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ESPECIALIZAÇÃO EM INTEGRAÇÃO DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL À EDUCAÇÃO BÁSICA NA MODALIDADE DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E

ADULTOS

Os Jovens em cumprimento de medida socioeducativa na FASE:

realidades e expectativas quanto à profissionalização

Evelise Neumann Passos

Orientador :Profª. Dra. Carmem Maria Craidy

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FICHA CATALOGRÁFICA

_____________________________________________________________________________ P289j Passos, Evelise Neumann

Os jovens em cumprimento de medida sócioeducativa na FASE; realidades e expectativas quanto à profissionalização / Evelise Neumann Passos ; orientadora Carmem Maria Craidy. – Porto Alegre, 2009.

22 f.

Trabalho de conclusão (Especialização) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Faculdade de Educação. Programa de Pós-Graduação em Educação. Curso de Especialização em Educação Profissional integrada à Educação Básica na Modalidade Educação de Jovens e Adultos, 2009, Porto Alegre, BR-RS.

1. Educação. 2. Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos. 3. PROEJA. 4. PROEJA prisional. 5. Adolescentes – Conflito com a lei – Escolarização – Exclusão – Profissionalização. 6. Fundação de Atendimento Sócio-educativo do Rio Grande do Sul (FASE) – Unidade Porto Alegre. I. Craidy, Carmem Maria II. Título

CDU 374.7 _____________________________________________________________________________ CIP-Brasil. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação.

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Ao concluir este trabalho quero agradecer:

À minha orientadora, Profa. Dra. Carmem Maria Craidy, pelas orientações e pela paciência com as minhas demoras e ausências.

À minha mãe, que se preocupou tanto quanto eu com a finalização deste trabalho e que acredito, tem essa vitória como se também fosse sua.

Ao colega e amigo Leandro Silva Virginio, pelo apoio e ajuda na organização das minhas idéias e pela presteza incondicional.

Aos jovens internos da FASE, com os quais eu aprendo a cada dia o valor das diferenças e aos quais eu desejo um mundo mais justo, mais digno, menos violento e também menos desigual.

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(...) nascer significa ver-se submetido à obrigação de aprender. Aprender para construir-se, em um triplo processo de “hominização” (tornar-se homem), de singularização (tornar-se um exemplar único de homem), de socialização (tornar-se membro de uma comunidade, partilhando seus valores e ocupando um lugar nela). Aprender para viver com outros homens com quem o mundo é partilhado. (...) (CHARLOT, 2000, p.53).

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RESUMO

PASSOS, Evelise Neumann. Os jovens em cumprimento de medida socioeducativa na Fase: Realidades e expectativas quanto à profissionalização. Porto Alegre: Ufrgs, 2009, 21 f. Trabalho de Conclusão (Especialização em Educação Profissional Integrada à Educação Básica na Modalidade Educação de Jovens e Adultos) – Programa de Pós-Graduação em Educação. Faculdade de Educação. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2009.

Frente à possibilidade de implantação do PROEJA Prisional faz-se necessário que haja um entendimento de quem são os sujeitos a serem beneficiados com o mesmo, para além da condição de infratores. Desta forma, o presente trabalho objetiva abordar as trajetórias de escolarização e profissionalização dos jovens em conflito com a lei e que cumprem medida socioeducativa de Internação Sem Possibilidade de Atividade Externa numa Unidade da FASE de Porto Alegre, buscando compreender os sentidos que esses jovens atribuem à escolarização e à profissionalização em termos de perspectivas do presente e do futuro, sem desconsiderar seu passado que, na maioria das vezes é permeado por múltiplos processos de exclusão social, escolar e profissional.

Palavras-chave: PROEJA Prisional. Adolescentes. Conflito com a Lei. Escolarização. Exclusão. Invisibilidade. Profissionalização.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 6

2 REALIDADE ESCOLAR E MUNDO DO TRABALHO ... 8

3 INVISIBILIDADE E EXCLUSÃO... 9

4 CONHECENDO UM POUCO ESSES JOVENS ... 11

5 CONCLUSAO ... 16

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho propõe-se a pensar e buscar conhecer o sujeito que vai se beneficiar com o PROEJA Prisional, neste caso, os jovens em conflito com a lei em cumprimento de medida socioeducativa na FASE. Para tanto, é necessário que saibamos quem são eles, quais as suas experiências escolares e o que esperam de uma proposta de profissionalização, considerando suas trajetórias de vida.

Tendo-se como referência, o Documento Base do PROEJA para o Ensino Médio que propõe um programa de educação para jovens e adultos que possa atender as reais necessidades dos envolvidos e face à possibilidade de implementação do PROEJA em instituições prisionais é necessário e indispensável que se estabeleçam junto ao público beneficiado algumas diretrizes educacionais e profissionalizantes a serem seguidas.

Assim, faz-se necessário, contextualizar a vivência escolar desses jovens, advindos da escola pública que, em grande parte não estimula o processo de reflexão pessoal sobre a realidade deste aluno, não apresentando, portanto, pedagogias transformadoras ligadas à sua realidade, construindo e reproduzindo historicamente lacunas no processo de ensino-aprendizagem. Em geral, a escola não estimula o processo de entendimento sobre o mundo ao seu redor e desta maneira afasta o jovem do ambiente escolar e, consequentemente da compreensão e consciência do mundo existente, que é o de relações sociais cada vez mais complexas e desiguais.

De igual importância é a análise sobre os processos combinados de exclusão que levam esses jovens à condição de infratores associada à marginalização que, para Demo (1998) não se constitui como um fenômeno que se restringe à insuficiência de renda, mas expressa a combinação de muitas desvantagens que impedem esse excluído de pertencer à sociedade e de nela ser reconhecido como sujeito de direitos. A delinquência aparece então, como forma de denunciar várias carências e também de apontar desigualdades e injustiças no e do sistema social.

É de suma importância que tenhamos o entendimento de como os jovens veem, sentem, se formam, constroem e agem nos diversos espaços analisados, considerando-se aqui, sociedade, escola, profissionalização e mercado de trabalho.

Por fim, será traçado um fio imaginário no qual perpassará o PROEJA como uma política pública realmente eficaz e eficiente na luta contra a invisibilidade social

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desses jovens através de uma proposta não simplesmente de escolarização associada ao ensino profissionalizante, mas que, conforme Julião (2003) ajude o indivíduo a desenvolver mobilidade social, não se paralisando frente aos obstáculos encontrados e também que privilegie a busca pela formação de um cidadão consciente da realidade social e da possibilidade de mudança.

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2 REALIDADE ESCOLAR E MUNDO DO TRABALHO

São muitos os estudos e dados que nos mostram a realidade da escola pública nos tempos atuais. É uma escola que não encanta, não atrai, não seduz o imaginário jovem.

Entendendo-se que, “os processos educacionais, escolares ou não, consituem-se em práticas sociais mediadoras e formadoras da sociedade em que vivemos. São práticas sociais não-neutras.” (FRIGOTTO, 2002, p.23) não podemos deixar de pensar que a escola vem sendo cada vez mais um agravante no processo de exclusão dos indivíduos ao deixar de lado o processo de conhecimento e reconhecimento de seus alunos.

Não basta que se garanta o acesso à escola, mas é necessário garantir a permanência carregada de significados e possibilidades de mudança para tirar das sombras do esquecimento social milhões de pessoas cuja existência só é reconhecida nos quadros estatísticos de repetência e evasão.

Quanto à questão da profissionalização, é sabido que, em geral, a escola formal não estimula o processo de reflexão pessoal sobre esse aspecto, bem como não oferece informações consistentes sobre o mundo do trabalho. Essa escola vai de encontro ao que coloca Mészáros (2008), referindo-se a educar como um resgate do sentido estruturante da educação e de suas relações com o trabalho, as suas possibilidades criativas e emancipatórias.

Se as atitudes em relação ao trabalho são social e culturalmente determinadas e as pessoas são gradualmente instruídas quanto ao que podem esperar e querer do trabalho por várias agências de socialização, entre elas a família, a escola, a comunidade local e a mídia, podemos pensar que a escola, neste caso, vem excluindo o jovem também do mundo do trabalho, uma vez que não vem dando conta de suas funções.

Através de suas carências e da reprodução do modelo capitalista vigente, a escola acaba reforçando o equívoco de reduzir o trabalho, de atividade humana vital – forma de o ser humano criar e recriar seus meios de vida – a emprego, forma específica que assume dominantemente o trabalho sob o capitalismo: compra e venda de força de trabalho. (FRIGOTTO, 2004, p.181)

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O que se percebe é que o fracasso da escola reproduz-se também na questão profissional acabando por gerar uma alienação tanto de conhecimentos quanto do trabalho.

Alienar é uma palavra que vem do latim e significa transferir a outrem o seu direito de propriedade. A existência de proprietários particulares dos meios e instrumentos de produção de um lado, e de milhões de pessoas que apenas possuem sua força de trabalho para vender, de outro, produz uma situação que permite a exploração e superexploração dos trabalhadores. O trabalhador é alienado ou perde o controle sobre o produto do seu trabalho (que não lhe pertence) e do processo de produção. Transforma-se em mercadoria a força de trabalho. (FRIGOTTO, 2002, p. 17)

3 INVISIBILIDADE E EXCLUSÃO

Os adolescentes e jovens pertencentes às classes desfavorecidas e excluídas percebem e interiorizam os modelos sociais e culturais das classes sociais privilegiadas, propagadas em especial pela mídia (modo de vestir, frequência a lugares da moda, acesso à tecnologia de comunicação...) e assim, a necessidade de consumo imitativo se dissemina na tentativa de propiciar uma sensação de pertencimento.

Existe a tendência de alguns povos, sobretudo os considerados desenvolvidos, de adotarem o entendimento segundo o qual as suas sociedades centralizam a verdade em termos de costumes culturais, desenvolvimento social e econômico, etc. Essas sociedades têm dificuldade de compreender como verdade as diferenças culturais que não sejam as suas. (...) O etnocentrismo tem origem justamente na razão científica (...). É deste pensamento que nasce a concepção de dualidade envolvendo a idéia de centro e de periferia como atribuição de valor de verdade. (...) Com isto, nasce a tendência de se atribuir modelos sociais, culturais e de desenvolvimento social. A partir desta concepção, as necessidades dos grupos dominantes são absorvidas pelos setores pobres como seus (...) (BONETI, 2006, P. 21)

Na impossibilidade de gratificação imediata em termos de consumo, prazer, lazer e reconhecimento social (estimulados pela cultura de massas), devido às dificuldades de acesso e oportunidades sociais (escola, trabalho, remuneração digna, etc.), muitos jovens aderem aos apelos da criminalidade em seus diversos matizes, o que, inquestionavelmente traz benefícios materiais imediatos

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independentemente de suas consequências, passando assim da condição de vítima a de vitimizador. (SALES, 2007)

Não são necessidades biológicas que regem a ação de comprar, mas sim atos econômicos com implicações sociais. E, tais atos fazem com que nos tornemos todos diferentes e desiguais.

Adquirir mercadorias por meio da compra já define ‘quem é quem’ no universo social. A maior parte da população tem um poder de compra extremamente reduzido e alguns, para possuir o que desejam, roubam ou furtam. (COSTA, 2004, p. 77)

Conforme Sales (2007), os adolescentes gostam de ser vistos numa atitude cultural bastante em sintonia com a geração da indústria cultural, isto é, a geração midiática. Eles querem ser vistos associados à beleza, à irreverência e ao reconhecimento.

Os jovens em questão, uma vez excluídos da economia e da sociedade, acabam por ser diretamente estimulados a possuir o que não podem comprar e indiretamente incitados a se apropriarem de forma criminosa do que é levado a desejar, uma vez que os objetos de consumo lhes “agregam valor” social.

Segundo Arendt (1987), o que esses jovens tem sido, no passado e no presente são pré-cidadãos, o que condiz, senão com um processo de invisibilidade, certamente com um fenômeno de opacidade social. Assim, destacamos que tais artifícios de nosso sistema econômico, se reproduzem sutilmente e principalmente, através da mídia, que ideologicamente produz uma alienação em massa, onde o “ter” vem antes do “ser”.

Os jovens, então invisíveis, copiam os hábitos dos outros para identificarem-se com os outros, passando a valer o que eles valem para a sociedade. “Inclusão é sonho, respeito é utopia”. (SOARES, 2004, p. 148) A invisibilidade é uma carreira que começa cedo e culmina na estigmação.

Existimos para os outros, e nessa interação passamos a existir para nós mesmos. Nossa auto-imagem é então fruto também da nossa interação social, desse jogo de representações, nossa concepção de quem somos é o resultado de nossa percepção daquilo que somos (ou julgamos ser) para os outros. E assim, dá-se a unificação, pelo indivíduo, das diversas imagens que este julga lhe serem atribuídas pelos outros e é da internalização desse conjunto de imagens que emerge o modo como o individuo vê a si mesmo. (COELHO, 1999, P. 126-27)

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Com base no aqui exposto, podemos concluir que, no caso desses jovens “há uma fome mais funda que a fome, mais exigente e voraz que a física: a fome de sentido e de valor; de reconhecimento e acolhimento; fome de ser.” (SOARES, 2004, p.142)

4 CONHECENDO UM POUCO ESSES JOVENS

Segundo Carrano (2000) a juventude deve ser compreendida como uma complexidade variável: os jovens são diferentes porque diferentes são seus modos de viver, diferentes são seus espaços e tempos sociais, diferentes são suas identidades. Faz-se desta forma, de extrema importância que possamos conhecer, mesmo que parcialmente a realidade dos jovens em questão a fim de desconstituirmos o senso comum de que todos são iguais, acreditando em uma homogeneidade que não existe.

Para a coleta de informações foi utilizada a gravação de entrevistas semi-estruturadas, com dez jovens do sexo masculino (uma vez que a questão de gênero seria assunto para um trabalho a parte, devido às suas especificidades) com idades entre dezoito e vinte anos, todos com mais de dezoito meses de internação, estudantes do Ensino Médio, em uma Unidade da FASE em Porto Alegre.

A entrevista, de acordo com Minayo (1996), é o procedimento através do qual o pesquisador visa apreender o ponto de vista dos atores sociais previstos nos objetivos da pesquisa. No desenvolvimento da pesquisa, as seguintes questões surgem como objeto de estudo: escolaridade, evasão escolar, emprego, atividades empregatícias da família, conceito de emprego e profissão, experiências e interesse por profissionalização, mercado de trabalho.

Os jovens que temos são resultado de um processo educativo amplo, que ocorre no cotidiano das relações sociais, quando os sujeitos se fazem e se formam uns aos outros. Assim, apesar da aparente homogeneidade, expressam a diversidade cultural. São sujeitos que, segundo Castel (1998) são integrados pela via da exclusão como forma de pertença e, desta forma, a delinquência também aparece como uma possibilidade de identidade, o que é preocupante, pois as opções de futuro se tornam cada vez mais incertas e temerárias.

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Quanto à escolarização, estes jovens vem de um processo descontínuo, fruto de fracassos e evasão. Todos eles concluíram o Ensino Fundamental após o ingresso na FASE, evidenciando uma significativa distorção idade/série, como podemos verificar em algumas de suas falas. Podemos observar que eles apenas passaram pela escola, sem fazer parte dela.

A:“Na última escola que eu estudei, me expulsaram porque eu era do tráfico. B: “Só na 2ª série eu rodei três vezes. Fora o resto!” C: “A professora de Matemática tinha implicância comigo, daí eu não ia nas aulas.” D: “Eu nunca tive facilidade com as matérias, depois que comecei a usar drogas então...” E: “Quando eu comecei a estudar aqui na FASE foi difícil. Eu vi que não sabia mais nada! Eu acho que, na verdade, nunca tinha aprendido!”

Em se tratando da relação escola x profissionalização, a grande maioria desses jovens considera que os ensinamentos da escola são importantes para a vida em relação à conquista de um melhor futuro profissional, apesar de verbalizarem que a escola não os qualifica para exercerem uma atividade profissional.

A: “Claro que ter estudo é importante para conseguir um emprego, mas não é só isso.” B: “É importante ter estudo se o cara sabe mesmo as matérias. Se não sabe, não adianta ter estudo.” C: “Um cara que tem estudo tem mais chance do que o que não tem.” D: “A escola é importante, mas ela não ensina nenhuma profissão.” E: “Pelo menos nas escolas que eu estudei, nunca falaram sobre trabalho comigo.”

De acordo com os estudos de Pochmann (2004), a formação escolar não constitui garantia de ingresso no mundo do trabalho e nem tampouco condições de independência.

Foi após o ingresso na FASE que passaram a ter noção e acesso à profissionalização, através de cursos oferecidos pela instituição. Verbalizam que tais cursos não lhes tornam “profissionais”, mas mostram possibilidades que podem ser ampliadas no futuro.

A: “Eu já fiz curso de garçom, lanches rápidos e pintura predial aqui na FASE. Como garçom eu até me garanto.” B: “Fiz um curso de informática na FASE, mas foi pouco tempo. Sei que a informática tem muitas coisas que devemos aprender.” C: “Fiz um curso de marcenaria na FASE e gostei. Tenho vontade de fazer um curso mais completo de marcenaria e seguir a profissão.”

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As experiências de emprego desses jovens são constituídas de frágeis vínculos empregatícios, revelando certa ausência de uma história de trabalho formal. Todos tiveram alguma experiência informal de trabalho, na maioria das vezes fazendo “bicos” para conseguirem dinheiro imediato para suprir suas necessidades de consumo (drogas, moda, tecnologias...). O trabalho não fora até então fator central para esses jovens. O que sempre esteve em jogo foi a questão da visibilidade, do “ter” para “ser”, seguindo a ordem estabelecida pelo capitalismo.

A: “Trabalhei como segurança em festas. Eles pagavam na hora!” B: “Quando precisava de grana, ajudava meu pai na borracharia, mas não gosto deste trabalho.” C: “Meu tio é pedreiro, daí eu ajudava ele durante a semana para ganhar o troco do fim de semana.” D: “Fazer bico dá pouco dinheiro. Traficar rende mais.” E: “Eu até trabalhei numa lavagem de carro, mas eles pagavam pouco e só no final do mês. Aí não dá! O cara tem que roubar!” F: “A senhora acha que é bem assim conseguir um emprego? Tem muita gente precisando.”

Nenhum deles trabalhou com carteira assinada e tampouco conhecem a legislação trabalhista. Desta forma, a alienação do trabalho, sobre a qual já falamos anteriormente torna-se cada vez mais intensa.

Embora o trabalho continue mantendo o significado de obrigação, de esforço e até de sofrimento, alguns diagnósticos mostram uma outra realidade: a atitude dos jovens em relação ao emprego e trabalho aparece de forma ambivalente revelando diversos sentidos sobre o trabalho. (PAIS, 2001)

Suas expectativas e conceitos quanto à profissionalização são repletas de um sentido significativo no que se refere à constituição como sujeito, cidadão, ser social pertencente ao mundo das relações.

Mesmo percebendo que os jovens têm pouco acesso às informações ocupacionais, uma vez que vivem em um ambiente pouco estimulador a atividades profissionais especializadas, observa-se o desejo de uma profissionalização que esteja carregada de elementos de liberdade e autonomia e como forma de desconstrução da identidade marginal que lhes é atribuída. Consideram identidade profissional como parte da identidade pessoal e idealizam satisfação pessoal e prazer.

Em seus depoimentos os jovens demonstram considerar a profissionalização não primordialmente por questões econômicas e sim como direito de autonomia pessoal e dignidade.

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A: “Quem tem um curso tem legalização.” B: “A profissão é fixa, para sempre, né?”

“A profissionalização te dá um conhecimento que ninguém te tira.” C: “A profissionalização é aquilo que tu gostas. Ninguém vai procurar um curso que não gosta.” D: “Hoje em dia querem diploma para te dar emprego.” D: “Uma profissionalização deixa o cara seguro para procurar um emprego.” E: “No emprego tu estás só trabalhando. A tua profissão é aquilo que tu gostas de fazer.” F: “Profissionalização ninguém rouba. Tem que suar para conseguir.” G: “Por exemplo, se o cara tem um curso profissionalizante de elétrica de automóvel, todo mundo vai confiar no serviço dele.”

Na construção da identidade social e profissional, o ser humano é, em grande parte o que ele trabalha. Aí entra a questão da profissionalização como algo para sempre. Não se trata então, de uma recusa ao trabalho, mas que esse tenha mais sentido em suas vidas, para poderem viver uma vida com mais autonomia.

Os adolescentes vêem a profissionalização como algo que se refere ao “ser” alguém, e como algo que lhes pertence. Não almejam apenas como uma forma de inserção no mercado de trabalho, mas como uma conquista pessoal que pode levar a uma inserção na sociedade e também à constituição de sua identidade.

Para Manfredi (2005) o ato do trabalho também pode constituir-se numa relação dialética entre sujeito/objeto, que possibilita uma apropriação criadora.

Além de ser fonte de renda e subsistência, o trabalho pode ser um instrumento de realização das potencialidades individuais e fonte de prazer e criatividade.

É dada também, suma importância “(...) à capacidade de mobilizar saberes para dominar situações concretas de trabalho e transpor experiências adquiridas de uma situação a outra” (LEITE, 1996, p. 162) Não basta assim, um conhecimento superficial ou apenas prático. É necessário um aprofundamento teórico que leve a uma atividade especializada.

A: “Se a pessoa tem um curso profissionalizante ela sabe o que está fazendo, ela estudou para isso.” B: “Com um curso profissionalizante a gente resolve os problemas com mais facilidade.” C: “A pessoa que tem um curso profissionalizante não faz as coisas porque acha que é assim, ela faz porque sabe que é assim.”

Produtos da exclusão e marcados pelas injustiças sociais, os jovens anseiam uma profissionalização, mas demonstram receio quanto ao futuro. Sabem que existe grande diferença entre o que pensam ser e o que conseguirão ser realmente.

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A: “Eu queria fazer um curso, ter uma profissão, mas não sei como está o mundo lá fora.” “Tem muita gente desempregada. Quem tem um curso tem mais vantagem, mas não quer dizer que vai conseguir emprego certo.” B: “Tem gente com faculdade que não consegue emprego.” C: “O problema é que o cara estuda um monte e recebe um salário que não dá para nada. Quanto está o salário mínimo?” D: “Eu até quero fazer uma profissionalização, mas vou confessar para a senhora que a vida do crime ainda me atrai.” E: “O problema é que parece que o cara sai da FASE com um papel na testa dizendo que ele é bandido.” F: “Para eu poder ter a minha profissão tem que ser longe da minha vila. Lá ninguém mais acredita em mim, eu já aprontei muito.”

Revelam desta forma, a preocupação com a imagem que já foi construída a seu respeito e com a imobilidade da sociedade no sentido de igualdade social.

Quando solicitados a falarem sobre cursos profissionalizantes que gostariam de fazer, não surgiram muitas opções, até mesmo pela falta de orientação profissional destes jovens e pelo ambiente pobre em oportunidades de onde vem. Citaram cursos como: marceneiro, serralheiro, mecânico, padeiro, confeiteiro, pintor, informática e elétrica de automóveis. O motivo destas escolhas? Em caráter de unanimidade todos responderam que é uma profissão que eles gostam, acham legal ou tem habilidade. Rentabilidade? Não sabem e isso não interferiu na escolha. Mercado de trabalho? São profissões mais fáceis de trabalhar como autônomo.

Sobre a possibilidade de iniciarem um curso profissionalizante na FASE e concluírem após seu desligamento da instituição, os jovens acreditam que, se o curso for realmente bom e se tiver sido uma escolha deles, com certeza continuarão os estudos.

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5 CONCLUSÃO

Cabe refletirmos ao final deste trabalho sobre a ressignificação da Educação Profissional e da própria Educação Básica que devem estar baseadas numa formação diferente, que ultrapasse as meras competências para o mercado de trabalho. Trata-se de pensar que esta deve ir muito mais longe, na perspectiva de uma formação humana, que inclui, além do desenvolvimento intelectual, o cognitivo, o conhecimento cultural, social e tecnológico.

É importante perceber, portanto, que não se trata apenas de criar uma escola associada ao ensino profissional, mas sim uma escola que ajude a desenvolver potencialidades que favoreçam sua mobilidade social, não se deixando paralisar pelos obstáculos que serão encontrados na relação social: em suma, uma escola que privilegie a busca pela formação de um cidadão consciente de sua realidade social e da necessidade de mudança.

É neste contexto que se percebe, a necessidade e a importância de uma proposta como o PROEJA dentro do sistema prisional, que procure ver o indivíduo em sua integralidade, minimizando os processos de desumanização aos quais esses jovens foram e são expostos, buscando uma significação para as questões de escolarização e inserção no mundo do trabalho.

A possibilidade de implementação do PROEJA junto ao sistema prisional, incluindo-se aí a Fundação de Assistência Socioeducativa, vem ao encontro de propostas e legislações já existentes, como por exemplo:

- O SINASE (Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo), no eixo que se refere à profissionalização, prevê que o adolescente aprenda a ser, a conviver, a conhecer e a fazer, facilitando a sua convivência numa sociedade moderna. Também prevê que a escolha dos cursos profissionalizantes deve respeitar os interesses e anseios dos adolescentes e ser pertinente à demanda do mercado de trabalho.

- Por sua vez, o PEMSEIS (Programa de Execução de Medidas Sócio-Educativas de Internação e Semi-Liberdade) no item 5.5.1 diz que “A inclusão social do adolescente autor de ato infracional está em grande parte condicionada à sua capacidade de, ao sair da instituição, encontrar espaço no mercado de trabalho para produzir a sua própria sobrevivência.”

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- Também o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) garante, ou deveria garantir, em seu artigo 94, parágrafo X, que as entidades que desenvolvem programas de internação têm, entre outras, a obrigação de propiciar escolarização e profissionalização ao adolescente interno.

Conforme Frigotto (2004), por tratar-se de jovens que foram mutilados em sua existência, o caminho de volta é tortuoso, demorado e nem sempre bem sucedido. De imediato, a inclusão na escola ou a inclusão no trabalho não lhes são mais atrativas. Desta forma, os regimes socioeducativos devem constituir-se em condição que garanta o acesso do jovem às oportunidades de superação da sua condição de exclusão, bem como acesso à formação de valores positivos de participação na vida social.

Desta forma, é necessário pensarmos e acreditarmos em uma política pública que deixe de propor uma “educação pobre para os pobres” e contemple a elevação da escolaridade com profissionalização de qualidade, um programa que procure, conforme Documento Base do PROEJA, Decreto Lei nº 5840, originário do Decreto nº 5.478, de 24/06/2005

(...) formular uma proposta político-pedagógica específica, clara e bem definida para que possa atender as reais necessidades de todos os envolvidos e oferecer respostas condizentes com a natureza da educação que buscam, dialogando com as concepções formadas sobre o campo de atuação profissional, sobre o mundo do trabalho, sobre a vida. (BRASIL, 2006, p. 36)

Vislumbra-se o PROEJA prisional como uma forma de (re) inserção desses jovens no universo social, resgatando-se uma dignidade que lhes fora roubada pela sociedade capitalista e desigual onde vivemos.

(...) o que realmente se pretende é a formação humana, no seu sentido lato, com acesso ao universo de saberes e conhecimentos científicos e tecnológicos produzidos historicamente pela humanidade, integrada a uma formação profissional que permita compreender o mundo, compreender-se no mundo e nele atuar na busca de melhoria das próprias condições de vida e da construção de uma sociedade socialmente justa. A perspectiva precisa ser, portanto, de formação na vida e para a vida e não apenas de qualificação do mercado e para ele. (BRASIL, 2006, p.10)

É claro que não se trata de depositar toda a responsabilidade de igualdade e pertencimento desses jovens no PROEJA, mas de quem sabe, iniciar-se com ele um processo de mudança.

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Os sujeitos alunos deste processo não terão garantia de emprego ou melhoria material de vida, mas abrirão possibilidades de alcançar esses objetivos, além de se enriquecerem com outras referências culturais, sociais, históricas, laborais, ou seja, terão a possibilidade de ler o mundo, no sentido freireano, estando no mundo e o compreendendo de forma diferente da anterior ao processo formativo. (BRASIL, 2006, p. 36)

Como podemos perceber esses jovens vivem trabalho e escola com ambigüidade: ao mesmo tempo em que desprezam esses aspectos em detrimento ao “mundo do crime”, são jovens como quaisquer outros que, sabem da importância social das instituições escola e trabalho na vida em sociedade. Tal ambiguidade deve-se às suas experiências de exclusão vividas ao longo de suas existências e que lhes fazem encontrar caminhos aparentemente mais curtos para a sua visibilidade dentro de um ambiente social.

Daí podermos concluir sobre a importância de conhecermos os jovens envolvidos nesse processo, sabendo de suas expectativas e necessidades quanto à profissionalização, fazendo com que o PROEJA seja realmente um instrumento de inserção digna na sociedade e não apenas mais um projeto bem elaborado no papel, mas que na prática, não traz consigo um significado imbuído de possibilidades de mudança da (des) ordem já estabelecida.

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Referências

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