utiliza o Memorial/ Escrita de si, como ferramenta de captura dos momentos de rupturas e experiências que nos levam a nos tornar o que somos. No campo dos referenciais teórico-metodológicos estabelece diálogo com os ditos e escritos de autores como Michel Foucault (1992, 1998), Larrosa (2010), Machado (2009), Silva (2006), dentre outros para responder questões problematizadoras como: qual formação está sendo construída no curso de pedagogia? O que quer e pode esse currículo? Em que ou no que ele nos torna? Como se chega ao final dessa viagem formativa? A partir dos fragmentos das memórias elege como tópico interpretativo o currículo como produtor de sentidos e significados - por meio de disciplinas que foram cursadas ao longo da viagem formativa pelo curso de Pedagogia. Os resultados revelam que a aproximação entre teoria e prática, pesquisa e extensão, ainda são um desafio a se alcançar nas práticas cotidianas, também foi possível perceber a importância de uma educação sensível, alegre que seja capaz de provocar o desejo e o amor ao conhecimento onde a presença e a existência de estudantes e professores seja sentida e vivida na aula, na sala de aula, através de recursos metodológicos como o registro de memórias e a escrita de si, durante a viagem formativa no curso de pedagogia.

Palavras-chave: Memórias. Escrita de si. Currículo. Curso de Pedagogia. ABSTRACT

The work entitled “Memories and Writing of the self - a formative journey through the Pedagogy course” develops an interlocution within the field of research on Curriculum, Memories, Writing of the self and Teacher Training, and presents some of the results of the Final Course Work in 2017, as part of the pedagogy course at the Federal University of Pará, Campus do Tocantins. The text problematizes the ways in which the formation of the pedagogue has been woven using memories as

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an analytical corpus, understood as the writing of oneself - collected along the formative journey through the Pedagogy course. As a theoretical-methodological movement, it uses the Memorial / Escrita de si, as a tool to capture moments of ruptures and experiences that lead us to become what we are. In the field of theoretical-methodological frameworks, he establishes a dialogue with the sayings and writings of authors such as Michel Foucault (1992, 1998), Larrosa (2010), Machado (2009), Silva (2006), among others to answer problematic questions such as: which formation is being built in the pedagogy course? What does this curriculum want and can? What or what does it make us? How do you reach the end of this formative journey? Based on the fragments of the memoirs, the curriculum as a producer of meanings is chosen as an interpretive topic - by means of disciplines that were taken along the formative journey through the Pedagogy course. The results reveal that the approximation between theory and practice, research and extension, are still a challenge to be achieved in everyday practices, it was also possible to perceive the importance of a sensitive, joyful education that is capable of provoking the desire and love of knowledge where the presence and existence of students and teachers is felt and lived in the classroom, in the classroom, through methodological resources such as the recording of memories and the writing of oneself, during the educational trip in the pedagogy course.

Keywords: Memories. Writing of you. Curriculum. Pedagogy Course. 1 INTRODUÇÃO

A memória que lê e que conta é a memória em que o era uma vez converte-se em um começo. (LARROSA, 2010, p. 64)

Tornar-se estudante de Pedagogia certamente não é a escolha inicial para muitos estudantes que acabam de concluir o ensino médio, pois ainda há um predomínio de uma visão econômica e política, em certo sentido, que enquadra as licenciaturas em geral, em algo menor, com menos valor diante das “grandes áreas” como engenharia, direito e medicina. Muitos sequer imaginam as possiblidades de experimentar sensações libertadoras e intrigantes do pensamento que uma licenciatura proporcionar.

A liberdade do pensar é sem dúvidas a que está mais intrínseca a nós, mas ao mesmo tempo é a que mais pode ser dominada pelo outro. O encontro com as primeiras disciplinas no curso, especialmente a Filosofia permitiu a liberdade do pensar. É muito complexo sentir o livre pensar em uma sociedade que estabelece onde devemos estar o que devemos pensar e fazer, onde é tão mais seguro perpetuar algo do que abrir caminho para o novo.

O primeiro grande encontro durante os anos de curso de Pedagogia é sem dúvida com a Filosofia. Esse encontro permite sentir tamanha inquietude a ponto de pensar nas discussões em sala durante todo o dia e criar novas questões a partir das que nos eram levantadas. Como pode a filosofia nos toma desse modo?

A liberdade é o que a filosofia possibilita. Inquietude, problematização. Suspeita. Descaminhos. Bem aventuradas as aulas de filosofia!

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Por que, “de que valeria a obstinação do saber se ele assegurasse apenas a aquisição dos conhecimentos e não, de certa maneira, e tanto quanto possível, o descaminho daquele que conhece?” (FOUCAULT, 1998, p.13) o que aconteceria então se fôssemos convidados a conhecer algo novo ou um lugar novo, e ao chegar lá já soubéssemos o que iríamos encontrar? Ou então ao comprarmos um livro e já soubéssemos que final ele teria, ou mesmo, que caminhos percorreríamos até que seu fim chegasse?

A experiência incrível é vivenciar o início do curso, uma realidade em que a filosofia possibilita mover-se por lugares incertos, cheios de novidade e liberdade do pensar. Viver e escrever. Excelente inicio em uma viagem formativa.

Nessa jornada formativa tão importante e marcante quanto o encontro com a filosofia é poder participar da experiência da pesquisa. A participação no programa de iniciação científica, como bolsista, pode permitir ao aluno de Pedagogia aprendizados e experiências fundamentais para sua formação. O encontro com as atividades de pesquisa pode se constituir num momento de extrema inquietude, incerteza, mas de ricas experiências das quais certamente se sai transformado.

Estabelecer diálogos com a filosofia também nas atividades de pesquisa pode permitir o encontro com autores que por vezes não são muito comuns no currículo do curso de pedagogia, como o pensamento filosófico de Michel Foucault, dentre outros. O diálogo com diferentes autores através das atividades de Iniciação Científica podem oportunizar ao acadêmico de pedagogia a liberdade de experimentar o livre pensar em meio a atividades curriculares que vão para além da sala de aula e efetivamente podem articular o tripé acadêmico formativo: ensino, pesquisa e extensão.

Neste sentido, o significado de pesquisa e formação acadêmica, toma outro rumo. Através dela é possível conhecer e pensar diferentes modos de fazer pesquisa em Educação e a potencialidade desta para a formação acadêmica do estudante de Pedagogia. para que estes sejam libertados das sujeições das verdades constituídas pelo saber científico.

Partindo dos argumentos já destacados, nos colocamos a refletir sobre qual formação está sendo construída no curso de pedagogia? O que quer e pode esse currículo? Em que ou no que ele nos torna? Como se chega ao final dessa viagem formativa?

Tomando como corpus analítico as memórias da viagem formativa no curso de pedagogia, nos propomos a fazer uma aventura para fora de si, a partir da escrita de si. Uma escrita sobre as memórias do percurso formativo pessoal e acadêmico, capaz de capturar momentos de ruptura, e experiências que permitem nos tornar o que somos.

A novela de formação, que é a sua articulação narrativa, conta a própria constituição do herói através das experiências de uma viagem que, ao voltar-se sobre si mesmo, con-forma sua sensibilidade e seu caráter, sua maneira de ser e interpretar o mundo. Assim, a viagem

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exterior se enlaça com a viagem interior, com a própria formação da consciência, da sensibilidade e do caráter do viajante. A experiência formativa, em suma, está pensada a partir das formas de sensibilidade e construída como uma experiência estética. (LARROSA, 2010, p. 53)

Neste percurso, nos limites deste texto, elegemos como tópico interpretativo para problematizar o perfil/processo formativo do concluinte do curso de pedagogia: pensar o currículo

como produtor de sentidos e significados - por meio das disciplinas que foram sendo cursadas, sob

inspiração do pensando de Michel Foucault e autores como Larrosa (2010), Machado (2009), Silva (2006), dentre outros.

2 O PORTO DE PARTIDA - O NARRAR-SE: MEMÓRIA COMO ESCRITA DE SI

A tessitura da construção de uma pesquisa-formação nasce do desejo desafiador de ensaiar escrever um trabalho acadêmico a partir dos diferentes acontecimentos que marcam um percurso formativo e desdobram-se na apresentação de ressonâncias das experiências que marcam esse processo de formação.

Essas ressonâncias implicam em formas também de um dizer sobre si, de uma escrita de si a qual também nos forma durante o percurso de construção da pesquisa e se materializa num constante diálogo entre o vivido e a produtividade formativa e auto formativa das experiências vividas e das afetações/transformações na subjetividade do narrador ao longo de um curso de graduação em Pedagogia.

Numa perspectiva apresentada por JOSSO (2002) uma abordagem biográfica consiste num “caminhar para si” articulando-se aos campos do conhecimento e buscas dos sujeitos sobre narrativas de si.

Por sua vez para CUNHA (1997, p.5) destaca que

Trabalhar com narrativas na pesquisa e/ou no ensino é partir para a desconstrução/construção das próprias experiências tanto do professor/pesquisador como dos sujeitos da pesquisa e/ou do ensino. Exige que a relação dialógica se instale criando uma cumplicidade de dupla descoberta. Ao mesmo tempo que se descobre no outro, os fenômenos revelam-se em nós.

Outra dimensão considerada importante das narrativas é a possibilidade de auto escuta de suas próprias experiências e a reconstrução destas experiências de forma reflexiva, de modo que a narrativa provoca mudanças na forma como as pessoas compreendem a si próprias e aos outros. Trabalhar no campo das pesquisas com narrativas requer considerar que a investigação que usa narrativas é, ao mesmo tempo, investigação e formação.

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Este movimento precisa estar presente na prática investigativa que utiliza as narrativas como fonte de conhecimento. É importante não aprisioná-las, a priori, em categorias teóricas pré-definidas, por que este procedimento seria fortemente cerceador do relato espontâneo. Ao mesmo tempo, entretanto, não há como deixar de identificar formulações teóricas no discurso dos sujeitos e, também, nas estruturas cognitivas e afetivas dos seus interlocutores (CUNHA, op.cit, p.6).

E é nesta perspectiva que este trabalho segue as proposições apresentadas por LARROSA (1994, p.48-54) sobre o modo como se compreende as auto narrativas.

O sentido do que somos depende das histórias que contamos e das que contamos a nós mesmos [...], em particular das construções narrativas nas quais cada um de nós é, ao mesmo tempo, o autor, o narrador e o personagem principal.

[...]

o sujeito pedagógico ou, se quisermos, a produção pedagógica do sujeito, já não é analisada apenas do ponto de vista da objetivação mas, também, da subjetivação[...] isto é, do ponto de vista de como as práticas pedagógicas medeiam certas relações determinadas da pessoa consigo mesma. Aqui os sujeitos não são posicionados como objetos silenciosos, mas como sujeitos confessantes; não em relação a uma verdade sobre si mesmo que lhes é imposta de fora, mas em relação a uma verdade sobre si mesmos que eles mesmos devem contribuir ativamente para produzir.

É com base nessa perspectiva que a abordagem auto narrativa das memorias do percurso de formação se revela como um processo de formação-investigação, pois envolve uma tomada de consciência por parte daquele que descreve suas memórias, das itinerâncias e aprendizagens as quais são expostas pelo ato de narrar-se, de escrever sobre si mesmo.

Tomar a formação como itinerário de uma viagem implica considerar a necessidade de ampliar estudos no contexto da formação inicial em Pedagogia a partir das aprendizagens do sujeito de suas próprias experiências de formação e auto formação. Isso permite recuperar diferentes dimensões da viagem formativa a partir de um trabalho focado nas memórias de escolarização e do currículo, por exemplo, que são utilizados nas experiências formadoras.

Adotamos como abordagem teórico-metodológica a abordagem experiencial ou auto biográfica, caracterizando-a como auto narrativas sobre as memórias do percurso de formação inicial em pedagogia.

Tomamos a narrativa (auto narrativa) como formações discursivas em que os sujeitos constroem os sentidos tanto de si quanto de suas experiências no processo de contar e ouvir histórias. Para LARROSA (1996), a narrativa é uma modalidade discursiva, na qual as histórias que contamos e as histórias que ouvimos, produzidas e mediadas no interior de determinadas práticas sociais, passam a construir a nossa história, a dar sentido a quem somos.

Partindo do pressuposto de que a investigação narrativa permite a utilização de diversos instrumentos para a produção dos dados narrativos, elegemos como metodologia o uso de memórias,

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as quais são tomadas aqui como escrita de si numa perspectiva apresentada por Foucault (1992) e Segunda (2011) as quais nos remetem a uma escrita que transforma a coisa vista ou ouvida em forças e sangue; uma aventura para fora de si que nos permite pensar os momentos de ruptura nessa viagem formativa, e o que esta permite nos tornarmos ou o que nos tornamos através e a partir dela.

Ao optar pelo gênero memorial, como objeto de análise, o pesquisador precisa levar em consideração que o narrador pretende atingir o destinatário apresentando uma imagem de si mesmo que corresponda às exigências circunstanciais do contexto.

Portanto, o ato de lembrar e de narrar o lembrado traz em si a necessidade de uma seleção (BOSI,1987). Esta seleção denuncia que a memória não está reduzida ao indivíduo, mas ao contrário, ela envolve ambas as vozes: a social e a individual.

3 UM PORTO DE ANCORAGEM: A FORMAÇÃO COMO EXPERIÊNCIA

Problematizar a formação de estudante de pedagogia é contribuir para o campo da formação docente numa perspectiva mais geral e considerar a importância e considerar a subjetividade envolvida nesse processo de formação. De acordo com o escreve Lima, et al. (2020, p.13), pensar a subjetividade docente envolve

compreender a prática e a teoria como elementos únicos, considerar os fatores externos e internos para esse desenvolvimento, as experiências vivenciadas no cotidiano, na construção de saberes, memórias que podem ser reelaboradas e traduzidas na prática. Compreender a subjetividade docente (individual e social) como algo em construção é fundamental, pois a decisão de ser professor vai além de uma escolha temporal, é reforçada pelas nossas crenças, valores, motivações, trajetórias de vida do sujeito que aprende e ensina.

Pensar a formação como experiência e qual é a dimensão experiencial dessa viagem formativa é fundamental para entendermos em que se torna o estudante de pedagogia ao final de seu percurso acadêmico. Por isso compreendemos a formação como experiência produtora de sentidos a partir do que ensina Larrosa (2011, p.5) a experiência é “isso que me passa”. Não isso que passa, senão “isso que me passa”.

A experiência supõe, em primeiro lugar, um acontecimento ou, dito de outro modo, o passar de algo que não sou eu. E “algo que não sou eu” significa também algo que não depende de mim, que não é uma projeção de mim mesmo, que não é resultado de minhas palavras, nem de minhas ideias, nem de minhas representações, nem de meus sentimentos, nem de meus projetos, nem de minhas intenções, que não depende nem do meu saber, nem de meu poder, nem de minha vontade. “Que não sou eu” significa que é “outra coisa que eu”, outra coisa do que aquilo que eu digo, do que aquilo que eu sei, do que aquilo que eu sinto, do que aquilo que eu penso, do que eu antecipo, do que eu posso, do que eu quero. Chamaremos a isso de “princípio de alteridade”. Ou, também, de “princípio de exterioridade”. Ou, ainda, de “princípio de alienação”. Se lhe chamo “princípio de exterioridade” é porque essa exterioridade está contida no ex da própria palavra ex/periência. Esse ex que é o mesmo de ex/terior, de ex/trangeiro, de ex/tranheza, de êx/tase, de ex/ílio. Não há experiência, portanto, sem a aparição de alguém, ou de algo, ou de um isso, de um acontecimento em definitivo, que é

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exterior a mim, estrangeiro a mim, estranho a mim, que está fora de mim mesmo, que não pertence ao meu lugar, que não está no lugar que eu lhe dou, que está fora de lugar.

O principio da alteridade proposto por Larrosa (op.cit) para pensar a experiência estendemos ao campo da problematização da formação inicial em Pedagogia, de modo que pensar a formação como experiência é pensar que “o que me passa tem que ser outra coisa que eu”, algo radicalmente outro ao fim da viagem formativa.

Assim a experiência formativa o lugar da experiência, a experiência é sempre subjetiva onde o sujeito deve ser capaz de deixar que algo lhe passe, algo lhe aconteça, que algo passe suas ideias, sentimentos e que desse modo a experiência é sempre de cada um de um modo único, singular, particular.

Concordamos com Larrosa (2011) de que experiência é transformação; um sujeito da experiência formativa deve estar aberto a própria transformação,

Ou a transformação de suas palavras, de suas ideias, de seus sentimentos, de suas representações, etc. De fato, na experiência, o sujeito faz a experiência de algo, mas, sobre tudo, faz a experiência de sua própria transformação. Daí que a experiência me forma e me transforma. Daí a relação constitutiva entre a ideia de experiência e a ideia de formação. Daí que o resultado da experiência seja a formação ou a transformação do sujeito da experiência. Daí que o sujeito da experiência não seja o sujeito do saber, ou o sujeito do poder, ou o sujeito do querer, senão o sujeito da formação e da transformação (p.7).

Então experiência é passagem, percurso, viagem. A experiência formativa é entendida aqui como viagem, percurso formativo “uma saída para outra coisa, um passo para outra coisa” (LARROSA, op.cit). a viagem formativa pelo curso de pedagogia como território de passagem o qual deixa vestígio, rastros e por vezes feridas. Uma viagem da qual, certamente, não saímos os mesmos da partida.

4 O PORTO DO CURRÍCULO

A partir da inspiração e da produtividade de pensar o Currículo como pratica de significação e produtor de subjetividades, problematizamos a formação como experiência produtora de sentidos e não como produtora de verdade.

Segundo Silva (2006, pag. 12) “o currículo estabelece diferenças, constrói hierarquias, produz identidades.” Dessa forma, podemos perceber o currículo como algo que tem um objetivo e direciona a forma como se deve formar os indivíduos envolvidos nesse processo, e é nesse contexto que abordaremos essa pratica na formação acadêmica. O que quer esse currículo? O que pode um currículo? De que forma os professores utilizam esse documento? Em que ou no que ele nos torna? Através dele como se chega ao final da viagem formativa?

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O currículo encarado como pratica formadora e transformadora deve levar certos questionamentos aos que fazem uso dele, não afim de que se encontre uma resposta para tudo, ou uma prática que pode ser um manual de como as coisas devam ser feitas e encaradas como regras, mas que se possa pensar o currículo como algo que está dentro das nossas relações sociais, que nos modifica, sendo uma prática produtiva. A partir dessa perspectiva, afirma Silva (2006, pag. 19):

Outra vez, da mesma forma que a cultura, também o currículo pode ser visto como uma pratica de significação. Também o currículo pode ser visto como um texto, como uma trama de significados, pode ser analisado como um discurso e ser visto como uma pratica discursiva. E como pratica de significação, o currículo, tal como a cultura, é, sobretudo, uma pratica produtiva.

Desse modo, como o currículo é colocado em pratica na formação do pedagogo? Como este currículo chega aos professores do curso de pedagogia e a forma como este é aplicado e vivenciado dentro dessa perspectiva? Já temos de antemão um perfil do estudante de pedagogia previamente estabelecido/pensado, que se coloca da seguinte forma no Projeto Pedagógico e Curricular - PPC do curso Pedagogia UFPA/Campus do Tocantins/Cametá (2015, p. 2):

O perfil do egresso desejado pelo curso de Licenciatura em Pedagogia é de um profissional com domínio de conhecimentos científicos, didáticos, metodológicos e, por meio de ação critico reflexiva em relação a educação, de organização referente aos processos pedagógicos, a gestão educacional, a construção da sociedade, da cultura e dos valores éticos inerentes a aprendizagem, presente e atuante em espaços educativos formais e não formais, de forma política e com princípios éticos fundados no respeito, na solidariedade e na cidadania, no apreço ao diálogo e à valorização da vida, comprometido com a pluralidade de culturas e saberes.

Como fica evidente no documento acima citado o PPC já nos apresenta uma “definição” do egresso do curso de Pedagogia, mas nos perguntamos: qual o perfil que efetivamente vai se constituindo ao longo da viagem formativa? Quais rupturas ele provoca ao longo desse percurso? Até que ponto a ação critico reflexiva prevista no PPC se faz presente nas práticas das diferentes disciplinas? Em que as práticas contribuem para a formação do “aluno crítico reflexivo”, o “bom aluno”?

Por vezes nos deparamos com propostas de disciplinas que destoam desse ideal onde em algumas transpareceu um padrão tradicional de aluno quando diz respeito ao que é colocado pelo professor, como algo inquestionável e imutável.

Muitas vezes o que se valoriza são posturas em que aquele aluno que comenta a modo de reforçar o que foi dito pelo professor ganha destaque, sendo visto pelo professor como o que está melhor “aprendendo”. No entanto, não se percebe que ao deixar nítida a postura que se espera, acaba

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por deixar acuados, outros alunos que não se sentem a vontade para falar sobre algo, a transmitir sua opinião, que por vezes pode ser contrária a do professor.

A grande maioria dos professores não age dessa forma, mas os poucos que o fazem conseguem demarcar esse lugar, onde o aluno pode estar e deve permanecer, como o que somente segue o que o professor quer que ele pense e fale.

Por vezes, a ética é tão cobrada aos alunos, mas de que forma os professores lhes colocam/expressam essa ética? Já que eles estão ali para nortear práticas e valores.

A escola encontra-se como reflexo da sociedade em que vivemos, nesse contexto, a percebemos como um dos mecanismos que podem ser utilizados para continuar a perpetuar antigas praticas como uma educação que domestica e dociliza o individuo, ou para se instigar uma possível mudança no sentindo de uma liberdade, podendo nos induzir a atitudes questionadoras e desafiadoras.

Encontramo-nos imersos nesses paradoxos de certo e errado, e na vida de futuros educadores isso não seria diferente, por meio dos modos como se questiona, não de forma individual, mas de modo coletivo, para se entender o mundo em que vivemos hoje, onde historicamente somos criados e educados para aceitação passiva onde o poder decisório sobre a vida de muitos, se concentre nas mãos de poucos, e nesse contexto a educação ainda tem se refletido, de muitos modos, como objeto de produção e disseminação de falsas verdades. A esse respeito, Hermann (2005, p. 70), nos expõe que:

Ver a ética como um processo de criação indica que aqueles que se educam, enquanto agentes éticos, dispõem de liberdade, autonomia e poder na vida como um artista. O homem tornasse criador de leis e costumes ao produzir esteticamente um estilo de vida. O caminho que conduz às propostas de autocriação e satisfação estética, capaz de produzir experiências autênticas que reconfigurem nossa moralidade [...]

Nessa perspectiva, podemos refletir sobre a ética, como uma pratica constante, no sentido de um exercício de vivencia que nos possibilita pensar e repensar sobre práticas e posicionamentos, que por vezes nos levam a deixar essa ética em segundo plano, e esqueçamos de refletir no sentido de uma coletividade, deixando os interesses individuais se sobressaírem.

De que modo então nos dispomos a perceber o outro como alguém diferente de mim? De que modo eu transmito ao meu aluno, o cuidado que eu tenho com o ensinar, estudar e pesquisar, e os modos como me possibilito ter essa relação de dualidade com esse outro que está a mim diretamente ligado? Até que ponto os professores ao panejarem suas disciplinas, não pensam estas e seus alunos somente a partir de si mesmo, dos autores que gostam, do que querem ouvir, ler? Até que ponto as práticas curriculares presentes nas disciplinas pensam e tomam o aluno como “outro” e não como mera extensão do professor? Que alunos estas práticas curriculares formam?

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É preciso pensar o outro a partir de sua própria alteridade e não da mesmidade, pois assumindo esse caráter as diferenças acabam se apagando e juntamente com o isso toda a alteridade inerente a esse outro, e com isso tudo o que o constitui como um ser da diferença.

Assim é que fomos inspirados a pensar o campo da educação a partir de problematizações que colocam em evidencia algumas questões que nós acabamos por silenciar ou até mesmo negar, quando nos preocupamos mais em responder uma infinidade de perguntas e não nos colocamos dispostos a viver uma experiência, a sermos tocados por esse saber filosófico que nos permite refletir sobre a relação com a verdade, a pensar sobre nosso próprio pensamento.

Abordamos estas questões, não no sentido de que estas leituras garantirão o ideal de um aluno crítico e reflexivo, mas que elas podem e tem esse potencial de abrir nossos horizontes para algo jamais antes pensado, e estas só chegam até nós por meio de alguns poucos professores, que por meio das disciplinas que ministram tentam inseri-las nas atividades propostas. Na bibliografia básica e complementar, autores como Foucault, Nietzsche, Machado, Larrosa e outros da filosofia ainda são pouco evidentes tanto no Projeto Pedagógico Curricular quanto nos Planos de Curso disponibilizados pelas disciplinas. A própria carga horária de disciplinas como Filosofia e História da Educação é bastante reduzida no curso o que impõem aos professores, talvez priorizar autores em detrimento de outros. Mas com isso os alunos ficam de certo modo privados do contato com outros modos de pensar e problematizar a educação. Também são poucos os professores de outras disciplinas que se encorajam a dialogar com autores do campo da Filosofia, como se esta não estivesse na base do próprio pensamento e das demais disciplinas.

A disciplina ligada ao currículo pode ser um grande divisor de aguas durante a viagem formativa na medida em que permite problematizar o campo do currículo e pensar o próprio currículo não como mero documento forma, oficia de organização de componentes curriculares, mas como um campo produtor de sentidos marcado por relações de poder/saber e de resistências ao instituído.

O currículo está presente em todos os campos e momentos vividos da vida escolar, desde os processos discursivos até aos modos como organizamos o espaço/tempo da sala de aula, as regras instituídas, o modo como sentamos, os (não) lugares que ocupamos e como nos posicionamos. Tudo isso como construção e produção histórica e cultural em meio a processos de condução de condutas que tentam normalizar sujeitar os indivíduos. Nesse sentido, SILVA (2006, p. 21):

[...] o currículo é um espaço, um campo de produção e de criação de significado. No currículo se produz sentido e significado sobre os vários campos e atividades sociais, no currículo se trabalha sobre sentidos e significados recebidos, sobre materiais culturais existentes. O currículo tal como cultura, é uma zona de produtividade. Essa produtividade, entretanto não pode ser desvinculada do caráter social dos processos e das práticas de significação. Cultura e currículo são, sobretudo, relações sociais.

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O currículo, especialmente nos cursos que formam professores, também se encontra profundamente marcado por essas reações de poder/saber/sujeito e suas estratégias de resistências por isso pode ser modificado dependendo de nossas relações, pois não se trata de considera-lo como um produto acabado ou imutável, uma vez que está sujeito às relações de poder que se estabelecem nesse contexto.

Por isso dentro das experiências formativas do curso de pedagogia foi possível a experimentação no campo da disciplina de currículo práticas que oportunizaram perceber a importância da presença de sensibilidade e de amor ao conhecimento por parte de quem ministra uma disciplina, elementos capazes de criar envolvimento e de contagiar os alunos fazendo-os perceber prazer, alegria, desejo nos processos de ensinar e aprender, e despertar para a necessidade e valor de cada presença não seja apenas física, mas vivida e sentida, presença e existência experimentadas em meios aos processos de construção e dos sentidos atribuídos e vividos na aula e da própria ideia de sala de aula. Esse processo pode ser alcançado em meio a valorização de espaço de escuta das vozes-alunos/alunas, capturadas através do exercício da escrita de suas memórias, entendidas aqui como escritas de si.

Nesse processo do que é vivido e experimentado nas aulas, defendemos que é necessário que se oportunize ao estudante de pedagogia que exercite a própria escrita, a partir das próprias histórias. A construção de memoriais, narrativas de si podem se constituir um importante ferramenta no processo de formação e auto formação de futuros professores. Nessa perspectiva, Larrosa (1999, p. 69), nos expõe que:

[...] é contando nossas histórias, nossas próprias histórias, o que nos acontece e o sentido que damos ao que nos acontece, que nos damos a nós próprios uma identidade no tempo. [...] O eu, então, não é uma unidade psíquica de caráter substantivo, suscetível de temporalização ao contar com o rastro do passado no armazém da memória. O que ocorre antes é que o eu, da auto consciência temporal é algo que está significativamente constituído na narração.

Através das memórias das histórias vividas exercitar a escrita, afim de que essa aproximação seja um mecanismo positivo que nos permita nos aprimorar e aprimorar a escrita, e recriando a própria existência como alunos, alunas e professores, bem como potencializar desenvolvimento acadêmico que de ênfase na formação para o pensar, para a construção de autonomia e criticidade, capacidade de problematizar a vida, a escola e o próprio processo de formação em meio a nossa jornada/viagem formativa.

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5 O FIM E O PRINCIPIO... RUMO A UMA NOVA VIAGEM

Na leitura da lição não se busca o que o texto sabe, mas o que o texto pensa. Ou seja, o que o texto leva a pensar. Por isso, depois da leitura, o importante não é que nós saibamos do texto o que nós pensamos do texto, mas o que – com o texto, ou contra o texto, ou a partir do texto – nós sejamos capazes de pensar. (LARROSA, 2010, p. 142)

A viagem formativa pode nos levar a caminhos e descaminhos jamais antes habitados e vivenciados, especialmente se experimentarmos diálogos constantes com o campo filosófico de modo que a formação seja realmente uma experiência.

As ancoragens em portos permitiram pensar e problematizar a formação. Buscamos por meio desta viagem, por inspiração de Michel Foucault e seus comentadores, problematizar o campo da educação, no que diz respeito a alguns elementos quem podem contribuir nos modos de se tecer a formação do estudante de Pedagogia, especialmente através das disciplinas de base filosófica, bem como das que buscam ancoragem nessa base, especialmente as do campo do Currículo.

Acreditamos que durante a viagem formativa no curso de pedagogia é possível oportunizar a formação do aluno critico, com autonomia através de práticas de estimulem uma educação para o pensar, a problematização e a reinvenção da escrita de si, por meio de processos estéticos e metodológicos como o registro de suas memórias, a partir da escrita de si, como experiência libertária, a partir de uma escrita libertadora.

Chegamos ao fim desta viagem?

Por certo que não. Mais uma vez o sentimento de incompletude e inquietação nos toma. Algo ficou por ser dito? É certo que sim, no entanto, sabemos que algo sempre está a nos escapar, como seres de incompletude que somos jamais conseguiríamos dizer tudo, mas pontuamos neste texto alguns dos principais elementos que em nós reverberaram durante a pesquisa realizada que para nós também se constituiu em uma viagem formativa. Há ainda muitas viagens a fazer, muito a se problematizar sobre os processos de formação do estudante de Pedagogia, mas isso fica para um próximo diálogo.

REFERÊNCIAS

CHAUÍ, Marilena. Os trabalhos da memória. In: BOSSI, Ecléa. Memória e Sociedade:

lembranças de velhos.2 ed. São Paulo: T.A. Queiroz,1987.

COSTA, Marisa Vorraber. (Org.). Caminhos Investigativos - novos olhares na pesquisa educacional. Porto Alegre: Editora Mediação, 1996.

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CUNHA Maria Isabel da. CONTA-ME AGORA! as narrativas como alternativas pedagógicas

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Referências

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