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IDENTIFICAÇÃO PODER-DEVER JUIZ ÓNUS DA PROVA

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Tribunal da Relação do Porto Processo nº 10421/15.9T8VNG.P1 Relator: MADEIRA PINTO

Sessão: 09 Maio 2019

Número: RP2019050910421/15.9T8VNG.P1 Votação: UNANIMIDADE

Meio Processual: APELAÇÃO Decisão: ANULADA

DECLARAÇÃO DE MORTE PRESUMIDA APRESENTAÇÃO IDENTIFICAÇÃO PODER-DEVER JUIZ ÓNUS DA PROVA

Sumário

Deve o tribunal realizar todas as diligências de prova possíveis e úteis para apurar a verdadeira identidade do requerente e, na falência da prova global, decidir contra aquele que se apresenta como sendo o ausente cuja morte presumida foi declarada por sentença transitada em julgado.

Texto Integral

Procº nº 10.421/15.9T8VNG.P1 Relator: Madeira Pinto

Adjuntos: Carlos Portela Joaquim Correia Gomes

*

Sumário:

...

...

...

*

I - RELATÓRIO:

B…, C… e D… vieram interpor processo especial de declaração de morte presumida de seu marido e pai, E….

Procedeu-se às legais citações e publicações, não tendo sido deduzida qualquer contestação.

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Produzida a prova, em 15-09-1999, veio a ser proferida sentença, transitada em julgado, que declarou a morte presumida de E….

Em 01-12-2015, pessoa que se apresentou como E…, veio aos autos pedir que fosse dada sem efeito a declaração de morte presumida.

Juntou cópias de “cedula de identidad” e passaporte emitidos pela República Bolivariana da Venezuela.

Devidamente notificadas, B…, C… e D…, negaram a identidade do requerente, reputando de falsos os documentos por este juntos.

Em 20-01-2016 o requerente apresentou requerimento alegando factualidade diversa com vista a provar a sua identidade e veio a juntar documentos e requerer meios de prova.

Em 09-02-2016 as requeridas B… e filhas, apresentaram requerimento em que impugnaram motivadamente os factos e os documentos apresentados pelo requerente, negando que seja o seu marido e pai, respectivamente.

Foi proferido despacho, em 05-02-2016, que ordenou a tomada de declarações ao requerente, antes da sua partida para a Venezuela e a realização de perícia ao ADN destinada a determinar o parentesco entre o requerente e as

pretensas filhas, como produção antecipada de prova nos termos dos artºs 419º e 420º NCPC. Notificado esse despacho às partes não foi objecto de recurso.

Conforme informação do Instituto de Medicina Legal, Delegação do Norte, de 03.05.2017, as pretensas filhas do requerente não compareceram em duas datas previamente agendadas.

No requerimento das requeridas de 18.01.2017, estas expressamente

declaram no seu artigo 12º que não estão disponíveis a realizar a recolha de material genético na presença do requerente.

Em complemento do despacho de 05-02-2016, a senhora juíza proferiu

despacho em 03.07.2017, determinando que o IML providencie pela recolha de material genético em dias e horas separadas para requerente e requeridas, tendo solicitado designação de nova data para a diligência e ordenado a

notificação dos mandatários e das partes, sendo as requeridas por carta, por carta com prova de depósito e por funcionário judicial e, devendo estas serem advertidas que a nova falta levará à aplicação das consequências legais.

Também este despacho foi notificado às partes e dele não foi interposto recurso.

Foi designada data para as colheitas de amostras biológicas às requeridas filhas, em 18.09.2017, pelas 9h00, tendo estas sido notificadas por cartas com prova de depósito e faltaram (cfr fls 268, 270, 271 e 279).

Por requerimento de 19.09.2017, as aludidas requeridas vieram justificar as faltas por doença.

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O IML informou nos autos, em 25.9.2017 que foi realizada colheita de

amostras biológicas ao requerente em 14.09.2017, que ficaram em arquivo.

Foi designada nova data para as colheitas de amostras biológicas às

requeridas filhas, em 09.11.2017, pelas 9h00, tendo estas sido notificadas por cartas com prova de depósito e faltaram (cfr fls 287, 288 e 298).

Por requerimento de 23.11.2017, as aludidas requeridas vieram justificar as faltas por terem realizado uma viagem de cariz profissional a Madrid.

Em 19.01.2018 a senhora juíza proferiu despacho, julgando injustificada a falta daquelas requeridas a esta última data da perícia ordenada e tendo-as condenado em multa de 2,5 UCs a cada uma, tendo, ainda, determinando que o IML designe nova data para a diligência e ordenado a notificação dos

mandatários e das partes, sendo as requeridas por carta, por carta com prova de depósito e por funcionário judicial e, advertindo estas requeridas que, a nova falta se entenderá que estão propositadamente a inviabilizar a realização da perícia, com a consequente inversão do ónus da prova, nos termos do artº 344º, nº2, CC. Também este despacho foi notificado às partes e dele não foi interposto recurso.

Foi designada nova data para as colheitas de amostras biológicas às

requeridas filhas, em 05.03.2018, pelas 9h00, tendo estas sido notificadas por cartas com prova de depósito e faltaram (cfr fls 317, 326, 327 e 329), sem justificação alguma.

Teve lugar a instrução dos autos, com a audição do requerente em declarações de parte, em acta de 16.02.2016 e junção de cópias do documento de

identidade e passaporte cujos originais foram exibidas à senhora juíza.

Face à informação de fls. 221, frustrou-se a prova por meio de comparação entre as impressões digitais do requerente e as que constavam de pedidos de documento de identificação apresentados junto do registo civil.

Consta de fls 331 informação do Ministério dos Negócios Estrangeiros, de 14.05.21018, de que o cidadão português E…, nascido em 29.08.1967, natural da freguesia de …, Vila Nova de Gaia, portador do BI nº …….., filho de F… e de G…, se encontra inscrito no Consulado Geral de Portugal em Caracas, desde 22.12.1973, com a morada …, …, …. Catia, Venezuela e que o último pedido efectuado por ele junto do Posto Consular tem a data de 05.04.2006.

Procedeu-se a inquirição de testemunhas, conforme acta de 21.09.2018 e foi proferida a sentença recorrida, em 11.10.2018, que declarou que E… se encontra vivo, com a consequente cessação dos efeitos atinentes à sua declaração de morte presumida e determinou que lhe seja restituído o seu património, no estado em que se encontrar, com o preço dos bens alienados ou com os bens directamente sub-rogados e bem assim com o preço dos

alienados, quando no título de aquisição se declare expressamente a

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proveniência do dinheiro.

Desta sentença interpuseram recurso as autoras/requeridas, admitido e processado como apelação e apresentaram as seguintes conclusões:

……….

……….

……….

Não foram apresentadas contra alegações.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

*

II - DO RECURSO:

O recurso é balizado pelas conclusões das alegações, estando vedado ao tribunal apreciar e conhecer de matérias que naquelas não se encontrem incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso, acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido e no recurso não se

apreciam razões ou argumentos, antes questões- artºs 627º, nº1, 635º e 639º, nºs 1 e 2, CPC, na redacção da Lei nº 41/2013, de 26.06.2013, aplicável ao presente processo face ao disposto no artº 8º desta Lei.

II.1 - Âmbito do recurso:

Conforme se expôs no relatório supra, foi proferido despacho, em 05-02-2016, que ordenou a tomada de declarações ao requerente, antes da sua partida para a Venezuela e a realização de perícia ao ADN destinada a determinar o parentesco entre o requerente e as pretensas filhas, como produção

antecipada de prova nos termos dos artºs 419º e 420º NCPC. Notificado esse despacho às partes não foi objecto de recurso.

Em complemento do despacho de 05-02-2016, a senhora juíza proferiu

despacho em 03.07.2017, determinando que o IML providencie pela recolha de material genético em dias e horas separadas para requerente e requeridas, tendo solicitado designação de nova data para a diligência e ordenado a

notificação dos mandatários e das partes, sendo as requeridas por carta, por carta com prova de depósito e por funcionário judicial e, devendo estas serem advertidas que a nova falta levará à aplicação das consequências legais.

Também este despacho foi notificado às partes e dele não foi interposto recurso.

Em 19.01.2018 a senhora juíza proferiu despacho, julgando injustificada a falta das requeridas filhas do ausente E…, à última data da perícia ordenada e tendo-as condenado em multa de 2,5 UCs a cada uma, tendo, ainda,

determinando que o IML designe nova data para a diligência e ordenado a notificação dos mandatários e das partes, sendo as requeridas por carta, por carta com prova de depósito e por funcionário judicial e, advertindo estas

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requeridas que, a nova falta se entenderá que estão propositadamente a inviabilizar a realização da perícia, com a consequente inversão do ónus da prova, nos termos do artº 344º, nº2, CC.

Também este despacho foi notificado às partes e dele não foi interposto recurso.

Ora, tratando-se aquela diligência de meio de prova, pretendendo as

requeridas impugnar os despachos de 05-02-2016 e de 03.07.2017, deveriam tê-lo feito logo após as suas notificações por recurso de apelação autónomo, no prazo de quinze dias, de acordo com o disposto nos artºs 627º, nºs 1 e 2, 629º, nº1, 631º, nº1, 637º, nºs 1 e 2, 638º, nº1 e 644º, nº2, al. d), NCPC.

Não o tendo feito, as aludidas decisões transitaram em julgado- artº 628, NCPC - não podendo ser objecto do presente recurso.

Quanto ao despacho de 19.01.2018, deveria ser objecto de recurso no recurso da decisão final, nos termos do artº 644º, nº3, NCPC, devendo as apelantes expressamente indicar essa impugnação nas alegações e conclusões de recurso, de acordo com o disposto nos artºs 627º, nº1, 637º, nº2 e 639º, nº1, NCPC.

Ora, expressamente resulta das alegações e conclusões do recurso interposto pelas apelantes em 27.11.2018 e que foi admitido, que recorrem apenas da decisão final proferida em 11-10.2018.

Assim, a aludida decisão transitou em julgado- artº 628, NCPC- não podendo ser objecto de apreciação por este tribunal ad quem.

Pelo exposto, não se conhece das conclusões de recurso relativamente à matéria decidida naqueles despachos.

*

II.2 - Impugnação da matéria de facto:

Na sentença foram considerados provados os seguintes factos:

1. E… nasceu em 09-02-1055, em …, Vila Nova de Gaia, sendo filho de H… e de I….

2. Por sentença de 15-091999, transitada em julgado, constante de fls. 46 e ss e que aqui se dá por reproduzida, foi declarada a sua morte presumida.

3. E…, aqui requerente, soube entretanto que a mulher tinha obtido em tribunal a sua morte presumida.

4. Decidiu por isso vir a Portugal para se inteirar pessoalmente da situação 5.No processo de inventário que corre por apenso faram partilhados entre a sua mulher B… e as suas filhas, C… e D…, os seguintes bens:

a. prédio urbano, formado por casa térrea, sito no Lugar …, Freguesia de …, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o n.º 16.596;

b. metade indivisa de um prédio rústico, sito no Lugar …, freguesia …, Vila

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Nova de Gaia, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o n.º 25.473;

c. uma sepultura, sita no cemitério paroquial de …, com alvará de registo n.

71, do ano de 1974.

6. Conforme conferência de interessados, mapa de partilha e sentença de fls.

67, 70 e ss e 80 desses autos, que aqui se dão por reproduzidas, ficaram tais bens adjudicados a B…, tendo as demais interessadas declarado que as tornas estavam pagas.

*

Nas conclusões a GG) a VV) entendem as recorrentes que ocorreu erro na apreciação da prova pelo tribunal a quo quanto aos pontos nºs 3 e 4 da matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, que não tem suporte nos depoimentos das testemunhas que se apresentaram em juízo, muito menos, pelas próprias declarações prestadas pelo requerente/recorrido, impondo-se, que tais pontos deixem de constar como provados e sejam dados como “não provados”.

Vejamos a motivação de facto da sentença recorrida:

“O ponto 1 foi dado como provados com base no documento de fls. 8. O ponto 2 resulta de fls. 46 e ss destes autos.

Foi dado como provado em 3 e 4 que o requerente da justificação da sua identidade era, de facto, F…, presumidamente julgado morto.

Antes do mais teve-se em conta que as requeridas, ao inviabilizarem a recolha de ADN, igualmente inviabilizaram meio de prova que com toda a

probabilidade permitiria confirmar a identidade do requerente.

É certo que não está em causa (como correctamente estas alegam) acção de filiação.

Mas a verdade é que D… era marido e pai das requeridas (tais relações familiares foram por estas assumidas para sustentarem a sua legitimidade para proporem a acção de morte presumida e para se apresentarem como herdeiras no processo apenso).

Assim, se com aquele exame se provasse que a pessoa que se apresentou em juízo como D… era o pai de C… e de D… (sendo certo que tais exames

actualmente possibilitam obter esses resultados com um grau elevadíssimo de probabilidade), ficaria mais do que suficientemente provada a identidade do requerente.

Assim, ao não comparecerem sucessivamente no INML para recolha do

necessário material biológico (apesar de notificadas para o efeito – sendo para tal exaustivas as diligências do tribunal – muito para além do que seria

imposto pelos arts. 247º/1 e 249º/2, do Código de Processo Civil), culposamente tornaram impossível a produção da pretendida prova.

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Advertidas de que a manterem tal comportamento tal implicaria a inversão do ónus da prova, ao abrigo do preceituado no art. 344º/2, do CCivil, as

requeridas voltaram a faltar à data pelo INML indicada para recolha de material biológico.

Assim, invertendo-se o ónus da prova, teriam que ser estas a provar que o justificante não era E….

Ora nenhuma prova fizeram nesse sentido.

Aliás a única prova a este respeito feita nos autos, consistiu na inquirição das testemunhas arroladas pelo justificante, conhecidos, familiares e amigos dos tempos de juventude de E… que, com maior ou menor objectividade e/ou fundamentação, asseguraram de forma firme e convicta reconhecerem no justificante como o seu conhecido/familiar/amigo.

Sendo que o mais que consta de tal factualidade resulta da justificação aqui deduzida. Os ponto 5 e 6 resultam do inventário apenso”.

Importa apreciar.

Face ao Novo Código de Processo Civil, é na sentença que o juiz declara quais os factos que julga provados e os que julga não provados[1].

A selecção da matéria de facto só pode integrar acontecimentos ou factos concretos, que não conceitos, proposições normativas ou juízos jurídico-

conclusivos. Caso contrário, as asserções que revistam tal natureza devem ser excluídas do acervo factual relevante- artº 607º, nº 4, NPCP.

Quanto aos factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, o juiz está sujeito a essa prova vinculada- artº 607º, nº 4, NCPC.

Quanto aos demais factos necessitados de prova, vigora o princípio da livre convicção do juiz face as restantes provas legalmente admissíveis pela forma que foram realizadas- artºs 607º, nº 5 e 410º, NCPC, sem prejuízo da

relevância dos factos que não carecem de alegação e de prova face ao disposto no artº 412º NCPC.

Esta Relação deve alterar a decisão da matéria de facto se os factos tidos

como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa-artº 662º, nº 1, NCPC.

Tem de se continuar a entender que as três situações enunciadas no nº 1 do anterior artº 712º do CPC cabem na previsão da norma genérica do actual artº 662º, nº 1 do NCPC.

Assim, quando a decisão da matéria de facto assente em meios de prova não vinculada, ou seja, sujeitos a livre apreciação, tais como, documentos sem valor probatório pleno, relatórios periciais, declarações da parte não

confessórias ou depoimentos testemunhais, os poderes da Relação quanto à alteração da matéria de facto estão dependentes da iniciativa da parte

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interessada, que, nas conclusões do recurso, tem de impugnar a decisão da matéria de facto e cumprir os ónus previstos no artº 640º do NCPC.

Já pode alterar oficiosamente a matéria de facto quando ela assenta em confissão expressa ou ficta (nos articulados) ou documento autêntico ou autenticado.

Nesta conformidade, porque é matéria de facto provada documentalmente, por certidões de nascimento juntas de fls 5 a 7 e de casamento junta de fls 4 dos autos, bem porque foi dada como provada na sentença que declarou a morte presumida, de 15.09.1999, transitada em julgado, considera esta Relação provados os seguintes factos, cujo aditamento aos factos provados com interesse para a decisão se ordena:

6)- O ausente E…, com vinte e um anos de idade, casou catolicamente na

Igreja da Paróquia de …, em 11.09.1976, com B…, que adoptou o apelido B1….

7)- Pouco tempo após o casamento o casal emigrou para a Venezuela, onde viveram juntos até 29.03.1987, data em que a esposa e as duas filhas do casal, regressaram definitivamente a Portugal, tendo aquele permanecido em

Caracas, Venezuela.

8)- O referido casal teve duas filhas, D…, nascida a 25.03.1978 e C…, nascida a 31.01.1985.

9)- O ausente E…, apresentou-se com a cédula . - ……. nos serviços de registo civil da Venezuela, em 24.04.1978 e em 26.02.1985, a declarar o nascimento das filhas, como natural de Portugal, domiciliado na Paroquia de …, Caracas.

10)- O requerente E… apresenta-se com a cédula de identidade de cidadão venezuelano, com o número . ..., emitido em 16.04.2015, como tendo nascido em 09.02.1955 e um passaporte da Venezuela, emitido em 06.11.2015 e constando como local de nascimento Lisboa e desses documentos não consta a sua filiação.

Importa rectificar o ano de nascimento do ausente referido no facto provado 1) da sentença, que é 09.02.1955 e não 09-02-1055.

*

As apelantes não concordam com a factualidade dada como provada nos pontos 3 e 4 da matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, por entenderem que não tem suporte nos depoimentos das testemunhas que se apresentaram em juízo, muito menos, pelas próprias declarações prestadas pelo requerente/recorrido, entendendo que devem ser considerados não

provados. Embora apenas indiquem nas conclusões de recurso a localização no suporte de gravação das declarações do requerente/recorrido, no corpo das alegações recursivas localizam esta gravação e os depoimentos das

testemunhas, que transcrevem, em que assentam a sua impugnação.

O artº 640º, nºs 1 e 2 NCPC impôe às apelantes ónus rigorosos, cujo

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incumprimento acarreta a imediata rejeição do recurso, sem possibilidade de convite ao aperfeiçoamento das conclusões – conforme vem sendo

entendimento dominante da doutrina e da jurisprudência, quer no âmbito da versão do CPC introduzida pela Lei 41/13, quer no âmbito da versão anterior (redacções do DL 329-A/95, de 12.12 e do DL 303/07, de 24.08).

A jurisprudência maioritária do STJ é no sentido de que a indicação dos concretos meios de prova em que assenta a impugnação da matéria de facto pode apenas constar do corpo das alegações de recurso e não constarem integralmente nas conclusões recursivas, exigindo-se que nestas constem os demais ónus expressos naquela norma legal, já que é por elas que se delimita o âmbito do recurso – nº 4 do artº 635º do NCPC- uma vez que a intervenção do Tribunal da Relação não é nessa parte oficiosa. Sintetiza-se tal

entendimento jurisprudencial no seguinte trecho do Acórdão do STJ de 23.02.10, in wwwdgsi.pt:

“Não se exige que o recorrente, nas conclusões, reproduza o que alegou acerca dos requisitos enunciados no art. 690º-A, nº1, a) e b) e nº2, do Código de Processo Civil, o que tornaria as conclusões, as mais das vezes, não numa síntese, mas uma complexa e prolixa enunciação repetida do que afirmara no corpo alegatório. Mas, esta consideração não dispensa o recorrente de fazer alusão àquela questão que pretende ver apreciada, mais não seja pela

resumida indicação dos pontos concretos que pretende ver reapreciados, de modo a que ao ler as conclusões das alegações resulte inquestionável que o recorrente pretende impugnar o julgamento da matéria de facto.”

Ora, nas conclusões e no corpo das alegações as apelantes indicam o novo sentido da decisão dessa matéria de facto (não provada), os concretos meios de prova em que fundamentam tal concreta alteração e localizam devidamente com referência ao suporte de gravação do registo do depoimento das

testemunhas a que se referem no corpo das alegações, os excertos desses depoimentos que implicassem as concretas alterações de cada um desses factos provados e de cuja resposta discordam.

Cumpriram pois esses ónus da impugnação de facto.

Os aludidos factos impugnados são estes:

“3. E…, aqui requerente, soube entretanto que a mulher tinha obtido em tribunal a sua morte presumida.

4. Decidiu, por isso, vir a Portugal para se inteirar pessoalmente da situação”.

É evidente que tais factos visam provar a identidade do verdadeiro E…, marido e pai das requeridas/apelantes respectivamente, cidadão português, emigrado na Venezuela e cuja morte presumida foi requerida, em 04.02.1998, pela esposa, por si e em representação das filhas, na altura menores, e que foi declarada por sentença de 15.09.1999, transitada em julgado, sem prévia

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instituição de curadoria definitiva, para que lhe sejam devolvidos os bens da herança de seus pais, de que era único herdeiro, H… e I…, que foram

partilhados no processo de inventário que corre por apenso, entre a sua mulher B… e as suas filhas, C… e D…, e que, conforme conferência de

interessados, mapa de partilha e sentença de fls. 67, 70 e ss e 80 desses autos, foram adjudicados a B…, tendo as demais interessadas declarado que as

tornas estavam pagas.

Esse pedido formulado em 20.01.2016 pelo ora requerente, que se apresentou como sendo o E…, marido e pai das requeridas/apelantes, deve ser apreciado nos termos do disposto no artº 888º, NCPC e artº 119º CC de 1966.

Tendo as requeridas, mulher e filhas do verdadeiro ausente, negado a

identidade do requerente que se apresentou como sendo aquele cuja morte presumida foi declarada deve este justificar a sua identidade e, produzidas as provas oferecidas deve o tribunal realizar todas as diligências necessárias para proferir decisão o que importa necessariamente a comprovação, sem dúvidas, da verdadeira identidade do requerente como sendo aquele cuja morte presumida foi antes declarada- artº 888º, nº 3, NCPC. Não há dúvida, pois, que impõe a lei processual ao juiz a oficiosidade das provas a realizar mas tal não subverte o regime do ónus da prova previsto no artº 342º, nº1, CC.

Em suma, deve o tribunal realizar todas as diligências de prova possíveis e úteis para apurar a verdadeira identidade do requerente e, na falência da prova global, decidir contra aquele cuja identidade como sendo o ausente não logrou ficar provada.

Daqui resulta, a nosso ver, que não se verifica in casu qualquer das previsões legais do artº 344º, nºs 1 e 2, CC, quanto à inversão desse ónus da prova.

Com efeito, quanto ao número 1 desse normativo, no caso não se verifica uma presunção legal, dispensa ou liberação do ónus da prova ou convenção nesse sentido, nem há norma legal que assim o determine.

Quanto ao número 2, também não ocorre situação em que as requeridas com culpa, na forma de dolo ou negligência, tivessem tornado impossível a prova do onerado.

É certo que por diversas ocasiões as requeridas faltaram às recolhas de

material genético no IML impedindo a realização da perícia ao ADN destinada a determinar o parentesco entre o requerente e as pretensas filhas, que havia sido ordenada por despacho transitado em julgado e com a cominação, no despacho de 19.01.2018 de que a nova falta se entenderá que estão

propositadamente a inviabilizar a realização da perícia, com a consequente inversão do ónus da prova, nos termos do artº 344º, nº2, CC. O facto de tal despacho ter transitado em julgado, não impõe que esta Relação, que deve fixar em definitivo os factos provados com interesse para a decisão da causa e,

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depois, aplicar o direito, aceite que essa inversão do ónus da prova só por esse despacho se imponha.

As requeridas expressamente declararam nos autos que não aceitavam submeter-se a tal perícia e têm as suas razões. O aludido exame de ADN apenas poderia determinar uma relação de parentesco muito aproximada ou excluí-la entre o agora requerente e as requeridas registadas como filhas do ausente presumivelmente falecido. Não é meio de prova único ou sequer fundamental ao dispor do requerente ou que o tribunal possa ordenar, como vimos, não para determinar a paternidade do requerente relativamente às segunda e terceira requeridas, que não é objecto do pedido, mas para

determinar a identidade do requerente como sendo o declarado falecido pai destas tal como consta do registo. Assim, por não se verificarem os requisitos da culpa das requeridas e da impossibilidade objectiva do prova do onerado quanto à sua identidade, não se verifica a inversão do ónus da prova nos termos do artº 344º, nº2, CC, quanto ao aludido facto e, pour cause, quanto aos pontos 3 e 4 dos factos provados da sentença.

Pelo exposto, não se aceita a motivação da sentença quanto à prova desses dois pontos que supra se transcreveu, assente na inversão do ónus da prova.

Entendemos também que a restante motivação dessa factualidade provada referindo que “(…) a única prova a este respeito feita nos autos, consistiu na inquirição das testemunhas arroladas pelo justificante, conhecidos, familiares e amigos dos tempos de juventude de E… que, com maior ou menor

objectividade e/ou fundamentação, asseguraram de forma firme e convicta reconhecerem no justificante como o seu conhecido/familiar/amigo” não colhe, por ser vaga e conclusiva e não especificar as razões do tribunal a quo que levaram a formular essa sua convicção e o que depoimento de cada

testemunha em concreto que convenceu o juízo do julgador a quo, como impôe o artº 607º, nº4, NCPC.

Como bem apontam as apelantes nas suas alegações de recurso e resulta da audição dos depoimentos das declarações de parte do requerente e dos

depoimentos das testemunhas ouvidas “todas as declarações prestadas vão no sentido de não haver qualquer segurança na determinação da identidade do ora recorrido como sendo o verdadeiro B…”.

Com efeito, o requerente/recorrido prestou depoimento em sede de audiência ocorrida no dia 16 de Fevereiro de 2016, pelas 10.00 horas, tendo ficado o seu depoimento gravado no sistema de gravação do tribunal, entre as 10.19:19 horas e as 11:14:34 horas e logo se vê que foi necessária a comparência de um intérprete de língua castelhana, o que não pode deixar de se estranhar dado que o ausente é cidadão português e necessita de obter ajuda com a língua portuguesa. O ausente emigrou para a Venezuela pouco tempo após o

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casamento com a primeira requerida, celebrado em Portugal em 11.09.1976, tendo nessa altura vinte e um anos e, sendo do conhecimento comum que os emigrantes vivem e convivem com os seus familiares e compatriotas, não é normal que, agora com 61 anos de idade, tivesse deixado de entender e compreender suficientemente a língua portuguesa. Aliás, isso não aconteceu com várias das testemunhas por si arroladas e ouvidas, com idade semelhante e emigrantes que foram dezenas de anos na Venezuela.

Depois, o seu depoimento padece de várias incongruências, nomeadamente, perguntado sobre o nome das duas filhas, respondeu:

“Meritíssimo juíz: quantas filhas tem?

Recorrido: duas!... Uma D… e a outra C1…… C…”.

Ou seja, o requerente hesitou em algo tão simples como o nome das suas próprias filhas, as ora 2ª e 3ªs recorrentes, chegando mesmo a errar no nome da 2ª Recorrente, cujo nome é “B3…” e não “B2…”.

As contradições e lapsos de memória do ora recorrido quanto a identidade das suas filhas não se ficam por aqui.

“Meritíssimo juíz: “(…)quando é que nasceram as suas filhas?

Recorrido: se não me engano, uma em 76 e a outra em 1985 (…)”.

Ora, de acordo com os documentos autênticos constantes de fls 5 a 7 dos autos, o pai das requeridas E…, com a cédula . - ……. declarou nos serviços de registo civil da Venezuela o nascimento das filhas dele e da esposa, D… e C…, respectivamente, em 25.03.1978 e 31.01.1985. Também não é normal um pai não se recordar bem pelo menos dos anos de nascimento (para não dizer datas certas) das suas duas filhas.

As imprecisões ainda se adensam quando lhe foi perguntado sobre o regresso da sua mulher e filhas a Portugal.

“Meritíssimo Juíz: “(…)em que ano é que as filhas e a mulher regressaram a Portugal?

Recorrido: 1994, mas não estou seguro.

Meritíssimo Juíz: e que idade tinham as suas filhas?

Recorrido: Eram pequenas. A maior, a mais velha teria um ano e meio. E a outra era recém nascida”.

Mais uma vez o recorrido falha face às informações que constam nos autos e que, de acordo com a sentença que declarou a morte presumida do verdadeiro E…, marido e pai das recorrentes, fixou que estas regressaram a Portugal em 29.03.1987, ali tendo permanecido aquele.

Dos autos resulta que, nessa data do regresso, as filhas do E… tinham nove e dois anos respectivamente.

De referir que entre o regresso das mulheres e filhas e o requerimento apresentado pelo requerente/recorrido decorreram apenas 29 anos, o

(13)

requerente tem 61 anos de idade e não foi alegado nem provado que sofra de limitações de memória ou cognitivas.

Quanto às testemunhas, nenhuma conseguiu afiançar, assente em factos comprováveis, objectivos e/ou subjectivos, que a pessoa que se apresenta como sendo o E… é verdadeiramente a pessoa que diz ser.

Não foi apontada qualquer característica física objectiva sobre a identidade daquela pessoa comparada com a pessoa que se apresenta como sendo tal individuo, vg. defeito físico, tique ou sinal visível no corpo. Dos depoimentos das testemunhas resultaram respostas assentes em convicções pessoais que não permitem afiançar objectivamente a identidade da pessoa em apreço.

Também parece ficar claro que as testemunhas que afirmam estar vivo e ser este o verdadeiro E… foram disso convencidas por terceiros e, sobretudo, pelas vozes públicas que passaram a ser ouvidas no local onde tal pessoa apareceu.

Além disso, resulta dos seus depoimentos que ou não privaram sequer com o ausente ou não estiveram com o verdadeiro E… nos últimos 20, 30 e 40 anos, apenas o tendo conhecido quando ele era criança, nos idos das décadas de 60 e 70 do século passado, e com ele apenas tendo tido contactos fugazes.

Consta de fls 19 dos autos informação do Consulado Geral de Portugal em Caracas, de 24.11.1997, no sentido de que, desde 1979, que o ausente E… não comparece naquele Consulado.

Mais consta, a fls 331, informação do Ministério dos Negócios Estrangeiros, de 14.05.2018, de que o cidadão português E…, nascido em 29.08.1967,

natural da freguesia de …, Vila Nova de Gaia, portador do BI nº ………, filho de F… e de G…, se encontra inscrito no Consulado Geral de Portugal em Caracas, desde 22.12.1973, com a morada …, …, …. Catia, Venezuela e que o último pedido efectuado por ele junto do Posto Consular tem a data de 05.04.2006.

Ora, estranhamente existem dois cidadãos portugueses registados naquele Consulado com o mesmo nome e nascidos na mesma freguesia, mas com datas de nascimento e filiação diferentes. Não deixa de ser curioso.

Acresce que, como já referimos, de acordo com os documentos autênticos constantes de fls 5 a 7 dos autos, o ausente E…, apresentou-se com a cédula . -

……. nos serviços de registo civil da Venezuela, em 24.04.1978 e em

26.02.1985, a declarar o nascimento daquelas filhas dele e da esposa, como natural de Portugal, domiciliado na Paroquia …, Caracas. Como ficou provado na sentença de declaração de morte presumida, esse indivíduo emigrou para a Venezuela pouco tempo após o casamento com a primeira requerida,

celebrado em Portugal em 11.09.1976, tinha nessa altura vinte e um anos.

Ocorre que esse indivíduo tinha o bilhete de identidade português nº ……. e, em 01.10.1976 (nem um mês após o casamento), pediu a sua renovação e não

(14)

entregou o documento anterior tendo declarado que o havia perdido no autocarro, conforme decorre dos documentos de fls 189 a 191 verso.

Ignora-se se o ausente E… tem dupla nacionalidade portuguesa e venezuelana, mas o indivíduo que se apresenta com a mesma identidade daquele nestes autos, apresenta um documento de identidade apenas como cidadão

venezuelano, com o número . ………., emitido em 16.04.2015, diferente da cédula de residente estrangeiro apresentada pelo ausente no registo de

nascimento das filhas e um passaporte da Venezuela, emitido em 06.11.2015 e constando como local de nascimento Lisboa, quando o ausente nasceu na freguesia de …, Vila Nova de Gaia, sendo filho de H… e de I…. Nos referidos documentos emitidos pela República Bolivariana de Venezuela, cujos originais foram exibidos à senhora juíza a quo, a declarada data de nascimento deste indivíduo é igual à do ausente, 09.02.1955, mas além dos elementos

divergentes já referidos, não consta a sua filiação.

É fundamental para a prova da referida identidade saber se o indivíduo a quem foi atribuída a “cedula de identidade” . - …….. e se apresentou nos serviços de registo civil da Venezuela, em 24.04.1978 e em 26.02.1985, a declarar o nascimento das filhas dele e da esposa, como natural de Portugal, domiciliado na Paroquia de …, Caracas, tem a mesma filiação do indivíduo com o mesmo nome e data de nascimento, que se apresentou agora, em 20.01.2016 a formular o pedido de devolução de bens, cidadão venezuelano, portador da “cedula de identidade” . …………, emitida em 16.04.2015 e

passaporte da Venezuela, emitido em 06.11.2015, onde consta, como local de nascimento, Lisboa. Tal poderia ter ocorrido através de processo de

naturalização.

Não pode esta Relação ordenar a realização dessa prova, que deve ser obtida pelo tribunal a quo por via de informação da Embaixada da República

Bolivariana da Venezuela em Lisboa ou por via de carta rogatória em pedido dirigido ao SAIME- Servicio Administrativo de Identificación, Migración y Estranjeria do Gobierno Bolivariano de Venezuela.

Assim, ao abrigo do disposto nos artºs 888º, nº3 e 662º, nº2, al. b), NCPC, ordena-se a produção daquele meio de prova e termos subsequentes, para a prova dos referidos factos que foram impugnados, anulando-se, em

conformidade a sentença proferida.

Mantem-se, no entanto, a demais factualidade provada com a rectificação e o aditamento de factos provados nos termos acima referidos.

*

III - Decisão:

Nestes termos, ACORDAM os juízes nesta Relação em anular a decisão recorrida nos termos que antecedem e, sem prejuízo da consideração dos

(15)

factos já fixados como provados neste acórdão, ordena-se a realização do apontado meio de prova e decisão posterior.

Sem custas.

*

P.09.05.2019 Madeira Pinto Carlos Portela

Joaquim Correia Gomes __________________

[1] http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/ProcessoCivil/

Texto_comunicacao_Paulo_Pimenta.pdf.

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