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Sumário. Texto Integral. Supremo Tribunal de Justiça Processo nº

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Supremo Tribunal de Justiça Processo nº 083947

Relator: FARIA DE SOUSA Sessão: 12 Janeiro 1994

Número: SJ199401120839472 Votação: UNANIMIDADE Meio Processual: REVISTA.

Decisão: NEGADA A REVISTA.

DESCONTO BANCÁRIO LETRA FALTA DE PAGAMENTO

Sumário

I - O desconto bancário é uma operação pela qual o portador de uma letra ainda não vencida é abonado do seu valor pelo banco, deduzidos os juros

compensatórios até ao vencimento e as comissões ou prémios a que haja lugar, aceitando o descontário transferir o título mediante endosso ao descontador, o qual, no vencimento, cobra a letra para si, reembolsando a quantia líquida paga ao primeiro e respectiva remuneração.

II - O extravio da letra endossada ao banco descontador é imputável a este, por não a ter expedido para o seu correspondente francês mediante registo com valor declarado mas antes por simples registo.

III - A falta de apresentação da letra ao aceitante em consequência do extravio exclui a responsabilidade subsidiária do descontário por falta de pagamento do título.

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

A Sociedade Comercial por quotas "Recer - Industrias de Revestimentos, Lda"

intentou na comarca da Anadia, contra o Banco Borges & Irmão, S.A. esta acção declarativa com processo ordinário, pedindo a condenação do

demandado:

1: a devolver à autora as quantias referidas no n. 54 da petição inicial:

2: ou, se assim se não entender, a indemnizar a demandante, pagando-lhe a quantia de 1133188 escudos e vinte centavos, acrescida duma compensação equivalente ao juro a contar sobre aquela quantia, à taxa de 24 por cento,

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desde 8 de Janeiro de 1987 até efectivo pagamento.

Para tanto alegou, que descontou no Banco Borges uma letra, no montante de 44300 francos franceses, do aceite de um seu cliente francês, referente ao fornecimento de materiais vendidos a esse cliente, crédito de que depois o Banco descontador se cobrou, compensando-o com depósito dela autora

existente numa conta de depósito à ordem nessa mesma instituição de crédito.

O réu contestou por impugnação os factos articulados na petição inicial e arguiu a prescrição da letra, que deu causa ao desconto bancário da quantia, cuja restituição se pede.

Foi proferido despacho saneador, que julgou improcedente a excepção deduzida, e, condensado o processo, seguiram os autos os seus ulteriores e regulares termos, tendo-se realizado a audiência de discussão e julgamento, em que foi publicado veredicto de resposta à factualidade integradora do questionário.

A sentença final julgou a acção procedente e condenou o

Banco demandado a pagar à autora, a titulo de indemnização, a quantia de 1133188 escudos e dez centavos, acrescida de uma compensação equivalente ao juro sobre aquela quantia, à taxa de 24 por cento, desde 8 de Janeiro de 1987 até efectivo pagamento.

O réu apelou, mas o Tribunal da Relação de Coimbra negou provimento ao recurso. Inconformado, pede revista.

Conclui nas suas alegações:

- O contrato de desconto bancário determina-se pelas regras do contrato de mútuo e da dação "pro solvendo".

- O comportamento do recorrente, atento os factos dados como provados, mormente, nas respostas aos quesitos 8 a

13, revela que foi usada a normal diligência e boa fé para evitar o extravio da letra descontada, na sua apresentação a pagamento.

- Tal diligência e boa fé excluem a responsabilidade do recorrente pelo extravio da letra e possibilitam-lhe, por isso, compensar o seu crédito,

proveniente do desconto, com o da descontária, esta prodiga, esta decorrente da conta de depósitos ordem desta.

- O acórdão recorrido violou, por erro de interpretação e de aplicação o disposto no artigo 847 do Código

Civil e nos artigos 12, n. 1, alínea h), n. 1 e 79, n.

1, do Regulamento do Serviço Público de Correios, aprovado pelo Decreto-Lei n. 176/88, de 18 de Maio.

"Ex adverso" pugna-se pela manutenção do acórdão recorrido.

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Corridos os vistos legais cumpre apreciar.

As instâncias fixaram a seguinte matéria de facto:

1. Em fins de Novembro de 1985, a recorrida exportou para Jim Pierras, Aoun - França, uma partida de produtos seus, pelo preço de 44800 francos

franceses;

2. As condições de pagamento foram as de entrega de mercadoria contra aceite de letra pagável a 90 dias da data da factura;

3. A recorrida enviou ao cliente a dita letra, que depois de aceite por ele foi devolvida;

4. A mesma vencia-se em 20 de Junho de 1986;

5. Em seguida a referida letra foi submetida a desconto na agência de Aguada de Cima do Banco recorrente;

6. Para esse efeito, a recorrida endossou a letra ao recorrente, através da assinatura ai posta no verso, pela sua gerência e procedeu à sua entrega naquela agência;

7. Contra a entrega da letra nas condições acabadas de referir, o recorrente adiantou à recorrida, através de crédito feito na sua conta de depósito à ordem na agência de Aguada de Cima, com o n. 46933501, valor

correspondente aos 44800 francos franceses e logo deduziu a quantia de 33444 escudos a titulo de juros e despesas.

8. Em consequência desta operação o recorrente apresentaria o titulo a

pagamento ao devedor - aceitante, e se este não pagasse então poderia exigir o pagamento ao seu cliente que foi beneficiado pelo desconto;

9. Passados mais de 45 dias da data do vencimento da letra, o recorrente comunicou à demandante que a letra não fora paga, sem fornecer mais qualquer explicação;

10. Como até meados de 1986 o recorrente nada mais dissesse à recorrida, esta escreveu-lhe em 19 de Junho de 1986 uma carta, em que lhe pedia que fosse informada do que se estava a passar com o não pagamento da letra;

11. O recorrente informou a recorrida pela carta junta em fotocópias a folhas 16, que a sede efectuou o acompanhamento normal de qualquer remessa e que a prova

é a resposta dada pelo seu correspondente;

12. Foi com esta carta que a recorrida ficou a saber que o correspondente do recorrente, já em Abril de

1986, teria comunicado a esta que não recebera a letra de 44000 francos franceses para apresentar a pagamento ao Jim Pierras;

13. A recorrida tentou receber o seu crédito directamente do devedor, Jim

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Pierras, e para facilitar a solução, chegou mesmo a aceitar receber a quantia em causa em quatro prestações;

14. Entretanto o recorrente tomou a iniciativa de creditar à demandante uma quantia de 3401 escudos, que alega ter recebido dos C.T.T. a titulo de extravio, digo, a titulo de indemnização pelo extravio da letra em causa;

15. A mesmo tempo debitou à recorrida a quantia de

175699 escudos e trinta centavos, a titulo de actualização de juros vencidos após a data do vencimento da letra;

16. A autora devolveu ao recorrente as notas de crédito e débito referidas, pedindo o estorno das respectivas quantias;

17. Em 8 de Janeiro de 1987, a recorrente enviou à recorrida uma nota de crédito no montante de 957488 escudos, que correspondia ao valor do capital representado pela letra em causa, despesas e juros daquele capital, até à data do débito;

18. A recorrida reagiu, devolvendo a nota de débito e exigindo estorno daquelas quantias;

19. Em 13 de Janeiro de 1988, a recorrida sacou sobre a sua conta à ordem, em Aguada de Cima, no banco recorrente, o cheque n. 7166116457, na quantia de

500000 escudos, a favor da sociedade Metalcertima;

20. O recorrente negou-se a pagar o cheque, declarando no respectivo verso e, em 20 de Janeiro de 1988, que não pagava "por falta de provisão na conta do emissor"

21. Aquelas quantias foram retiradas a título de auto pagamento do

empréstimo feito pelo recorrente à recorrida através do desconto da letra em causa, incluindo o capital, despesas e juros vencidos, após a data do

vencimento do referido titulo de crédito até à data da apropriação;

22. Como o recorrente não se mostrasse interessado em esclarecer a situação, a recorrida escreveu-lhe em 5 de

Setembro de 1986 uma carta em que lhe fez notar que o não pagamento da letra só ao Banco deve ser imputado;

23. O cliente da recorrida negou-se a efectuar o pagamento da letra por ele aceite, sem que ela lhe fosse entregue.

24. A recorrida reclamou contra a declaração de a sua conta não permitir o pagamento do cheque, em que se escreveu "por falta de pagamento, digo, "por falta de provisão na conta do emissor", porquanto nela havia um saldo de

1493344 escudos e noventa centavos;

25. Em 26 de Dezembro de 1985, a recorrida enviou ao recorrente uma letra de câmbio, cuja importância nela inscrita era de 44800 francos franceses;

26. A recorrida sabia que a partir de 8 de Janeiro de

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1987 não podia contar na sua conta com a importância de 957488 escudos, correspondendo 932870 escudos e quarenta centavos, o capital, 696 escudos a despesas de 3 swiftes e 23922 escudos, a juros devidos desde

30 de Novembro de 1986 a 8 de Janeiro de 1987, data da compensação;

27. Desde o momento em que a recebeu até ao momento em que a foi expedir para o seu correspondente francês, o

Banco Societé Generale, sempre o recorrente actuou de acordo com a usual e costumada prática bancária e dentro da normal diligencia exigível para estas situações;

28. Foi registar sob o n 2172, nos correios portugueses, a carta que expediu para França e continha a letra;

29. A letra não foi perdida nas instalações e serviços do recorrente, como atesta a reclamação que o próprio fez junto dos correios;

30. Por swift, em 18 de Março de 1986 e 18 de Abril de 1986, pediu a identificação do identificado titulo cambiário, a Banco Societé Generale;

31. Transmitiu à demandante, em Abril de 1986, que a carta registada contendo a letra aceite por Jim

Pierras, se tinha extraviado e não tinha chegado ao seu destino, conforme lhe fora dito pelo Banco francês;

32. O recorrente sugeriu à recorrida que emitisse uma segunda via da dita letra, conforme carta que lhe dirigiu.

O Código Comercial não contem qualquer definição do contrato de desconto bancário.

Convém, no entanto, fazer uma perfunctória análise do seu conceito jurídico.

Dir-se-á apenas, e circunscrevendo-o ao desconto de letras de câmbio, que há muito foram afastadas as teorias que o configuravam como uma compra e venda

(v.g. Ferreira Borges, in "Dicionário Jurídico -

Comercial", página 113 e Adriano Antero, in "Código

Comercial Português", vol.II, página 327) e que, alias, tiveram consagração legislativa na Carta Régio de 1802 e no Código Comercial de 1833, ou como uma compra do crédito a termo com o pagamento do preço a pronto (v.g. wahl, in "Précis Theorique et Pratique de Droit

Comercial", página 632 e Hammel in "Banques et

Operations de Banques", tomo III, página 746) ou ainda como um empréstimo retribuído (v.g. Palma Carlos, in

"Caractares do Desconto - Operações de Banco - Alegações em Recurso de Revista").

Nem se pode sustentar hoje que seja uma cessão de créditos - designadamente

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uma cessão com escopo de mútuo passivo - ou uma conjunção de mútuo com delegação imperfeita, doutrinas que tiveram voga mas que não resistiram ao crisol da critica hodierna.

Mas também se não pode reconduzir, como entre outros o faz Cunha Gonçalves (in "Comentário ao Código Comercial

Português", vol. I, página 330) ao contrato cambiário de endosso.

Dir-se-à porquê.

Na sua realidade económica o desconto resume-se na operação pelo qual o portador de uma letra ainda não vencida é abonado pelo banco da respectiva importância, diminuída dos juros compensatórios até ao vencimento e das comissões ou prémios a que houver lugar, aceitando o descontário transferir o titulo mediante endosso - preenchido ou em branco - ao descontador.

Este, no vencimento, cobra a letra para si, embolsando-se da quantia liquida paga ao descontário e da sua remuneração.

Não sofre dúvidas que é um contrato autónomo que se não resolve numa pura acção cambiária.

Na verdade, o endosso efectiva-se para operar a tradição do crédito mediante a cobrança do qual o descontador se embolsará da importância adiantada ao descontário, que fez essa dação por se ter vinculado pelo contrato a fazê-lo, em consequência de cumprir satisfazer a quantia recebida do descontador.

O endosso constitui tão só um acto que integra um dos aspectos do contrato.

Em súmula: o desconto é operado sobre letras endossadas ao banco pelo seu sacador ou portador, que aquele cobra para si no vencimento, reembolsando- se das importâncias que antecipou.

Por isso se propende, com Fernando Olavo (in "Desconto

Bancário", página 238 e seguintes) e na senda da jurisprudência dominante, em qualificá-lo como um contrato misto - um mútuo retribuído e uma "datio pro solvendi".

Como contrato misto, os respectivos elementos do negócio jurídico perdem a sua individualidade no esquema negocial unitário, impossível se tornando aplicar isoladamente as regras próprias do contrato de mútuo, como pretende o recorrente nas suas alegações, confundindo notoriamente o desconto com o regime do contrato de mútuo bancário caucionado por letra.

O descontário permanece responsável, mas só subsidiariamente, pelo pagamento da letra.

Mas para que possa exigir-se o pagamento ao descontário, necessário se torna que a letra seja previamente apresentada a pagamento ao aceitante, o devedor principal.

"In casu" a letra de 44800 francos franceses não foi apresentada a pagamento

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ao aceitante Jim Pierras.

Extraviou-se...

A culpa pelo extravio cabe por inteiro ao recorrente, por não ter assegurado a remessa da letra ao seu correspondente francês, o banco Societé Generale pelo meio idoneo imposto pela, expedindo-a como valor declarado (artigos 130, n 6 e 155 do Regulamento para os Serviços dos Correios, aprovado pelo Decreto de 14 de Junho de 1902 e artigo 39, n. 2, alínea a) do Decreto 5787).

Limitou-se a fazê-lo por simples registo.

Se tivesse remetido a letra como valor declarado, o

Estado seria responsável pela indemnização "correspondente ao valor real da perda" (artigo 79 do Decreto n. 5787).

Nunca a recorrida.

É, pois o recorrente que deve suportar as consequências do extravio.

Como preceitua o artigo 11 da Lei Uniforme, o endosso produz o efeito de transmitir a propriedade da letra.

O endosso é, efectivamente, o meio de transmissão, ao mesmo tempo da propriedade do titulo e da titularidade do direito.

Transferida a propriedade da letra, é aplicável o regime estabelecido pelos artigos 687 e 879 do Código Civil.

Em consequência, o risco da perda da letra recaiu sobre o Banco recorrente - artigo 796, n. 1, do mesmo compendio substantivo.

Res suo domino perit...

Alias o recorrente nem sequer tentou remediar as consequências do extravio da letra procedendo à reforma do titulo previsto no artigo 484 do Código Comercial e

1069 a 1072 do Código de Processo Civil, como seria curial.

Apressou-se a debitar na conta de depósito à ordem da recorrida o montante do capital representado pela letra extraviada, despesas e juros!

Virá ao caso recordar que o artigo 264 do Código de Processo Civil impõe às partes um dever de probidade.

Ao deduzir oposição à pretensão da autora, o Banco demandado pecou, pelo menos, por leviandade e imprudência, merecendo um juízo muito severo.

Termos em que deliberam negar a revista e confirmar a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente com o máximo de procuradoria.

LISBOA, 12 DE JANEIRO DE 1994

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Faria de Sousa, Ferreira da Silva, Sousa Macedo.

Decisões impugnadas:

Sentença de 91.05.24 de Anadia;

AC. de 92.04.21 da Relação de Coimbra.

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