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A REPRESENTAÇÃO DA IDENTIDADE FEMININA NEGRA NA FICÇÃO PÓS-COLONIAL BRASILEIRA DE CONCEIÇÃO EVARISTO

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A REPRESENTAÇÃO DA IDENTIDADE FEMININA NEGRA NA FICÇÃO PÓS-COLONIAL BRASILEIRA DE CONCEIÇÃO EVARISTO

Wilma dos Santos Coqueiro1 Resumo: Para Bonnici (2005), pode ser considerada literatura pós-colonial toda a produção dos povos colonizados pela Europa entre os séculos XV e XX. Essas narrativas surgem como uma versão alternativa do mundo colonizado, criando uma estética a partir dos excluídos. Ainda segundo o autor, se nessas sociedades o homem foi colonizado, a mulher teria sido duplamente colonizada. Nesse sentido, os estudos pós-coloniais interligam-se aos estudos da crítica feminista, uma vez que à submissão da mulher ao poder patriarcal, soma-se a opressão colonial. Essoma-se trabalho tem como objetivo refletir sobre a represoma-sentação da identidade feminina dilacerada pela diáspora africana no romance Ponciá Vicêncio, publicado em 2003, pela escritora negra Conceição Evaristo. Por meio de uma prosa densa e poética, Conceição Evaristo narra a trajetória da protagonista Ponciá, descendente de escravos, marcada pela exclusão social e racial e pela opressão patriarcal, da infância à maturidade, configurando-se, assim, como um romance de formação feminino. A análise respalda-se em estudos teóricos, entre outros, de Lauretis (1994), Bonnici (2000, 2005), Proença Filho (2004) e Bourdier (2005).

Palavras-Chave: Ficção Pós-colonial. Representações de gênero. Exclusão social.

Partindo-se do pressuposto de que as obras ficcionais surgem da necessidade de exprimir “um conteúdo essencial”, como afirma Lukács (2000), busca-se refletir sobre a representação ficcional da identidade feminina afro-brasileira no romance Ponciá Vicêncio, publicado em 2003, por Conceição Evaristo, uma vez que no Brasil, que foi colônia portuguesa por vários séculos, ainda persistem marcas do colonialismo, sobretudo na marcante opressão feminina. Nesse sentido, Bonnici afirma que “as raízes do imperialismo são muito mais profundas e extensas”.

Para Lukács, em seu livro clássico sobre A teoria do romance, a relação da obra romanesca com o contexto social é possível na medida em que “as categorias estruturais do romance coincidem constitutivamente com a situação do mundo” (2000, p.96). De fato, a intrínseca relação entre literatura e história remonta à antiguidade greco-romana uma vez que poetas como Homero escreveram as grandes epopeias inspiradas em fatos históricos.

Desde o início, portanto, Literatura e História aparecem imbricadas uma vez que ambas se preocupam basicamente em compreender o destino do homem. Embora essas relações sejam observadas e reconhecidas, ainda parece muito recorrente o conceito que o discurso histórico seria a verdade absoluta e o discurso literário uma mentira. Com efeito, os limites entre representação histórica e criação literária parecem bastante tênues, nem sempre sendo fácil definir a fronteira que os separa. Embora haja um consenso de que a literatura não é mimese direta do real, constituindo-se como uma transfiguração da realidade, para Freitas (1989), “a literatura pode prever os acontecimentos”. Segundo a autora, os grandes escritores são capazes de registrar os movimentos difusos no inconsciente de um determinado grupo social e dar

1Docente do Departamento de Letras da UNESPAR/FECILCAM, campus de Campo Mourão, Brasil. Doutoranda em

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significação estética aos seus desejos mais vagos e inconfessados. Assim, “mais do que imagem, a Literatura seria antes o imaginário da História” (Freitas, 1989, p. 115).

De certa forma, parece que todas as literaturas, em algum momento de sua história, produziram obras em que havia um conteúdo histórico subjacente à imaginação do escritor. Nessas obras predominavam geralmente um tom épico, enaltecendo os aspectos históricos do ponto de vista dos vencedores.

Contudo, à medida que o século XX avança, cresce em todo o mundo uma literatura mais social e engajada politicamente. Sobretudo, a partir da década de 1960, com a emergência do Multiculturalismo, tem-se verificado uma desconstrução dos princípios morais e concepções filosóficas e existenciais que caracterizavam o mundo ocidental. Esses movimentos constituem o que tem sido denominado de Pós-modernismo. Para Bonnici, “os pós-modernistas, baseados na premissa de que a filosofia e a teoria não são mais adequadas para fundamentar a crítica social e política, tentam interpretar o mundo contemporâneo sem a base filosófica tradicional” (2005, p. 45). Seguindo essa perspectiva, as várias minorias – como a negra, a homossexual e a feminina – começam a questionar, de forma incisiva, o papel marginal a que estavam relegadas até então, assumindo a retórica da ruptura. Para Linda Hutcheon (1991) conhecida teórica do pós-modernismo, “quando o centro começa a dar lugar às margens, quando a universalidade totalizante começa a desconstruir a si mesma, a complexidade das contradições que existem dentro das convenções – como, por exemplo, as de gênero começam a ficar visíveis” (p. 86).

Nos países que sofreram a violenta marca do Colonialismo Europeu, sobretudo na África e na Ásia, paralelamente ao processo de descolonização em meio a guerras cruentas, começam a surgir movimentos culturais de contestação que, como afirma Hutcheon, tinham como protagonistas os excluídos da História.

Nesse contexto, surge, nos vários países que foram colonizados pelas potências europeias, uma literatura pós-colonial, que está ligada ao resgate da identidade cultural e à resistência contra o imperialismo europeu. Para Bonnici, pode ser considerada como literatura pós-colonial toda a produção literária dos povos colonizados pela Europa, entre os séculos XV e XX. O estudioso ressalta que essa literatura “narra ficcionalmente eventos de povos colonizados e cria uma estética a partir do excluído” (2005, p. 10). O autor enfatiza que é o que integra essas narrativas, de maneira geral, é a consciência aguda da supressão da cultura e das identidades desses povos. Assim, a criação dessas obras contestatórias têm o objetivo de resistir aos valores historicamente construídos pelos colonizadores e promover uma versão alternativa desse mundo colonizado.

Se, nessas sociedades , o homem foi colonizado e impedido de ter voz, para Bonnici, a mulher teria sido duplamente colonizada. Nesse ponto, há semelhanças entre os estudos pós-coloniais e os estudos feministas, uma vez que é muito difícil definir qual fator teria mais influência sobre a vida da mulher: a opressão colonial ou a submissão patriarcal.

A interligação entre o feminismo e a representação da mulher colonizada pode ser evidenciada não apenas nas colônias invadidas (África, Índia), mas também nas colônias de colonizadores brancos (Austrália, Canadá). Nas primeiras, a pictografia do corpo feminino

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sexualizado, com fortes conotações de desvios sexuais, reproduzida no século XIX, construiu estereótipos do outro diferente, os quais permanecem até o presente. Nas outras os corpos das indígenas (Ameríndias, Aborígenes) foi vitimado pelo discurso do poder e usado como recipiente produtivo. (BONNICI, 2005, p. 28)

Para Bourdieu, o homem criou a dominação sobre a mulher contanto com a ajuda das instituições sociais como: Estado, Igreja, Escola, Família. Isso significa que a construção dos gêneros e a consequente dominação de um sobre o outro, que é cultural, com o passar do tempo, tornou-se natural: “A divisão entre os sexos parece estar “na ordem das coisas”, como se diz por vezes para falar do que é normal, natural, a ponto de ser inevitável”. (2005, p.17) . Lauretis, por sua vez, evidencia, em seus estudos sobre “Tecnologia de Gênero”, que a função que define os gêneros na constituição de indivíduos concretos em homens e mulheres está ligada de forma intrínseca à ideologia. Essa relação entre gênero e ideologia constitui o sujeito, não só pela diferença sexual, mas por meio de códigos linguísticos e representações culturais. Este seria, para a autora, um sujeito “‘engendrado’ não só nas experiências de relações de sexo, mas também nas de raça e classe: um sujeito, portanto, múltiplo em vez de único, e contraditório em vez de simplesmente dividido”. (1994, p. 213). Por isso, para Lauretis, não são só as diferenças sexuais que determinam as trajetórias femininas, mas o sistema econômico como um todo. Para ela, a análise feminista contemporânea deve levar em consideração “que podemos perceber duas ordens, a sexual e a econômica, operando juntas” (Lauretis, 1994, p. 216)

No que diz respeito ao Brasil que seria uma sociedade um pouco diferente das africanas, uma vez que para Bonnici (2000), de acordo com o deslocamento, seria uma “settler colonies”, ou seja, houve um deslocamento da população indígena nativa e uma espécie de transplante da cultura europeia para as terras brasileiras,uma vez que o negro escravo foi usado apenas como força de trabalho. Formou-se, então, um cânone literário que privilegiou o padrão masculino, branco e europeu e que raramente tem sido questionado. Segundo Bonnici, “os grandes silêncios e hiatos do indígena e do negro escravo ou foragido, como também a dupla colonização da mulher, são dignos de serem apreciados no contexto pós-colonial brasileiro” (2000, p.09).

O conceito de Literatura Negra ou Literatura Afro-descendente ainda encontra-se em construção, uma vez que, segundo alguns autores, além de ser negro, o escritor deve escrever de um ponto de vista negro. Para Duarte, “desde o período colonial, o trabalho dos afro-brasileiros se faz presente em praticamente todos os campos da atividade artística, mas nem sempre obtendo o reconhecimento devido” (2002, p. 35).

Nesse sentido, são importantes as considerações de Proença Filho. Embora reconheça que tanto escritores negros quanto brancos escreveram obras acerca da temática negra, na maioria das vezes, a representação da personagem negra apresentava um caráter marginalizador, marcado por estereótipos. Nesse sentido, ele enfatiza que, no discurso literário nacional, geralmente houve dois direcionamentos em relação à representação da figura da personagem negra: a condição do negro como objeto e como sujeito. Em relação à condição do negro como objeto, ocorre uma visão distanciada do autor, na qual geralmente percebem-se

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indícios das “ideologias, atitudes e estereótipos da estética branca dominante” (2004, p. 161). Algumas obras que, na visão do autor, são marcados pela presença de personagens negras estereotipadas são, entre outras, A

Escrava Isaura, de Bernardo Guimarães, O Mulato e O Cortiço, ambas de Aluísio de Azevedo, e, até

mesmo, o poema Navio Negreiro, que a despeito do empenho consciente na luta pela abolição, “o poeta não consegue livrar-se nos textos das marcas profundas de uma formação desenvolvida no bojo de uma estrutura escravista” (2004, p. 164).

Proença Filho enfatiza que a prevalência dessa visão estereotipada, sobretudo do negro erotizado, representado como objeto sexual, acompanha a literatura brasileira até pelo menos 1960. A partir daí são mais comuns textos de autores negros, compromissados com a sua etnia. Alguns escritores que seriam precursores desse compromisso étnico na representação do negro são Luis Gama (1850-1882), Lima Barreto (1881-1922) e Solano Trindade (1908-1973).

Assim, o autor chega a um conceito de literatura negra que, num sentido mais específico, seria configurada como um espaço de reivindicação identitária de escritores negros e mestiços. Para Proença Filho:

Em sentido restrito, considera literatura negra uma literatura feita por negros ou por descendentes assumidos de negros, e como tal, reveladora de visões de mundo, de ideologia e de modos de realização que por força das condições atávicas, sociais e históricas condicionadas, caracteriza-se por uma certa especificidade, ligada a um intuito claro de singularidade social. (2004, p. 185)

Nesse sentido, uma obra de fundamental importância é o romance Ponciá Vicêncio, publicado em 2003, pela escritora negra Conceição Evaristo. Nesse romance, de qualidade estética bastante singular, a autora narra de forma concisa, densa e poética a trajetória de Ponciá Vicêncio, descendente de escravos, da infância à maturidade, configurando assim como um Bildungsroman, ou seja, um romance de formação feminino.

A autora lança mão de um elemento marcante na literatura negra brasileira que é a temática da diáspora africana, representando o resgate da memória coletiva cultural, por meio da trajetória de Ponciá Vicêncio, uma descendente de escravos que, no próprio nome traz impressa a marca da dominação, pois ela tinha o mesmo sobrenome do Coronel Vicêncio, de quem o avô tinha sido escravo: “Na assinatura dela, a reminiscência do poderio do senhor (...) O tempo passou deixando a marca daqueles que se fizeram donos das terras e dos homens” (Evaristo, 2003, p.27).

No romance, as marcas da escravidão, que se estendem na história do país para muito depois da Lei Áurea, de 1888, aparecem de forma pungente na vida do pai de Ponciá, na dela própria e do irmão. Mesmo após a abolição, os negros das terras do Coronel Vicêncio continuam trabalhando como escravos e sendo maltratados. O pai de Ponciá, ainda criança, ao servir de pajem do filho do coronel, vivencia sofrimentos indescritíveis, servindo de cavalo para o mocinho galopar em busca de conhecer as terras do pai, culminando na grande humilhação do dia em que “o coronelzinho exigiu que ele abrisse a boca, pois queria mijar dentro.

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O pajem abriu. A urina do outro caía escorrendo quente por sua goela e pelo canto de sua boca” (Evaristo, 2003, p. 14).

Nesse romance, que não segue uma ordem linear, misturando passado e presente, seguindo os fios da memória, podemos observar que se, em países de terceiro mundo que foram colonizados por europeus, os homens negros ainda estão, na maioria das vezes, sujeitos a vidas precárias e miseráveis devido a herança social e cultural deixada por séculos de escravidão, para a mulher negra essa opressão é ainda maior devido aos preconceitos relativos ao sexo.

Na infância, apesar da miséria em que vive, Ponciá, a menina que não se acostumava com o próprio nome, aparece integrada no universo familiar, modelando objetos artesanais de barro com a mãe – inclusive perpetuara, em um boneco de barro, a imagem do avô que ela mal chegara a conhecer – e a espera do pai e do irmão que trabalhavam longe e vinham raramente para casa: “Nos tempos de roça de Ponciá, nos tempos da casa pau-a-pique, de chão de barro batido, de bonecas de espiga de milho, de arco-íris feito cobra coral bebendo água no rio, a menina gostava de ser mulher, era feliz.” (Evaristo, 2003, p. 24).

Apesar das dificuldades a vida transcorria normalmente e ela até aprendera algumas letras com uns padres que passaram pouco tempo pelo povoado. Com a morte do pai, Ponciá percebe a inutilidade e a luta inglória do trabalho quase escravo, de homens, mulheres e crianças, nas plantações dos coronéis que estavam cada mais ricos. Por isso, resolve partir para a cidade acreditando que “poderia traçar outros caminhos, inventar uma nova vida” (Evaristo, 2003, p. 24).

Após vários dias, em uma sofrida viagem de trem e a chegada sem nenhuma perspectiva na cidade, Ponciá arruma emprego como doméstica, perde o contato com os seus, casa-se e sente desterritorializada na favela da cidade. Não conseguindo realizar-se como mulher e como mãe – ela tivera sete abortos – ela começa a viver de grandes ausências, ao lado de um homem que a maltrata, tentando trazê-la de volta ao mundo. Nesses momentos, ela lembra as superstições de infância quando acreditava que se passasse por debaixo do arco-íris tornar-se-ia homem: “Deu-lhe um violento soco nas costas, gritando-lhe pelo nome. Ela lhe devolveu o olhar de ódio. Pensou em sair dali, ir para o lado de fora, passar por debaixo do arco-íris e virar logo homem. Levantou-se, porém, amargurada de seu cantinho e foi preparar a janta dele.” (Evaristo, 2003, p. 17).

A cisão entre o “destino de mulher” que recai sobre Ponciá e “a vocação de ser humano” que lhe traria liberdade, conforme salienta Simone de Beauvoir (1980), está bem marcada nesse romance, embora a leitura denuncia, de forma muito mais contundente, a exclusão social e racial que mesmo a sexual. O marido de Ponciá, muito mais que um agressor, parece ser uma vítima dessa sociedade extremamente desigual.

Seguindo uma tendência bastante comum na literatura de autoria feminina pós anos 90, a autora desvela as teias da opressão, não só baseadas nas relações de gênero, mas também advindas das causas sociais. Dessa forma, tanto Ponciá como seu homem são vitimas de mecanismos socio-econômicos de poder que reduzem os pobres, sobretudo negros, a vidas precárias e miseráveis, encarcerados nos espaços

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marginalizados das favelas. A citação, apesar de longa, merece ser lida, uma vez que ressalta o imenso desamparo a que estão submetidos esses seres desprovidos de qualquer sorte ou esperança:

Desde o dia em que o homem de Ponciá havia batido nela tanto, a ponto de fazer sangrar-lhe a boca, depois condoído do sofrimento que infligira à musangrar-lher, nunca mais ele a agrediu e se tronou carinhoso com ela. Foi tanto pavor, tanto sofrimento, tanta dor que ele leu nos olhos dela, enquanto lhe limpava o sangue, que descobriu não só o desamparo dela, mas também o dele. Descobriu o quanto eram sós. Percebeu que cada um tinha os seus mistérios. (...) Desde então, ao perceber a solidão da mulher e a sua própria, o homem viu na mulher o seu semelhante e tomou-se de uma imensa ternura por ela. ((EVARISTO, 2003, p. 111).

Ao passar por um desenraizamento cultural longe dos seus e não se realizar por meio do casamento, é visível o desencanto da protagonista com a vida naquele espaço e ela se pergunta “o que acontecera com os sonhos tão certos de uma vida melhor?” (Evaristo, 2003, p. 33). Após cumprir um ciclo de infortúnios e perdas, Ponciá acaba por encontrar o irmão e a mãe e a refazer o caminho de volta ao povoado, ao rio, ao trabalho artesanal com o barro, reencontrando assim sua memória ancestral: “Lá fora, no céu de cor de íris, um enorme angorô multicolorido se diluía lentamente, enquanto Ponciá Vicêncio, elo e herança de uma memória reencontrada pelos seus, não se perderia jamais, se guardaria nas águas do rio” (Evaristo, 2003, p. 132).

Esse denso romance poético de Conceição Evaristo mostra que a literatura pós-colonial está ligada a movimentos de afirmação da etnia negra, incluindo a mulher nessa tomada de consciência social e coletiva. Nesse sentido, Ponciá, com sua identidade dilacerada pela diáspora a que foram submetidos os povos africanos na América, busca uma afirmação social e um reencontro com a coletividade. Para Proença Filho, num sentido amplo, é negra toda a literatura, que independente de quem a escreva, seja “centrada em dimensões peculiares aos negros ou aos descendentes negros” (2004, p. 185).

Concluímos, portanto, que a literatura de Conceição Evaristo assume o ponto de vista da mulher negra, triplamente colonizada: pela etnia, pela condição social e pela questão sexual. Dessa forma, é capaz de inscrever o corpo e a voz dessa mulher negra como parte constitutiva de uma textualidade cultural.

Referências

BEAUVOIR, Simone. O segundo sexo. Trad. Sérgio Milliet. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980. 2.v. BONNICI, Thomas. O Pós-colonialismo e a Literatura: estratégias de leitura. Maringá: Eduem, 2000. _____. . Conceitos-Chave da Teoria Pós-colonial. Maringá: Eduem, 2005.

BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina.Trad. Maria Helena Künher. 4.ed. Rio de Janeiro:Bertrand Brasil, 2005.

DUARTE, Eduardo de Assis. Literatura e Afro-descendência. In: Literatura, Políticas e Identidades. Ensaios. Belo Horizonte: UEMG, 2005.

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FREITAS, Maria Teresa de. Romance e História. In: Uniletras. Ponta grossa: UEPG, 1989.

HUTCHEON, Linda. Poética do Pós-modernismo: história, teoria e ficção. Trad. Ricardo Cruz. Rio de Janeiro: Imago, 1991.

LAURETIS, Teresa. Tecnologia de gênero. In: Hollanda, Heloísa Buarque. Tendências e impasses: o feminismo como crítica da cultura. Rio de Janeiro: Rocco, 1994.

LUKÁCS, Georg. A teoria do romance. São Paulo: Duas Cidades; Ed. 34, 2000.

PROENÇA FILHO, Domício. A Trajetória do Negro na Literatura Brasileira. 500. In: Revista dos Estudos

Avançados da USP, São Paulo, 2004.

Black Women Identity Representation in Postcolonial Brazilian Fiction by Conceição Evaristo

Abstract: For Bonnici (2005), it can be considered postcolonial literature all production of colonized people around Europe between the fifteenth and twentieth centuries. Those narratives appear as an alternative version of the colonized world, by creating an aesthetic based on the excluded ones. Also according to the author, if in those societies man was colonized, woman would have been colonized twice. In this sense, postcolonial studies are interconnected to the feminist criticism studies, since the submission of woman to patriarchal power is added to the colonial oppression. This paper aims to reflect on the representation of female identity torn by African diaspora in Ponciá Vicência novel, published in 2003, by black writer Conceição Evaristo. By means of a dense and poetic prose, Conceição Evaristo narrates the life trajectory of the protagonist Poncia, a descendant of slaves, marked by social and racial exclusion and patriarchal oppression, from childhood to adulthood, being, thus, a female novel of formation. The analysis is based on theoretical studies, among others, Lauretis (1994), Bonnici (2000, 2005), Proenca Son (2004) and Bourdier (2005).

Referências

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