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A representação da ausência da família no imaginário de um grupo de idosos asilados

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Academic year: 2017

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ANNA CRISTINA PIRES - DE - MELLO

A REPRESENTAÇÃO DA AUSÊNCIA DA FAMÍLIA NO IMAGINÁRIO DE UM GRUPO DE IDOSOS ASILADOS.

Dissertação apresentada ao programa de Pós Graduação Stricto Sensu em Gerontologia da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Gerontologia.

Orientadora: Profª Drª Altair M.L. Loureiro.

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TERMO DE APROVAÇÃO

Dissertação de autoria de Anna Cristina Pires de Mello, intitulada - A REPRESENTAÇÃO DA AUSÊNCIA DA FAMÍLIA NO IMAGINÁRIO DE UM GRUPO DE IDOSOS ASILADOS. Requisito parcial para obtenção do grau de Mestre do Programa de Pós Graduação Stricto Sensu em gerontologia, defendida e aprovada pela banca examinadora constituída por:

Profª Drª Altair Macedo Lahud Loureiro - UCB ...

Orientadora

Profª Drª Maria Cecília Sanchez Teixeira - USP ...

Examinadora Externa

Profª Drª Carmen J. Cárdenas – UCB ………

Examinadora Interna

Prof. Dr. Vicente Paulo Alves - UCB ...

Examinador Interno

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DEDICATÓRIA

Com amor para

Hernani e Odette meus avós paternos, Alcino e Djalmira, meus avós maternos,

meus pais

José Geraldo e Yeda Nicia, minha mãe preta Rozilda Veríssimo da Silva,

meus filhos

Matheus Geraldo, minha nora Isabella, Gabriel Henrique

Filipe Augusto e

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AGRADECIMENTO

À minha orientadora do Mestrado, Profª Drª Altair Loureiro, por toda amizade e dedicação que permeia os momentos de pesquisa e de convívio.

À minha orientadora do curso de especialização em Terapia de Casal, Família e Sexologia Humana, Profª Drª Ana Maria Fonseca Zampieri, por me ensinar pelo exemplo, com deferência, validação e carinho.

À Profª Drª Carmen J. Cárdenas, o agradecimento pela paz que sua presença me transmite e pela confiança em meu desempenho.

Ao Prof. Dr. Vicente de Paulo Alves, por todos os momentos de partilha, de referência ética e de reflexão.

À Profª Drª Maria Cecília Sanchez Teixeira, por contribuir qualitativamente em meu aprendizado, por meio de seus escritos.

À Profª Virgínia Turra, a referência de valor infinitamente humano.

À psicóloga e terapeuta de casal e de família, Antonia Lucia Ribeiro Freitas, o brilho de luz que ilumina e significa para mim, familia extensa.

Aos professores e colegas do Instituto de Pesquisa e de Intervenção Psicossocial (INTERPSI)

Ao Lar dos Velhinhos Maria Madalena.

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RESUMO

Esta dissertação de Mestrado STRICTO SENSU em Gerontologia Universidade Católica de Brasília – UCB; de Anna Cristina Pires-de-Mello tem como título: A representação da ausência da família no imaginário de um grupo de idosos asilados. O projeto foi desenvolvido sob a orientação da Profª Drª Altair Loureiro e integra o projeto “Imaginário, idosos tabagistas asilados e organização de asilos: organizacionalidade antropolítica – IATO –”, pesquisa interdisciplinar aprovada pelo CNPq e CEP/UCB. O projeto IATO (CNPq/UCB 2007-2009) por sua vez, está vinculado ao projeto interinstitucional, com a participação de cinco instituições de Ensino Superior do País, aprovado pelo CNPq, denominado “Instituições de Longa Permanência para Idosos – ILPIs no Brasil: Tipologia e proposta de modelo básico de atendimento multidimensional” (2007-2009), que tem como objeto de pesquisa a Instituição de Longa Permanência para Idosos – ILPI –, o asilo. Tem como foco, desvelar o imaginário de seis idosos asilados diante da condição de excluídos da família, do grupo social de origem e de uma condição cidadã. Para tal, utilizamos como metodologia e instrumento de pesquisa os seguintes itens: Termo de Consentimento Livre e esclarecido (TCLE), observação do funcionamento da ILPI, observação do relacionamento humano entre funcionários, cuidadores e os idosos, interação social em datas e horários diferenciados, entrevista, coleta livre de fala, aplicação e análise de dados do protocolo do teste projetivo: Arquétipo teste de 9 elementos, AT-9. Os resultados obtidos explicitaram para os seis idosos pertencentes à pesquisa, que a ausência da família representa para eles, a condição de maior perda. A marca da ausência do convívio com a família deixa evidente a interferência no imaginário, bem como permite que se considere a necessidade de uma intervenção realizada por equipe multiprofissional qualificada, alicerçada em ações eficazes de políticas públicas voltadas para a melhoria de vida da população idosa.

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ABSTRACT

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SUMARIO

1.Introdução...09

2. Objetivo geral...13

2.1Objetivos específicos...13

2.2.1. Utilizar o Arquétipo Teste de 9 Elementos – teste AT-9, de Yves Durand -, para descobrir a estrutura do imaginário do grupo de idosos...13

2.2.2. Colher imagens representacionais da família, na fala dos sujeitos...13

2.2.3 Identificar a coerência mítica, ou não, no micro universo mítico de cada um dos sujeitos idosos e no universo mítico geral do grupo em questão...13

3.Temática...14

3.1 Uma apresentação do grupo de idosos institucionalizados, sujeitos da pesquisa e sua contextualização familiar: fatos, falas, histórias das mudanças espaço temporais da família e considerações psicoterapêuticas...14

3.1.1 As lealdades invisíveis existentes no grupo familiar...19

3.2 O idoso institucionalizado e o mito familiar: Uma contextualização gerontológica. ...20

3.2.1 Confronto de mitos: o mito familiar e a ILPI...22

3.2.2 A ILPI: contexto da investigação...24

3.3. Sobre a velhice, o processo de envelhecimento e o velho...28

4. Base Metodológica ...31

4.1 População...31

4. 2. Procedimento e instrumentos...31

5. Bases teóricas...33

5.1 - Antropologia do imaginário...33

5.1.1. Regime diurno de imagens...34

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5.1.3 O arquétipo teste de 9 elementos AT-9: a heurística da teoria do

imaginário...37

5.2 A psicologia do envelhecimento: uma abordagem sistêmica da família aplicada a gerontologia...38

6 . Tabulação dos dados contidos nos protocolos AT- 9...42

6.1 Contexto possibilitador do campo de pesquisa e suas especificidades...42

6.1.1 Análise e resultado dos dados contidos no protocolo AT-9 sujeito 1 ...44

6.1.2 Análise e resultado dos dados contidos no protocolo AT-9 sujeito 2...54

6.1.3 Análise e resultado dos dados contidos no protocolo AT-9 sujeito 3 ....61

6.1.4 Análise e resultado dos dados contidos no protocolo AT-9 sujeito 4 ....69

6.1.5 Análise e resultado dos dados contidos no protocolo AT-9 sujeito 5 ....77

6.1.6 Análise e resultado dos dados contidos no protocolo AT-9 sujeito 6 ....87

7. Considerações finais...97

7.1 Sugestões possíveis...102

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1. INTRODUÇÃO

Esta dissertação tem, como indicador reflexivo, a ausência da família como interferência possível no imaginário de um grupo de idosos institucionalizados, relativamente ao contexto do ser humano que envelhece inserido numa Instituição de Longa Permanência para Idosos - ILPI.

O recorte sociocronológico utilizado teve como parâmetro para o entendimento do fenômeno da velhice, assim como do ser humano velho ou envelhecendo nas suas diferentes realidades, a modificação do comportamento sócio-familiar, a partir do término da Segunda Guerra Mundial, e suas alterações, no Brasil dos últimos sessenta anos, marcado pelo aumento da população idosa e pelo aparecimento dos asilos, hoje ditos ILPIs. Tais fatores foram considerados sob o foco das seguintes teorias: (1) do Imaginário, de Gilbert Durand - imaginário entendido, com Durand (1989) “como o conjunto das imagens e das relações de imagens que constitui o capital pensado do homo sapiens; [...]” imaginário que “aparece-nos como o grande denominador fundamental aonde se vêm encontrar todas as criações do pensamento humano” (DURAND, 1989, p. 14); (2) da Psicologia, “ciência do comportamento humano e animal” (CABRAL, NICK, 1995, p. 246); e (3) da Gerontologia, “campo multi e interdisciplinar que visa a descrição e a explicação das mudanças típicas do processo do envelhecimento e de seus determinantes genéticos, biológicos, psicológicos e socioculturais” (NERI, 2008, p. 95).

O envelhecimento é um processo universal, embora a contextualização, valor e lugar de pertencimento do ser humano que envelhece seja próprio de cada época e cada cultura; a atualidade configura-se demograficamente com a expectativa de que o Brasil seja, a partir da década de 2020, a sexta população mais idosa no planeta, trazendo assim a necessidade de novos entendimentos sobre o idoso, segundo Neri (2007).

O processo de envelhecimento e o aumento da expectativa de vida, associados a todo contexto de mudanças e reconfigurações do cotidiano em família, trazem, em si, a necessidade de novos estudos, pesquisas e intervenções sociopolíticas e psicológicas que possibilitem uma atuação mais efetiva para esta parcela da população que, independente de morar com a família ou em ILPI, necessita e tem o direito de ser tratada dignamente.

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está, portanto, relacionada com a família, posto que “dentre as mudanças culturais que afetaram os arranjos domiciliares dos idosos, observou-se, em todo o mundo, a dissociação entre os laços de família e a residência conjunta entre pais e filhos em idade adulta” (CAMARANO, LEMOS, PASSINATO, apud NERI, 2007, p. 129).

Consequentemente, os temas ou categorias de análise consideradas, iluminadas pelas teorias explicitadas nesta pesquisa, foram: imaginário, velhice, família e institucionalização do idoso, tendo este trabalho como sujeito um grupo formado por seis idosos institucionalizados no Distrito Federal (D.F.), referenciados pelos nomes fictícios, em respeito à ética, de: Ladinha, Tatá, Cacá, Tonha, Lino e Pina.

Convém lembrar aqui o caráter multidisciplinar da gerontologia, área de concentração na qual se insere esta dissertação de mestrado, estando a psicologia integrada a esse universo, de forma interdisciplinar, e a abordagem sistêmica, de forma integrativa entre os fenômenos físicos, biológicos, psicológicos, sociais e culturais, abrangendo aspectos da religiosidade e da espiritualidade, atuando assim, de forma inclusiva, para ampliar as fronteiras do conhecimento do ser humano e especificamente do grupo de idosos que fazem parte desta dissertação.

A abordagem sistêmica nos fala da importância do contexto, quando do atendimento de família. Todos nós fazemos diariamente trocas com vários outros sistemas que nos circundam (familiar, social, cultural ambiental, entre outros), logo influenciamos e somos influenciados por todos eles (FREITAS, apud FLEURY, MARRA 2005, p. 47).

Incluir na multidimensionalidade da gerontologia a dimensão simbólica é um pressuposto para o maior conhecimento, entendimento e compreensão dos indivíduos e dos grupos que vivem a fase da velhice. O imaginário traz as evidências, expressas em imagens e símbolos, das construções e desconstruções advindas das trocas, as permutações entre o contexto exterior, e as vontades e aspirações interiores, amalgamadas no que Durand (1989, p. 29) denomina “trajeto antropológico”.

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relação familiar intergeracional, a qual permeia interativamente as relações humanas, desde o pensamento à vida em sociedade.

Em recente pesquisa interdisciplinar (2007 – 2009), aprovada pelo Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq) e pela Universidade Católica de Brasília (UCB), intitulada “Imaginário, idosos tabagistas asilados e organização de asilos: organizacionalidade antropolítica – IATO” e realizada no asilo em pauta, no Distrito Federal, ficou patente o aspecto relacionado à ausência da família na vida dos idosos asilados, explicitada no discurso desses sujeitos como saudade, mágoa e outras imagens verbais recorrentes e carregadas de afetos, todas elas produzidas no interior dessa carência. (LOUREIRO, 2007 – 2009). Recorrendo à perspectiva da teoria do imaginário:

A motivação de Durand ao estudar o imaginário era buscar, nos componentes fundamentais do psiquismo humano, as estruturas profundas arquetipicas, nas quais se ancoram as representações simbólicas e o pensamento. Era estudar o homem como produtor de imagens, conhecer as que o estruturam e todas as suas obras (TEIXEIRA, 2004, p. 4).

Surge, assim, a intenção de, no aproveitamento de tais estudos e experiência pessoais, aplicá-los e desenvolvê-los, diretamente relacionados com a situação institucional e integrados aos achados da pesquisa IATO.

Identifica-se, na coleta de fala do grupo considerado, que o idoso muitas vezes refere-se a sua memória de vida, sua religiosidade, aos fatos relacionados ao passado não mais existente como um modelo único e geralmente não compartilhado por todos os seguimentos socioculturais e familiares da atualidade. Segundo Roudinesco (2003), as interdições, limites e ordem nos mecanismos possibilitadores da expectativa da existência de uma família simbolicamente perfeita é uma representação imagético-simbólica do autocentramento característico da sociedade atual.

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2. OBJETIVO. 2.1 Objetivo Geral

Trata-se de desvendar, nas representações imagético-simbólicas de seis idosos institucionalizados – afastados do convívio familiar -, a interferência e as possíveis consequências desse afastamento na estrutura ou desestrutura de seu imaginário.

2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS. Dizem respeito a:

2.2.1. Descobrir a estrutura do imaginário do grupo de idosos, por meio do teste projetivo Arquétipo Teste de 9 Elementos – teste AT-9 -, de Yves Durand

2.2.2. Colher imagens representacionais da família, na fala dos sujeitos.

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3. TEMÁTICA

3.1 Apresentação do grupo de idosos institucionalizados, sujeitos pertencentes à pesquisa e sua contextualização familiar: fatos, falas, histórias das mudanças espaço temporais da família e considerações psicoterapêuticas.

O ser humano, quando nasce, passa a fazer parte de um grande grupo que é a humanidade como um todo. Ele pode ou não fazer parte da estatística, pode ou não ter um registro civil, mas possui necessariamente um corpo e uma contextualização, sua própria complexidade, de acordo com o papel que exerce, ocupa e desempenha no grupo familiar e sóciocultural. Tudo isso lhe permite existir em seu ambiente, sendo ou não aceito, validado e compreendido ou sentido na forma cultural de seu grupo social. “Uma família é um tipo especial de sistema, com estrutura, padrões e propriedades que organizam a estabilidade e a mudança” (COLAPINTO, MINUCHIN, MINUCHIN, 1999, p. 22).

A possibilidade de permanência, no convívio familiar, de cada ser humano referido ao seu grupo de origem biológica, interliga-se a uma série de fatores predisponentes, tais como: condição sócio-afetiva, condição financeira, condição de saúde, entre outras.

A pobreza não raro altera a permanência do ser humano no grupo familiar, criando a necessidade de mudanças que, muitas vezes, envolvem a entrada prematura do mesmo no mercado de trabalho, levando-o para uma condição de perda de oportunidades, inclusive a de continuar os estudos, como no caso dos sujeitos pertencentes a esta pesquisa.

Sem desmerecer as garantias e os avanços dos direitos da criança e do adolescente, e resguardados os direitos e prerrogativas inerentes ao adulto, não se observou, no mesmo intervalo de tempo, uma dinâmica social que assegurasse, como nas idades anteriores, os direitos dos idosos, portanto, as responsabilidades da família e do Estado em relação a eles (ALMEIDA, apud CUNHA, FÁVERO, 2009, p. 36).

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Para facilitar a identificação de cada sujeito nas falas ao longo do texto e registro gráfico contido na análise dos protocolos do AT-9, os idosos serão identificados, por uma questão ética, pelo número, sexo e idade, de acordo com seu pseudônimo: Ladinha 1 F 80 anos, Tatá 2 F 75 anos, Cacá 3 M 81anos, Tonha 4 F 93 anos, Lino 5 M 75 anos e Pina 6 F 69 anos.

Sujeito 1: Morava com a família dos patrões há tempos. Cuidou das crianças dessa família, desde pequenas, da caçula, desde que esta saiu da maternidade para casa com a mãe. A idosa foi levada por essa mesma família para morar na ILPI, devido a alterações de saúde, fator que a limitava no exercício das tarefas laborais. Locomove-se atualmente em uma cadeira de rodas e relatou que um dia, com calma, vai falar sobre o assunto, mas que ainda não vai ser por agora. Recebe cuidado e carinho da família dos patrões, que a visitam frequentemente e observa-se que é tratada com respeito e consideração, tendo assumido, em sua fala, que eles também são como sua família.

A família de escolha, fictícia ou criada, é geralmente fruto de situações excludentes, como no caso da ausência da família nuclear. Esse tipo de família é nomeado por Keren e Johnson, citado por McGoldrick (2003), sugerindo que a questão básica de conceito do que constitui uma família relaciona-se ao respeito e à consideração no convívio. No caso deste sujeito, a família de escolha, apesar de suportar a condição da falta da família nuclear, não a substitui, uma vez que a fala contém o termo eles são como se fossem a minha família.

A falta da família constitui assim, para o sujeito, o núcleo de sofrimento subjetivo e que possivelmente ocasionou a não-aceitação de casamento e consequentemente, de formação de uma família nuclear. Conforme relato contido no protocolo do AT-9, esta não quis se casar e ter filhos, para não conviver com homem bêbado.

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alguns que foram dados para famílias. Em relação aos outros, ela não teve mais notícia, dizendo que devem estar espalhados pelo mundo. Este fato nos possibilitou uma reflexão acerca da pluralidade de condições sócioemocionais referentes a suas atitudes diante da vida e à condição de velhice que ela atravessa neste momento.

No protocolo AT-9 deste sujeito, a condição da falta da família pode ser observada no desamparo diante da vida, uma vez que a única expectativa citada por ela é esperar a morte!

Sujeito 3: Foi morar na instituição por vontade própria, depois de uma decepção amorosa. Segundo seu relato, não pretende morar com nenhum de seus filhos, pois estaria dando trabalho e ocupando um quarto da casa. Embora tenha uma situação econômica estável, que lhe permite viver num imóvel próprio ou alugado, “preferiu” a opção da ILPI, segundo ele, porque isto lhe permite a convivência social com pessoas que o compreendem, conversam com ele sobre assuntos semelhantes e onde não ocorrem conflitos significativos. Considera-se bem atendido pelos profissionais contratados pela instituição.

A condição que o sujeito 3 ocupa na ILPI é diferenciada, pois, em virtude de sua condição financeira, ele ocupa um dos dois quartos com banheiro privativo, existentes em cada ala, separada por gênero. Os demais idosos, agrupados em pares, compartilham o espaço comum de cada quarto e banheiro. Ele apresenta-se sempre com roupa e sapatos limpos, verbaliza a importância do asseio pessoal diário, mantém os cabelos penteados e uma voz que ostenta significativo orgulho pela conquista de uma vida com autonomia, na qual se destacam o fato de ocupar um quarto individual, ter seu próprio carro e envolver os filhos somente quando vai às consultas externas com o oftalmologista. A instituição é, para ele, o lar de sossego e descanso, com as amizades que fez lá. Embora apresente uma condição menos afetada pela ausência da família, por ter convivido com sua família nuclear e ter tido dois casamentos, o que representa a maior parte de sua vida, os últimos nove anos são o tempo de sua moradia na ILPI. Este trecho do relato destoa da tonalidade geral do discurso de busca de equilíbrio pois, conforme sua narrativa do AT-9, não quer incomodar, nem quer ocupar um cômodo, permanecendo assim isolado do convívio familiar.

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O contexto dos segredos e dos não ditos aproxima-se, assim, da importância universal e da complexidade que a família e o convívio cotidiano com esta ocupam na vida do sujeito, seja no seu imaginário, seja como núcleo mantenedor de seu pertencimento, possibilitando-nos, desse modo, pensar sobre a importância de novos estudos que possam agregar valor a esta dissertação de mestrado, na continuação de pesquisa de campo e de produção acadêmica, na produção de artigos ou mesmo, e/ou num futuro projeto de doutoramento.

Sujeito 4: Mora na ILPI mas, segundo ela mesma, convive com a família, filhos e netos, nos dias em que recebe suas visitas. Os aspectos sócio-antropológicos, políticos e familiares relacionados ao patriarcado estão presentes na fala deste sujeito de 93 anos envolvendo falas e lembranças esmaecidas sobre as Guerras Mundiais, o século XX, frustrações relacionadas a não poder estudar por proibição de seu marido, a ausência de fala sobre a filha, os relatos sobre os filhos, genro e netos. Tudo isso são, a meu ver, indícios da força dos valores do patriarcado, impressos na vida da idosa, conforme consta em seu protocolo do AT-9.

A mesma verbaliza ainda a necessidade de contato e da permanente atenção de alguém, indiferentemente de quem seja. Requisita que se vá ao quarto dela, que se permaneça com ela sempre envolvido (a) numa conversa com ela, na qual é exaustivamente verbalizado: todo mundo gosta da vovó, a vovó é boa com todo mundo. Mantém-se auto-referente, reafirmando, em sua fala. Que é uma pessoa boa, bonita e generosa, demonstrando assim o poder contido nas palavras. “A palavra constitui a essência do mundo e a essência do homem” (CÁRDENAS, 2000, p. 55).

Sujeito 5: Relata poucas lembranças significativas da família biológica, da qual vivia distante desde a mocidade. Revela em sua verbalização, por vezes contraditória, que teve filhos com mulheres diferentes e com profissionais do mercado de sexo. Traz, ainda, como informação relevante, o fato de ter ido morar numa instituição do DF, levado por um superior hierárquico da Força Armada na qual prestava serviço, depois da construção de Brasília. Saiu de lá e foi morar na ILPI, por vontade própria, relatando estar satisfeito, pois sente-se útil, tendo tomado para si a responsabilidade de apagar as luzes externas da instituição, a cada dia.

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Quanto ao cuidado pessoal, esse sujeito apresenta-se asseado e relata que ele mesmo realiza as tarefas de lavar e passar suas roupas e de engraxar seus sapatos. A atividade laboral, a busca de algo a ser feito, trouxe para o sujeito 5, inserido no contexto institucional, a oportunidade de readquirir o sentido de pertença, vivenciado anteriormente na corporação militar, com o sentido de utilidade e, portanto, de valor pessoal e coletivo.

Observa-se que este conversa com todos de igual forma, não demonstrando preferências e mantendo-se afastado dos que ele considera terem comportamentos inadequados, que não são coisas de Deus, como consta registrado no protocolo AT-9. A bondade é coisa de Deus, as palavras de educação também, diz ele por vezes seguidas, sorridente e cordial. “Respeitar e cultivar a religiosidade do idoso é ajudá-lo a descobrir os valores humanos religiosos de sua vida e a viver esse tempo de sua existência na serenidade e na paz que só Deus sabe dar” (ALVES, apud FALEIROS, LOUREIRO, 2006, p. 52).

Sujeito 6: Foi criada na região sudeste desde os dez anos, idade com a qual começou a trabalhar como doméstica, para ajudar no sustento de sua família. Atualmente é viúva, tem uma filha e revela em sua fala que foi morar na instituição porque a religião da filha e do genro é muito diferente, não dá certo não.

Relatou ainda que o marido foi uma pessoa muito boa e significativa para ela. Ele trabalhava como funcionário de serviços gerais em uma firma perto da residência onde ela executava as tarefas domésticas, desde os dezoito anos. Que o conheceu de uma maneira singular: um dia ela estava limpando as vidraças com uma flanela e reparou que um homem estava balançando um espanador no edifício em frente. Reparou bem e percebeu que o aceno era para ela, desde então, relata com alegria que esse gesto de carinho foi se tornando cada vez mais frequente e que ela o correspondia acenando-lhe com a flanela. No meu tempo, diz ela, não se namorava com agarramentos, como hoje. Uma moça se dava ao respeito, e um homem de boas intenções agia corretamente.

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3.1.1 As lealdades invisíveis existentes no grupo familiar

O acolhimento, a escuta atenta e respeitosa, a necessidade humana de ser e de se sentir compreendido podem ser elementos pacificadores de uma dor emocional, geralmente mantida sobre o peso de um segredo ou de uma lealdade, no passado de cada um dos idosos, ao seu próprio grupo familiar de origem. Segundo Boszormeny-Nagy (1983), as lealdades referem-se a aspectos de proteção, de solidariedade e de compromisso mútuo, unificador de necessidades.

As lealdades podem indicar, na fala e no comportamento do ser humano, um caminho pré – traçado, que indica a partir de onde se pode observar e compreender, olhar de outro ângulo, ampliando esse olhar para uma compreensão sistêmica, na qual os mitos, crenças, mandatos e compromissos influenciam, muitas vezes, a ação de todo um grupo seja ele, familiar e ou sócio cultural.

No grupo de idosos pertencentes à pesquisa, as lealdades manifestam-se aglutinadas à justificativa de que a ausência da família tem sempre uma explicação para eles. Tal explicação pode ser contextualizada pelo mito da família, como sendo uma narrativa de cunho sagrado, tal como aparece nesta citação (DURAND 1989; LOUREIRO 2000; ROUDINESCO 2003)

Os membros da família desenvolvem uma idéia de que são uma família a partir de elementos míticos: por exemplo, em relação às qualidades ou as falhas do grupo, que lhe seriam específicas; as relações que esse grupo deve manter com o mundo exterior. [...]. Os rituais foram estudados por Lévy – Strauss. Eles são complementares ao mito. São todas as condutas repetitivas que tem por função reforçar o pólo mítico do grupo, fazendo-o transparecer (NEUBURGER, 1999, p. 26).

A narrativa e a sua repetição remetem, neste grupo, à importância da família nuclear como presença perene, mesmo diante da ausência de seus membros. Estender o olhar especificamente remetido ao imaginário oportunizou, durante a pesquisa, uma atenção sobre o grupo de idosos institucionalizados, como foco de interesse desta dissertação. As possíveis consequências da ausência do convívio cotidiano com as próprias famílias trouxe narrativas do sujeito sobre o si mesmo e sobre uma família real, idealizada ou esmaecida pela passagem dos dois tempos: um, objetivo (cronológico, linear, sucessivo) e outro, subjetivo.

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saindo de seus baús para tomar ar, renascendo, revivendo e criando oportunidades para novos aprendizados, se e quando isso for possível.

“Na percepção do tempo, é possível distinguir, também, dois modos de vivência: a vivência subjetiva e a vivência objetiva do mesmo” (ROSELLÓ, 1998, p. 79).

3.2 O idoso institucionalizado e o mito familiar: uma contextualização gerontológica.

São parte integrante deste estudo as possibilidades de construir um entendimento sobre a fundamentação cultural e ideológica do patriarcado, fator que orientou o comportamento familiar e sóciocultural no Ocidente desde o Cristianismo e durante os séculos anteriores ao século XXI, bem como de identificar e explorar o comportamento dos idosos institucionalizados, incluindo-se a estrutura mítica do imaginário do grupo em questão, considerada como um foco de novas perspectivas de atuação institucional. A narrativa mítica sobre a família possibilitou, assim, para os idosos pertencentes a esta pesquisa, a produção de sentidos no relacionamento significativo com o ambiente.

No século XX, o pós-guerra trouxe a necessidade e a consequente construção de uma cidadania compartilhada entre os gêneros, em diversos níveis de organização sociopolítica, e a participação ativa no mercado de trabalho, possibilitando que ações integradas em grupos laborais tivessem novos focos de aprendizado e de convívio cotidiano.

O avanço tecnológico e científico nas perspectivas de novas ações do feminino, em seu caminho rumo à busca de autonomia, de liberdade de escolha abarcaram tópicos importantes, tais como: participação social, participação acadêmica, participação no mercado de trabalho, constituição de modelos e de funcionalidade familiar, gravidez, entre outros. A contextualização desses tópicos e sua interferência na vida do cotidiano feminino alterou o sistema de vida e de relação sócio-familiar.

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Atualmente a adaptação sócio-familiar a novos campos de convívio e graus de investimento afetivo trazem a contextualização da complexidade como um dos vetores nos quais a intensidade do comprometimento pode ser considerada um diferencial entre a inclusão ou exclusão dos membros de um determinado grupo, a partir de questões tais como gênero, raça, religião, crenças e valores, resiliência, ciclos de vida, envelhecimento (WALSH 2005; McGOLDRICK 2003). Tais temas são abarcados em seus conteúdos imagético-simbólicos no imaginário e em suas alterações de medo e angústia diante da morte, como descritos por Loureiro (2000a; 2004; 2008), com base em Durand (1989).

A velhice é um fenômeno não só de natureza biológica, de geriatria, mas social e cultural (sociocultural), de gerontologia, entendido e definido em versões alternadas tanto pessimistas como otimistas, com um imaginário pleno de idéias de morte ou de idéias de vida, pulsão interna a equilibrar com as imposições externas (LOUREIRO, 2000b: 72).

A dor emocional, a desrealização do sentimento, a invalidação, a exclusão constituem fatores cotidianos de conflitos existentes no universo familiar; nem sempre um campo de convivência amorosa, mas também de batalhas intergeracionais ou campo de concentração na luta pelo poder e pela manutenção de um modelo ou ideologia. Este olhar permite uma reflexão sobre os motivos que possibilitam ao familiar, ao responsável ou ao próprio idoso, a condição de envelhecer em uma ILPI.

O estudo sobre a importância da interação humana traz novas formas de percepção sobre os diversos ciclos de vida da família, contribuindo para ações mais objetivas e integradas dos terapeutas, gerontólogos e grupo familiar, em questões por vezes delicadas, como o são: a prática dos cultos religiosos, com toda complexidade de seus mitos, crenças e ritos; a convivência cotidiana entre gerações; a reformulação e recomposição de conceitos mais abrangentes e democráticos que contribuam para a busca do equilíbrio e da resolução de problemas do grupo familiar. “O sujeito não é passivo nem apenas ativo, o sujeito é interativo” (CÁRDENAS, 2000, p. 55).

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Família e atividade laboral são, portanto, possibilitadores de expressão, dados de relevância sóciocultural, tanto como campo de inserção e pertencimento, quanto como campo de exclusão e de não pertencimento. “Os psicoterapeutas estão adquirindo a consciência de que o sofrimento mental origina-se frequentemente no colapso das relações sociais. Assim verificou-se uma tendência gradual para passar das terapias individuais para as terapias de grupo e de família” (CAPRA, 2006, p.360).

A possibilidade de expressão pode ser considerada como necessidade humana universal e é também uma artéria vital para restauração emocional e da cidadania, possibilitando um sentido de pertencimento mais real ao grupo de convívio, como um direito conquistado. A conquista de um direito e da construção de um espaço pessoal pode ser considerada, em qualquer instância, o cerne da cidadania, segundo Demo (1996).

Pertencer civilmente a um clã, assinar o mesmo sobrenome, morar na mesma casa, não é garantia de pertencimento ao grupo familiar de origem, como se observou nos fatos que ocorreram na vida dos idosos pertencentes a esta pesquisa.

3.2.1 Confronto de mitos: o mito familiar e a ILPI

O conceito de mito familiar remonta à década de 1960. O mito é necessário, pois organiza o funcionamento de cada grupo. “Do mesmo modo que a sociedade cria mitos que justificam sua existência, a família também tem um modelo mítico que garante sua coesão interna e sua proteção externa” (COSTA, PENSO 2008, p.11).

O mito do poder, conforme Krom (2000) reproduz a narrativa do autoritarismo, do abuso de autoridade encontrado frequentemente na história do patriarcado, qual seja, “um sistema jurídico político no qual a autoridade e os direitos sobre os bens e as pessoas, obedeciam a uma regra de filiação patrilinear” (ROUDINESCO, 2003, p. 36).

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Os mitos da familia, e o mito do poder (KROM 2000) foram confrontados neste grupo dos idosos institucionalizados.

O entendimento sobre a funcionalidade desses mitos específicos ampliou os campos de convivência e oportunizou que uma nova narrativa tivesse início, como um ponto em comum da fala, pois que não foi possível verificar a existência de um vínculo fortalecido na convivência deste grupo específico.

O imaginário e o mito podem ser considerados como aspectos reconstituidores do ser humano, na medida em que este, independentemente de sua faixa etária, existe como seu próprio sujeito de ação, criando e recriando sua própria forma de sentir e de viver.

A ILPI, morada do grupo de idosos pertencentes a esta pesquisa, é fundamentada em base religiosa e aceita que servidores voluntários, pertencentes a outros segmentos religiosos e ou filosóficos, atuem na instituição. Observa-se com frequência jovens e adultos em ação compartilhada com os idosos, seja em atividades de aulas de informática e de artesanato, jogos de bingo, entre outras atividades ainda insuficientes, diante da necessidade real que se observa, principalmente relacionadas à educação formal. Vale ressaltar, no entanto, que nem sempre e que nem todos os idosos aceitam e participam das atividades oferecidas.

O modelo de família que o idoso vivenciou expressa-se nas falas que os sujeitos trazem sobre si mesmos, seja como vontade ou não de ser feliz e de viver; e isso se reflete na formação de um novo grupo de convivência. A ILPI, para alguns, torna-se um grupo de amigos, uma nova família, porém sem o mesmo nível de vínculo sócio-afetivo que os sujeitos revelam nas narrativas sobre suas famílias de origem; para outros ainda, trata-se simplesmente de um lugar de moradia, como no caso dos sujeitos 2 e 6. Para o sujeito 3, morar na ILPI pode ser considerado uma forma de autonomia e de libertação. A heterogeneidade que caracteriza a velhice deixa-se constatar também nesta pesquisa.

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Na escuta e na partilha das histórias familiares, pode-se, aos poucos, caminhar na reconstrução da unidade funcional possível, muitas vezes distanciados da expectativa de família idealizada que o idoso institucionalizado pode ter ou não, impressa em seu imaginário.

Um novo olhar sobre o sentir e o pensar acerca do “outro”, no contexto sistêmico, deve, incluir, além da psicologia, a antropologia, a sociologia, as ciências sociais e jurídicas, assumindo aspectos democráticos e contornos flexíveis, além de ampliar o entendimento sobre a importância da cultura, da raça humana, da alteridade no processo de vida dos seres humanos. “Cidadania e democracia são critérios gerais fundamentais para se estabelecer interfaces” (FALEIROS, 2006, p. 108).

O “outro” do qual nos ocupamos vive e interage no ambiente do grupo institucional, e o faz no culto dos ritos, das tradições, dos mitos sócio-familiares e no cumprimento de regras, reconstruindo internamente a subjetividade na qual o sujeito se forma como um aprendiz de valores e como um condutor de seu próprio processo de crescimento, maturidade e envelhecimento...

O contexto social na ILPI, permeando o sistema funcional do grupo de idosos e ampliando as possibilidades de entendimento sobre “este” ser que envelhece, independentemente de o foco de atuação multidisciplinar ser centrado no problema, na solução, na formação de estratégias, possibilita uma forma integradora de ação positiva e de inclusão da alteridade.

Décadas de transição e de tentativas de adaptação a um novo modelo institucional, desembocam, no século XXI, ainda com necessidades de aperfeiçoamento e de melhorias sócio-espaciais e humanitárias, como se pode observar no funcionamento das ILPIs.

3.2.2 A ILPI: contexto da investigação.

O espaço geográfico da ILPI distribui-se numa área amplamente arborizada, com alas de moradia separadas por gênero e condição de autonomia total ou parcial de movimento, que varia do deambular à necessidade de permanência no leito.

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É também um espaço possibilitador de construções de aprendizado em novas formas de socialização, uma vez que os idosos, nessa instituição, pertencem a grupos culturais geograficamente diferenciados por hábitos alimentares, de vestimenta, de comportamento sócio- cultural e de crenças, aspectos esses que são minimizados durante as atividades realizadas pelos grupos voluntários que atuam nessa ILPI.

Durante o período de observação do ambiente, do funcionamento da instituição e da interrelação entre funcionários, cuidadores e idosos, dois entre os sujeitos pertencentes ao grupo faleceram, e dois foram morar noutro lugar.

A lista dos idosos que se dispuseram a participar deste trabalho surgiu durante as abordagens que foram ocorrendo espontaneamente, durante os contatos verbais estabelecidos na ILPI, sendo assim, uma população formada por conveniência.

O grupo de idosos que faz parte deste estudo dispõe das características abaixo citadas: contempla os dois gêneros, é formada por solteiros, divorciado e viúvos. São pessoas de naturalidades diversas, além de abarcar todas as fases da velhice (de 69 a 93 anos). ”Alguns estudiosos já classificaram os idosos em três grupos: velho jovem (67 a 75 anos); velho médio (de 75 a 85 – 90 anos) e velho – velho, daí em diante” (LANNES apud MONTEIRO, 2004, p. 52).

A coleta inicial de fala de cada um deles, isolados ou em grupo, trouxe subsídios para que as informações relatadas fossem construídas num padrão afetivo agradável. Durante a coleta de fala com o sujeito 2, o sujeito 4 achegou-se, pegou a conversa para si e ofereceu-se para participar. Outro dado importante foi o fato de que, com o oferecimento espontâneo para participar, vem a possibilidade de que as respostas aproximem-se da realidade preservada interna e subjetivamente em cada um deles, como o ocorrido também com o sujeito 5. Numa tarde, ele dirigiu-se até a varanda da ala feminina e disse: Eu sempre vejo quando você passa e fica conversando aqui. Se quiser ver a minha coleção de medalhas ou jogar dominó, é bem vinda. Que trabalho é esse que ela está fazendo? (referindo-se aos protocolos de pesquisa que estavam sobre a mesa). Desta forma, ele integrou-se ao grupo, durante uma das coletas de fala com o sujeito 1.

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estudos futuros possam ser desenvolvidos a partir da vontade dos próprios idosos, moradores da ILPI. Muito ainda há para ser feito na estrutura das instituições. A prática participativa é ainda incipiente e, muitas vezes, o idoso ainda continua destituído de voz e de poder de ação, fato que dá espaço a uma ampla reflexão sobre a antropolítica e sua importância.

Em termos de intervenção psicoterapêutica, abre-se a possibilidade de uma prática mais humanizada, contextualizando-se a dinâmica real e possível da realidade do idoso, não a partir da expectativa que se tem dele, mas de acordo com o que é possível alcançar com ele, um dia de cada vez.

A vivência do dia a dia com o grupo de idosos foi-nos possibilitado, no estudo multidisciplinar em gerontologia, uma observação integrada por um processo de reflexão acerca da institucionalização, tendo por motivação o respeito humano, a qualidade e dignidade de vida, e sua condição e velhice, caminho este trilhado ao longo de contatos semanais, em diversos formatos de atuação.

Acreditava, e continuo a acreditar, que qualquer grupo de pessoas – prisioneiros, primitivos, pilotos ou pacientes - desenvolve uma vida própria que se torna significativa, razoável, e normal, desde que você se aproxime dela, e que uma boa forma de conhecer qualquer desses mundos é submeter-se à companhia de seus participantes, de acordo com as pequenas conjunturas a que estão sujeitos (GOFFMAN, 2001, p. 8). Portanto, ancorar-se em valores em relação à cultura e ao desenvolvimento do ser humano pode ser um vetor de outras construções mais humanizadas, acolhedoras e possíveis como convivência cotidiana, que se apresentam, por exemplo, na imagem da varanda, esse continente e conteúdo expresso na fala dos idosos.

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A dor, em sua multiplicidade de configurações, complexidade e subjetividade, tem como assoalho emocional a contínua fragilidade afetiva, fato que traz, convergentemente, a fala poliqueixosa como uma das características da perda.

O poder dar e receber, na reciprocidade constante do viver saudável e digno; o ter esperança de ainda poder ser feliz, sem esquecer-se de fazer feliz, de ser ainda um elo necessário na corrente do sorrir e do viver em paz consigo mesmo e com os demais; o ser ainda produtor, mas produtor de felicidade é o possível pretendido para uma categoria etária de homens não mais jovens, mas ainda não mortos, seres humanos vivos (LOUREIRO, 2000 a, p. 36).

Alguns fatores possibilitam a alteração do modelo de moradia do idoso, entre eles a mudança de ação do feminino, de um papel único, o de cuidadora, para uma alteração que coloca a mulher no mundo do trabalho, da produção, da competição por um lugar ao sol, em seu caminho rumo à busca de autonomia, de liberdade e de escolhas que abarcaram tópicos importantes como: participação social, participação acadêmica, participação no mercado de trabalho. Este fato altera, em muitos aspectos, a vida em família, gerando uma síndrome: a síndrome da insuficiência familiar, que cria um contexto no qual se pode incluir o asilamento de idosos.

A síndrome de insuficiência familiar configura-se como uma importante alteração funcional da atualidade e pode ser a cada dia melhor contextualizada e observada, como um fato consequente das alterações funcionais do pós-guerra.

"Com a progressiva diminuição do tamanho das famílias, gerando a síndrome do filho único, seus membros ficam impossibilitados de prestar assistência necessária a seus idosos, pois necessitam trabalhar, não podendo dar atenção em tempo integral que o caso exige" (PAPALÉO NETO, PONTE Jr, 1996).

O modelo monoparental, o tamanho diminuto de alguns grupos familiares que, além do idoso, possuem membros com doenças degenerativas, síndromes, deficiência mental, entre outras questões, precisa também ser considerado num contexto diferenciado e diferenciador.

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3.3. Sobre a velhice, o processo de envelhecimento e o velho

“O envelhecimento (processo), a velhice (fase da vida) e o velho ou idoso (resultado final), constituem um conjunto cujos componentes estão intimamente ligados” (PAPALÉO NETO, apud FREITAS et al, 2006, p. 9).

O entendimento acerca da contínua modificação para o ser que envelhece insere-se, segundo Prado e Dutra (2007), no aspecto contextual da gerontologia como estudo e pesquisa multidisciplinar, tendo como bases tanto a dimensão filosófica e histórica quanto a produção de pesquisa acadêmica, como campos científicos do saber e da manutenção do controle, validados social, histórica e culturalmente.

O aumento da perspectiva de vida do ser humano e a possibilidade de que o envelhecimento possa ocorrer dentro de um processo saudável abre o campo de pesquisas para que novas configurações e parâmetros sejam alterados, inclusive na aplicação e avaliação de testes psicológicos.

A presença da medicina, o estudo da patologia, dos sintomas e a perspectiva de cura atuam como um sistema de cunho geriátrico, ampliando a pesquisa sobre o processo de envelhecimento com a subjetividade e com a complexidade que as interfaces multi e interdisciplinar indicam, possibilitando, assim, que os avanços da ciência e da tecnologia também sejam utilizados com a finalidade de possibilitar um envelhecimento com dignidade e saúde.

Segundo Prado e Dutra (2007), a Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG) atua de maneira mais expressiva desde 1990, contribuindo para que a legitimação científica desta área adquira cada vez mais a importância para que a produção de pesquisa, formas de atuação profissional em todos os níveis e o cuidado necessário relacionado à pessoa idosa sejam cada vez melhor estruturados, dessa maneira possibilitando um pensar mais amplo e complexo sobre a gerontologia como uma área de atuação. No entanto, o fato de não dispor de um conceito definido, teoria e metodologia específica que normatizem o profissional gerontólogo, são fatores que dificultam a busca de soluções para os problemas, mesmo quando identificados.

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rejuvenescimento biológico, possibilitados parcialmente pelos avanços da ciência, as intervenções da mídia e a evolução das técnicas cirúrgicas, além de transplantes, implantes, clonagens ou ações sociais assistencialistas.

Segundo Freitas et al (2006), a construção de um discurso sobre a velhice é um marco definidor entre filosofia e ciência que possibilitou o surgimento da geriatria como especialidade médica no início do século XX. A geriatria como especialidade médica consta doa anais dos hospitais cariocas a partir da década de 1960. A década de 1980 é caracterizada pela constituição de uma política nacional do idoso, gerando assim a possibilidade da criação de serviços especializados para esse ciclo da vida, na década de 1990 até a atualidade, ampliando a participação do idoso no contexto sociopolítico, corporativo, familiar e individual. A atuação do Estado, embasada em estatutos e leis, trouxe, como arcabouço, as dificuldades conceituais, contextuais, epistemológicas, hierárquicas e técnicas, pelas quais a promoção à saúde do idoso e a atuação do campo gerontológico passa, desde o século XX, na tentativa de firmar-se como um campo científico validado, de atuação específica no que tange ao ser que envelhece.

A prevalência de indivíduos idosos em comparação demográfica com os indivíduos jovens aumenta significativamente em toda a população mundial. As pesquisas demonstram que, em 2050, cerca de 20% da população mundial será constituída por indivíduos idosos, segundo Garbi et al, (2005). No Brasil, a estimativa é de que nos tornemos o sexto país do mundo em população idosa a partir de 2025, segundo Monteiro (2004).

No decorrer do século XX, a ciência e a tecnologia desenvolveram, através de pesquisas e descobertas, a possibilidade de que as condições da vida dos seres humanos atingissem um nível qualitativo diferenciado. Tais condições possibilitam que o idoso desfrute o cotidiano com maiores indicadores de prevenção e de manutenção da saúde como, por exemplo, a vacinação contra a gripe, realizada anualmente no sistema público de saúde e amplamente divulgada na mídia.

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Um novo olhar sobre a gerontologia pode gerar recursos a serem utilizados pelas equipes interdisciplinares e multiprofissionais nas sugestões oferecidas ao idoso, cuidador e familiar, sobre a importância vital de práticas cotidianas, tais como: manter em dia o cartão de vacinas e praticar regularmente atividades físicas.

A atividade física regular é vista, atualmente, como um dos procedimentos mais eficazes para a promoção da qualidade de vida em qualquer população. Os critérios de qualidade de vida são subjetivos e individuais, é parte da avaliação, feita pelo indivíduo, tendo como base sua satisfação pessoal relacionada às atividades interativas, as quais ele pratica no convívio sócio- cultural, valendo como estratégias de enfrentamento dos desafios específicos dessa etapa da vida, possibilitadoras de novos aprendizados. (Neri 2007).

Segundo Freitas et al (2006), a atividade física em idosos pode ser utilizada no cotidiano, alterando adequadamente o funcionamento do sistema músculo esquelético, imunitário, cardiovascular, respiratório, gerando benefícios inclusive nos casos de doenças crônicas tais como diabetes mellitus, hipertensão, entre outras.

O contexto antropológico, que envolve religião, cultura, filosofia e ciência, contudo, não possibilitou, até os dias atuais, o controle sobre a degeneração e morte do corpo físico. Trata-se, porém, de um conteúdo que independente do contexto cronológico de séculos ou milênios, perpassando o imaginário e gerando a angústia do humano sobre sua própria finitude, bem como os mecanismos para elaborar essa angústia. “É a chegada do corpo, no grupo familiar, que marca mais uma vida e é a finitude desse corpo que marca, com a ausência, a morte e traz a significância do luto” (PIRES - DE - MELLO, 2004, p. 44). O ser humano é, portanto, um produto relacional de si mesmo e do construto social, tendo como interface a própria complexidade e a da cultura vigente.

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4. BASE METODOLÓGICA.

4. Base metodológica

Natureza da pesquisa: Pesquisa culturanalítica de cunho qualitativo. Com base em Paula Carvalho (1990), Loureiro (2004, p. 20), registra que “culturanálise é um campo de pesquisa, um “objeto” a ser investigado, mas também “um instrumento”- ferramenta para conhecer e mapear a cultura dos grupos formados ou em formação”.

4.1 População.

Foram coletados dados de 06 (seis) sujeitos idosos asilados, sendo 02 (dois) do gênero masculino e 04 (quatro) do gênero feminino, com idade entre 69 e 93 anos de idade; citados no sob os pseudônimos: Ladinha, Tatá, Cacá, Tonha, Lino e Pina.

Quanto à naturalidade, 03 (três) são do estado de Minas Gerais e 03 (três) são naturais da Bahia, Maranhão e Rio Grande do Sul.

Quanto ao estado civil, 03 (três) são solteiros, 02 (dois) são viúvos e 01 (um) é divorciado. 4.2 Procedimento e Instrumentos.

Foi utilizado, no levantamento dos dados míticos, o teste projetivo - Arquétipo Teste de 9 elementos – o AT-9, de Yves Durand. Os protocolos do AT-9 realizados com os idosos foram analisados à luz da teoria geral do imaginário, tal como a concebeu Gilbert Durand, com a identificação do regime de imagens ao qual a estrutura do imaginário de cada sujeito pertence.

A frequência de atuação com os idosos asilados do grupo de pesquisa foi semanal, realizada em diferentes dias da semana, inclusive feriados e em horários diversos, para uma observação mais ampla sobre o funcionamento geral da Instituição, no que se refere ao manejo e cuidado aos idosos.

Em abril de 2009, foi realizado um primeiro contato com a Instituição, para conhecimento do espaço físico e administrativo, bem como a primeira coleta de dados, incluindo entrevista psicológica e o protocolo do AT9.

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Em maio de 2009, a atuação em pesquisa foi realizada com uma segunda abordagem, no modelo de livre coleta de fala (escuta) com os sujeitos pertencentes ao grupo da pesquisa.

A entrevista foi realizada com o objetivo de coleta de aspectos emocionais relacionados à família, dados estes que foram ou não preservados na memória de cada um dos idosos pertencentes a esta pesquisa.

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5. BASES TEÓRICAS

5.1 - Antropologia do imaginário.

A antropologia do imaginário, de Gilbert Durand (1989), forma-se a partir de fundamentos sobre o ser humano em autores como Freud, Jung, Piaget, Bachelard, entre outros. O ser humano, em sua trajetória de evolução, é caracterizado como um ser sócio-cultural e grupal. Mais do que isso, trata-se de um ser bio-psico-social, dotado de espiritualidade, e cuja experiência de vida transcorre em integração de sua natureza com a cultura na qual está inserido. É sobre o “trajeto antropológico”, já explicitado anteriormente, na introdução deste trabalho, que incide a busca das imagens e a identificação das estruturas que as atraem e organizam. Tais imagens são geradas na. permuta entre as pulsões do sujeito e as exigências exteriores do meio ambiente social, sedimentando-se as mesmas nas produções da psique e da cultura, expressas nos sonhos, símbolos, mitos e em outras narrativas individuais e coletivas, tanto quando nas loucuras internas, íntimas e silenciosas que diferenciam os indivíduos (DURAND, 1989). “O imaginário é um sistema dinâmico organizador de imagens e de símbolos que tem por função colocar o homem em relação de significado com o mundo, com o outro e consigo mesmo, constituindo-se como o referente fundamental da evolução humana” (TEIXEIRA, 2004, p. 4).

Baseado em Durand (1996), tem-se que o mito é considerado como palavra ou narrativa universal que se adapta a cada cultura, anterior à escrita não necessariamente utilizando-a para fixar-se, o que significa a inclusão, nesse cenário, de analfabetos ou idosos com baixo letramento, os quais, portanto, encontram um lugar de valor no contexto desta pesquisa.

“O mito pode ser traduzido [...] nesta linguagem aonde o gestual do rito, do culto e da magia vêm substituir a gramática e o léxico. O mito é o discurso último onde se forma a tensão antagonista fundamental a todo o discurso, ou seja, todo o ‘desenvolvimento’ do sentido (DURAND, 1996, p. 83).

A produção de sentido que se dá através do processo terapêutico é citada por Bucher (1989) e encontra, em Durand (1988; 1989), o ponto de fusão entre o mito, o imaginário e o AT-9 como campo de mediações inclusivas de compreensão sobre o ser humano.

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Entre os comportamentos específicos normalizados em cada cultura encontram-se os que são determinados como aceitáveis ou não, possibilitando que os preconceitos sejam construídos de acordo com o gênero, faixa etária, religião e outros fatores que conferem ao ser humano um lugar de exclusão ou inclusão.

Para um melhor entendimento sobre o ser humano, podem-se utilizar também os conceitos durandianos sobre a teoria do imaginário, a qual que localiza as imagens produzidas pelo sujeito em contato com o ambiente em dois regimes: o Regime Diurno de Imagens (R.D.I) e Regime Noturno de Imagens (R.N.I).

5.1.1 Regime Diurno de Imagens.

Simbolicamente desdobrado em três categorias, esse regime contém e organiza: Símbolos Teriomorfos (de Animais) Nictomorfos (da Escuridão) e Catamorfos (da Queda).

Palavras com o simbolismo de Luz, tais como céu, dia, divino, dourado, duro, imenso, ouro, puro, referem, geralmente, ao Regime Diurno de Imagens.

Palavras com o simbolismo de sombra, tais como amor, lento, misterioso, pálido, pesado, profundo, segredo, sonho, só, triste, endereçam, normalmente, ao Regime Noturno das Imagens, pois não expressam luta e sim aconchego e paz.

As estruturas antropológicas do imaginário Durand (1989), constituídas com base na reflexologia betchreviana, diferenciam-se a partir de três dominantes reflexas (postural, digestiva e sexual), as quais, por sua vez, dão lugar a três estruturas organizadoras de imagens: a estrutura heróica ou esquizomorfa (pertencente ao R.D.I.) , mística ou antifrásica e dramática ou sintética ou disseminatória (ambas pertencentes ao R.N.I.).

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As armas cortantes arquetípicas são, ao mesmo tempo, símbolos culturais de combate contra os aspectos sombrios, tenebrosos, ameaçadores da noite. O combate do tempo e da morte dá-se, então, por meio de símbolos tais como o cetro e a espada, possibilitadores da manutenção da centralidade, da ordem, da pureza, da discriminação, da sublimação e da religiosidade celeste. Portanto, o simbólico da purificação, seja pela água, ar, espada ou fogo, remete à transcendência, à pureza e à claridade do herói, as quais envolvem a justiça divina, no contexto de uma ordem patriarcal.

O regime diurno de imagens é assim, o regime das imagens de luz, da dialética. A estrutura heróica não aceita a ordem pré–estabelecida pelo mundo como alteridade radical, que deve ser submetida e domada.

5.1.2 - Regime Noturno de Imagens

A queda como imagem representativa dos aspectos negativos do Regime Diurno da Imagens, ou seja, do fracasso do herói, diferencia-se da descida, pelo movimento lento, suave e gradual de penetração em direção a um centro, esta última representativa do Regime Noturno da Imagem. No interior do R.N.I. as imagens operam pela inversão e pela eufemização dos aspectos negativos da existência. A primeira estrutura gerada no interior desse regime é chamada mística ou antifrásica.

O amor e o ódio simbolizam o desejo de morte no fim das atribulações temporais, no qual o instinto de morte se revela como um regresso ao inorgânico ou ao indiferenciado e o sadismo se mostra na libido apoderada pelo desejo de morte e projetado no objeto do desejo intensificado na coloração macabra do prazer.

O amor pode continuando a amar, carregar-se de ódio ou de desejo de morte [...]. Seria a libido que se apoderaria dos instintos de morte e os projetaria no objeto do desejo dando assim uma coloração macabra ao próprio prazer. O instinto de morte residiria no desejo que cada vivente tem de regressar ao inorgânico ao indiferenciado (DURAND, 1989, p. 137).

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Como já foi dito anteriormente, no Regime Noturno da Imagem, Durand (1989) aloca as estruturas mística ou antifrásica e disseminatória, sintética ou dramática.

A estrutura mística ou antifrásica, baseada na dominante digestiva, conforme Betcherev (apud DURAND, 1989), remete ao contexto côncavo de aninhamento, ao acomodar-se em sossego e descanso, acionando “o ideário e a imaginaria do repouso, da intimidade, da união do ‘dentro’, do refúgio” (LOUREIRO, 2004, p.18).

Segundo Durand (1989), os fantasmas da interioridade e a fantasia do engolimento podem ser contextualizados no esquema do engolidor / engolido. O regresso ao útero materno, os movimentos involutivos (posição fetal), o simbolismo das cavernas e das grutas podem ser vistos como maturação da intimidade.

A condição humana frente à angústia da morte e diante da passagem do tempo encontra, nesta estrutura mística, a possibilidade de eufemização, por meio da qual se miniaturizaria ou se diminuiria o monstro, aliviando-se assim o horror e o medo terrificante do tempo e da morte. Assim, ao abismo e ao precipício que ameaçam o herói, como contextos geográficos e emocionais, correspondem a garganta e os movimentos involuntários da digestão mental e emocional, como contextos nos quais emergem imagens e sonhos de descida suave, de fusão com o outro e com o ambiente como formas de desaprender o medo abissal e a angústia de morte, segundo Durand (1989).

Quanto à estrutura sintética, disseminatória ou dramática, esta resulta da consideração durandiana da terceira dominante, ou seja, a copulativa, estudada em rãs adultas por Oufland. “Apesar da falta de informações, neste domínio no que diz ao animal humano, podemos reter, no entanto, das conclusões de Oufland o caráter cíclico e interiormente motivado da dominante copulativa” (DURAND, 1989, p. 35).

Essa estrutura traz, em si mesma, a regularidade do ritmo da cópula e dos ciclos, sejam eles orgânicos, como o ciclo menstrual, ou relacionados à natureza, como o ciclo das estações do ano, do movimento de rotação da terra na dualidade noite / dia.

A procura incessante de união de opostos polares e complementares encontra-se, nessa estrutura, em símbolos como a cruz e a árvore (verticalidade e horizontalidade).

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O símbolo do Tao reúne em sua imagem os elementos polares-complementares Yin e Yang, da filosofia e da medicina tradicional chinesa, os quais congregam tanto a totalidade quanto a diferenciação, em especial no que se refere ao conteúdo mínimo do “outro”,aspecto do “dual” no si mesmo uno, como representação da unidade perfeita. No contexto do Tao, YIN e Yang são representados como um círculo completo das repetições cíclicas e vitais, “o fogo Yang e a água Yin, que constituem a operação da têmpera a um verdadeiro casamento dos elementos” (DURAND, 1989, p. 228).

5.1.3 O Arquétipo Teste de 9 Elementos, o AT 9, como heurística do Imaginário.

O AT9 é um teste criado pelo psicólogo Yves Durand, na década de 1960. Vale-se de nove elementos, previamente escolhidos por seu caráter e profundidade simbólicos capazes de acessar, no ser humano, imagens da arquetipologia tal como sistematizada pelo mestre de Yves Durand, Gilbert Durand. Esses elementos são: Queda, Espada, Refúgio, Monstro Devorador, Algo Cíclico, Personagem, Água, Animal e Fogo (Durand, 1988). Na proposta do AT-9, “a leitura do universo mítico se dará no conjunto, gráfica e semanticamente registrado no protocolo do teste, destes nove elementos arquetípicos” (LOUREIRO, 2004, p. 25).

A estrutura na qual as imagens se organizam de forma dinâmica pode ser compreendida em seu sentido mais amplo, como arquétipo que representa, então, o núcleo dinâmico de singificado que atua como “um centro de força invisível” (DURAND, 1993, p. 56). 1O protocolo do teste AT9 é constituído, inicialmente, por um pequeno elenco de solicitações, dados básicos e pessoais, seguido de uma parte pictórica, na qual os elementos vão ser representados em imagens desenhadas pelo sujeito. Assim pretende-se, de forma relacionada, uma parte discursiva, a narrativa, a história escrita imaginada e já desenhada pelo sujeito, seguida de um quadro resumo, onde vão ser registrados as representações, as funções e os simbolismos atribuídos, pelo sujeito autor, a cada um dos nove elementos do teste. Finalizando as demandas, o teste apresenta um grupo de questões a serem respondidas, para auxiliar na análise do teste.

1 As informações acima constam na carta de Yves Durand endereçada à Paula Carvalho (apud LOUREIRO,

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Cabe aqui também uma reflexão sobre o caráter inclusivo e multidisciplinar do AT9, uma vez que sua aplicação é permitida aos profissionais de diversas áreas como educação, antropologia, sociologia, entre outras, o que confere a ele não somente uma posição diferenciada entre os testes cuja aplicação e interpretação são geralmente campo dos psicólogos, como também a possibilidade para que profissionais de áreas diversas possam adquirir a mesma linguagem de entendimento sobre o imaginário do ser humano ou do imaginário de grupos específicos, em seu funcionamento.

5.2. Psicologia do envelhecimento e familia: uma abordagem sistêmica aplicada a gerontologia.

As teorias sociológicas do envelhecimento contribuem para que a compreensão dos eventos sócio-culturais, econômicos e antropológicos que influenciam a velhice sejam elucidados, facilitando, desta forma, a construção de manejos mais eficazes no trato com a população idosa. Fenômenos como pobreza, exclusão, declínio físico e problemas familiares estão entre as principais preocupações que envolvem a população idosa, de acordo com Neri (2007).

“A família pode ser considerada uma instituição humana duplamente universal, uma vez que associa um fato de cultura, construído pela sociedade, a um fato de natureza, inscrito nas leis da reprodução biológica” (ROUDINESCO, 2003, p.16).

A mudança social e a dinâmica de organização sociopolítica, em permanente alteração de valores e de modos de vida desde o pós-guerra, descortinam um novo ambiente sócio-cultural que se esboça já nesta primeira década do século XXI. Segundo Roudinesco (2003), isso se reflete em toda uma necessidade de mudança estrutural, na mudança de um sistema sócio-familiar que não mais se amolda ou se mantém estático no monólogo patriarcal que permaneceu, como um sistema primordial de funcionamento, desde a Antigüidade até os séculos XIX e XX.

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O idoso, como referência cultural de sabedoria, foi aos poucos compartilhando de uma nova representação: o fenômeno da avosidade, ou seja, o da relação específica entre avôs, avós e seus netos e netas, fenômeno citado por Oliveira (2009).

A convivência entre avôs, avós, netos e netas configura-se, na atualidade, muitas vezes sob o signo da convivência afetiva, mas também da necessidade de manutenção econômica ou da guarda jurídica, entre outras causas advindas da mudança nos modelos de funcionamento familiar.

Uma pluralidade de modelos de funcionamento familiar apresenta-se ou se configura na atualidade, indicando assim uma necessidade de adaptação cultural para que sejam validados e, sobretudo “aceitos”. Entre ele estão os modelos monoparental, de recasamento, de familia extensa, as uniões homossexuais, os filhos concebidos por inseminação artificial, entre outros citados e descritos por ELKAÏM, 1998; MCGOLDRICK 2003; ROUDINESCO 2003; WALSH 2005; NICHOLS, SCHWARTZ 2007; CARTER , McGOLDRICK 2008.

O complexo sistema de relações interativas entre os membros de um grupo familiar e a cultura na qual este está inserido constrói-se, atualmente, de forma dinâmica, segundo os parâmetros adaptativos decorrentes das alterações do funcionamento social nos últimos sessenta anos. É necessário trazer a questão da importância da psicologia do envelhecimento, do diálogo, das estratégias eficazes, da mudança de paradigma dos rótulos intimidadores e excludentes, para a construção permanente de um aprendizado e interação humana sob outros olhares que contextualizem o ser humano e a família, não apenas o problema ou a patologia. Este é o horizonte que se descortina pouco a pouco, em oposição ao modelo cartesiano. (Grandesso, 2000). Contextualizando o descarrilhamento que as patologias e alterações de comportamento possibilitaram ao estudo diferenciado de pequenos grupos, encontramos o modelo para o surgimento da terapia familiar sistêmica. A adaptação a novas formas de convivência interrelacional remete a um contexto, no qual existe o conflito entre a ideologia e a cultura, gerando a necessidade de reformulações para que seja possível um coexistir inclusivo na sociedade atual (McGOLDRICK, 2003; NERI 2007; CARTER, McGOLDRICK 2008; MINUCHIN 2008).

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pesquisa conquistar a condição cotidiana concreta e objetiva de convivência em um grupo sócio- cultural heterogêneo, no qual as necessidades básicas relativas à alimentação, descanso e higiene são mantidas pelos funcionários da ILPI. Os espaços de convívio, tais como a varanda, a sala de televisão, o refeitório, funcionam como o campo disponível para que o cotidiano disponha de elementos organizadores de uma rotina institucional: horário para refeições, horário para descanso, horário para que os idosos se recolham em seus quartos para dormir, entre outros.

A psicologia do envelhecimento prioriza o idoso e a complexidade de seu comportamento, na forma específica de viver diante de uma nova perspectiva social e demográfica. O idoso, muitas vezes, é ainda discriminado, excluído, não aceito, não ouvido, tanto no grupo familiar quanto no grupo cultural.

As questões de gênero, viuvez, qualidade de vida fazem parte da temática que diferencia a abordagem terapêutica direcionada a essa população, pois que homens e mulheres enfrentam realidades diversas durante a velhice, também no que se refere ao adoecimento. A abordagem interdisciplinar que contextualiza a atuação no campo da gerontologia pontua a necessidade de atuação de equipes multidisciplinares, no que se refere ao cuidado e intervenção.

Estudos epidemiológicos e demográficos brasileiros apontam para um maior número de mulheres idosas residindo nos centros urbanos, indicando um fenômeno chamado de “feminização da velhice”. (NERI, 2007).

A configuração demográfica e a demanda relacionada ao estudo e cuidados com o idoso, independentemente da questão de gênero, permitem e solicitam novos estudos e pesquisas multidisciplinares, possibilitadores de maior atuação qualitativa da gerontologia.

Estudos epidemiológicos revelam que os tratamentos para as doenças infecciosas e cardíacas têm apresentado resultados positivos, enquanto o câncer, apesar da tentativa de uma abordagem imunológica, no último século, continua sendo uma das três causas principais de mortalidade nos países industrializados, conforme Janeway et al (2007).

Os cânceres de mama e de colo de útero estão entre os tipos mais comuns encontrados em idosas, tal como citado por Costa (2000). Em idosos, as desordens auto-imunes estão associadas às prostatites, segundo Neri (2007).

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cuidado dificulta que o idoso desfrute, de fato, dos direitos a ele devidos. Portanto, o estudo do comportamento específico relacionado ao processo de envelhecimento pode trazer elucidações, perspectivas e necessidades de adaptação, que visem um melhor entendimento sobre a condição específica dessa população, sendo tudo isso traduzido em questões tratadas à luz de leis como o Estatuto do Idoso, além de pesquisas de cunho acadêmico e científico.

Um marco pontual na necessidade de adaptações refere-se ao Estatuto do Idoso, que na forma de lei, sob o número 10.741, (Senado Federal, 2004), estabelece os direitos básicos à atenção, prestação de serviços, saúde, direcionados especificamente à população acima de 60 anos. O Estatuto do Idoso pode ser considerado, nesse sentido, como um vetor de construção de cidadania, uma vez que “a cidadania é um status concedido àqueles que são membros integrais de uma comunidade” (MARSHALL, 1988, p. 20).

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6 . TABULAÇÃO DOS DADOS CONTIDOS NOS PROTOCOLOS. Sujeitos Sexo Idade Nat. Est.civil Nº

filhos Letramento Estrutura mítica

1 F 80 RS solteira 0 não Micro universo

mítico com características de pseudo estrutura.

2 F 75 MA solteira 3 não Micro universo

mítico com características de não estrutura.

3 M 81 MG divorciado 2 Assina o

nome Micro estrutura mítica, imaginário

positivo.

4 F 93 MG viúva 3 Assina o

nome

Micro universo mítico com características de não estrutura.

5 M 75 MG solteiro Não

sabe ao certo

não Micro universo

mítico, estrutura sintética,

disseminatória.

6 F 69 BA viúva 1 Assina o

nome

Micro universo mítico com características de não estrutura.

6.1 Contexto possibilitador do campo de pesquisa e suas especificidades

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considerado também uma categoria, uma vez que a ausência da família foi considerada por eles, como a maior perda.

Nesta pesquisa, foram considerados os fatores de diferenciação, no momento da análise dos protocolos do grupo de idosos deste estudo. As condições abaixo citadas foram consideradas, para finalidade de análise no sentido de preservar o aspecto científico, foi confirmando a influência do contexto sócio-cultural – asilo, nível mental – analfabetismo, e idade 69 a 93 anos, motivo pelo qual o comando e instruções de cada etapa do trabalho foram verbalizados, por mim, para cada um dos idosos, de forma a facilitar-lhes o entendimento e compreensão sobre o que seria realizado, no protocolo do teste AT-9.

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6.1.1 Análise e resultado dos dados contidos no protocolo AT-9 do sujeito1. 1ª parte: Informações Preliminares

1 F, 80 anos, solteira, sem filhos, é natural de Caxias do Sul, não possui letramento, recebe visita da filha de seus patrões e de um amigo. Não relatou nada sobre quem recebe sua aposentadoria. Não gosta de morar na ILPI, mas relatou sentir-se bem convivendo com os funcionários.

2ª parte

A – Você tem 30 minutos para fazer um desenho com os seguintes elementos: Uma queda, uma espada, um refúgio, um monstro devorante, alguma coisa cíclica (que gira que progride), um personagem, água, um animal (pássaro, peixe, réptil ou mamífero), fogo.

Imagem

Tabela sujeito 1.  4 vida  ( + )                              4 morte ( - )
Tabela do sujeito 2.        4  Vida  ( + )                                          2 Morte
Tabela sujeito 3.         7 vida   ( + )                                     1 morte ( - )
Tabela sujeito 4.         5 vida ( + )                                      4 morte. ( - )
+2

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