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DESENVOLVIMENTO SOCIOMORAL, ÉTICA PROFISSIONAL E EDUCAÇÃO PARA A CIDADANIA

AO LONGO DO CICLO DE VIDA

Mar ia José D. Mar tins

Escola Superior de Educação de Portalegre

RESUMO

A educação para a cidadania ao longo do ciclo de vida constitui um a preocupação da sociedade contem porânea, estando m esm o consagrada nas recom endações do Conselho da Europa. O objectivo desta com unicação é dem onstrar que a operacionalização desta recom endação deverá privilegiar estratégias de prom oção do desenvolvim ento sociom oral, com parativam ente a estratégias de m era doutrinação ou de clarificação de valores. A utilização dessa abordagem deverá ser privilegiada em qualquer etapa do ciclo de vida, um a vez que se considera não existir um a ruptura conceptual entre as estratégias utilizadas com crianças e adolescentes e as estratégias utilizadas com adultos, deverão efectuar-se apenas algum as adaptações de conteúdo, relacionadas com as experiências pessoais e profissionais próprias da vida adulta. Assim , revêem -se algum as das principais teorias do desenvolvim ento sociom oral, integrando os contributos quer das teorias que enfatizam aspectos cognitivos, quer das teorias que salientam aspectos afectivos e em ocionais, com vista a delinear as estratégias pedagógicas m ais adequadas para se efectuar um a educação para a cidadania ao longo de todo o ciclo de vida. Apresentam -se alguns dados exploratórios relativos a dilem as m orais relatados por estudantes do 1º ano de Serviço Social, diferenciando-se os relatos dos estudantes com e sem experiência profissional. Os relatos dos estudantes com experiência profissional parecem indicar que a experiência profissional constitui um im portante contexto de resolução de conflitos e exercício de cidadania. As estratégias pedagógicas baseadas na prom oção do desenvolvim ento sociom oral são discutidas com o as m ais adequadas para a prom oção de um a cidadania dem ocrática e participativa.

Palavr as-chave:

Cidadania no ciclo de vida; prom oção do desenvolvim ento sociom oral.

ABSTRACT

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is to discuss that the concretisation of that recom m endation should privilege strategies of sociom oral prom otion com pared with strategies of m ere in doctrine or value clarification. The choice of that approach should be m ade in any phase of life span because there shouldn’t exist a rupture between children and adult education; just som e adjustm ent related with the different experiences lived by each one. We review som e of the principal sociom oral theories, both cognitive and affective ones in view to delineate strategies of citizenship education along life-span. We present som e exploratory qualitative data about m oral dilem m as referred by students attending the 1st

year in a course of Social Work, with and without professional experience. The narratives by the students with professional experience seem to indicate that professional experience is a rich context of conflict resolution and an exercise of citizenship. We discuss the prom otion of sociom oral developm ent as the best one for dem ocratic and participate citizenship.

Key wor ds:

Citizenship along life span; prom otion of sociom oral developm ent.

INTRODUÇÃO

A crescente com plexidade das sociedades hum anas; o increm ento das exigências de qualificação profissional; o aum ento da quantidade de inform ação disponível, associado à aparente dificuldade para o seu processam ento; e por últim o, m as não m enos im portante, a necessidade de dispositivos de form ação que contribuam para um a utilização responsável das tecnologias e para tom adas de decisão éticas no exercício das profissões, tornam a educação para a cidadania ao longo da vida um a necessidade e um a obrigatoriedade no século XXI.

Em particular, no que respeita à educação para a cidadania, o Conselho da Europa, na sua Declaração de Budapeste de 1999 ( citada por Monteiro, 2001, p.92) , afirm a que:

«( ...) a educação para a cidadania dem ocrática fundada nos direitos e responsabilidade dos cidadãos constitui um a experiência de aprendizagem ao longo da vida e um processo participativo desenvolvido em contextos variados: no seio da fam ília, das instituições educacionais, nos locais de trabalho, no quadro de organizações profissionais, políticas e não governam entais, nas colectividades locais, através das actividades recreativas e culturais e dos m eios de com unicação social, assim com o das actividades de protecção e de m elhoria do am biente natural e construído».

Nesta com unicação pretende-se explorar com o as teorias do desenvolvim ento m oral podem contribuir para a form ação de profissionais qualificados no âm bito de profissões ligadas ao serviço social. Mais especificam ente, pretende-se explorar o m odo com o o raciocínio sobre dilem as m orais vividos pelo próprio pode ajudar a reflectir sobre diferentes tipos de tom adas de decisão e sobre as consequências dessas tom adas de decisão, partindo-se do pressuposto que a responsabilização e consciência sobre as suas próprias escolhas se relacionam com o exercício da cidadania e a ética no exercício de profissões na área das ciências sociais e hum anas.

Desenvo lvim ento m o ra l, justiça , cuida do e ética : teoria s e da do s empírico s

O tem a do desenvolvim ento m oral tem sido abordado segundo diferentes perspectivas teóricas, das quais se destacam : a teoria da aprendizagem social, a perspectiva psicanalítica e a perspectiva cognitivo-desenvolvim entista ou construtivista ( ver Lourenço, 1992; 1995; Vicente Castro,1994) .

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enquanto que no âm bito da perspectiva psicanalítica destaca-se o contributo de Hoffm an ( 1991) que salienta o papel dos aspectos de natureza afectivo-em ocional na m oralidade. Alguns autores têm m esm o tentado um a conciliação entre estas duas últim as perspectivas ( Gibbs, 1991a; 1994; 1995b) .

Os estudos em píricos conduzidos por estes autores sugerem que a com preensão e os m otivos para respeitar as regras, assim com o as operações de justiça que o indivíduo é capaz de realizar, parecem aperfeiçoar-se com o desenvolvim ento. Considerando que o processo de desenvolvim ento abrange todo o ciclo de vida, vários outros autores têm constatado que este aspecto particular do desenvolvim ento parece sofrer várias alterações de natureza qualitativa na vida adulta, reflectindo-se no m odo com o os indivíduos exercem a cidadania, conceptualizam a ética profissional e ainda na form a com o tom am vários tipos de decisões na sua vida pessoal e profissional ( Cum m ings, Harlow, & Maddux, 2007; Gilligan, 1997; Martins, 2004; Walker, Pitts, Hennig & Matsuba 1995; Rest & Narváez, 1994) .

A m etodologia de Kolhberg ( 1976; 1984a; 1984b) para avaliar o juízo m oral consistia em apresentar aos sujeitos dilem as m orais, ou seja, situações hipotéticas nas quais eram descritas situações onde a obediência à autoridade e regras sociais entravam em conflito com as necessidades ou aspirações dos indivíduos. A form a com o os sujeitos resolviam esses dilem as e, sobretudo, a form a com o justificavam as suas opções por um determ inado curso de acção, conduziu Kolhberg à identificação de um a utilização consistente de um a certa form a de raciocínio em diferentes m om entos do desenvolvim ento, o que, por sua vez lhe perm itiu identificar seis estádios de desenvolvim ento do juízo m oral ( Kohlberg, 1984a) .

O exercício do juízo m oral m anifesta-se, assim , na form a de um processo cognitivo, que leva os sujeitos a reflectir nos seus valores e a colocá-los num a hierarquia lógica. Um juízo m oral é tanto m ais avançado ( ou justo) , quanto m ais se basear em princípios de universalidade ( a solução proposta para resolver um dilem a m oral pode ser adoptada em qualquer circunstância, por qualquer indivíduo) e reversibilidade ( a solução proposta para resolver determ inado conflito m oral não se altera se os indivíduos nele envolvidos trocarem de posição ou perspectiva) ( ver Colby & Kohlberg, 1987a) . O autor partiu do pressuposto que, um a vez que um a pessoa tenha desenvolvido um a determ inada estrutura de raciocínio, esta será por ela utilizada tanto na resolução de problem as da vida real, com o na resolução de dilem as hipotéticos ( ver Kolhberg, 1984b) . Cada estádio reflecte um a determ inada orientação m oral ( baseada nos m otivos que levam os sujeitos a optar por determ inados cursos de acção) e um a determ inada capacidade de coordenar perspectivas em confronto nos conflitos m orais.

Vários autores têm criticado ou m esm o com plem entado o m odelo proposto por Kohlberg. Por exem plo, Gilligan ( 1997/82) crítica o facto de Kohlberg partir do pressuposto de que apenas o sentido de justiça, entendido com o reconhecim ento dos direitos e deveres do próprio e dos outros, está subjacente ao juízo m oral. De facto, esse pode não ser o único aspecto com base no qual os indivíduos fazem juízos m orais ( Gilligan, 1997; Eisenberg, 1986) .

A autora propôs-se assim analisar os dilem as reais vividos pelas m ulheres, nom eadam ente o dilem a de fazer ou não um aborto, seguindo o m étodo da entrevista clínica. Nestas investigações, Gilligan ( 1997/82) deu oportunidades às m ulheres de falarem dos dilem as m orais que surgem naturalm ente nas suas vidas. Estes estudos levaram a autora à conclusão de que o que estava subjacente aos juízos m orais do sexo fem inino, não era apenas o sentido de justiça, m as o sentir-se responsável pelos outros e o sentir-se na obrigação de cuidar dos outros por contraposição a tom ar conta de si própria ( “responsability and caring”) . ( Gilligan,1997/82) .

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a questão das diferenças entre géneros tem sido um a questão controversa no dom ínio do desenvolvim ento m oral, porque m uitos outros autores não têm encontrado diferenças significativas entre sexos ( e.g., Kohlberg,1984b; Lourenço,1992; Gibbs, Basinger & Fuller 1992; Walker, 1995; Walker et al., 1995) .

De qualquer m odo, o contributo de Gilligan foi im portante para clarificar que subjacente ao desenvolvim ento sociom oral está presente não apenas um a ética de justiça, m as tam bém um a ética do cuidado, aspecto que viria a ser estudado sobretudo pelos autores que se têm dedicado a estudar a conduta pró-social ( e.g. Eisenberg, 1986; Martins, 1993; 1995b) . Consideram -se pró-sociais todos os actos positivos ( tais com o dar, partilhar, ajudar e confortar) que visam beneficiar alguém , envolvendo custos pessoais, m as nos quais o papel de norm as, proibições e obrigações não são salientes. Neste tipo de conflito ou dilem a o papel das com ponentes afectivo-em ocionais parece ser m ais saliente do que nos dilem as m orais de tipo kohlbergiano ( Eisenberg, 1986, 1989, 2000; Martins, 1995a) .

A abordagem com dilem as da vida real tem orientado várias investigações ( e.g. Diaz-Aguado e Medrano,1994; Walker et al. 1995) e tem revelado facetas do desenvolvim ento m oral m enos salientes na abordagem Kohlbergiana.

Assim , num a investigação em Espanha, com sujeitos com idades com preendidas entre os 9 e os 22 anos, Diaz-Aguado e Medrano ( 1994, p.42) utilizaram «os três dilem as hipotéticos da form a A de Kohlberg e Colby ( 1987b) e posteriorm ente solicitaram a cada sujeito que relatasse um dilem a real que ele próprio tivesse experim entado. Desta m aneira foi possível avançar na com preensão das relações entre a estrutura ( estádio de raciocínio) e o conteúdo ( os valores de cada dilem a) . O conteúdo representa o que o indivíduo julga num a situação real que, por sua vez, influi no estádio de raciocínio m oral utilizado».

O estudo de Diaz-Aguado e Medrano ( 1994) perm itiu-lhes estabelecer um paralelism o entre os estádios do desenvolvim ento m oral tal com o avaliados com dilem as hipotéticos, segundo a m etodologia proposta por Kohlberg, e as respostas e soluções propostas para resolver dilem as reais estruturados pelos próprios sujeitos, representativos dos conflitos e valores que eles estavam a viver no seu quotidiano.

Os resultados perm item concluir que há um isom orfism o entre os dois tipos de raciocínio ( activado por dilem as hipotéticos ou da vida real) e apontam não apenas no sentido da validação da teoria de Kohlberg, m as tam bém no sentido do seu aperfeiçoam ento e aprofundam ento. Assim , após um a análise às respostas aos dilem as de vida real, verifica-se que há algum as diferenças entre géneros, que rem etem sobretudo para o conteúdo das tem áticas. Verifica-se ainda que o grau de envolvim ento dos sujeitos nos dilem as reflecte-se, de algum m odo, na capacidade de em itir juízos m orais m ais ou m enos avançados, aspecto curioso que parece apontar para a actuação de processos de natureza predom inantem ente afectiva e não necessariam ente estrutural a influenciar o raciocínio m oral dos sujeitos.

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juízo m oral face a situações de conflito da vida real, relatadas pelos próprios sujeitos ( Walker et al., 1995, pp.403-404) .

Estudos recentes, de vários autores (Eisenberg, 2000; Tangney, Stuwewig & Mashek, 2007) são unânim es em considerar a em patia e a culpa com o im portantes m ediadores entre a cognição m oral ( raciocínio de acordo com elevados padrões m orais) e o com portam en to m oral e/ou pró-social. A culpa parece ser activada sobretudo em situação de transgressão m oral enquanto que a vergonha e o em baraço parecem ser as em oções que são activadas em situação de transgressão das convenções sociais ( Tangney, Stuwewig & Mashek, 2007) .

Desenvo lvim ento m o ra l, educa çã o pa ra a cida da nia e ética na s pro fissõ es

A m aioria das profissões qualificadas, quer na área das ciências sociais e hum anas, quer nas restantes ciências, im plica processos de tom ada de decisão que têm consequências na vida das pessoas im plicadas. Por exem plo, ensinar, avaliar e disciplinar crianças no caso de professores; avaliar, distribuir tarefas, espaços e recursos pelos subordinados, no caso de directores e gestores; inform ar, diagnosticar e cuidar de doentes no caso de m édicos; decidir com o apoiar e/ou denunciar fam ílias no caso dos técnicos de serviço social; publicar ou não im agens e notícias que revelam aspectos da vida privada dos outros, no caso dos jornalistas...

Muitas das decisões que os profissionais qualificados tom am envolvem escolhas entre valores em conflito, nas quais cada valor representa algo de intrinsecam ente positivo. A questão não é apenas fazer o que está bem , m as saber discernir o que pode ser m elhor e m ais justo para todos. Preparar profissionais qualificados para discernir e escolher os cursos de acção m ais eficazes, justos e responsáveis, não é tarefa sim ples, nem um processo de socialização rudim entar. A m oralidade nas profissões não se deve reduzir à procura do bem e do bom , m as antes enfatizar a capacidade para tom ar decisões m ais justas, m ais responsáveis, e m ais orientadas pelo cuidado pelos outros, em situações de conflito intrapessoal e interpessoal ( Rest & Narváez, 1994; Lourenço, 2005) .

Assim , pode m esm o acontecer que as duas fontes de m otivação m oral entrem em conflito, isto é, a ética da justiça e a ética do cuidado ( com os consequentes sentim entos de em patia) podem im pelir a com portam entos opostos em situações de conflito de justiça distributiva. Por exem plo, um indivíduo m erece m ais e um outro indivíduo, em bora m enos m erecedor, está em situação de m aior necessidade. Para obviar a este tipo de problem a, Frankena ( citado por Gibbs,1991a, p. 208) propôs m esm o que a «justiça deva ser tem perada pela beneficência quando um a decisão justa resulte num sofrim ento grave, tal com o a beneficência deve ser tem perada com a justiça quando o acto beneficente resulte em grande desigualdade m oral».

O estabelecim ento de códigos de ética nas profissões pode ajudar os adultos a tom ar decisões m orais m ais justas e adequadas. Contudo, devido à natureza prescritiva destes códigos, eles podem revelar-se insuficientes para a resolução de situações m ais com plexas e am bíguas. A educação para a cidadania deveria incluir conteúdos e m etodologias relativos ao dom ínio do desenvolvim ento m oral, bem com o aspectos relativos aos processos de tom ada de decisões em situações de conflito ou de dilem a m oral no exercício das profissões.

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espírito crítico, justos, responsáveis e capazes de tom adas de decisão conscientes, eficazes e éticas ( Martins, 1995a; Martins & Alexandre, 2006) .

O objectivo deste estudo era explorar em que m edida os alunos do prim eiro ano do curso de Serviço Social viveram ou não dilem as m orais no decurso do seu ciclo de vida; e, no caso de terem vivido dilem as m orais, que tipo de dilem as m orais relatavam ( relacionados com a vida pessoal ou com a vida profissional) . Pretendia-se ainda verificar se as em oções e os sentim entos experim entados nessas situações surgiam associados aos relatos e qual a dim ensão ética m ais enfatizada, a ética da justiça ou a ética do cuidado. A análise dos relatos contribuirá para o aperfeiçoam ento e delineam ento de dispositivos form ativos baseados nas estratégias de debate e resolução de problem as a partir dos conflitos m orais reais relatados pelos alunos.

METODOLOGIA

Pa rticipa ntes

40 alunos do 1º ano do curso de Serviço Social, dos quais 18 tinham experiência profissional. Destes 40 alunos 15 frequentavam um a turm a em regim e diurno, sem estudantes-trabalhadores e com idades situadas abaixo dos 23 anos. 25 alunos frequentavam um a turm a em regim e pós-laboral, na qual 18 alunos já tinham tido algum tipo experiência profissional e, na altura 17 eram estudantes-trabalhadores, com idades situadas acim a dos 23 anos.

Instrum ento

Os alunos deveriam redigir um a narrativa pessoal na form a de conflito ou dilem a m oral vivido no âm bito da sua vida pessoal ou profissional. Apenas no caso de não conseguirem identificar um dilem a m oral nas suas vidas deveriam escrever sobre dilem as pessoais não m orais.

Pro cedim ento

A redacção da narrativa pessoal estava incluída no âm bito da form ação dos alunos num a unidade curricular sobre Psicologia do Desenvolvim ento e Ciclo de Vida, era antecedida de um debate sobre o dilem a de Heinz ( um dos dilem as de Kohlberg m ais conhecidos) ; um a exposição teórica sobre o m odelo de Kohlberg; um trabalho de grupo com vista à atribuição de estádio m oral a diferentes respostas a dilem as m orais. Esta sequência de actividades form ativas culm inava com a solicitação aos alunos do relato escrito de um dilem a m oral real, que tivesse sido experim entado nas suas próprias vidas. Estes dilem as seriam ainda debatidos num a das aulas, apenas m ediante o consentim ento inform ado de cada aluno, de m odo que alguns alunos entregaram o seu dilem a m as não autorizaram a divulgação na turm a. Para os alunos que considerassem que nunca tinham vivido dilem as m orais encorajava-se o relato de um dilem a pessoal, não m oral.

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No quadro 1 apresentam -se os tipos de dilem as relatados pelos alunos em função da sua dim ensão m oral, ou não e, no caso dos dilem as m orais, em função da sua natureza profissional ou pessoal.

Quadr o 1: Tipo de dile m as r e latados pelos alunos com e se m e xpe r iê ncia pr ofissional

Tipo de dilem a relatado

Alunos com experiência

profissional

Alunos sem experiência profissional Dilem as m orais vividos no exercício das profissões 8 ( 44,4%) 0 ( 0%) Dilem as m orais vividos no âm bito da vida pessoal 4 ( 22,2%) 4 ( 18,2%)

Dilem as pessoais não m orais 5 ( 27,8%) 18 ( 81,8%)

Não conseguiu equacionar um dilem a, apenas um a experiência m arcante

1 ( 5,6%) 0 ( 0%)

Totais 18 ( 100%) 22 ( 100%)

A leitura do quadro 1 indica-nos que são os alunos com experiência profissional, e tam bém os m ais velhos, que relatam m ais dilem as m orais, optando m aioritariam ente por dilem as m orais vividos em contexto profissional. Os alunos sem experiência profissional, m ais novos em bora no ínicio da idade adulta, relatam sobretudo conflitos intra-pessoais não m orais. Apenas 4 alunos relataram dilem as m orais ou pró-sociais.

Descrevem -se em seguida alguns excertos dos dilem as profissionais relatados.

Um dos alunos trabalha num centro de dia que acolhe idosos das 9h às 18h, um dia, um idoso «o senhor J. expressa o seu m edo de ficar em casa sozinho e pede para ficar a dorm ir na instituição, num sofá, dado que a instituição tem um vigilante durante a noite ( ....) se aceder ao pedido e acolher o idoso não estou a cum prir o regulam ento interno da instituição. Não acolhendo, tem o que aconteça o pior».

Outro aluno, com o técnico de reinserção social, relata «( … ) sendo responsável pela liberdade condicional de um antigo am igo de infância, tom o conhecim ento de um novo crim e do indivíduo a 3 dias do final da liberdade condicional ( ...) não tom o conhecim ento por via oficial m as sim por via inform al. Dilem a: faço seguir de im ediato a inform ação para o tribunal, o que conduzirá à revogação da liberdade condicional do indivíduo, ou fico à espera da inform ação oficial?»

Um a outra aluna trabalhou, inicialm ente com o voluntária e depois com o profissional, num a certa instituição privada ligada à em ergência m édica e ao transporte de doentes, relata: «Um dia eu estava de serviço na central e um m endigo procurou-nos porque se sentia m al. Eu achei que havia necessidade de o encam inhar para o hospital e cham ei um colega para fazer o transporte com igo ( ...) o m eu colega não queria porque o m endigo não poderia pagar o transporte ( ...) , lem brei-lhe de determ inado príncipios e valores, afinal a vida daquele hom em valeria m enos de 35 Euros?».

Praticam ente todos os relatos relativos a dilem as profissionais enfatizam conflitos entre a ética da justiça ( cum prir o regulam ento, seguir determ inados príncipios) e a ética do cuidado ( não deixar alguém em necessidade) . Os sentim entos e em oções associados não apareceram relatados de form a clara, talvez por essa instrução não ter sido explicitada. Apenas um aluno escreveu «tem o que aconteça o pior».

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«Gostava de continuar a estudar, m as os m eus pais não tinham dinheiro, então teria o direito de os sacrificar ou deveria ir trabalhar para os ajudar ?» Um dilem a pró-social m ais do que um dilem a m oral.

«Um dia um a am iga conduziu sem carta e bateu no carro de um vizinho, depois não queria dizer que tinha sido ela, deveria eu denunciá-la ou não?»

«Um a am iga m inha estava grávida e era m uito nova, deveria aconselhá-la a fazer um aborto ou não?»

«Vi as m inhas irm ãs m ais novas num a discoteca, num a hora em que era suposto estarem em casa de um as am igas, devo contar aos m eus pais ou não?»

Os alunos que não relataram nem dilem as m orais, nem dilem as pró-sociais, relataram dilem as ou conflitos intrapessoais do tipo: «Não sabia se devia continuar a estudar ou se preferia ir trabalhar»; «Estava indecisa entre ir para o curso de Enferm agem ou de Serviço Social»; «Não sabia se era m elhor escolher um curso que m e perm itisse ficar perto de casa dos pais ou um curso m ais do m eu agrado m as que im plicava um afastam ento da fam ília».

O prim eiro relato, relativo a um dilem a profissional, foi debatido na turm a e os alunos sugeriram algum as soluções pouco realistas ( por exem plo: levar o idoso para a sua própria casa ) . No final o relator apresentou a solução e as m edidas que acabou por tomar ( levou o idoso a casa e no dia seguinte encam inhou o caso para um a consulta m édica) , revelando assim um a tentativa de conciliação entre a ética da justiça e a ética do cuidado.

CONCLUSÕES

Os alunos m ais jovens e sem experiência profissional têm dificuldade em relatar dilem as m orais no âm bito da seu ciclo de vida, provavelm ente porque ainda não os viveram . Cerca de 45% dos alunos com experiência profissional, com m ais de 23 anos, relatam dilem as vividos no âm bito da sua experiência profissional. Estes alunos relatam tam bém bastante m ais dilem as m orais ( quer da vida pessoal, quer profissional) do que os alunos m ais novos e sem experiência profissional. A dim ensão m oral associada ao

cuida do

surge na m aioria dos dilem as m orais relatados e, na m aioria das vezes, aparece em conflito com a ética da justiça. As em oções e sentim entos não são claram ente explicitados, talvez por não ter havido um a instrução clara que conduzisse os alunos a referi-los.

Deste m odo, os relatos sugerem que a pertinência da estratégia de prom oção do desenvolvim ento sociom oral, enquanto estratégia de educação para a cidadania, e de capacitação para tom adas de decisão responsáveis, poderá ser m ais eficaz na form ação contínua do que na form ação inicial. No entanto, o confronto de diferentes perspectivas, no que se refere aos dilem as profissionais reais vividos por alguns alunos afigura-se prom issora com o estratégia de educação para a cidadania, tanto m ais que m uitos desses dilem as conduziram a tom adas de decisão, por parte dos relatores.

A investigação aponta no sentido da possibilidade, desejabilidade e eficácia destas estratégias na prom oção do desenvolvim ento sociom oral de professores, e de outros profissionais qualificados, e ainda do consequente aum ento da sua responsabilidade e orientação ética na tom ada de decisões profissionais ( Oser & Althof, 1993) .

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Em conclusão a educação/form ação de adultos qualificados deverá incluir com ponentes ou aspectos que visem o exercício de práticas profissionais éticas e responsáveis, pois a ética no exercício das profissões é um a form a de expressão da cidadania dem ocrática e é tam bém um a form a de prevenção prim ária da violência.

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Referências

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