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Critérios de diagnóstico de demência com corpos de Lewy (DCL) na prática clínica de rotina no norte/nordeste de Portugal

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UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO ESCOLA DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO E PSICOLOGIA

Critérios de diagnóstico de demência e possível demência com corpos de Lewy (DCL) na prática clínica de rotina no norte/nordeste de Portugal

Estrela Janete Soares Pereira

Dissertação de Mestrado apresentada como parte das exigências para a obtenção do grau de Mestre em Psicologia (especialização em Psicologia Clínica)

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Critérios de diagnóstico de demência e possível demência com corpos de Lewy (DCL) na prática clínica de rotina no norte/nordeste de Portugal

Estrela Janete Soares Pereira

Trabalho realizado sob a orientação dos Professores Doutores Rosangela BERTELLI e José J.P. de BIANCHI

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Agradecimentos

À Profª Drª Rosangela Bertelli, que teve um papel fundamental para que a realização deste trabalho fosse feita de inúmeras aprendizagens profissionais e pessoais, possibilitadas por toda a sua imensa disponibilidade laboral e pós-laboral. Muito obrigada por todas as horas de empenho e reforços - que foram muitas(os) - e sempre tão prontamente e pertinentemente cedidas(os). Foi um privilégio ser orientada por si ao longo de todo este percurso.

Ao Prof. Dr. José de Bianchi.

Aos responsáveis pelas diversas instituições contatadas (Diretores Executivos, Presidentes dos Conselhos Clínicos, Presidentes dos Conselhos de Administração,

Presidentes dos Conselhos de Gerência), que autorizaram a visita às respetivas instituições, um muito obrigada.

Aos profissionais das diversas instituições visitadas (Médicos Clínicos Gerais, Médicos de Família, Médicos Neurologistas, Médicos Psiquiatras, Psicólogos), cuja prática clínica de rotina envolvia o trabalho com idosos e que assentiram à entrevista, um muito obrigada.

Tenho a agradecer também a alguns familiares e amigos que apoiaram não só a realização deste trabalho, bem como todo o caminho percorrido até aqui, que culmina com o encerrar de um ciclo:

Ao António Pereira, obrigada pelo teu sempre carinho, apoio, dedicação, conforto e disponibilidade de pai e de amigo de todas as horas e em todos os momentos. Obrigada por todo o investimento em mim.

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Ao Andrés Pereira… o “nosso” equilíbrio e o meu orgulho. A tua paz e calma harmonizam-nos. Cuidarei de ti e tu de mim como “ela” de nós e nós da lembrança “dela”! Obrigada por todo o teu apoio ao longo deste percurso.

Em Memória de Maria José Pereira Luís, minha querida mãe.

À Sílvia Oliveira… obrigada por teres estado sempre, sempre presente. Foste e és a pessoa que mais contribuiu para a conclusão de algumas “tarefas” ao longo destes cinco anos. Nunca será retribuível da minha parte tudo o que tão prontamente me ofereces-te. Obrigada por Tudo irmã, tu sabes!

À Vânia Freitas… espero que S. Lourenço não cesse a distância que levou 18 anos a conquistar. A nossa amizade e o nosso companheirismo foram e continuarão a ser muito importantes para mim. Muito obrigada por Tudo amiga!

À Joana Ramalho… tudo foi necessário para crescermos como pessoa e em amizade. A ti devo-te e agradeço-te parte destas duas aprendizagens, tu sabes! Obrigada por Tudo amiga.

Ao Martinho Gonçalves… ainda bem que te reencontrei. Na infinita possibilidade de lugares, na infinita possibilidade de tempos, nossos lugares coincidiram e deu-se o

“encontro” (R. Alves). Obrigada “particularmente” por ocupares um espaço infinitamente tão especial e fundamental nos lugares, espaços e tempos das nossas vidas em comum.

De forma não menos importante quero agradecer também ao grande amigo e irmão Richard Marques.

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Resumo

O presente estudo teve como finalidade fornecer um quadro geral dos critérios de diagnóstico de demência, particularmente de possível DCL, mais comumente utilizados na prática clínica de rotina no norte/nordeste de Portugal. Para tal, utilizou-se um roteiro estruturado de

entrevista, realizada com os profissionais da saúde, que, reconhecidamente, desempenham um papel no processo de avaliação de suspeitas de alguma forma de demência. Participaram do estudo 89 profissionais de saúde, dos setores público e privado, entre os quais 34 médicos de família e clínicos gerais, 12 neurologistas, 14 psiquiatras e 29 psicólogos. As entrevistas foram gravadas e transcritas. As respostas a cada uma das perguntas foram categorizadas, sendo cada categoria de respostas quantificada em termos da sua frequência de ocorrência. Os resultados revelaram que os médicos de família e clínicos gerais, quando diante da suspeita de alguma forma de demência, tenderam a encaminhar os pacientes para os neurologistas, os quais, por sua vez, quando referiam algum critério de diagnóstico, tenderam a referir os Critérios de Consenso para cada uma das formas de demência. Os psiquiatras tenderam a recorrer aos critérios do DSM-IV, do CID-10 e ao encaminhamento dos pacientes para os psicólogos, os quais, por sua vez, quando forneceram respostas pertinentes, tenderam a referir o DSM-IV. Relativamente aos critérios de diagnóstico de possível DCL, os neurologistas tenderam a considerar a presença de demência associada a sinais extrapiramidais e

alucinações, enquanto os psicólogos tenderam a demonstrar desconhecimento dos indicadores de possível DCL.

Palavras-chave: critérios de diagnóstico, demência com corpos de Lewy (DCL), prática clínica de rotina, Portugal

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Abstract

The present study aimed at describing the most commonly used diagnostic criteria for making the diagnosis of dementia, particularly of dementia with Lewy bodies (DLB), in routine clinical practice in the North/Northest of Portugal. A structured qualitative interview was carried out with health professionals enrolled in performing evaluations of dementia and age-related cognitive change. Participated in the study 89 health professionals, from public and private sectors, among which 34 general practitioners (GP), 12 neurologists, 14 psychiatrists, and 29 psychologists. The interviews were tape recorded and transcribed. The answers were arranged into categories and categories' occurrence were computed. The results obtained showed that GP, when suspected the presence of some form of dementia, tended to opt for the patient's referral to the neurologist. Neurologists tended to adopt diagnostic criteria developed by expert groups. Psychiatrists tended to adopt the diagnostic criteria of DSM-IV and ICD-10, and to seek information from the psychologist. Psychologists tended to adopt the diagnostic criteria of DSM-IV. When it comes to the diagnostic criteria for the diagnosis of possible DLB, neurologists tended to consider the presence of dementia associated to extrapyramidal symptoms and hallucination in general, while psychologists tended to show lack of knowledge or education on the indicators for the diagnosis of possible DLB.

Keywords: diagnostic criteria, dementia with Lewy bodies (DLB), routine clinical practice, Portugal

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Critérios de diagnóstico de demência e possível demência com corpos de Lewy (DCL) na prática clínica de rotina no norte/nordeste de Portugal

Os dois sistemas padrão utilizados para o diagnóstico de demência são “The American Psychiatric Association's Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders” (DSM) e “The World Health Organization's International Classification of Diseases” (ICD), que são basicamente similares (American Psychological Association, 2011). Em Portugal faz-se referência aos mesmos como DSM e CID, respetivamente. Ambos definem a síndrome de demência e apresentam critérios operacionais para o diagnóstico de tipos de demência, como, entre outras, a demência de Alzheimer (DA) e a demência vascular. Embora o DSM e o CID contenham critérios de diagnóstico para a demência na doença de Parkinson (DDP), não incluem critérios de diagnóstico para algumas formas importantes de demência, como a demência com corpos de Lewy (DCL) e a demência frontotemporal, e para formas mais raras, como a degeneração corticobasal ou a paralisia supranuclear progressiva. Essas patologias têm critérios de diagnóstico específicos, desenvolvidos por grupos de especialistas. Tais critérios de diagnóstico são chamados “Critérios de Consenso”, porque resultam do entendimento entre especialistas de diversos países, que se reúnem periodicamente e

harmonizam normas específicas para o diagnóstico e a gestão clínica de diferentes formas de demência (APA, 2011; McKeith et al., 2005; Neary et al., 1998).

Entre os Critérios de Consenso encontram-se o NINCDS-ADRDA (National Institute of Neurological and Communicative Disorders and Stroke - Alzheimer’s Disease and Related Disorders Association) e o NINDS-AIREN (International Workshop of the National Institute of Neurological Disorders and Stroke - Association Internationale pour la Recherche et L'Enseignement en Neurosciences) para os diagnósticos de DA e de demência vascular,

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respetivamente, e, ainda, os Consensus Criteria for Clinical and Pathologic Diagnosis of Dementia with Lewy Bodies (Clifford et al., 2011; McKeith et al., 2005; McKhann et al., 1984; Roman et al., 1993).

A DCL tem sido considerada a segunda causa mais frequente de demência

neurodegenerativa em idosos e faz parte de um espetro de doenças denominado doença com corpos de Lewy. Essas doenças neurodegenerativas compartilham a desregulação e a

aglomeração anormal de uma proteína, chamada alfa-sinucleína, que, em quantidades

normais, tem a função de proteção das células cerebrais. As manifestações clínicas da doença com corpos de Lewy incluem a DCL, a doença de Parkinson (DP) e falhas no sistema

autónomo (Bertelli, Bianchi, & Cruz, 2009; Latoo & Jan, 2008; McKeith, 2006).

As diretrizes diagnósticas recomendadas pelo Terceiro Relatório do Consortium para a DCL (McKeith et al., 2005) fazem referência aos critérios centrais para o diagnóstico de possível e provável DCL, às características essenciais, às características sugestivas e às características auxiliares, utilizadas para o diagnóstico clínico de DCL. Deste modo, os Critérios de Consenso preconizam, como características consideradas centrais, a existência de declínio cognitivo progressivo, de tal forma significativo que interfira na funcionalidade social e ocupacional normal, e de danos na memória, não ocorrendo necessariamente nos estádios iniciais de declínio cognitivo. Destacam-se, na DCL, défices ao nível da função executiva, atencional, e ao nível das funções visuoespaciais.

As características clínicas essenciais para o diagnóstico de DCL são as flutuações cognitivas, com variações na atenção e na prontidão para responder, as alucinações visuais, recorrentes, bem formadas e detalhadas, e as características espontâneas da DP. As diretrizes para o diagnóstico clínico-patológico preconizam que, destas características essenciais, a presença de duas ou mais é necessária para o diagnóstico de provável DCL, e que a presença

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de apenas uma das características essenciais é suficiente para o diagnóstico de possível DCL. No entanto, para melhorar a identificação de idosos com DCL, dado que os critérios para provável DCL são mais exigentes, adota-se o critério da presença de uma única característica essencial para o diagnóstico clínico de possível DCL (Bertelli, 2011; McKeith et al., 2005; McKeith, 2006).

Três características sugestivas (consideradas significativamente mais frequentes na DCL do que em outras formas de demência, que ocorrem de forma isolada ou em

combinação em um idoso que apresente declínio cognitivo progressivo e limitação da sua funcionalidade social e ocupacional normal), que dão suporte ao diagnóstico de DCL, são o distúrbio comportamental do sono REM (Rapid Eye Moviment), a intolerância ou grande suscetibilidade aos neuroléticos e a baixa captação de dopamina pelos gânglios ou núcleos da base. O diagnóstico clínico de provável DCL ocorre se as características sugestivas estiverem presentes com uma ou mais características essenciais. As características auxiliares para o diagnóstico, que, apesar do seu valor indicativo, constituem elementos com baixa

especificidade, são as quedas repetidas, os desmaios, as tonturas, as breves perdas de consciência, as ilusões, as alucinações em outros domínios além do visual, a apatia, a disfunção autonómica, os défices de atenção, a sonolência diurna, a relativa preservação da memória episódica, a significativa deterioração visuoespacial, a incontinência urinária, a ausência de atrofia no lobo temporal medial, conforme TC (Tomografia Computorizada) e MR (Ressonância Magnética) e a boa resposta aos inibidores de colinesterase (Bertelli, et al., 2009; McKeith, et al., 2005).

O diagnóstico de DCL é questionável, quando se está na presença de doença cerebrovascular evidente, onde há sinais neurológicos focais ou evidentes em exames de neuroimagem, ou na presença de qualquer outra doença física ou disfunção cerebral que dê

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conta total ou parcialmente do quadro clínico, ou, ainda, se as características espontâneas de DP aparecerem, pela primeira vez, num estágio de demência já avançada. Para tentar

diferenciar DCL, DP e DDP, recorre-se usualmente à análise da sequência temporal do aparecimento dos sintomas. Deste modo, para ser diagnosticada DCL, os sintomas cognitivos devem ter aparecido simultaneamente com os sintomas motores, ou dentro dos primeiros 12 meses do aparecimento destes, enquanto, para o diagnóstico de DP, apenas sintomas motores são necessários, e, para o diagnóstico de DDP, os sintomas cognitivos devem ter aparecido mais de 12 meses depois do aparecimento dos sintomas motores (McKeith, et al., 2005).

Na DCL, as flutuações cognitivas são observáveis, quando, num dia, o idoso é capaz de manter uma conversa sustentada e, no dia seguinte, está apático e com falta de atenção, podendo o seu funcionamento cognitivo alterar-se em minutos, horas, ou dias, com variações nos níveis de atenção e prontidão para responder (Bertelli, 2011). Os défices de atenção na DCL podem ser um indício clínico útil para o diagnóstico diferencial, face a outras

patologias, uma vez que esses défices geram dificuldades na capacidade de inibição cognitiva, que é significativamente diferente, comparativamente à capacidade de inibição cognitiva de idosos diagnosticados com outras patologias cognitivas, como DA, esquizofrenia e depressão (Costa, 2011).

A tolerância aos neuroléticos não exclui o diagnóstico de DCL, uma vez que, segundo McKeith et al. (2005), cerca de metade dos pacientes não reagem tão negativamente à sua administração. No entanto, a história clínica positiva de extrema suscetibilidade ao uso de neuroléticos é um forte indício de DCL. Os Critérios de Consenso para o diagnóstico de demência e, em particular, de DCL constituem-se, portanto, como ferramentas de diagnóstico extremamente importantes na diferenciação entre os sintomas comportamentais,

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processo de avaliação dessas queixas é feito tendo em atenção a individualidade (pessoa humana) e os direitos, deveres e liberdades (cidadania) do paciente com demência (APA, 2011; Bartlett & Connor, 2007; Ferman et al., 2011).

O presente estudo visa fornecer um quadro geral dos critérios de diagnóstico de demência, particularmente de possível DCL, mais comumente utilizados na prática clínica de rotina pelos profissionais de saúde no norte/nordeste de Portugal.

Método

Participantes

A amostra foi constituída por 89 profissionais de saúde, dos setores público e privado, da zona norte/nordeste de Portugal, 34 dos quais eram médicos de família ou clínicos gerais, 12 neurologistas, 14 psiquiatras e 29 psicólogos que, na sua prática clínica de rotina,

mantinham contato direto com utentes idosos e suas queixas cognitivas, comportamentais, psicológicas ou psiquiátricas.

Materiais e Procedimento

Os materiais utilizados para a recolha de dados foram roteiros de entrevista estruturados, previamente testados através de dois estudos-piloto, e um gravador.

Os responsáveis pelas várias instituições dos setores público e privado das regiões norte/nordeste de Portugal foram contatados, por carta, pelos orientadores da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, requerendo autorização para que os diversos profissionais da saúde, que reconhecidamente interviessem no processo de avaliação de mudanças no funcionamento cognitivo que frequentemente ocorrem nas últimas décadas de vida e que,

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para alguns idosos, são persistentemente progressivas, pudessem ser contatados pela investigadora e convidados a participar na entrevista. Após autorização das instituições, os profissionais de interesse foram contatados pessoalmente pela investigadora e, quando assentiram, foram entrevistados face-a-face, tal como em alguns casos de profissionais que, não tendo sido previamente contatados, por carta, mostraram interesse em participar no estudo, sem constrangimentos pessoais ou institucionais.

As entrevistas, que seguiam rigidamente os roteiros definitivos, não ultrapassavam os 10 minutos. Antes de iniciar a entrevista era pedido consentimento para a respetiva gravação áudio. Os roteiros definitivos continham questões distintas, para os diferentes grupos

profissionais.

Aos médicos de família e clínicos gerais foi colocada uma única pergunta: “Quando o(a) senhor(a) doutor(a), na prática clínica de rotina, suspeita da possibilidade de alguma forma de demência, para que especialidade encaminha esses idosos?”. Aos psiquiatras também foi colocada uma única pergunta: “Quando o(a) senhor(a) doutor(a), na prática clínica de rotina, suspeita da possibilidade de alguma forma de demência, quais são os critérios de diagnóstico que o(a) senhor(a) doutor(a) usa?”.

Aos neurologistas e aos psicólogos foram colocadas duas perguntas: 1ª) “Quando o(a) senhor(a) doutor(a), na prática clínica de rotina, suspeita da possibilidade de alguma forma de demência, quais são os critérios de diagnóstico que o(a) senhor(a) doutor(a) usa?”; 2ª) “Como é feito o diagnóstico de possível demência com corpos de Lewy?”.

Resultados

As entrevistas gravadas foram transcritas e as respostas a cada uma das perguntas foram categorizadas e, então, para cada categoria, foi determinada a frequência das

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correspondentes respostas. A Tabela 1 apresenta, distribuídas por categorias, as percentagens das respostas dos médicos de família ou clínicos gerais à questão “Quando o(a) senhor(a) doutor(a), na prática clínica de rotina, suspeita da possibilidade de alguma forma de demência, para que especialidade encaminha esses idosos?”

Tabela 1. Categorias de respostas e percentagens das respostas dos médicos de família ou clínicos gerais (entre parênteses, frequências absolutas)

__________________________________________________________________________ Categorias Neurologia Psiquiatria Psiquiatria/Neurologia impertinente/irrelevante TOTAL

% 73.5 (25) 17.7 (6) 5.9 (2) 2.9 (1) 100 (34)

___________________________________________________________________________

Os dados da Tabela 1 mostram que mais de 70% dos médicos de família/clínicos gerais, quando, na prática clínica de rotina, suspeitam da possibilidade de alguma forma de demência, optam por encaminhar o idoso especificamente para o neurologista. Apenas um profissional forneceu uma resposta à margem daquilo que foi perguntado, ou seja, uma resposta impertinente ou irrelevante (“Encaminho o idoso para o domicílio, não vale a pena… é melhor preparar o cuidador”).

A Tabela 2 apresenta, distribuídas por categorias, as percentagens das respostas dos psiquiatras à questão “Quando o(a) senhor(a) doutor(a), na prática clínica de rotina, suspeita da possibilidade de alguma forma de demência, quais são os critérios de diagnóstico que o(a) senhor(a) doutor(a) usa?”. Deverá ter-se presente que o número de

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critérios mencionados excedeu o número de inquiridos, o que era expectável, uma vez que cada inquirido tinha a possibilidade de referir mais do que um critério.

Tabela 2. Categorias de respostas e percentagens das respostas dos psiquiatras (entre parênteses, frequências absolutas)

__________________________________________________________________________ Categorias

encaminhamento impertinente/

DSM-IV psicologia CID-10 irrelevante história clínica

% 35.7 (5) 28.6 (4) 28.6 (4) 28.6 (4) 14.3 (2)

__________________________________________________________________________

Os dados da Tabela 2 mostram que 35.7% dos psiquiatras recorrem ao DSM-IV. Dos cinco psiquiatras que recorrem ao DSM-IV, três referem DSM-IV e CID-10, como critérios de diagnóstico no caso de suspeita de alguma forma de demência. Os dados da Tabela 2 mostram ainda que 28.6% dos psiquiatras, quando suspeitam da possibilidade de alguma forma de demência, optam por encaminhar o idoso para o psicólogo. Dos quatro psiquiatras que referem o encaminhamento para a psicologia, dois deles referem também a história clínica. As respostas do género “As demências, quando chegam à psiquiatria, aqui nesta região, vêm da medicina paralela…”, ou seja, respostas dadas à margem daquilo que foi perguntado, foram categorizadas como respostas impertinentes ou irrelevantes.

A Tabela 3 apresenta, distribuídas por categorias, as percentagens das respostas dos neurologistas à questão “Quando o(a) senhor(a) doutor(a), na prática clínica de rotina, suspeita da possibilidade de alguma forma de demência, quais são os critérios de

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diagnóstico que o(a) senhor(a) doutor(a) usa?”. Tal como na Tabela 2, o número de critérios apontados excedeu o número de inquiridos, pela razão já referida.

Tabela 3. Categorias de respostas e percentagens das respostas dos neurologistas (entre parênteses, frequências absolutas)

__________________________________________________________________________ Categorias impertinente/ Critérios de

irrelevante Consenso DSM-IV CID-10 NINDS-AIREN

específicos

% 41.7 (5) 33.3 (4) 25.0 (3) 25.0 (3) 8.3 (1)

__________________________________________________________________________

Os dados da Tabela 3 mostram que 41.7% das respostas fornecidas pelos neurologistas estavam à margem daquilo que foi perguntado, ou seja, eram respostas impertinentes ou irrelevantes (por exemplo “...desde as faltas de memória até às alterações da linguagem...”). A Tabela 3 mostra também que 33.3% dos neurologistas entrevistados referiram utilizar Critérios de Consenso para cada forma de demência. Dos quatro neurologistas que referiram Critérios de Consenso específicos, um médico referiu utilizar o CID-10. Os dados da Tabela 3 mostram ainda que 25% dos neurologistas referiram utilizar critérios do DSM-IV, sendo que desses três médicos, dois referiram utilizar também os critérios do CID-10. Um único neurologista referiu utilizar critérios do DSM-IV, CID-10 e NINDS-AIREN.

A Tabela 4 apresenta, distribuídas por categorias, as percentagens das respostas dos neurologistas à questão “Como é feito o diagnóstico de possível demência com corpos de

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Lewy?”. Deverá manter-se presente que o número de indicadores de possível DCL

mencionados excedeu o número de inquiridos, pois, também neste caso, cada inquirido tinha a possibilidade de referir mais do que um indicador.

Tabela 4. Categorias de respostas e percentagens das respostas dos neurologistas (entre parênteses, frequências absolutas)

__________________________________________________________________________ %

demência associada a sinais extrapiramidais 83.3 (10)

alucinações 50.0 (6)

flutuações atencionais 33.3 (4)

distúrbios do sono REM 33.3 (4)

suscetibilidade aos neuroléticos 25.0 (3)

Categorias história clínica 16.7 (2)

alucinações visuais 16.7 (2) características espontâneas da DP 16.7 (2) história de quedas 8.3 (1) demência 8.3 (1) sonolência diurna 8.3 (1) estudos de neuroimagem 8.3 (1) __________________________________________________________________________

A Tabela 4 mostra que 83.3% dos neurologistas referiram utilizar como indicador de possível DCL a presença de demência associada a sinais extrapiramidais. Dos 10

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neurologistas que referiram utilizar esse indicador, seis também referiram as alucinações, quatro também referiram as flutuações atencionais e três o distúrbio comportamental do sono REM e a suscetibilidade aos efeitos colaterais dos neuroléticos.

A Tabela 5 apresenta, distribuídas por categorias, as percentagens das respostas dos psicólogos à questão “Quando o(a) senhor(a) doutor(a), na prática clínica de rotina, suspeita da possibilidade de alguma forma de demência, quais são os critérios de diagnóstico que o(a) senhor(a) doutor(a) usa?”. Uma vez mais, o número de critérios apontados excedeu o número de inquiridos.

Tabela 5. Categorias de respostas e percentagens das respostas dos psicólogos (entre parênteses, frequências absolutas)

__________________________________________________________________________ Categorias

impertinente/

irrelevante DSM-IV CID-10 NINDS-AIREN

% 51.7 (15) 44.8 (13) 20.7 (6) 6.9 (3)

__________________________________________________________________________

A Tabela 5 mostra que 51.7% dos psicólogos deram respostas impertinentes ou irrelevantes, ou seja, respostas à margem daquilo que foi perguntado. Por exemplo: “… costumo questionar por coisas de memórias…”; “…tem a ver com as questões de discurso…”; “…tenho que ver alguns desenhos…”; “…aplicamos testes, corrigimos e vemos as pontuações…”;”…levanto as minhas suspeitas…”;”…estamos a espera de uma

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escala de ansiedade…”;”…tentamos intervir o mais cedo possível…”. A Tabela 5 mostra também que 44.8% dos psicólogos referiram que, na prática clínica de rotina, quando

suspeitam da possibilidade de alguma forma de demência, recorrem aos critérios do DSM-IV. Dos 13 psicólogos que referiram o DSM-IV, cinco também referiram o CID-10 e dois o NINDS-AIREN.

A Tabela 6 apresenta a percentagem para cada uma das categorias das respostas dos psicólogos à questão “Como é feito o diagnóstico de possível demência com corpos de Lewy?”. Tal como nas Tabelas anteriores, o número de critérios apontados excedeu o número de inquiridos.

Tabela 6. Categorias de respostas e percentagens das respostas dos psicólogos (entre parênteses, frequências absolutas)

__________________________________________________________________________ % impertinente ou irrelevante 51.7 (15) não sabe 31.0 (9) alucinações 13.8 (4)

Categorias flutuação atencional 10.4 (3)

características espontâneas da DP 10.4 (3)

suscetibilidade aos neuroléticos 6.9 (2)

CID-10 3.5 (1)

prejuízo visuoespacial 3.5 (1)

problemas de sono 3.5 (1)

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A Tabela 6 mostra que mais de metade (51.7%) dos psicólogos entrevistados, ao serem perguntados “Como é feito o diagnóstico de possível demência com corpos de Lewy?”, deram respostas impertinentes ou irrelevantes. Os exemplos “...a psicologia não faz tudo, não é? Não somos donos da verdade...”; “...costuma passar sempre, numa primeira fase, pela psicologia...”; “...nós fazemos a avaliação...”; “...uma vez por semana, chegamos ao

diagnóstico...”; “...na avaliação mais profunda...”; “...normalmente damos a

probabilidade...”; “...está inerente a alterações estruturais...”; “...corpos de Lewy já foi há bastante tempo...” ilustram respostas totalmente à margem daquilo que foi perguntado. A Tabela 6 também mostra que 31.0% dos psicólogos entrevistados declararam explicitamente não saber como é feito o diagnóstico de possível DCL, por exemplo: “...não sei...”; “...não tenho essa informação...”; “...não faço a mínima ideia...”; “...desconheço...”. As duas

categorias de respostas mais frequentes mostram que, à pergunta “Como é feito o diagnóstico de possível demência com corpos de Lewy?”, 82.7% dos psicólogos entrevistados não

referiram qualquer indicador.

A Tabela 6 mostra ainda que 13.8% dos psicólogos declararam utilizar a presença de alucinações como indicador de possível DCL. Dos quatro psicólogos, três indicaram também a presença de características espontâneas da DP e flutuação atencional e dois referiram a suscetibilidade aos neuroléticos como indicadores de possível DCL.

Discussão

O presente estudo de campo, seguindo uma abordagem descritiva, exploratória, permitiu aceder a uma perspetiva clara e realista da prática clínica de rotina de especialistas que atendem idosos com queixas cognitivas, comportamentais e psicológicas/psiquiátricas no

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norte/nordeste de Portugal relativamente à utilização de critérios de diagnóstico de demência e, especificamente, critérios de diagnóstico de possível DCL.

Ao serem entrevistados, esses especialistas implicados no processo de avaliação de mudanças no funcionamento cognitivo, que têm um papel preponderante no diagnóstico de demência, forneceram informação sobre o processo pelo qual passam os idosos, quando são evidentes queixas relativas a défices cognitivos, que podem culminar no diagnóstico de alguma forma de demência, bem como a interdisciplinaridade existente em termos de encaminhamento entre especialidades. De facto, os médicos de família ou clínicos gerais entrevistados, aquando da suspeita de alguma forma de demência, tenderam a encaminhar os idosos especificamente para a especialidade de neurologia, seguindo-se, em menor

percentagem, o encaminhamento para a especialidade de psiquiatria. Por sua vez, os psiquiatras, aquando da suspeita de alguma forma de demência, tenderam a encaminhar os idosos para a especialidade de psicologia, ilustrando que os profissionais da saúde esperam que o psicólogo esteja capacitado a dar suporte no processo de diagnóstico de queixas relativas a défices cognitivos e, em particular, de demência.

No que se refere aos critérios de diagnóstico utilizados, quando surge a suspeita de alguma forma de demência, os psiquiatras tenderam a recorrer preferencialmente ao DSM-IV, mas, também referiram o CID-10. Os dois sistemas, apesar de serem sistemas padrões utilizados para o diagnóstico de demência, que, como já foi referido, são basicamente similares, visto que ambos definem a síndrome de demência e apresentam critérios

operacionais para o diagnóstico de alguns tipos de demência, mas não para a DCL. O CID-10 descreve a demência como um espetro de perturbações crónicas progressivas, que originam limitações ocupacionais e psicossociais, devido ao comprometimento do funcionamento cortical superior em, pelo menos, um dos seguintes domínios: memória, pensamento,

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orientação, compreensão, cálculo, capacidade de aprendizagem, linguagem e julgamento. O DSM-IV apresenta critérios alternativos de diagnóstico de demência, caracterizada como um declínio significativo no funcionamento ocupacional e social, devido a danos na memória e um ou mais dos seguintes distúrbios: afasia, apraxia, agnosia ou desordem disexecutiva (American Psychiatric Association, 2000; World Health Organization, 1992).

Os critérios do CID-10, do DSM-IV e até mesmo do DSM-IV-TR, que consiste numa revisão mais recente e atualizada da anterior, têm sido amplamente criticados devido à ausência de especificidade na discriminação entre as várias formas de demência. Sendo assim, quando existe uma suspeita de demência, nenhum desses sistemas fornece critérios de diagnóstico suficientemente abrangentes para a conceptualização de condições

neurodegenerativas, como a DA, a demência vascular e a DCL. Assim, não é aceitável que o diagnóstico de possível DCL se baseie exclusivamente nestes sistemas, que poderão conduzir a formulações diagnósticas desacertadas, uma vez que a descrição clínico-patológica deste tipo de demência apenas está presente nos Consensus Criteria for Clinical and Pathologic Diagnosis of Dementia with Lewy Bodies.

De acordo com os dados recolhidos, os neurologistas, na prática clínica de rotina, perante a suspeita de alguma forma de demência, tendem a utilizar os Critérios de Consenso apropriados às diferentes formas de demência, bem como o DSM-IV e o CID-10, apesar de (ou justamente porque), nos dois últimos, existir um vazio de especificidade na discriminação entre as várias formas de demência. Portanto, ao serem encaminhados, pelos médicos de família ou clínicos gerais, para os neurologistas, os idosos parecem beneficiar da

oportunidade de uma resposta terapêutica mais bem adaptada à sua condição

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utilizam os Critérios de Consenso existentes (APA, 2011; Clifford et al., 2011; McKeith et al., 2005; McKhann et al., 1984; Neary et al., 1998; Roman et al., 1993).

Os critérios de diagnóstico são importantes e imprescindíveis meios de auxílio para a identificação fundamentada de qualquer tipo de demência e, se é certo que tanto o CID-10 como o DSM-IV preconizam critérios específicos para a síndrome de demência e critérios de diagnóstico para algumas formas de demência, também é certo que são manifestamente insuficientes para a realização de diagnósticos diferenciais adequados, quando utilizados isoladamente, sem o auxílio dos mencionados Critérios de Consenso.

Relativamente aos critérios de diagnóstico de possível DCL, os neurologistas tendem a considerar o critério de presença de demência associada aos sinais extrapiramidais (SEP). “As vias extrapiramidais são aquelas vias motoras que não passam através das pirâmides da medula oblonga. O sistema extrapiramidal consiste em vias centrais que regulam as áreas motoras do Sistema Nervoso Central, no córtex cerebral, no cerebelo, no tronco cerebral e na medula espinhal. A função primária do sistema extrapiramidal é a sintonia fina dos movimentos voluntários, no sentido de torná-los conscientemente reguláveis, em níveis mais elevados. A ausência dessa sintonia fina torna-se evidente em condições como o

parkinsonismo, em que os movimentos voluntários são prejudicados, por exemplo, pela presença de tremores e abrandamento motor” (Bertelli, et al., 2009, p. 52).

Verifica-se que, em 75% a 80% dos casos que apresentam DCL, se observam SEP, no curso da doença, mas apenas em 25% a 50% dos casos, no momento do diagnóstico, o que sugere que os SEP podem surgir ou agravar-se em consequência da administração de

neuroléticos (Bertelli et al., 2009). De facto, os SEP representam uma das características mais essenciais para o diagnóstico de possível DCL. Ao enfatizarem essa característica para o

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diagnóstico de possível DCL, percebe-se o conhecimento mais aprofundado dos médicos neurologistas relativamente à importância dos sintomas motores na DCL (Bertelli, 2011). Ao constatar-se que 83.3% das respostas fornecidas pelos médicos neurologistas à pergunta “Como é feito o diagnóstico de possível DCL?” se referiram aos SEP (associados à demência) e que 16.7% das respostas desses especialistas referiram as características

espontâneas da DP (sem referência à demência), fica claro que todos os médicos neurologistas entrevistados deram particular relevo aos sinais motores da DCL.

Outro dos critérios mais referidos, pelos neurologistas para o diagnóstico de possível DCL, foram as alucinações, sem, no entanto, especificarem em que domínio. Os Critérios de Consenso explicitam como indicador primordial para o diagnóstico de possível DCL as alucinações visuais recorrentes, bem formadas e detalhadas, que se manifestam logo no início, em 50% dos casos de DCL. As alucinações em outros domínios, que não o visual, constituem-se como características acessórias, ou seja, “characteristics that furnish added support, characteristics that may be present but that do not constitute the most important elements, characteristics which commonly occur but with lower specificity” (Bertelli, 2011, p. 64). Em outras palavras, têm baixa especificidade diagnóstica.

Outra das respostas a considerar é a referência às flutuações atencionais, como critério de diagnóstico para possível DCL. O termo flutuação remete invariavelmente para o

indicador de flutuações cognitivas ou cognição flutuante, que faz referência a um

aumento/diminuição (em termos de magnitude) nas capacidades de pensamento, ou seja, nas capacidades de processamento de informação, nas habilidades de manter um estado de alerta, de vigilância, que permita que decisões possam ser tomadas racionalmente. O termo

flutuação implica a existência de episódios durante os quais o indivíduo apresenta um pensamento desorganizado, um estado de sonolência extrema durante o dia, um discurso

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incoerente e fica temporariamente incapacitado para executar tarefas que são absolutamente familiares. Esses episódios acima são intercalados com episódios em que o indivíduo apresenta um melhor funcionamento cognitivo, melhor discurso e estado de alerta, de vigilância ou, simplesmente, retorna ao seu funcionamento cognitivo, discurso e estado de alerta normal ou quase normal.

As flutuações atencionais referidas (33.3% das respostas) pelos neurologistas aludem aos altos e baixos (flutuação) em termos do estado de alerta, de vigilância e de capacidade de pensamento dos indivíduos com DCL. Essas flutuações manifestam-se em comportamentos do tipo quedas, sonolência, défice de atenção, pensamento desorganizado, níveis de

consciência alterados e problemas de comunicação.

Os neurologistas (33.3% das respostas) fazem também referência à presença de alterações do comportamento durante o sono REM ou, em outras palavras, distúrbios comportamentais do sono REM, como um dos indicadores para o diagnóstico de possível DCL. Esse distúrbio, considerado uma das características sugestivas de DCL, quando associada às três características primordiais (alucinações visuais, flutuação cognitiva e características espontâneas da DP), melhora a precisão do diagnóstico, verificando-se um aumento considerável da sensibilidade dos critérios de diagnóstico (Ferman et al., 2011). A sensibilidade é definida como a proporção de pessoas com uma doença, que são realmente diagnosticadas como doentes. É possível definir a sensibilidade de, por exemplo, um

determinado indicador de possível DCL, como a sua capacidade de identificar os indivíduos doentes ou, em outras palavras, a probabilidade de um diagnóstico ser positivo, dado que o indivíduo é doente. Especificidade, por outro lado, é definida como a proporção de pessoas sem a doença, que realmente são diagnosticadas como saudáveis ou com outra doença qualquer. É assim possível definir a especificidade de, por exemplo, um determinado

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indicador de possível DCL, como a capacidade desse indicador de identificar o indivíduo saudável ou com outra doença qualquer, ou, em outras palavras, a probabilidade de um diagnóstico ser negativo, dado que o indivíduo é saudável ou tem outra doença qualquer (Loong, 2003).

Ferman et al. (2011) avaliaram o valor potencial do indicador distúrbios do sono REM no processo de diagnóstico de DCL e verificaram que a sua inclusão aumentava seis vezes a probabilidade de confirmação da presença de DCL na autópsia, ou seja, esse indicador apresenta elevada sensibilidade diagnóstica de DCL.

Apenas 25% das respostas dos médicos neurologistas indicavam a extrema

suscetibilidade dos indivíduos com DCL aos neuroléticos. O conhecimento desse indicador é extremamente importante, não apenas para o processo de diagnóstico diferencial, mas, principalmente, porque a gestão farmacológica da DCL é essencial, já que esses indivíduos reagem bem aos inibidores de colinesterase (que aumentam a disponibilidade de acetilcoline para neurotransmissão), mas sofrem os efeitos colaterais das drogas que normalmente são utilizadas para tratar as condições psicóticas, quando um efeito calmante é desejado

(antipsicóticos ou neuroléticos). Quando tratados com essas drogas, mesmo em baixas doses, os indivíduos que não apresentam SEP ficam extremamente suscetíveis de virem a

desenvolvê-los (Bertelli, Raposo, & Fernandes, 2007).

A Tabela 7 apresenta os indicadores para o diagnóstico de possível DCL, segundo os Consensus Criteria for Clinical and Pathologic Diagnosis of Dementia with Lewy Bodies (McKeith et al., 2005).

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Tabela 7. Indicadores diagnósticos de possível DCL

_________________________________________________________________________ 1) Presença de UMA das seguintes características essenciais:

alucinações visuais flutuação cognitiva

características espontâneas da DP

_________________________________________________________________________ OU

na ausência de qualquer uma das características acima

________________________________________________________________________ 2) UMA OU MAIS das seguintes características sugestivas:

distúrbio comportamental do sono REM suscetibilidade extrema aos antipsicóticos baixa captação de dopamina pelos núcleos da base

_________________________________________________________________________

As entrevistas aos psicólogos, em contrapartida, envidenciaram que 82.7% dos entrevistados não conseguiam fornecer quaisquer indicadores para o diagnóstico de possível DCL. Responderam à margem da pergunta ou simplesmente declararam desconhecer o assunto. Dos 29 psicólogos entrevistados, apenas quatro fizeram alusão às alucinações, apesar de, tal como os neurologistas, não diferenciarem em que domínio. Apesar de os médicos inserirem os psicólogos no processo de diagnóstico das queixas cognitivas, comportamentais, psicológicas ou psiquiátricas dos pacientes idosos, por exemplo, como já referido,

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avaliação do psicólogo, esses demonstraram falta de preparação nesse domínio da prática clínica.

Mais de metade (51.7%) das respostas dadas pelos psicólogos inquiridos à pergunta “Quando o(a) senhor(a) doutor(a), na prática clínica de rotina, suspeita da possibilidade de alguma forma de demência, quais são os critérios de diagnóstico que o(a) senhor(a)

doutor(a) usa?” evidenciaram total desconhecimento de critérios adequados. Um dos entrevistados, por exemplo, referiu que “…aplicamos testes, corrigimos e vemos as

pontuações…”, ou seja, uma resposta que demonstra ignorância completa das obrigações do psicólogo que participa nas avaliações de demência e de mudanças cognitivas associadas ao envelhecimento.

Esses psicólogos, mesmo que o seu papel seja o de, única e exclusivamente, “… aplicar testes, corrigir e ver as pontuações…” deveriam ter a responsabilidade de estar familiarizados com a nomenclatura diagnóstica em vigor e com os critérios de diagnóstico específicos. A ausência de compreensão, relativamente às definições das síndromes e de como essas são diagnosticadas, impede o desenvolvimento de planos de avaliação das queixas, das suspeitas e de como fornecer feedback a outros profissionais da saúde, aos próprios doentes e aos seus familiares (Bartlett & Connor, 2007).

Além disso, a participação no processo de diagnóstico diferencial exige conhecimento de uma ampla faixa de condições médicas e psicológicas, que podem afetar o funcionamento cognitivo do indivíduo, e discernimento das tendências gerais e das diferenças individuais que caracterizam o envelhecimento cognitivo saudável e patológico (Bertelli, 2011). Os critérios de diagnóstico e a respetiva nomenclatura evoluem, como consequência dos avanços clínicos e científicos, por isso o psicólogo tem obrigação de se atualizar e de manter um elevado grau de competência. Os profissionais entrevistados, conforme já referido, eram

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considerados como aqueles que, reconhecidamente, intervinham no processo de avaliação de mudanças no funcionamento cognitivo, que, frequentemente, ocorrem nas últimas décadas de vida, e que para alguns idosos se apresentam como persistentemente progressivas. No

entanto, esses psicólogos não demonstraram possuir a expertise exigida pela contribuição que lhes cabia assegurar.

Uma primeira limitação do presente estudo foi o processo moroso no contato com os responsáveis das diversas instituições da saúde, em termos de obtenção de concordância e receção das respostas às solicitações feitas. Uma segunda limitação do estudo foi a relutância de muitos profissionais da saúde em receber a investigadora. Essas duas limitações acabaram por restringir a amostra a apenas 89 profissionais da saúde.

Os resultados aqui obtidos permitem concluir que a necessidade pública de psicólogos profissionais competentes é urgente. Os défices de formação evidenciados por muitos dos profissionais da saúde inquiridos e, principalmente pelos psicólogos, representam um claro desafio para as Universidades que os preparam para a prática profissional. Uma das

conclusões mais importantes deste estudo de campo é uma questão há muito levantada por Peterson (2006, p. 50): “Suppose we abandon the illusion that most graduates...in psychology will become productive researchers. Suppose we accept the fact that the interests of many people entering the field lie in practice rather than research and that many will enter jobs that impose high demands for competent professional service but offer little opportunity for research. How can we educate those people in the most effective way?”

Os resultados obtidos evidenciaram que, em termos de preparação para o atendimento aos idosos com queixas cognitivas, comportamentais, psicológicas ou psiquiátricas e

suspeitas de doenças neurodegenerativas associadas ao envelhecimento patológico, os neurologistas são os profissionais da saúde que melhor acompanham a evolução do

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conhecimento e, consequentemente, oferecem uma prática atualizada. Apesar disso, mostraram algumas lacunas no conhecimento específico necessário para o diagnóstico de DCL e, portanto, no conhecimento exigido para o processo de diagnóstico diferencial. Some-se a isso as profundas lacunas evidenciadas pelos próprios médicos de família/clínicos gerais e psiquiatras e psicólogos. A sugestão mais óbvia é a de que as Universidades não cumprem o seu papel de oferecerem programas de formação contínua e atualização para esses vários profissionais que exercem na área da saúde e que revelam sérios défices no desenvolvimento do seu conhecimento de base, necesssário para o trabalho especializado com idosos (Bartram & Roe, 2005). Dado que as diversas nações da União Europeia têm convivido com um substancial aumento da proporção de adultos idosos na população, devido às diminutas taxas de natalidade e à crescente longevidade, os resultados obtidos permitem ainda a sugestão de que as Universidades deveriam começar a incluír nos curricula dos cursos de formação de profissionais da saúde, particularmente na formação de psicólogos, conteúdos específicos e sistematizados nas áreas da gerontologia, avaliação de mudanças cognitivas associadas ao processo de envelhecimento normal, avaliação de sintomas cognitivos, comportamentais e psicológicos ou psiquiátricos característicos das diversas formas de demência

neurodegenerativa associadas ao envelhecimento patológico e intervenções voltadas à reabilitação ou reeducação do paciente idoso, de forma a capacitá-lo a alcançar um nível ótimo de funcionamento físico, social, cognitivo e psicológico (Young, Epstein, & Coles, 2010).

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Tabela 2. Categorias de respostas e percentagens das respostas dos psiquiatras (entre  parênteses, frequências absolutas)
Tabela 3. Categorias de respostas e percentagens das respostas dos neurologistas (entre  parênteses, frequências absolutas)
Tabela 5. Categorias de respostas e percentagens das respostas dos psicólogos (entre  parênteses, frequências absolutas)

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