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HISTORY AND ANTHROPOLOGY OF PORTUGUESE TIMOR ONLINE DICTIONARY OF BIOGRAPHIES. D. Jaime Garcia Goulart o primeiro bispo da diocese de Díli

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HISTORY AND ANTHROPOLOGY OF PORTUGUESE TIMOR

ONLINE DICTIONARY OF BIOGRAPHIES

*

D. Jaime Garcia Goulart – o primeiro bispo da diocese de Díli

*

Vicente Paulino

Universidade de Lisboa

vlino78@yahoo.com

You are welcome to cite this biography, but please reference it appropriately –

for instance in the following form:

Vicente Paulino, “D. Jaime Garcia Goulart – o primeiro bispo da diocese de

Díli”, in Ricardo Roque (org.), History and Anthropology of “Portuguese

Timor”, 1850-1975. An Online Dictionary of Biographies, available at

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D. Jaime Garcia Goulart

nasceu em 10 de Janeiro de 1908, na freguesia de Candelária, Concelho de Madalena, Ponta Delgada, falecendo, por motivos de uma doença prolongada, na cidade de Ponta Delgada a 15 de Abril de 1997, com 89 anos de idade.1 Era filho de João Garcia Goulart e Maria Felizarda Goulart e parente do antigo bispo de Macau e patriarca das Índias Orientais, D. José da Costa Nunes.2

Figura 1 – D. Jaime Garcia Goulart com seu tio D. José da Costa Nunes3

Jaime Garcia Goulart sentiu-se inspirado pela vocação do seu tio José. Em 1921, com apenas 13 anos de idade, partiu juntamente com 11 rapazes açorianos para a cidade do Santo Nome de Deus de Macau, onde frequentou o Seminário de São José (ver Costa, 2007/2008: 265). Era um estudante de Teologia com estatuto especial, pois foi nomeado

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De acordo com o Boletim Eclesiástico dos Açores, nº 848 de 1997, embora muito debilitado devido ao seu estado de saúde, não hesitou em receber a visita de D. Carlos Ximenes Belo. Nesta ocasião, Ximenes Belo descreveu o antigo prelado de Timor como sendo um homem que dedicou a alma e o coração ao seu povo timorense. Cf. “Centenário de D. Jaime Garcia Goulart, primeiro Bispo de Díli” - http://www.agencia.ecclesia.pt/cgi-bin/noticia.pl?id=54614 (acedido em 4/4/2012). Há um lapso de informação sobre a data da sua morte. No documento oficial intitulado “Voto de pesar” assinado por deputados da “Assembleia Legislativa Regional da Região Autónoma dos Açores” afirma-se que esse bispo faleceu a 8 de Março de 1997 (cf. “Voto de Pesar” – http://base.alra.pt:82/Doc_Voto/VIvoto1446.pdf - acedido em 4/4/2012). Esta informação é contrária a outros documentos eclesiásticos. Segundo documentos da Igreja Católica, o bispo resignatário de Díli, D. Jaime Garcia Goulart, foi internado a 8 de Março de 1997 na clínica do Bom Jesus da Ponta Delgada, vindo a falecer nessa mesma clínica a 15 de Abril do mesmo ano.

2

Cf. http://pt.wikipedia.org/wiki/Jaime_Garcia_Goulart (acedido em 4/4/2012); consulta-se também a biografia de D. José da Costa Nunes em http://pt.wikipedia.org/wiki/Jos%C3%A9_da_Costa_Nunes (acedido em 4/4/2012).

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secretário privado de seu tio pelo então bispo de Macau.4 Digamos que Jaime Garcia Goulart era um jovem de sorte, que soube aproveitar sempre as oportunidades dadas por seu tio.

Voltou com seu tio José da Costa Nunes aos Açores para concluir os estudos de Teologia no Seminário Episcopal de Angra, cidade onde recebeu a ordenação sacerdotal a 10 de Maio de 1931. A 15 de Maio desse mesmo ano, celebrou a sua primeira missa na sua freguesia Candelária do Pico (cf. Boletim Geral das Colónias, 1946:108; Jornal Tribuna de

Macau, 4/1/2008)). Ficou alguns tempos com a família na ilha distante e, de seguida,

retomou a viagem de regresso a Macau para dedicar a sua vida sacerdotal aquela diocese, onde permaneceu até 1933. Mais tarde, foi transferido para Timor, onde em 1936 foi nomeado Superior da Missão, interinamente, em substituição do Pe. Francisco António Durão Quintão, o qual havia sido transferido para Oé-Cussi. Assim, foi nesse mesmo período que fundou o Seminário Menor de Nossa Senhora de Fátima, na Missão de Soibada5, o qual abriu as suas portas a 13 de Outubro de 1936, com 17 seminaristas. Contudo, no mesmo ano, chegaram a Timor, vindos então de Macau, dois jovens sacerdotes: Jorge Barros Duarte e Júlio Augusto Ferreira, cuja missão era substituírem os padres Jaime Garcia Goulart e Jacinto de Campos na função de docentes (Ximenes, 1967:5). Em 1937, regressou a Macau, no ano em que os batismos de adultos subiram para 1.815, mais 844 batismos de adultos do que em 1936, e em que o numero de alunos aumentou de 2.330 para 2.979 (Boletim Geral

das Colónias, 1939:139). Em 1940, voltou de novo a Timor como vigário-geral das missões,

com a verdadeira finalidade de desenvolver o projeto de missionação através dos programas de catequese e ensino.

A diocese de Díli foi erigida com base na bula papal Sollemnibus Conventionibus, de 4 de Setembro de 19406 (Cf. Belo, 2010), pelo Papa Pio XII. Até então, Timor pertencia a

4

Esta matéria encontra-se ainda em estudo, sob a tutela da investigadora e jornalista Maria Guiomar Lima que está a preparar uma obra histórica sobre o Cardeal da Costa Nunes (Correio dos Açores, 6/12/2012).

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Este Seminário Menor foi transferido em 1954 para Dare, sendo confiado aos Jesuítas em 1958. 6

A criação da diocese de Díli foi resultado de uma ‘Concordata’ e do ‘Acordo Missionário’ entre Santa Sé e a República Portuguesa, em 7 de Maio de 1940. Veja-se o documento “INTER SANCTAM SEDEM ET REMPUBLICAM LUSITANAM SOLLEMNES CONVENTIONES – CONCORDATA ENTRE A SANTA SÉ E A REPÚBLICA PORTUGUESA”, http://www.vatican.va/roman_curia/secretariat_state/archivio/documents/rc_seg-st_19400507_santa-sede-portogallo_po.html (acedido em 4/4/2012) e “INTER SANCTAM SEDEM ET REMPUBLICAM LUSITANAM SOLLEMNES CONVENTIONES – ACORDO MISSIONÁRIO ENTRE A SANTA SÉ E A REPÚBLICA PORTUGUESA” http://www.vatican.va/roman_curia/secretariat_state/archivio/documents/rc _seg-t_19400507_missioni-santa-sede-portogallo_po.html (acedido em 4/4/2012). Portanto, o acordo entre Vaticano e o governo português daquela época, ou seja, o acordo missionário entre o Estado e a Igreja, visava a partilha e a execução do conceito estratégico nacional que constava do Acto Colonial de 1930, o qual instituía, no seu artigo 24: “As missões católicas portuguesas do Ultramar, instrumentos de civilização e influência

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diocese de Macau. Por uma questão de burocracia, a recém-criada diocese foi submetida provisoriamente pro tempore ao direito da Metrópole do Arcebispo de Goa e Damão (Paulino, 2011a; cf. Seara, 1949:3), nomeando-se o padre Jaime Garcia Goulart como administrador apostólico, papel que assumiu entre 1940 e 1942.7

De acordo com o jornal “De A Voz”, citado por Boletim Geral das Colónias (1946:107), em Março de 1942, os japoneses chegaram à missão de Lahane, onde se encontrava o então administrador apostólico D. Jaime Garcia Goulart. Este foi interrogado de forma pouco digna e, devido a constante ameaça, o coronel Calligan organizou a sua fuga para Austrália, com estatuto de “refugiado de Timor”. Era uma fuga emergente e arriscada, pois, tinha sido apanhado juntamente com outros missionários pelas forças nipónicas na residência missionária da Missão de Ossu (Fernandes, 2011:131-132). Aliás, uma fuga de emergência dos missionários naquele período significaria “salvar a própria vida” em face dos perigos indesejados, como revela na seguinte passagem o Pe. Manuel Teixeira, citado por Francisco Maria Fernandes (2011:132.):

“Quando rebentou a II Guerra Mundial, o administrador apostólico ordenou que todos os missionários continuassem no seu posto. Mas quando foram fuzilados alguns sacerdotes, deu ordens para que partissem com ele para Austrália. Da Austrália, o Administrador Apostólico pediu à Santa Sé a sua resignação, declarando-se o único culpado da saída dos padres. O Papa respondeu promovendo-o a Bispo de Díli. D. Jaime voltou a Timor no fim da guerra e teve que ressuscitar a sua Diocese das cinzas de destruição”.

nacional, e os estabelecimentos de formação de pessoal para o serviço nelas e do Padroado Português, terão

personalidade jurídica e serão protegidas e auxiliadas pelo Estado, como instituições de ensino” (cf. “D. Sebastião de Resende, profeta em Moçambique”, in Biblioteca Adriano Moreira, versão online – http://bibliotecaadrianomoreira.cm-braganca.pt/PageGen.aspx?WMCM_PaginaId=27807, acedido em 4/4/2012)

7 É de salientar que tem existido um lapso de informação sobre a data de criação da diocese de Díli. Isto é, em outro documento não oficial (documento de duas páginas não assinado) intitulado “Primeiro Bispo de Díli”, publicado em 1945 (ano 1, nº245) no Boletim Geral do Ultramar, declara-se que a diocese de Díli foi criada pela

Bula Solemnibus, de 4 de Setembro de 1944, e só entrou em vigor em 18 de Janeiro de 1945, ou seja, dois dias

depois da nomeação do administrador apostólico, D. Jaime Garcia Goulart (Boletim Geral do Ultramar, 1945:112). Esta informação é muito contrária ao documento apresentado pelo serviço pastoral da diocese de Díli, na revista Seara – Boletim Eclesiástico da Diocese de Díli, do ano 1, nº 1 de 1949, e, até, ao próprio documento oficial do Vaticano.

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Contudo, o principal motivo da sua eleição para o cargo de bispo de Timor em 12 de Outubro de 19458, foi resultado do seu relatório enviado ao Vaticano, relatando em detalhe os trágicos acontecimentos que tiveram lugar em Timor. Após lido o relatório, o Vaticano declarou: “Temos aqui um bispo e um diplomata” (Medeiros, 2011). Em 18 de Outubro do mesmo ano, D. Jaime recebeu o título de “Reverência” (Seara, 1966:1), deste modo passando a ser designado de “pai e pastor” das almas timorenses convertidas ao cristianismo (Seara, 1949:6-7). A sua sagração foi efetuada em 28 de Outubro do mesmo ano, na Igreja de São Patrício do Seminário Católico de Sydney (Boletim Geral do Ultramar, 1945:111), classificando-se como uma sagração “quase nos antípodas” (Boletim Geral das

Colónias, 1946:108).

Segundo o Pe. Manuel Teixeira, alguns anos depois de ter sido eleito bispo, “D. Jaime Garcia Goulart pediu à Santa Sé a nomeação de um bispo coadjutor. Foi-lhe dado na pessoa de D. Ribeiro9, a quem D. Jaime disse à chegada: dou-lhe todos os poderes do bispo efectivo e considere-me como seu condutor” (apud Fernandes, 2011:132). Os padres Jorge Barros Duarte e Ezequiel Enes Pascoal testemunharam que D. Jaime Garcia Goulart foi um bispo de carácter extraordinário, enquanto Pe. Francisco Maria Fernandes revelou que conheceu-o quando era seminarista no Seminário de Dare e, sobretudo, trabalhou com ele no episcopado. De acordo com estes testemunhos, o bispo era uma pessoa calma e simples, dotado pela sua capacidade de persuadir os seus colegas com estilo de “bom humor” a contar as anedotas (Fernandes, 2011:135).

Em 1948, D. Jaime Garcia Goulart decidiu, juntamente com os padres Ezequiel Enes Pascoal, Jorge Barros Duarte, Jacinto António Campos, Manuel Silveira Luís, entre outros, criar o boletim de informação diocesano, cuja primeira edição se deu em Janeiro de 1949 (Paulino, 2011b:2). Para aquele ano, o cargo de diretor foi confiado ao Pe. Ezequiel Enes Pascoal (Paulino, 2011c). Surgiu, assim, a imprensa católica chamada revista Seara na colónia portuguesa de Timor.

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Ver Bishop Jaime Garcia Goulart – http://www.catholic-hierarchy.org/bishop/bgarciago.html (acedido em 4/4/2012). Foi o primeiro bispo formado no Seminário de Macau – D. Jaime Garcia Goulart, o primeiro bispo de Díli (Boletim Eclesiástico da Diocese de Macau, ano XLVIII, nº 549, pp.31-43).

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Foi nomeado por Papa Paulo VI, em 23 de Julho de 1965, coadjutor com direito a sucessão direta, do bispo de Díli, D. Jaime Garcia Goulart (A Voz de Timor, 25/7-/1965:1). O Ministro do Ultramar publicou no Diário do

Governo, uma declaração segundo a qual justificaria o tal facto histórico de nomeação como um evento

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Ao longo da sua governação eclesiástica, deu especial atenção ao serviço de missionação e formação de sacerdotes timorenses, conseguindo obter mais cristãos batizados: de 30 000 católicos batizados antes da Segunda Guerra Mundial cresceu-se para para 152.151 batizados (Fernandes, 2011:135); de igual modo, o número de alunos das escolas missionárias passou de 1500 para 8000. Na aérea da educação, mereceu-lhe particular atenção a formação de professores-catequistas (processo que havia sido iniciado anos antes por D. João Paulino de Azevedo e Castro, ao tempo bispo de Macau), e a consolidação do seminário menor de Soibada, consoante programa que apresentara no relatório intitulado “Escola de professores-catequistas – relatório referente ao ano lectivo de 1934/1935”, publicado em 1936 no Boletim Eclesiástico da Diocese de Macau (Goulart, 1936).

Pela sua dedicação total ao serviço de missionação e a glorificação da pátria portuguesa em Timor Português de então, o governo da Metrópole, através do decreto de 23 de Maio de 1964, condecorou-o com a Ordem do Infante D. Henrique. Em 26 de Fevereiro de 1967, a sua personalidade foi homenageada na Assembleia Nacional pelo deputado por Timor, Pe. Jorge Barros Duarte (A Voz de Timor, 19/2/1967:3). No mesmo ano, foi recebido juntamente com quatro sacerdotes timorenses pelo presidente da República Portuguesa (Boletim Geral do Ultramar, 1967). Este tipo de reconhecimento veio ao propósito de que o bispo de Díli defendeu sempre a visão de “conservadorismo cristo-centrista” e da “cultura enciclopédica”.

Alegando cansaço e com a saúde abalada, dirigiu uma carta de resignação à Santa Sé, em 1965, cuja proposta foi aceite (ver a carta do Papa na figura 2) e a resignação formal foi noticiada em 31 de Janeiro de 1967 (A Voz de Timor, 5/2/1967)10. De acordo com outro documento, a resignação D. Jaime Garcia Goulart do cargo de bispo não foi apenas por motivo de saúde, mas devido a outros problemas ocultos dentro da instituição missionária. Por exemplo, ao ver que o bispo coadjutor não estava satisfeito com o poder que lhe tinha sido conferido, e por esta razão, “D. Jaime Garcia Goulart resignou-se, antes que rebentasse o escândalo das desinteligências episcopais e partiu para os Açores em 1967” (cf. Fernandes, 2011:132). Talvez devido a este facto Ruy Cinatti o tenha recriminado mais tarde, como veremos em diante.

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O bispo resignado continuou a permanecer como bispo titular de Trofimiana, onde manteria tal título até 27 de Janeiro de 1971, data em que o resignou, passando a bispo emérito de Díli.

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Em todo o caso, para evitar uma crise de liderança prolongada na diocese, o Vaticano escolheu D. José Joaquim Ribeiro para suceder ‘ipso jure’ o bispo resignatário D. Jaime Garcia Goulart no sólio episcopal de Díli (A Voz de Timor, 19/2/1967:1-3), que então servia na Arquidiocese de Évora11. Grosso modo, o bispo recém-eleito apresentou formalmente a “simples saudação pastoral” a todas as autoridades coloniais e aos ilustres consulados destacados no território de Timor Português e, sobretudo, aos cristãos timorenses (A Voz de

Timor, 19/2/1967:3).

Segundo A Voz de Timor (12/3/1967:1), a despedida do bispo resignatário, D. Jaime Garcia Goulart, no aeroporto de Díli, foi uma vibrante manifestação popular com apoteose de saudade e gratidão. O prelado ficou satisfeito com a forma como o povo de Timor lhe agradeceu e, por isso, metaforicamente, dizia ele: “Ao contrário do que sucedeu com o Mestre, a minha vida de bispo de Díli instalou-se num ambiente de sexta-feira santa, mas termina numa atmosfera do domingo de ramos”. Assim sendo, deixou uma profunda angústia e saudade que o liga ao bom povo de Timor12, tanto mais que, ao longo da sua governação eclesiástica, fez algumas visitas pastorais ao interior do território (Voz de Timor, 28/11/1965), como foi o caso da sua visita “Por terras de Mena” (Pascoal, 1949).

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“Monsenhor José Joaquim Ribeiro coadjutor do bispo de Díli” (A Voz de Timor, 25/7/1969).

12 Eis as palavras pronunciadas pelo D. Jaime Garcia Goulart no ato da sua despedida da diocese timorense: “há trinta e três anos, pela primeira vez, pisei terras de Timor e tomei contacto com a sua gente. Desde então para cá, se tem vindo, dia a dia, apertando os laços de espiritual afecto, que me ligam a este bom Povo Timorense, laços que ainda mais fortemente a ele me vinculou a cruz episcopal Por isso, certamente me não levareis a mal que, na angústia deste momento, eu me ampare a alguns pensamentos de conforto e esperança. De todos o maior é o de Ter podido dotar a diocese de um seminário e de ter visto já os seus primeiros e benéficos frutos. O Reino de Deus em Timor não se dilatará nem consolidará sem numerosos e santos sacerdotes timorenses. Outro motivo de satisfação: o consolador e sempre crescente aumento da comunidade cristã. Recebi a diocese com 30 000 católicos. Entrego-a com mais de 150 000. Ainda e só mais uma reconfortante verificação: durante o meu episcopado vi subir o número de alunos das escolas missionárias de 1500 para 8000. Cessam as minhas funções de pastor directamente responsável por esta porção dilecta da Grei Cristã. Não cessam, porém, as de bispo da Igreja Católica. De algum modo continuo presente em Timor. Presente, por dever de membro do colégio Episcopal, presente por afecto e gratidão; presente nas minhas orações e nos meus sacrifícios, presente pela minha imorredoira saudade”. Cf. “Comemorações do centenário do Nascimento de D. Jaime Garcia Goulart” - http://www.agencia.ecclesia.pt/cgi-bin/noticia.pl?id=54885 (acedido em 4/4/2012).

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Figura 2 – Carta de gratidão do Papa Paulus P. P. VI. (A Voz de Timor, 5/2/1967).

Depois da sua resignação, D. Jaime Garcia Goulart, regressou aos Açores, onde chegou em Agosto de 1967, fixando-se inicialmente na cidade da Horta, na ilha do Faial, o com o “estado de saúde bastante abalado” (A Voz de Timor, 26/3/1967). Mudou-se depois para a ilha do Pico, onde, na sua freguesia natal de Candelária, dirigiu o Patronato Infantil da Casa de São José, instituição particular de solidariedade social fundada pelo seu tio cardeal D. José da Costa Nunes. Em 3 de Novembro de 1985 foi um dos concelebrantes da cerimónia de bênção da Sé Catedral de Angra após a sua reconstrução, devido aos danos causados pelo sismo de 1 de Janeiro de 1980.

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É necessário salientar que Jaime Garcia Goulart era um sacerdote culto, pois tinha dedicado muito do seu tempo à evangelização e aos estudos de história do Padroado Português no Oriente (cf. Boletim Geral do Ultramar, 1945:112). No cumprimento do seu bispado em Timor não se mostrou interessado pelos estudos antropo-etnográficos, pois vivia-se numa vida muito atarefada com os serviços relacionados a missionação, isto é, procurou-se converter mais timorenses ao cristianismo. O prelado percebeu que o povo de Timor queria abraçar a fé cristã (Oliveira, 1952:201). Devido a este facto, produziu um ou dois artigos sobre usos e costumes como se pode ver na bibliografia compilada para este projeto (coordenada por Ricardo Roque, 2011), e publicados no Boletim Eclesiástico da Diocese de Macau, os quais eu próprio consultei como uma forma de “abrir o horizonte da pesquisa”. Aí, encontra-se outros artigos de D. Jaime Garcia Goulart, publicados no mesmo Boletim Eclesiástico.

Não deixou, porém, de apoiar o governo colonial da província ultramarina de Timor através de política cooperativa. Por esta razão, penso eu, em 1964, o governador Óscar Ruas na sua entrevista concedida ao jornal A voz de Timor13, revelou que “O bispo de Díli é uma figura que se impõe pela sua bondade e pela sua inteligência. Novo ainda, trabalha com muita atividade e melhor orientação, com uma fé inabalável no futuro da raça e em todas as circunstâncias procura ser um próximo e útil colaborador do governo” (Ruas, 1946:185).

Ruy Cinatti (1948:189) elogiou a obra feita pelo D. Jaime Garcia Goulart, nos seguintes termos: “sendo pau para toda a obra de missionação e de instrução, a todos convence pelo seu poder de inteligência e preclaro bom senso e onde a obra é feita com amor tudo floresce”, acrescentando ainda que foi este bispo de Díli que lhe emprestou o livro “A Ilha Verde e Vermelha de Timor” de Alberto Osório Castro. Noutra ocasião, Cinatti teceu-lhe críticas, considerando-o de “bispo açoriano, clama: ‘… o pariu!...’ e fuma cigarros com tosse convulsa”, deste modo, alguns timorenses alcunhando-o de “bispo tossedor”14, talvez, por ter sido um grande fumador. O caso não estava só pelo seu interesse em “fumar

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A entrevista concedida ao jornal A Voz de Timor pelo governador de Timor, Óscar Ruas, foi reeditada integralmente pelo Boletim Geral das Colónias (1946, nº 253) na secção “revista de imprensa”, sob o título “Timor, Terra de Lealdade e Sofrimento”.

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Esta informação foi confirmada pela professora Sabina da Fonseca que também conheceu o bispo de Díli D. Jaime Garcia Goulart. Este não deixou de fumar cigarros todos os dias, fosse em reuniões, fosse na sua residência episcopal. O diretor Barradas de Oliveira, do “Diário de Manhã”, afirmou que o cabelo do bispo de Díli “é já um tanto ralo, sobrancelhas muito negras e fartas, grisalha a pera e o bigode curto. O prelado que está na minha frente a fumar o seu cigarro, não é a ressurreição do velho Richelieu. (…). Um bispo desportista, prática equitação, volley-ball e natação (Oliveira, 1952:199).

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cigarros” como uma forma de distrair a mente, mas piorou ainda mais “depois de ter lido o crime e castigo de ‘Dostoiévsquiu’”, “não dormiu um nico durante três horas”. Além de mais, segundo Cinatti, regressou a sua terra natal sem cumprir o que tinha prometido aos timorenses. Nas palavras de Cinatti, “O bispo emigrou para a ilha do Pico, negando aos de agora o que prometeu”, “se, por acaso Deus” (Cinatti, 1996:38-39). AComo dizia Francisco Andrade de Medeiros (2011), o “bispo picaroto” partiu com outros picarotos pelo mundo fora e regressou de novo a terra, onde viu a primeira luz do mundo e, desta vez, para ficar.

Ao celebrar o 1º centenário do nascimento do D. Jaime Garcia Goulart, o atual bispo de Díli, D. Alberto Ricardo Silva (2008) afirma que:

“Um açoriano que entrou para a história de Timor e particularmente para a história da Igreja em Timor, (…), não podia Timor Leste e a Igreja em Timor Leste estar ausente deste evento de saudade e de gratidão. Por isso, nós os bispos de Timor Leste, em nome do povo e da Igreja timorenses, (…) ousamos fazer um pedido aos habitantes do Pico e particularmente à família do Sr. Bispo D. Jaime Garcia Goulart. Logo que tivermos condições gostaríamos de trazer os restos mortais do Sr. D. Jaime para Timor Leste para repousar para sempre no meio deste povo e desta terra que ele tanto amou e pelo qual se sacrificou dando a melhor parte da sua vida. Obrigado a Deus, obrigado ao Sr. Bispo D. Jaime Garcia Goulart, obrigado a todos os missionários Açorianos que passaram por Timor, obrigado às suas famílias, obrigado à Igreja Açoriana e obrigado ao povo açoriano”.

Em um gesto de reconhecimento manifestado pelo atual bispo de Díli, D. Alberto Ricardo Silva, elogiou todos os missionários Açorianos que passaram por terras de Timor, especialmente a personagem de D. Jaime Garcia Goulart que conduziu incansavelmente a primeira diocese de Díli.

Vicente Paulino Abril de 2012

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Bibliografia do autor sobre Timor Livros:

GOULART, Jaime Garcia. 1956. Elenchus facultatum - formula A15. Imprensa Nacional de Díli, Timor.

GOULART, Jaime Garcia. 1999. Textos de D. Jaime Garcia Goulart: bispo de Dili-Timor,

1945-1967. Macau.

Artigos publicados:

GOULART, Jaime Garcia. 1932. “Fim Primário das Missões”. Boletim Eclesiástico da Diocese

de Macau, 343: 271-275.

GOULART, Jaime Garcia. 1932. “Voltará Portugal à Vanguarda Missionária?”. Boletim

Eclesiástico da Diocese de Macau, 338: 661-664.

GOULART, Jaime Garcia. 1933. “Tradição e Missiologia”. Boletim Eclesiástico da Diocese de

Macau, 347: 595-597.

GOULART, Jaime Garcia. 1936.“Escola de professores-catequistas – relatório referente ao ano lectivo de 1934/1935”. Boletim Eclesiástico da Diocese de Macau, nº 382. pp. 404.

GOULART, Jaime Garcia. 1938. “Missões de Timor”. Boletim Eclesiástico da Diocese de

Macau, nº 410, pp.810.

GOULART, Jaime Garcia. 1938. “Reorganização das missões de Timor, 1874-1878”. Boletim

Eclesiástico da Diocese de Macau, nº 411, pp.896 e nº 416, pp.242-

GOULART, Jaime Garcia. 1938. “Soibada”. Boletim Eclesiástico da Diocese de Macau, 406: 471-477.

GOULART, Jaime Garcia. 1950. “Palavras de S. Ex.ª Reverendíssima o bispo de Díli, D. Jaime Garcia Goulart”. Defesa Nacional, nº 193/194, pp.10.

GOULART, Jaime Garcia. 1958. “Lux in tenebris”. Informações, 5 de Setembro, Díli-Timor. GOULART, Jaime Garcia. 1949. “Discurso na inauguração da escola feminina de Baucau em

17-10-1949”. Crónica de Timor, nº 9.

Fontes e bibliografia citadas

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A VOZ DE TIMOR (28/11/1965), “D. Jaime Garcia Goulart, bispo da diocese de Díli em visita pastoral pelo interior da província”, nº 328, p.1.

A VOZ DE Timor (5/2/1967), “A resignação de D. Jaime Garcia Goulart”, nº 385-386, pp.1 e 4. A VOZ DE Timor (26/3/1967), “O bispo resignatário de Díli a repousar nos Açores”, nº

391-3992.

A VOZ DE TIMOR (19/2/1967), “D. José Joaquim Ribeiro sucedeu ‘Ipso Jure’ a D. Jaime Garcia Goulart no sólio episcopal de Díli”, nº 387-388, pp.1 e 3.

A VOZ DE TIMOR (19/2/1967), “A personalidade de D. Jaime Garcia Goulart focada na Assembleia Nacional”, nº 387-388, p.3.

A VOZ DE TIMOR (19/2/1967), “Simples saudação pastoral de D. José Joaquim Ribeiro – bispo da diocese de Díli”, nº 387-388, p.3.

A VOZ DE TIMOR (12/3/1967), “Foi uma vibrante e apoteose de saudade e de gratidão a despedida no aeroporto de Díli de D. Jaime Garcia Goulart”, nº 389-390, p.1 e 5. BOLETIM GERAL DO ULTRAMAR (1945), “Primeiro Bispo de Díli”, vol. 21, nº 245, pp.

111-112.

BOLETIM GERAL DAS COLÓNIAS (1946), “A odisseia do actual Bispo de Díli ou a história da sua fuga com outros missionários para a Austrália, durante a ocupação de Timor”, vol. 22, nº 252, pp.107-109.

BOLETIM ECLESIÁSTICO DA DIOCESE DE MACAU (1950), “O 1.º bispo formado no seminário de Macau : D. Jaime Garcia Goulart : 1.º bispo da diocese de Díli”, ano XLVIII, nº 549, pp.31-43

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