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Divergências constitucionais no tratado de Roma do Tribunal Penal Internacional

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA MICHELLE FURTADO

DIVERGÊNCIAS CONSTITUCIONAIS NO TRATADO DE ROMA DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL

Tubarão 2011

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DIVERGÊNCIAS CONSTITUCIONAIS NO TRATADO DE ROMA DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito, graduação em Direito, da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel.

Linha de pesquisa: Justiça e Sociedade

Orientadora temática: Profª Carla Aparecida Marinho Borba, Msc.

Tubarão 2011

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DIVERGÊNCIAS CONSTITUCIONAIS NO TRATADO DE ROMA DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL

Esta monografia foi julgada adequada à obtenção do título Bacharel em Direito e aprovada em sua forma final pelo Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Tubarão, 30 de junho de 2011.

______________________________________________________ Professora e orientadora Carla Aparecida Marinho Borba, Msc.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Professor Wanio Wiggers, Msc.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Professor Geraldo Machado Cota Junior, Esp.

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Esta monografia é resultado de um trabalho de pesquisa realizado durante o curso de Direito na Universidade do Sul de Santa Catarina, por esse motivo não poderia deixar de expressar minha gratidão a algumas pessoas que colaboraram para esta realização.

Meus agradecimentos a Deus, que irriga minha história com amor e me faz entender que, ainda que eu saiba todos os mistérios e todo o conhecimento, e tenha uma fé capaz de mover montanhas, se não tiver amor, nada serei, pois sem o amor os ricos se tornam miseráveis e, com ele, os miseráveis em abastados; sem o amor, o conhecimento se torna uma fonte de tédio e, com ele, um manancial de sabedoria;

Aos meus pais, Tânia e Maurílio, pelo amor incondicional e por não medirem esforços ao investir em minha formação;

Ao meu irmão Nícolas, simplesmente por existir;

Ao meu coordenador Lester Marcantonio Camargo, pela sua compreensão, paciência e ajuda, que permearam a realização desta conclusão de curso;

À professora orientadora, Carla Aparecida Marinho Borba, por todo incentivo e, sobretudo, pelos valiosos ensinamentos;

Aos meus professores Wanio Wiggers e Geraldo Machado Cota Júnior, por contribuírem para a realização deste trabalho de conclusão de curso.

(5)

No presente estudo, o tema abordado é “divergências constitucionais no tratado de Roma do tribunal penal internacional”, cujo objetivo geral é analisar as controvérsias entre o Estatuto de Roma, que instituiu o Tribunal Penal Internacional, e a Constituição Federal brasileira de 1988. Para alcançar tal objetivo, foi utilizado o método de abordagem dedutivo, pois irá partir de uma proposição geral, dentro da Constituição Federal brasileira de 1988 e do Tribunal Penal Internacional, para atingir uma conclusão específica, os aparentes conflitos entre as normas. O modelo de investigação empregado foi o bibliográfico, uma vez que foi utilizado doutrina para sua elaboração. O referido Trabalho procura demonstrar a compatibilidade entre as normas do Estatuto de Roma e a Constituição Federal brasileira de 1988, evidenciando que não há qualquer afronta ou inconstitucionalidade nas questões relativas à coisa julgada, a prisão perpétua, a entrega de indivíduos, a imprescritibilidade de crimes e a ausência de imunidade de certos agentes públicos. Assim, conclui-se que o Tribunal Penal Internacional configura-se um avanço para a sociedade internacional contemporânea, marcando definitivamente a proteção internacional dos Direitos Humanos e a justiça penal internacional, uma vez que processa, julga e pune com rigor os responsáveis pelas grandes atrocidades cometidas contra a humanidade, buscando soluções pacíficas para os conflitos em prol da proteção aos Direitos Humanos.

Palavras-chave: Tribunais Penais Internacionais. Direito Internacional Público. Direitos Humanos.

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In this study the subject is “constitutional differences in the treaty of Rome of the International Criminal Court, whose general objective is to analyze the controversy between the Rome Statute that established the International Criminal Court and the Brazilian Constitution of 1988. To achieve this we used the method of deductive approach, as it will depart from a general proposition, in the Brazilian Constitution of 1988 and the International Criminal Court, to reach a specific conclusion, the apparent conflict between the rules. The research model used was the literature, since that doctrine was used for its elaboration. This work seeks to demonstrate the compatibility between the rules of the Rome Statute and the Brazilian Constitution of 1988, showing that there is no wrong or unconstitutional in matters relating to res judicata, life imprisonment, the surrender of individuals, imprescriptibility of crimes, and lack of immunity of certain public officials. Thus, we conclude that the ICC set up a breakthrough for contemporary international society, definitely marking the international protection of human rights and international criminal justice, since it tried, judged and punished with great severity those responsible for atrocities committed against humanity, seeking peaceful solutions to conflicts in favor of protection of Human Rights.

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1 INTRODUÇÃO ... 8

1.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA E FORMULAÇÃO DO PROBLEMA ... 8

1.2 JUSTIFICATIVA ... 9 1.3 OBJETIVOS ... 11 1.3.1 Objetivo geral ... 11 1.3.2 Objetivos específicos ... 11 1.4 HIPÓTESE ... 11 1.5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ... 12

1.6 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: ESTRUTURAÇÃO DOS CAPÍTULOS ... 12

2 O TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL ... 14

2.1 O DIREITO INTERNACIONAL ... 14

2.2 OS PRECURSORES DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL – TRIBUNAIS AD HOC ... 16

2.2.1 Tribunal militar internacional de Nuremberg ... 16

2.2.2 Tribunal militar internacional para o Extremo Oriente (TMIEO) ... 19

2.2.3 Tribunal penal internacional da antiga Iugoslávia ... 21

2.2.4 Tribunal penal internacional para Ruanda ... 23

2.3 SURGIMENTO DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL ... 25

3 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL ... 28

3.1 PRESIDÊNCIA ... 29

3.2 CÂMARA DE JULGAMENTO PRELIMINAR ... 30

3.3 CÂMARA DE PRIMEIRA INSTÂNCIA ... 31

3.4 CÂMARA DE RECURSO ... 32

3.5 PROMOTORIA ... 32

3.6 SECRETARIA ... 33

3.7 INÍCIO DE UM PROCESSO PERANTE O TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL . 34 3.7.1 O direito de remeter um caso através de um Estado-parte ... 34

3.7.2 O direito de remeter um caso através do Conselho de Segurança ... 35

3.7.3 Audiência de confirmação ... 35

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3.7.6 Execução das penas ... 39

3.8 IMPOSSIBILIDADES DE RESERVAS AO ESTATUTO DE ROMA E ALTERAÇÕES POSTERIORES ... 40

3.9 COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL ... 41

3.9.1 Definição dos crimes de atribuição do tribunal penal internacional ... 42

4 AS DIVERGÊNCIAS ENTRE O ESTATUTO DE ROMA E A CONTITUIÇÃO FEDERAL BRASILEIRA ... 47

4.1 A INCORPORAÇÃO DOS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ... 47

4.2 A NATUREZA DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL – UM TRATADO INTERNACIONAL DE DIREITOS HUMANOS ... 51

4.3 O PRINCÍPIO DA COMPLEMENTARIDADE ... 52

4.4 AS APARENTES CONTRADIÇÕES ENTRE O TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL BRASILEIRA ... 53

4.4.1 A entrega de nacionais ... 54

4.4.2 A pena de prisão perpétua ... 57

4.4.3 A ausência de imunidade de certos agentes públicos ... 59

4.4.5 A imprescritibilidade de crimes ... 61

4.4.6 A coisa julgada ... 63

5 CONCLUSÃO ... 67

REFERÊNCIAS ... 69

ANEXO ... 72

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1 INTRODUÇÃO

No presente trabalho, será abordada a diferença entre o Direito Internacional e o Direito Nacional, a história dos Tribunais anteriores até a criação do Tribunal Penal Internacional, a estrutura e funcionalidade do Tribunal Penal Internacional, e, posteriormente, a inserção dos Tratados Internacionais no Direito Interno. Para dar seguimento, serão analisadas as aparentes divergências entre as normas do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional e a Constituição Federal brasileira com a solução dessas controvérsias.

1.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA E FORMULAÇÃO DO PROBLEMA

A pesquisa delimita-se pelos aspectos divergentes entre as normas da Constituição Federal brasileira e o Tribunal Penal Internacional.

Desde o início dos tempos, alguns momentos históricos marcaram a humanidade pelos crimes e atrocidades realizados, por consequência, houve a necessidade de criar um tribunal internacional que julgasse os mais severos crimes contra a humanidade, surgindo a construção do Direito Penal Internacional.

A primeira menção de uma jurisdição internacional voltada para a punição dos delitos contra a humanidade surge com o Tratado de Versalhes.1 Em 1945, fora estabelecido outro Tribunal Penal, o de Nuremberg2, embasado na Declaração de Moscou. Os crimes julgados seriam aqueles cometidos na Segunda Guerra mundial pelos nazistas.

Em 1993 e 1994, a Organização das Nações Unidas (ONU) criou duas cortes internacionais específicas e temporárias: o Tribunal Penal Internacional da ex-Iugoslávia, para julgar os casos da guerra da Bósnia-Herzegovina, e o Tribunal Penal Internacional de Ruanda, para julgar as pessoas implicadas nas atrocidades ocorridas em Ruanda.

Contudo, tais tribunais receberam severas críticas quanto a sua composição. A primeira dizia respeito ao julgamento apenas daqueles que haviam sido vencidos nas Guerras, chegaram até mesmo a intitulá-lo “Tribunal dos Vencedores”, já que os crimes de guerra praticados pelos vencedores não recebiam a devida punição. A segunda crítica se referia à

1 MAGNOLI, Demetrio. História da paz. São Paulo: Contexto, 2008. p. 21.

2 FERNANDES, David Augusto. Tribunal penal internacional: a concretização de um sonho. São Paulo: Renovar, 2006. p. 39.

(10)

criação de um Tribunal específico e posterior ao fato cometido, os denominados tribunais de exceção, que afrontavam ao Princípio da Legalidade Penal.

Destarte, em 1 de julho de 2002 entra em vigor o Estatuto de Roma3, instituindo, pela primeira vez na história, um Tribunal Penal Internacional (TPI)4 de caráter permanente, destinado a processar e julgar os responsáveis pelos mais graves crimes internacionais.

O Brasil, no dia 12 de junho de 2002, assinou a carta de ratificação do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional. Ao aderir a esse Estatuto, o Brasil passa, obrigatoriamente, consentir em aceitar a jurisdição complementar do TPI.

Nesse sentido, surgem alguns aspectos polêmicos entre o Tribunal Penal Internacional adotado pelo Brasil e a Constituição Federal brasileira. Uma das polêmicas reside no fato de o Brasil ter acatado, pelo Estatuto de Roma, entregar seus nacionais para serem julgados pelo TPI, enquanto a Constituição Federal brasileira veda expressamente a extradição de brasileiros para serem julgados em outros países.

Diante dos fatores expostos, apresentam-se as seguintes problemáticas a serem pesquisadas:

Quais são as controvérsias entre o Tratado que cria o Tribunal Penal Internacional e a Constituição Federal brasileira?

A coisa julgada, a prisão perpétua, a entrega de indivíduos, a imprescritibilidade de crimes, e a ausência de imunidade de certos agentes públicos, disciplinadas pelo Estatuto de Roma, podem ser consideradas inconstitucionais?

1.2 JUSTIFICATIVA

A evolução do mundo é marcada por grandes acontecimentos, sendo as guerras um dos mais importantes, tendo, por fim, a morte de milhões de pessoas. Nos últimos tempos, a história da humanidade é composta por vários atos de atrocidades, como, por exemplo, a 1ª e 2ª Guerra Mundial, que causaram a morte de milhões de vítimas; o campo de concentração Auschwitz – Birkenau, símbolos do Holocausto perpetrado pelo nazismo; e o mais recente ato de atrocidade que foram os atentados de 11 de setembro de 2001, realizando uma série de ataques suicidas coordenados pela Al-Qaeda aos Estados Unidos.

3 FERNANDES, 2006, p. 136. 4

(11)

Esses atos atingem cidadãos de diferentes países e são praticados por pessoas de distintas nacionalidades, e, por isso, torna-se difícil julgá-los em Tribunais Nacionais, tendo em vista que haveria um conflito sobre qual norma se aplicaria aos estrangeiros que cometem crimes severos em outros países.

Por conta desse problema, houve a necessidade de criar um Tribunal Internacional de caráter permanente, para punir eventuais crimes gravosos, surgindo o Tribunal Penal Internacional (TPI).

O Tribunal Penal Internacional trouxe grandes polêmicas para os Estados que o adotaram por conter normas severas de punição. O Brasil foi um desses Estados que ratificou esse tratado, e também encontrou conflitos entre as normas do TPI e a legislação brasileira.

Apesar da discussão envolvendo o Tribunal Penal Internacional e sua aplicabilidade no Direito Interno, seu estabelecimento foi um novo passo rumo à repressão efetiva de pessoas responsáveis pelos crimes mais graves do mundo. Insta-se aos Estados a ratificarem o Estatuto do Tribunal para que essas pessoas deixem de gozar a impunidade.

Desta forma, o Brasil agiu corretamente ao ratificar o Tratado do TPI, visto que todos os argumentos para a sua não aceitação no ordenamento interno são contestados e o TPI se mostra válido, com soluções contidas em seu próprio tratado.

Sua aplicação em nosso ordenamento jurídico representa o fortalecimento do sistema jurídico interno, auxiliando a Constituição Federal brasileira na punição de crimes contra a humanidade, contrariando a tese de inconstitucionalidade, que afirmam alguns constitucionais.

O Tribunal Penal Internacional é a tentativa da comunidade internacional de julgar e punir pessoas que cometam crimes contra a humanidade, tendo, portanto, o objetivo de evitar a impunidade. Ele pode significar um mecanismo extremamente poderoso de contenção de novos genocídios, crimes contra a humanidade e sérios crimes de guerra que têm atormentado a humanidade durante o curso do século 21, por isso a sua importância. O presente trabalho justifica-se por dar maior visibilidade a esse instrumento poderoso de repressão aos considerados “grandes crimes contra a humanidade”.

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1.3 OBJETIVOS

1.3.1 Objetivo geral

Analisar as possíveis controvérsias entre o Tribunal Penal Internacional e a Constituição Federal brasileira.

1.3.2 Objetivos específicos

Os objetivos específicos da monografia são:

Conhecer a história da formação do Tribunal Penal Internacional; Verificar a estrutura de funcionamento do Tribunal Penal Internacional;

Verificar as normas estipuladas no Tratado Penal Internacional e sua aplicabilidade nos Estados;

Demonstrar os pontos em que a Constituição Federal brasileira diverge do Estatuto de Roma;

Demonstrar as soluções para os conflitos entre as normas do Tribunal Penal Internacional e a Constituição Federal brasileira.

1.4 HIPÓTESE

Os aspectos polêmicos entre as normas do TPI e a Constituição Federal têm soluções contidas no próprio Tratado Penal Internacional, no qual resolve as controvérsias para cada conflito.

(13)

1.5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A presente pesquisa basear-se-á pelo método dedutivo de abordagem, pois irá partir de uma proposição geral para atingir uma conclusão específica.5

A pesquisa deste projeto será realizada com base no método de abordagem dedutivo, exploratório quanto ao nível, e bibliográfico quanto ao método de pesquisa.

Considera-se o método de abordagem mais indicado para a futura pesquisa, uma vez que possibilita o estudo de conceitos universais sobre o tema, conhecer e apreciar casos específicos em que a atuação do Tribunal Penal Internacional teve papel primordial na solução das controvérsias transnacionais, entre a Constituição Federal brasileira e o Tratado de Roma.

Quanto ao nível, utilizar-se-á o exploratório, tendo em vista, segundo Theodorson, “ser um estudo preliminar em que o maior objetivo é a familiarização com o fenômeno que se quer investigar.”6

O método bibliográfico como pesquisa foi o utilizado, visto que “trata-se de levantamento de toda a bibliografia já publicada, em forma de livros e revistas.”7

A pesquisa se dará através da coleta de dados baseada em referências bibliográficas, buscando solucionar questionamentos, conceituar e caracterizar os elementos do tema através do método dedutivo.

1.6 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: ESTRUTURAÇÃO DOS CAPÍTULOS

No primeiro capítulo, será abordada a diferença entre o Direito interno e o Direito Internacional, bem como a história dos Tribunais anteriores até a criação do Tribunal Penal Internacional.

5 LEONEL, Vilson; MOTTA Alexandre de Medeiros. Ciência e pesquisa. 2. ed. rev. atual. Palhoça: Unisul Virtual, 2007. p. 66.

6 PIOVESAN, Armando; TEMPORINI, Edméa Rita. Pesquisa exploratória: procedimento metodológico para o estudo de fatores humanos no campo da saúde pública. Rev. Saúde Pública, v. 29, n. 4, p. 318-25, 1995. In: ScieloSP. Disponível em: <http://www.scielosp.org/pdf/rsp/v29n4/10.pdf>. Acesso em: 2 nov. 2010. 7 MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Metodologia do trabalho científico. 6. ed. São

(14)

No segundo capítulo, será verificada a estrutura e funcionalidade do Tribunal Penal Internacional.

No terceiro capítulo, será analisada a recepção dos tratados internacionais no Direito Interno, bem como as aparentes divergências entre as normas do Estatuto de Roma e a Constituição Federal com a posterior solução desses possíveis conflitos.

(15)

2 O TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL

Neste capítulo, serão estudadas as relações entre o Direito Internacional e do Direito Nacional, os surgimentos dos tribunais ad hoc e a criação do Tribunal Penal Internacional.

2.1 O DIREITO INTERNACIONAL

Para facilitar a compreensão do assunto que será abordado neste trabalho, surge a necessidade de se fazer uma breve introdução acerca das relações entre o Direito Internacional e o Direito Nacional.

As relações entre o Direito Internacional e o Direito Nacional acarretam alguns conflitos doutrinários que decorrem da questão que consiste em se saber qual o tipo de relações existem entre si. Para alguns doutrinadores, essas ordens jurídicas são independentes, não possuindo qualquer área em comum.1

Esta posição doutrinária é resultante de três diferenças que existem nas duas ordens jurídicas, segundo Mello são elas:

A primeira diferença é de „relações sociais‟: na ordem internacional o Estado é o único sujeito de direito enquanto na ordem interna aparece o homem também como sujeito de direito.

A segunda diferença é das fontes nas duas ordens jurídicas: o Direito Interno é o resultado da vontade de um Estado, enquanto o Direito Internacional tem como fonte a vontade coletiva dos Estados, que se manifesta expressamente nos tratados-leis e tacitamente no costume internacional. [...]

A terceira diferença é relativa à estrutura das ordens jurídicas: a interna está baseada em um sistema de subordinação e a internacional na coordenação. É a comunidade internacional uma sociedade paritária.2

Para entender a diferença entre o Direito Internacional e o Direito Nacional e como se dá a sua atuação no ordenamento interno de cada País, Mello traz um conceito sobre Direito Internacional:

O Direito Internacional é a parte do Direito que cuida das relações internacionais existentes entre países ou entre pessoas de nacionalidades diferentes. O Direito Internacional tem profunda relação com a área das Relações Internacionais, servindo

1 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. 15. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. v. 1. p. 121.

2

(16)

de instrumento dessas. É por meio do Direito Internacional que as relações internacionais entre os Estados acontecem com maior segurança, e as relações privadas de caráter internacional são facilitadas.3

Importante mencionar que o Direito Internacional divide-se em duas áreas: a pública e a privada. O Direito Internacional Público trata dos interesses internacionais públicos, regulando os direitos e deveres internacionais dos Estados, dos organismos internacionais e dos indivíduos perante os Estados. Seu objetivo é regular os interesses dos países, para diminuir os conflitos e alcançar a paz mundial. Com relação ao Direito Internacional Privado, pode-se dizer que se trata do conjunto de normas reguladoras das relações de ordem privada da sociedade internacional, conjugando leis de ordenamentos jurídicos distintos e indicando a lei competente a ser aplicada. Seu objetivo é decidir a lei que será aplicada quando houver divergências entre as leis internas de dois países em questões de interesse privado.4

Assim, o Direito Internacional público auxilia, por meio de tratados, a formação do Direito Internacional Privado, como por exemplo, se dois ou mais países firmarem um tratado de comércio, essa área vai corresponder ao Direito Internacional Público, e, com base nesse tratado, se as empresas dos países envolvidos assinarem contratos e realizarem negócios, essa área vai pertencer ao Direito Internacional Privado.5

Na ordem jurídica internacional não existe autoridade superior, como ocorre com os países, que têm em seus direitos internos um poder central, denominado Constituição, que estabelece as leis e os faz respeitá-las. O Direito Internacional é regido por princípios, fontes, tratados e/ou convenções, costumes e analogias, assim, pressupõe a promulgação em comum, por meio de acordo ou de uma regulamentação, cabendo a cada Estado avaliar a dimensão do dever que lhe incumbe e as condições de sua execução.6

Os princípios do Direito Internacional servem para guiar as ações dos países no plano internacional e são divididas em três grupos:

Princípios relativos à defesa da paz mundial: renúncia à ameaça ou uso da força; solução pacífica das controvérsias; segurança coletiva; busca do desarmamento; proibição de propaganda de guerra.

Princípios relativos à cooperação entre todos os Estados e povos, independente de qualquer diferença: respeito à soberania e igualdade de direitos de todos os Estados; não – intervenção nos assuntos internos; obrigação de cooperar com todos os Estados em base equitativa. Cumprimento de boa-fé das obrigações assumidas.

3 MELLO, 2004, v. 1, p. 77. 4 Ibid., p. 78. 5 Ibid., p. 78. 6 Ibid., p. 79.

(17)

Princípios relativos ao livre desenvolvimento de todos os povos: igualdade de direitos e autodeterminação dos povos; respeito aos direitos humanos.7

O campo de atuação do Direito Internacional não se limita apenas nos espaços internacionais (alto-mar, pólo antártico ou espaço ultraterrestre), aplicando sua jurisdição no território dos países, também conhecidos no Direito Internacional como Estados. Entretanto, essa relação entre o Direito Internacional e o Direito Nacional está sujeita a conflitos de normas, tendo em vista a grande diferença entre esses dois ordenamentos jurídicos.

Portanto, o Direito Internacional e o Direito Nacional são considerados duas ordens jurídicas distintas e, quando esses dois Direitos são aplicados no mesmo território de um Estado, podem surgir eventuais conflitos. O importante é ter em mente que o Direito Internacional é um Direito em construção e não há uma Constituição Universal para governar todos os Estados.

2.2 OS PRECURSORES DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL – TRIBUNAIS AD

HOC

Neste tópico, será abordado o surgimento dos tribunais ad hoc, tais como o Tribunal Militar Internacional de Nuremberg, o Tribunal Militar Para o Extremo Oriente, o Tribunal Penal Internacional da Antiga Iugoslávia e o Tribunal Penal Internacional Para Ruanda, que precederam o Tribunal Penal Internacional.

2.2.1 Tribunal militar internacional de Nuremberg

Ao longo da história das civilizações, tem-se sido testemunhas das agressões e atrocidades cometidas contra os seres humanos. Milhões de pessoas foram e têm sido vítimas dos crimes mais bárbaros8, que ultrajam a dignidade de toda a humanidade. A impunidade de muitos dos criminosos é um precedente que contribui para a prática contínua dos crimes, que põe em risco a vida e os direitos humanos.9

7 MELLO, 2004, p. 97-101. 8

São exemplos de alguns crimes bárbaros contra a sociedade internacional: crimes de guerra, crimes de genocídio, crimes contra a humanidade e crimes de agressão.

9 MAIA, Marriele. Tribunal penal internacional: aspectos institucionais, jurisdição e princípio da complementaridade. Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p. 45.

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A Segunda Guerra Mundial, que ocorreu entre 1939 a 1945, marcou o início da conscientização global para resgatar os direitos humanos, surgindo a necessidade de criar uma instância penal internacional, de caráter permanente e com a capacidade de julgar e punir os indivíduos que cometeram os crimes mais atrozes contra a humanidade.10

Com a necessidade de estabelecer um sistema internacional de Justiça independente de considerações políticas, em 13 de janeiro de 1942, foi assinado um acordo no Palácio de Saint James, pelos representantes dos governos aliados refugiados na Inglaterra, França, Grécia, Polônia, Holanda, Tchecoslováquia, Iugoslávia, Luxemburgo e Noruega, instituindo a Comissão das Nações Unidas para Crimes de Guerra.11

Porém, a referida Comissão não havia uma estrutura adequada para a realização das investigações e um orçamento suficiente para a condução do trabalho, e confiou aos Estados a submissão de relatórios.12

Após a Segunda Guerra Mundial, os países aliados, França, Estados Unidos da América, Grã-Bretanha, Reino Unido e a União Soviética13, decidiram criar um tribunal internacional na cidade de Nuremberg, na Alemanha, com a finalidade de julgar os crimes cometidos pelos inimigos de guerra.14 Assim, em 8 de agosto de 1945, foi celebrado um acordo que ficou conhecido como a Carta do Tribunal Internacional Militar, que logo veio a ser chamado como o Tribunal de Nuremberg.15

O Tribunal de Nuremberg continha 30 artigos e teve a finalidade de punir os criminosos ligados ao regime nazista, o que significou um importante avanço para a internacionalização dos direitos humanos, pois “[...] surgiu, em reação direta às violências e barbáries do Holocausto, para processar e julgar os „grandes criminosos de guerra‟ do Eixo europeu, acusados de colaboração direta para com o regime nazista.”16

Os crimes de competência do Tribunal de Nuremberg estão tipificados em seu art. 6o. São eles: crimes contra a paz, crimes de guerra e crimes contra a humanidade.17

Mazzuoli traz, em sua obra, a definição dos crimes mencionados:

10 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. O tribunal penal internacional e o direito brasileiro. São Paulo: Premier Máxima, 2009. p. 24.

11

MAIA, 2001, p. 47. 12 Ibid., p. 47.

13 MAZZUOLI, op. cit., p. 26.

14 FERNANDES, David Augusto. Tribunal penal internacional: a concretização de um sonho. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 39.

15 Ibid., p. 47.

16 MAZZUOLI, op. cit., p. 26. 17

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a) Crimes contra a paz – planejar, preparar, incitar ou contribuir para a guerra de agressão, ou para a guerra em violação aos tratados internacionais, ou participar de um plano comum ou conspiração para a consecução de quaisquer atos de guerra; b) Crimes de guerra – violação ao direito e aos costumes de guerra, tais como assassinato, tratamento cruel, deportação de populações civis que estejam ou não em territórios ocupados, para trabalho escravo ou forçado ou para qualquer outro propósito, maus tratos ou assassinato cruel de prisioneiros de guerra ou de pessoas em alto-mar, assassinatos de reféns, pilhagem de propriedades públicas ou privadas, destruição arbitrária de cidades, vilas ou lugarejos, ou devastação injustificada por ordem militar;

c) Crimes contra a humanidade – assassinato, extermínio, escravidão, deportação ou outro ato desumano contra qualquer membro da população civil, antes ou durante a guerra, ou perseguições baseadas em critérios raciais, políticos e religiosos, na execução ou em conexão com qualquer crime de competência do Tribunal, independentemente se, em violação ou não do direito doméstico do país em que foi perpetrado.18

Importante mencionar o que diz Taquary a respeito do Tribunal de Nuremberg:

[...] que o Tribunal Militar de Nuremberg, apesar da denominação, não era formado por militares, mas por leigos. Inclusive por ter sido instituído para julgar os crimes mencionados e atender às circunstâncias resultantes da Segunda Guerra Mundial. Referia-se a fatos pretéritos e possuía a natureza jurídica de Tribunal de caráter transitório.19

O art. 7o do Estatuto do Tribunal de Nuremberg dispõe acerca da responsabilidade de certos agentes políticos.

Nesse sentido, leciona Mazzuoli:

no seu art. 7o, o Estatuto do Tribunal de Nuremberg deixou assente que a posição oficial dos acusados, como os chefes de Estado ou funcionários responsáveis em departamentos governamentais, não os livraria e nem os mitigaria de responsabilidade. O seu art. 8o, por seu turno, procurou deixar claro que o fato de „um acusado ter agido por ordem de seu governo ou de um superior‟ não o livraria de responsabilidade, o que reforça a concepção de que os indivíduos também são passíveis de responsabilização no âmbito internacional.20

Tendo em vista a possibilidade que trouxe o Tribunal de Nuremberg de punir indivíduos que exercem cargos governamentais, surgiu para o Direito Internacional uma nova era, no qual, a sociedade internacional passa a ter direito de levar a julgamento, através de seus tribunais, pessoas responsáveis pelos piores crimes cometidos contra a humanidade, deixando de existir a proteção que havia para cargos ou funções do Estado.21

Com a rendição da Alemanha, ao término da Segunda Guerra, os Estados Aliados estavam exercendo poder soberano sobre os territórios alemães ocupados e levando a

18 MAZZUOLI, 2009, p. 27. 19

TAQUARY, Eneida Orbage de Brito. Tribunal penal internacional e a emenda constitucional 45/04. Curitiba: Juruá, 2008. p. 82.

20 MAZZUOLI, op. cit., p. 28. 21

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julgamento alemães nacionais. O Tribunal indiciou 24 acusados, dos quais 22 foram processados, 12 sentenciados à morte, 3 punidos com prisão perpétua e outros condenados de 10 a 12 anos de prisão.22

Entretanto, a atuação do Tribunal não era perfeita, pois mesmo com o mecanismo de extradição previsto pelos tratados de rendição (que previam a extradição de criminosos de guerra), os italianos que cometeram violações fora de seu país não foram extraditados aos Estados que sofreram tais violações, pois foi negada a requisição de extradição dos criminosos italianos.23

O Tribunal de Nuremberg foi essencialmente político, por ter sido constituído por vencedores e também por ter dado satisfação ao sentimento de indignação da humanidade ao punir as atrocidades cometidas pelos vencidos. Contudo, apesar das falhas cometidas em sua atuação, o Tribunal de Nuremberg serviu de alicerce para os demais tribunais penais ad hoc e para o atual Tribunal Penal Internacional.24

2.2.2 Tribunal militar internacional para o Extremo Oriente (TMIEO)

Em 1o de dezembro de 1943, na Conferência do Cairo, os representantes chineses, britânicos e americanos, haviam manifestado por meio de uma declaração, a necessidade de por fim à agressão japonesa e de julgar os criminosos de guerra provenientes do Japão. Na Conferência de Potsdam, na Alemanha, de 1o de agosto de 1945, os objetivos manifestos na declaração foram atingidos, após um mês de sua ratificação, com o ato de rendição.25

Bazelaire menciona a respeito do tema e diz

[...] que no ato da rendição japonesa, em 2 de setembro de 1945, foram definidos como se dariam as prisões e o tratamento imposto aos criminosos de guerra. Concomitantemente, a Comissão de Crimes das Nações Unidas recomendou o estabelecimento de um tribunal militar internacional para julgar os crimes praticados pelos japoneses. Com base neste fato, o departamento de Estado norte-americano notificou o Comandante Supremo das Forças Aliadas, General Douglas MacArthur e oito nações (Austrália, Canadá, China, França, Reino Unido, Nova Zelândia, Países Baixos e União Soviética), para ser organizado o Tribunal militar.26

22 MAIA, 2001, p. 49. 23 Ibid., p. 49. 24 FERNANDES, 2006, p. 55-57. 25 Ibid., p. 57.

26 BAZELAIRE, Jean-Paul; CRETIN, Thierry. La justice pénale international, son evolution, son avenir: de Nuremberg à La Haye. Paris: Press Universitaires de France, 2000. p. 57-58.

(21)

Em Janeiro de 1946, o General Douglas MacArthur, que atuou como comandante-em-chefe dos Aliados, estabeleceu o Estatuto e instituiu o Tribunal Militar Internacional para o Extremo Oriente (TMIEO). A Corte era composta por Austrália, Canadá, China, França, Reino Unido, Nova Zelândia, Países Baixos e União Soviética. Na Conferência de Moscou, por decisão dos Ministros das Relações Exteriores da China, Estados Unidos, Grã-Bretanha e União Soviética, ficou estabelecido que a Sede do Tribunal seria em Tóquio.27

De acordo com Greppi:

o regulamento do Tribunal de Tóquio é de 25 de abril de 1946, tendo iniciado suas atividades em 29 de abril do mesmo ano e as encerrou em 12 de novembro de 1948. O Estatuto do Tribunal Militar Internacional para o Extremo Oriente tinha 17 artigos, contra 30 do Estatuto de Nuremberg, apesar de bastante similares, porque estava baseado nos mesmos princípios celebrados no Acordo de Londres, que havia instituído o Tribunal de Nuremberg. Tinha competência para julgar os crimes contra paz, os crimes contra as convenções da guerra e os crimes contra humanidade.28

O Tribunal de Tóquio, como ficou conhecido o Tribunal Militar Internacional para o Extremo Oriente, era composto pelas potências aliadas e vencedoras da guerra, quais sejam, Austrália, Canadá, China, Estados Unidos, Filipinas, França, Reino Unido, Países Baixos, Nova Zelândia, URSS e Índia. Este último país não participou da Segunda Guerra Mundial, mas fez parte do tribunal na condição de país neutro.29

Há que se ressaltar, no entanto, que como o Tribunal de Tóquio era formado, dirigido e presidido pelas potências vencedoras da Segunda Guerra, seus acusados acabavam sendo escolhidos por critérios políticos e, por essa razão, ter um julgamento imparcial e que respeitasse os princípios gerais de justiça seria uma utopia, pois o tribunal tinha o objetivo de infligir um castigo para seus acusados, ignorando a aplicação de uma sanção que pudesse reconduzi-los ao respeito humano.30

Desse modo, a atuação do Tribunal de Tóquio foi marcada por irregularidades e não obteve sucesso em instituir um modelo referente à jurisdição universal. Assim como o tribunal de Nuremberg, o enfoque político também prevaleceu.31

Todavia, o Tribunal Militar Internacional do Extremo Oriente, assim como o Tribunal Militar Internacional de Nuremberg, concorreu para estabelecer o princípio da

27 FERNANDES, 2006, p. 58.

28 GREPPI, Edoardo. La evolución de la responsabilidad penal individual bajo el derecho internacional. Revista Internacional de la Cruz Roja. Genebra, n. 835, p. 533, set. 1999.

29 FERNANDES, op. cit., p. 58-59. 30 TAQUARY, 2008, p. 84. 31

(22)

responsabilidade individual e para criar uma jurisdição, no âmbito internacional, que sancione de maneira independente e legalmente válida.32

Nesse sentido, afirma Maia:

O Tribunal Militar Internacional e o Tribunal Militar para o Extremo Oriente alimentaram a esperança de que, no futuro, os crimes contra os direitos humanos seriam julgados em um tribunal penal permanente das Nações Unidas, livre de pressões políticas, dotado de uma jurisdição definida e com base em uma legislação abarcando os crimes contra a humanidade.33

Destarte, os Tribunais de Tóquio e de Nuremberg serviram de base para o avanço e a estruturação do Direito Penal Internacional e, ainda, contribuíram para a origem da obrigação das Nações em respeitar os princípios de Direito Internacional, a partir da tipificação dos crimes contra a paz, de guerra e contra a humanidade.34

2.2.3 Tribunal penal internacional da antiga Iugoslávia

A história de conflito na ex-Iugoslávia começou em consequência das profundas diferenças religiosas entre os sérvios, croatas e muçulmanos, que se revezaram no domínio da região.35

A Iugoslávia foi constituída em 1929 pelo rei Alexandre, que fez um projeto de reunião das três nações, Sérvia, Croácia e Eslovênia.36

Para maior entendimento do conflito ocorrido na ex-Iugoslávia, explica Fernandes:

[...] sérvios, croatas e muçulmanos se revezaram no domínio da região, ocorrendo a miscigenação, mas também a separação, em decorrência das profundas diferenças religiosas, que afetam os demais aspectos da vida social daqueles povos. A história de conflitos nos Bálcãs, território de múltiplos povos e disputas sangrentas, vem desde a Idade Antiga.37

Em 1941, foi iniciado um processo de limpeza étnica com a invasão dos nazistas alemães na Iugoslávia. Em decorrência de uma aliança feita pelos nazistas com os croatas, começou um processo de execução e deportação de sérvios.38

32 TAQUARY, 2008, p. 86. 33 MAIA, 2001, p. 50. 34 TAQUARY, op. cit., p. 86. 35

FERNANDES, 2006, p. 68. 36 TAQUARY, op. cit., p. 86. 37 FERNANDES, op. cit., p. 68. 38

(23)

Em 1944, os alemães são expulsos da Iugoslávia pelo exército do Marechal Josep Broz Tito, que contou com a ajuda da União Soviética e do Reino Unido. O grupo comunista liderado por Tito assume o poder e durante quatro décadas, a Iugoslávia manteve-se unida e suas repúblicas conviveram em relativa harmonia.39

Após a morte do Marechal Tito, em 1980, reaparecem os conflitos que se agravam com a crise econômica em 1987.40

Segundo Apostolava;

o colapso dos regimes políticos socialistas na Europa Central e Oriental no final dos anos 80 e no começo de 90 foi acompanhado pelo nascimento de um antigo problema na região – o nascionalismo. Em pouco mais de quatro anos de guerra, a Iugoslávia multiétnica converteu-se em um cenário de ódio e morte, cujas imagens chocaram o mundo.41

Nesse sentido, assevera Fernandes:

[...] Ante esta situação e a falta de uma resposta eficaz para a solução dos problemas existentes na região, tanto por parte da Comunidade Europeia e dos Estados envolvidos até o momento, o Conselho de Segurança das Nações Unidas passou a tomar decisões e resoluções mais fortes. A partir de 1992, deixou entrever a possibilidade de adotar medidas que sancionaram diretamente os responsáveis, tendo como evidência a Resolução 764, de 13 de julho de 1992.[...].42

A resolução 764 menciona expressamente que todas as partes têm o dever de cumprir as obrigações impostas pelo Direito Internacional Humanitário, especialmente as aprovadas na Convenção de Genebra, de 12 de agosto de 1949, e quem cometer ou ordenar as violações graves destas Convenções é considerado pessoalmente responsável pelas infrações.43

Em 1993, o Conselho de Segurança da ONU, mediante a Resolução 808, cria o Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia, com competência para julgar crimes de guerra, crimes contra a humanidade e crimes de genocídios cometidos no território da Iugoslávia.44

Tendo em vista a gravidade do conflito na Iugoslávia, o tribunal foi criado através de uma resolução, com o objetivo de agilizar a sua atuação, pois a criação de um tribunal por

39 MAIA, 2001, p. 102.

40 FERNANDES, 2006, p. 68-69.

41 APOSTOLOVA, Maria Stefanova. Quem libertou o gênio? Nacionalismo e conflito étnico na ex-Iugoslávia, 1991-1995. Brasília: IPR/UnB, 1996. p. 52 apud MAIA, op. cit., p. 102-103.

42 FERNANDES, op. cit., p. 70. 43 Ibid., p. 70-71.

44

(24)

meio de um tratado poderia levar muito tempo e correria o risco dos Estados diretamente interessados não aceitarem.45

Afirma, Taquary, que

o grande marco na estrutura do Tribunal é a regra contida no art. 7o, que prevê a responsabilidade penal individual, quando dispõe que, além dos sérvios-bósnios, também os ocupantes de cargos oficiais, como chefes de Estados ou de Governo serão submetidos à jurisdição criminal do Tribunal.46

Por fim, a atuação do Tribunal da Iugoslávia serviu para desenvolver princípios de apuração dos crimes de sua competência e para responsabilizar cada indivíduo por sua infração, até mesmo quando pratica atos na qualidade de governante, ou desempenha as funções de preposto do Estado ou agindo em seu nome.47

2.2.4 Tribunal penal internacional para Ruanda

No período colonialista48, a formação dos Estados africanos colocou no mesmo território povos de etnias diferentes e historicamente rivais.49

Desde o ano de 1962, já havia refugiados dos conflitos étnicos em Ruanda, especialmente da etnia tutsi, pois fugiam da violência que seguiu com a tomada de poder pela etnia hutu, e trouxe consigo a instalação de uma ditadura. Durante duas décadas, os exilados tentaram regressar para Ruanda.50

Ao tratar da questão dos conflitos étnicos, Maia ressalta: “De fato, as imigrações forçadas, dentro e através de fronteiras, são uma das consequências mais visíveis da perseguição política e dos conflitos armados [...].”51

Em 1990, houve um processo de redemocratização que gerou uma competição pelo poder. No mesmo ano, um movimento integrado, principalmente por exilados tutsis, a Frente Patriótica do Ruanda (FRP) atacou o nordeste de Ruanda.52

45 FERNANDES, op. cit., p. 72. 46 TAQUARY, 2008, p. 87-88. 47 Ibid., p. 89.

48

WIKIPÉDIA. O período colonial começa com a expedição de Martim Afonso de Souza, em 1530, e vai até a proclamação da independência por dom Pedro I em 7 de setembro de 1822, o Brasil estava sob domínio socioeconômico e político de Portugal. Disponível em:

<http://www.wikipedia.org/wiki/Brasil_Col%C3%B4nia>. Acesso em: 7 jun. 2011. 49 MAIA, 2001, p. 106. 50 Ibid., p. 106. 51 Ibid., p. 106. 52 Ibid., p. 106.

(25)

Em 1993, foi criado pelo governo um acordo de paz com a FRP, e que foi rejeitado por radicais tanto do governo quanto do movimento rebelde. As consequências dessa rejeição foi catastrófica, pois causou uma guerra civil.53

Em 1994, tornou-se mais intensa a guerra civil, devido a um desastre aéreo em que morreram o Presidente ruandês, Juvenal Habyarimana, e o Presidente Ceyprien Ntaryamira, do Burundi. Os partidos de Habyarimana, os hutus, culparam os guerrilheiros tutsi da FRP.54

Com isso, foi estabelecido, em 8 de novembro de 1994, através da Resolução no 955 do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU), o Tribunal Penal Internacional para Ruanda, sediado em Arusha, na Tanzãnia.55

Conforme menciona Fernandes, o tribunal era competente para julgar:

[...] as pessoas responsáveis pelas graves violações de Direito Internacional Humanitário, cometidas no território de Ruanda, bem como os cidadãos ruandeses responsáveis por tais violações, cometidas em territórios dos Estados vizinhos, entre 1o de janeiro e 31 de dezembro de 1994.56

Assim como o Tribunal da Iugoslávia, o Tribunal de Ruanda, não isenta de culpa quem pratica violações na qualidade de auto-funcionário, chefe de Estado ou governo. Importante salientar que as ordens ilegais de superior hierárquico não eximem de pena o executor da ordem, no máximo poderão atenuar a pena.57

Há um diferencial na criação dos Tribunais da Iugoslávia e Ruanda, pois ambos foram constituídos pela comunidade internacional e não pelos vencedores aos vencidos em um conflito internacional.58

Entretanto, suas atuações obtiveram algumas críticas já mencionadas anteriormente, mas que merecem destaque. Uma delas diz respeito à criação desses tribunais, decorrente de resoluções do Conselho de Segurança da ONU, e não de tratados multilaterais. Este fato é apontado como uma imperfeição no procedimento, embora as resoluções do Conselho tenham sido proferidas sob da carta das nações Unidas, que por si só significou um impulso importante para se chegar a um ideal de Justiça Penal Internacional.59

Essa crítica fundamentava-se na ideia de que os tribunais internacionais ad hoc estabelecidos por resoluções, tornar-se-iam órgãos subsidiários do Conselho de Segurança da

53 MAIA, 2001, p. 106. 54 FERNANDES, 2006, p. 98. 55 Ibid., p. 99. 56 Ibid., p. 99. 57 TAQUARY, 2008, p. 90. 58 MAIA, op. cit., p. 55. 59

(26)

ONU, e para a sua aprovação não seria necessário mais que nove votos de seus quinze membros, incluídos os cinco permanentes.60

Em contra-partida, um tribunal criado a partir de um tratado poderia ser lento e incerto, podendo levar anos para sua conclusão e entrada em vigor internacional.61

Outra importante crítica diz respeito à violação do direito penal representada por esses tribunais ad hoc, pois seus juízes eram constituídos após a concretização dos fatos, e, conforme a lei, o juiz deve ser pré-constituído ao cometimento do crime. Por esta razão, países como Brasil, que aprovaram o surgimento de tribunais ad hoc, também expressaram-se favoravelmente ao estabelecimento de uma Corte Penal Internacional de caráter permanente e independente, para que, após sua entrada em vigor, fosse capaz de processar e julgar eventuais crimes.62

2.3 SURGIMENTO DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL

Tendo em vista os horrores e atrocidades cometidos na ex-Iugoslávia e Ruanda, no entender de Mazzuoli, torna-se justificável a criação de um tribunal ad hoc pelo Conselho de Segurança da ONU. Esses tribunais trouxeram uma contribuição de grande valor para a punição dos acusados que praticaram crimes bárbaros contra a humanidade, ajudando a consolidar a responsabilidade penal internacional dos indivíduos acusados, à isenção das imunidades de jurisdição para crimes definidos pelo Direito Internacional, e do não reconhecimento de ordens superiores como excludentes de responsabilidade internacional.63

No decorrer dos anos, desde a criação do Tribunal de Nuremberg até a atuação dos tribunais ad hoc, não houve um exemplo de Tribunal Penal Internacional que possuísse competência para julgar crimes que atentassem contra os direitos humanos, e que cumprisse a promessa de Nuremberg de revolucionar o Direito Internacional.64

Contudo, a sociedade internacional ansiava por um tribunal de caráter permanente, independente e imparcial, que conferisse legitimidade institucional no plano internacional. Assim, a criação e atuação dos tribunais ad hoc serviu de experiência para consolidar um

60 MAZZUOLI, 2009, p. 30. 61

FERNANDES, 2006, p. 72. 62 MAZZUOLI, op. cit., p. 32. 63 Ibid., p. 32.

64

(27)

eficaz sistema de justiça criminal internacional, que viria a se concretizar com o Tribunal Penal Internacional.65

Nesse sentido, o Tribunal Penal Internacional traçou um novo modelo de cooperação jurídica, complementando a justiça penal dos Estados que aderiram o Estatuto de Roma, sem ferir a independência e a autodeterminação dos Estados soberanos.66

Foi assim que, em 15 de junho de 1998, iniciou-se em Roma a Conferência Diplomática de Plenipotenciários das Nações Unidas, que durou cinco semanas, e teve a finalidade de constituir um tribunal internacional com jurisdição criminal permanente, dotado de personalidade jurídica.67

A conferência produziu efeitos positivos, pois o estabelecimento do Estatuto do Tribunal Penal foi aprovado por meio de tratado e contou com 120 votos favoráveis, 7 votos contrários e 21 abstenções.68

O Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional foi aprovado em julho de 1998, com sede em Haia, na Holanda.69

No dia 11 de abril de 2002, foram atingidas 60 ratificações exigidas para a entrada em vigor do Estatuto, fazendo com que o mesmo entrasse em vigor internacional em 1o de julho de 2002, data correspondente ao primeiro dia do mês seguinte ao término do período de 60 dias após a data do depósito do sexagésimo instrumento de ratificação, de aceitação, de aprovação ou de adesão junto do Secretário-Geral das Nações Unidas, nos termos do seu art. 126, § 1o.70

O Brasil assinou o tratado de Roma em 07 de fevereiro de 2000, como leciona Mazzuoli:

Em 7 de fevereiro de 2000 o governo brasileiro assinou o tratado Internacional referente ao Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, tendo sido o mesmo posteriormente aprovado pelo Parlamento brasileiro, por meio de Decreto Legislativo 112, de 6 de junho de 2002, e promulgado pelo Decreto presidencial 4.388, de 25 de setembro de 2002. O depósito da carta de ratificação brasileira se deu em 20 de junho de 2002, momento a partir do qual o Brasil já se tornou parte no respectivo tratado.71

O Estatuto de Roma entrou no ordenamento interno brasileiro com status de norma materialmente constitucional, como informa Mazzuoli:

65 MAIA, 2001, p. 123. 66 TAQUARY, 2008, p. 93. 67 FERNANDES, 2006, p. 135. 68

TAQUARY, op. cit., p. 97. 69 MAZZUOLI, 2009, p. 40. 70 Ibid., p. 38.

71

(28)

A partir de 8 de dezembro de 2004, em virtude da entrada em vigor da Emenda Constitucional 45, o Brasil passou a reconhecer formalmente a jurisdição do TPI, por meio do § 4o, acrescentado ao art. 5o da Constituição, segundo o qual: „O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão‟. O que fez essa salutar disposição constitucional de 1998 está perfeitamente apta a operar com o Direito Internacional e com o sistema internacional de proteção dos direitos humanos [...].72

A integração do Estatuto na Constituição brasileira garantiu uma primazia hierárquica no direito interno relativo à proteção dos direitos humanos.73 Portanto, o Tribunal Penal Internacional é um órgão que completará as jurisdições nacionais, quando as mesmas mostrarem-se falhas ou omissas na proteção dos direitos humanos.74

Para uma melhor compreensão dessa jurisdição internacional, no próximo capítulo, será analisada sua estrutura e funcionalidade, com a finalidade de conhecer as normas que são regidas pelo Tribunal Penal Internacional e entender a sua aplicabilidade no Direito interno brasileiro. 72 MAZZUOLI, 2009, p. 41. 73 Ibid., p. 42. 74 FERNANDES, 2006, p. 168.

(29)

3 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL

Neste capítulo, serão analisadas a estrutura e funcionalidade do Tribunal Penal Internacional, para compreender os elementos de sua composição e, em seguida, analisar seus aspectos funcionais, abordando as principais partes que compõem o seu Estatuto, com o objetivo de entender sua atuação dentro do Direito Interno dos Estados signatários, e, assim, servir de alicerce ao estudo das aparentes divergências entre os dispositivos do Estatuto de Roma e a Constituição Federal brasileira.

O Tribunal Penal Internacional foi criado por intermédio de um tratado multilateral de caráter penal, atuando de forma permanente e independente, considerado o único órgão jurisdicional que atualmente possui um alcance universal.1 Isso deve-se ao fato de que o Tribunal poderá julgar todas as pessoas de todos os Estados-partes responsáveis pelos crimes de maior gravidade com alcance internacional, como prevê o artigo 1o do Estatuto de Roma2, desse modo, o Tribunal Penal Internacional surge como uma resposta à necessidade internacional de prevenção e punição da criminalidade.3

O Estatuto do Tribunal Penal Internacional é composto de um preâmbulo e 128 artigos divididos em 13 partes.4

Maia, traz em sua obra, um mecanismo de funcionamento do Tribunal que está estruturado da seguinte forma:

a) Presidência = composta por um presidente e dois vice-presidentes, todos juízes do tribunal, eleitos pela maioria absoluta de seus pares, é responsável pela administração de todos os demais órgãos, exceto o de acusação.

b) Câmaras – divididas em:

1. Câmara de Questões Preliminares. Composta por três juízes, funcionará como órgão jurisdicional nos casos a serem definidos, no futuro corpo de regras, sobre procedimentos e prova. Sua competência vai desde a decisão de permitir uma investigação até a decisão do recebimento da denúncia.

2. Câmara de Julgamento. Este órgão jurisdicional, composto por três juízes, terá competência para o julgamento da causa e dos incidentes processuais ainda não preclusos.

1 TAQUARY, Eneida Orbage de Brito. Tribunal penal internacional e a emenda constitucional 45/04. Curitiba: Juruá, 2008. p. 101.

2

Artigo 1°- O Tribunal É criado, pelo presente instrumento, um Tribunal Penal Internacional (“o Tribunal”). O Tribunal será uma instituição permanente, com jurisdição sobre as pessoas responsáveis pelos crimes de maior gravidade com alcance internacional, de acordo com o presente Estatuto, e será complementar às jurisdições penais nacionais. A competência e o funcionamento do Tribunal reger-se-ão pelo presente Estatuto.

3

O preâmbulo do Estatuto de Roma em anexo, explica os motivos que levou a criação do Tribunal Penal Internacional.

4 A estrutura e a funcionalidade do Tribunal Penal Internacional pode ser verifica no Estatuto de Roma que está em anexo.

(30)

3. Câmara de Recurso. Composta por cinco juízes, será responsável pelo julgamento de recursos de decisões em sentido estrito e apelações.

c) Assembléia dos Estados – parte - órgão com a função de: fixar diretrizes, com o objetivo de manter o sistema penal internacional atualizado e adequado à realidade internacional, por meio do estabelecimento de normas; decidir sobre orçamento e a prerrogativa de alterar o número de juízes (18 inicialmente). A assembleia se reunirá uma vez por ano na sede da ONU, ou do Tribunal, e, para tanto, contará com um escritório permanente, para auxiliá-la com relatórios e estudos.

d) Registro – órgão administrativo. Seu titular será um oficial notário.

e) Promotoria – segundo o Estatuto, estabelecido como órgão separado do tribunal, integrará o novo sistema penal internacional, com seu arcabouço normativo sujeito á Assembleia dos Estados-partes.5

O Tribunal Penal Internacional também conta com um quadro administrativo comum para seus órgãos jurisdicionais, encarregado dos aspectos não judiciais da administração do Tribunal que exerce suas funções sob a autoridade do Presidente.6

Feita essas explanações, passa-se, então, ao estudo da funcionalidade dos órgãos que compõe o Tribunal Penal Internacional.

3.1 PRESIDÊNCIA

A Presidência, como mencionado anteriormente, é composta por um presidente e dois vice-presidentes, todos juízes do tribunal, eleitos pela maioria absoluta de seus pares.7

Sua função principal é a administração da Corte, com exceção da Procuradoria, órgão independente do Tribunal. A Presidência também tem a função de decidir o tempo que os demais magistrados vão desempenhar seus cargos em regime de dedicação exclusiva, assim como propor o aumento ou diminuição dos magistrados para o melhor funcionamento do Tribunal.8

A Presidência poderá, ainda, dispensar um magistrado ou procurador de exercer funções, quando por estes requerido, bem como retirar os privilégios e imunidades do Secretário.9

5 MAIA, Marriele. Tribunal penal internacional: aspectos institucionais, jurisdição e princípio da complementaridade. Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p. 71-72.

6

TAQUARY, 2008, p. 184. 7 MAIA, op. cit., p. 71. 8 FERNANDES, 2006, p. 211. 9

(31)

3.2 CÂMARA DE JULGAMENTO PRELIMINAR

O Tribunal Penal Internacional é dividido em três áreas: a Câmara de Questões Preliminares, a Câmara de Primeira Instância e a Câmara de Apelações.10

A Câmara de Questões Preliminares será composta por não menos de seis juízes que tenham experiência em processo penal e desempenharão a função de solucionar e dirigir as seções processuais anteriores ao juízo.11

As funções da Câmara serão exercidas por três juízes ou por um único juiz, em conformidade com o Estatuto e com as Regras de Procedimento e Prova.12

As determinações ou decisões, que a Câmara proferir, deverão ser aprovadas por maioria dos juízes que a compõem. Nos demais casos, um único juiz da Câmara de Questões Preliminares poderá exercer as funções estabelecidas no Estatuto de Roma, salvo se as Regras de Procedimento e Prova afirmarem o contrário ou a Câmara, por maioria, decida diferentemente.13

Os magistrados designados para a Câmara exercerão o cargo por um período de três anos, mas se eles estiverem trabalhando em uma causa, o prazo se estenderá até o término da causa.14

Além de outras funções previstas no Estatuto de Roma, a Câmara de Questões Preliminares poderá autorizar ao Procurador o início de uma investigação e, quando necessário, assegurar a proteção e o respeito das vítimas e testemunhas.15

Fernandes aponta a função geral da Câmara de Questões Preliminares:

Como função geral, a Câmara deverá especificar as providências e ordens necessárias aos fins da investigação, entre as quais podemos citar: a autorização para o Procurador arrecadar provas como medida preventiva (artigo 18), autorização para o Procurador reunir e examinar as provas, interrogar pessoas, solicitar a cooperação de um Estado e, caso não haja cooperação, autorizar ao Procurador realizar a investigação em um Estado-Parte.16

Cabe, também, a esta Câmara, por solicitação do Procurador, adotar as medidas necessárias para assegurar a eficiência e a integridade dos procedimentos e, em particular,

10 FERNANDES, 2006, p. 212. 11 Ibid., p. 212. 12 Ibid., p. 212. 13 Ibid., p. 212. 14 Ibid., p. 212. 15 Ibid., p. 212. 16 Ibid., p. 213.

(32)

para proteger os direitos da defesa. Também deverá tomar medidas para a preservação de provas e proteção de informações que afetem a segurança nacional de um Estado.17

Por fim, a Câmara de Questões Preliminares será encarregada de remeter todo o caso à Presidência, para posteriormente designar uma Câmara de Primeira Instância para proceder em juízo.18

3.3 CÂMARA DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

A Câmara de Primeira Instância, assim como a Câmara de Questões Preliminares, é composta por não menos de seis juízes que deverão possuir experiência na matéria processual penal e suas funções serão exercidas por três juízes e seus integrantes.19

A função principal da Câmara de Primeira Instância é velar por um julgamento justo, ágil e que se realize com pleno respeito aos direitos do acusado, bem como ter a devida consideração à proteção das vítimas e testemunhas.20

Para obter a realização dessa função, a Câmara determinará o idioma ou os idiomas que serão utilizados no julgamento, realizará consultas às partes, disponibilizará a divulgação dos documentos ou das informações que não tenham sido divulgadas anteriormente, com suficiente intervalo de tempo do julgamento, para permitir uma defesa adequada e dar leitura às imputações feitas aos acusados, tendo a certeza de que o acusado compreende a natureza das acusações.21

Fernandes cita outra função importante da Câmara, que está prevista nos artigos 64 e 65 do Estatuto de Roma:

[...] receber, proteger e ordenar a produção de provas para sustentar os argumentos do juízo. O artigo 64 enumera algumas destas funções: ordenar o comparecimento e a audição de testemunhas e a apresentação de documentos e outras provas (artigos 64 e 65), adotar medidas para a proteção do acusado, das testemunhas e das vítimas, e decidir que diligências serão realizadas de portas fechadas, por circunstâncias de especial proteção.22

Quando for necessário, a Câmara de Primeira Instância poderá assumir algumas atribuições que pertencem à Câmara de Questões Preliminares, indicadas no artigo 61, § 11

17 FERNANDES, 2006, p. 213. 18 Ibid., p. 213.

19

Ibid., p. 213.

20 Artigo 64 do Estatuto de Roma em anexo. 21 Artigo 64 do Estatuto de Roma em anexo. 22

(33)

do Estatuto de Roma. Quando julgar mais conveniente, poderá remeter questões preliminares à Câmara de Questões Preliminares.23

3.4 CÂMARA DE RECURSO

A Câmara de Recursos, também denominada Câmara de Apelações, é composta por um Presidente e outros quatros magistrados. Os juízes designados à Câmara de Recursos desempenharão o cargo unicamente nesta durante todo o seu mandato, conforme dispõe o artigo 39 do Estatuto de Roma.24

Entre as principais funções da Câmara de Recursos estão: julgar as apelações de resoluções sobre questões preliminares ditadas pela Câmara de Questões Preliminares, resolver questões relativas à jurisdição ou admissibilidade ditadas pela Câmara de Questões Preliminares ou a Câmara de Primeira Instância, dirimir controvérsias relativas ao impedimento do Promotor ou de um Promotor Adjunto, e, por fim, resolver os recursos de apelações da Câmara de Questões Preliminares e Câmara de Primeira Instância.25

3.5 PROMOTORIA

A Promotoria funciona como órgão independente da Corte, representado por um promotor e auxiliado por procuradores adjuntos, que exercerão suas funções por um período de nove anos e não poderão ser reeleitos.26

O promotor terá plena autoridade para dirigir e administrar a promotoria, inclusive o pessoal, as instalações e outros recursos. O promotor e os promotores adjuntos terão que ser de diferentes nacionalidades e exercerão seus cargos em regime de dedicação exclusiva.27

A Promotoria tem suas funções restritas, tais como: não solicita e não cumpre instruções de órgãos externos do Tribunal, é impedida de desenvolver qualquer atividade que

23 FERNANDES, 2006, p. 215. 24

Artigo 39 do Estatuto de Roma em anexo. 25 FERNANDES, op. cit., p. 216.

26 TAQUARY, 2008, p. 183. 27

(34)

possa interferir com o exercício das suas funções ou afetar a confiança na sua independência, não deverá desempenhar qualquer outra função de caráter profissional, e, por fim, não poderá participar em qualquer processo em que, por qualquer motivo, a sua imparcialidade possa ser posta em causa.28

Tem como atribuição o recebimento de denúncias e informações sobre crimes da competência do Tribunal, para examiná-las, realizar investigações e exercitar a ação penal ante a Corte, quando se fizerem necessárias.29

A Promotoria também exerce as funções de propor emendas aos Elementos do Crime, iniciar uma investigação encaminhada por um Estado-parte, ou pelo Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas, instaurar de ofício uma investigação e trabalhar em coordenação com a unidade de atenção às vítimas.30

O promotor e os promotores adjuntos terão que ter a mais alta consideração moral, uma extrema competência e uma extensa experiência prática de persecução ou julgamento de causas penais.31 Deverão, ainda, ter um excelente conhecimento e domínio de pelo menos um dos idiomas de trabalho da Corte.32

Além dos promotores adjuntos, o promotor terá a opção de nomear assessores jurídicos especializados em determinadas áreas, por exemplo, violência sexual, violência por razões de gênero e violência contra crianças.33

3.6 SECRETARIA

A Secretaria é um órgão administrativo da Corte, composta pelo secretário e por um secretário adjunto. O secretário será o principal funcionário administrativo do Tribunal e exercerá suas funções sob a autoridade do Presidente.34

Os magistrados elegerão o secretário e o secretário adjunto. O secretário exercerá suas funções por um período de cinco anos, em regime de dedicação exclusiva e poderá ser reeleito apenas uma vez.35

28 Artigo 42 do Estatuto de Roma em anexo. 29

TAQUARY, 2008, p. 183.

30 Artigos 9o, 14 e 43 do Estatuto de Roma em anexo. 31 Artigo 42 do Estatuto de Roma em anexo.

32 Os idiomas de trabalho do Tribunal Penal Internacional serão o francês e o inglês, conforme prevê o artigo 50, § 2o do Estatuto de Roma em anexo.

33 Artigo 42 do Estatuto de Roma 34 FERNANDES, 2006, p. 218. 35

(35)

O secretário adjunto cumprirá suas funções também por um período de cinco anos, ou por um período mais curto.36

A Secretaria será encarregada dos aspectos não judiciais da administração da Corte e de prestar-lhe serviços. Entre as funções essenciais da Secretaria estão: a de facilitar a proteção da confidencialidade; a de prestar assessoramento ao promotor e às Câmaras, segundo seja necessário, com respeito às questões relativas à defesa; a de proporcionar à defesa os meios adequados e necessários para o exercício de suas funções e facilitar a difusão de informações e da jurisprudência da Corte ao advogado de defesa.37

O secretário tem outra função importante, a de estabelecer uma Unidade de Vítimas e Testemunhas. Em consulta com a Promotoria, adotará medidas de proteção e dispositivos de segurança e prestará assessoria a testemunhas e vítimas que comparecerem ao Tribunal, bem como para outras pessoas que estejam ameaçadas em razão do testemunho prestado.38

A Unidade contará com pessoal especializado para atender as vítimas de traumas, incluídos os relacionados com delitos de violência sexual.39

3.7 INÍCIO DE UM PROCESSO PERANTE O TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL

Conforme o disposto no Estatuto de Roma, o Tribunal terá capacidade de iniciar sua atividade processual por denúncia de um Estado-parte, do Conselho de Segurança ou por iniciativa do Promotor.40

3.7.1 O direito de remeter um caso através de um Estado-parte

O Artigo 14 do Estatuto de Roma estabelece que qualquer Estado-parte poderá denunciar ao Promotor uma situação com indícios de ter sido cometidos um ou vários crimes sob a competência do Tribunal.41

36 FERNANDES, 2006, p. 218. 37 Ibid., p. 219. 38 Ibid., p. 219. 39 Ibid., p. 220.

40 Artigo 13 do Estatuto de Roma. 41

Referências

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