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Formação continuada do professor alfabetizador proposta pelo PNAIC: o papel do orientador de estudo no processo formativo

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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

MARIA DAS GRAÇAS GONÇALVES DA SILVA

FORMAÇÃO CONTINUADA DO PROFESSOR ALFABETIZADOR: O PAPEL DO ORIENTADOR DE ESTUDO NO PROCESSO FORMATIVO DO PNAIC

RECIFE

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FORMAÇÃO CONTINUADA DO PROFESSOR ALFABETIZADOR: O PAPEL DO ORIENTADOR DE ESTUDO NO PROCESSO FORMATIVO DO PNAIC

Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Educação da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação.

RECIFE 2015

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Catalogação na fonte

Bibliotecária Andréia Alcântara, CRB-4/1460

S586f Silva, Maria das Graças Gonçalves da.

Formação continuada do professor alfabetizador proposta pelo PNAIC: o papel do orientador de estudo no processo formativo / Maria das Graças Gonçalves da Silva. – Recife: O autor, 2015.

197 f.il.; 30 cm.

Orientadora: Andréa Tereza Brito Ferreira.

Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal de Pernambuco, CE. Programa de Pós-graduação em Educação, 2015.

Inclui Referências e Apêndice.

1. Professores alfabetizadores - Formação. 2. Alfabetização. 3. Prática de ensino. 4. UFPE - Pós-graduação. I. Ferreira, Andréa Tereza Brito. II. Título.

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FORMAÇÃO CONTINUADA DO PROFESSOR ALFABETIZADOR: O PAPEL DO ORIENTADOR DE ESTUDO NO PROCESSO FORMATIVO DO PNAIC

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Pernambuco como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação.

Aprovada em: 28.10.2015

BANCA EXAMINADORA

________________________________________________________ Prof.ª Dr.ª Andréa Tereza Brito Ferreira (Orientadora)

Universidade Federal de Pernambuco

________________________________________________________ Profª. Drª. Leila Nascimento da Silva (Examinadora Externa)

Universidade Federal Rural de Pernambuco

________________________________________________________ Profª. Drª. Eliana Borges Correia de Albuquerque (Examinadora Interna)

Universidade Federal de Pernambuco

RECIFE 2015

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Esse momento de agradecer foi uma das coisas que me fizeram chegar até aqui. Agradeço, portanto, a Deus, nosso pai, que esteve (está) comigo em todos os momentos me fortalecendo e cuidando para que pudesse seguir em frente. Obrigada...

À toda minha família por estar sempre ao meu lado e feliz por minhas conquistas, meus pais e em especial à minha mãe, um exemplo de ser humano, que mesmo tendo oito filhos tinha um cuidado especial com nossa educação. A ela que passou a sua vida alfabetizando crianças e hoje tenho orgulho de seguir seus passos como professora.

A meu companheiro Robson, meu fã número um, que esteve ao meu lado sempre para que hoje eu estivesse escrevendo esse texto, obrigada pela compreensão, pelo amor, pelo cuidado. Amo você!

A meu filho Kauê, razão pela qual vivo e por ser a minha melhor produção. Amor divino!

A minhas irmãs: Dui, Lúcia, Fátima, Dora, pela torcida e pelo amor. A meus irmãos: Ricardo, Zito, Bosco, por estarem sempre ao meu lado.

Aos meus sobrinhos: Bárbara, Isabela, karol, Rodrigo, Hugo, Matheus, Felipe, Paulo, Laura, Davi, Paulina e Marquinhos e Karina.

A minha querida professora Drª Andrea Brito, aquela que lutou junto comigo até e pela qual nutro um respeito e um amor muito grande. Obrigada Deus por tê-la como Professora, orientadora, amiga. A senhora é referência em minha vida em todas as dimensões. Além de incontestável profissional, ela consegue enxergar o ser humano, o ser afetivo, psicológico e cognitivo do pós-graduando considerando e respeitando todos esses campos no processo de construção do pesquisador, do profissional.

Às irmãs aqui encontrei, declaro meus sinceros agradecimentos a:

Marcela Monteiro, uma pessoa muito especial de fé admirável e de um coração infinito que esteve comigo em todas as horas. Agora mais do que amiga você é minha irmã;

Érica Santana, ser humano maravilhoso e de muita fé que dividiu comigo sua atenção e suas sábias palavras, assim como Marcela, me mostrou que a maior virtude do ser humano é amar e cuidar do próximo. Agora mais do que amiga você é minha irmã;

Cristiana Vasconcelos, assim como Marcela e Érica, faz parte de uma família que foi constituída aqui, na Universidade Federal de Pernambuco, com valores raros em

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você é minha irmã.

Ao Programa de Pós-graduação em Educação do Centro de Educação da UFPE pela pareceria e oportunidade de cursar o mestrado, especialmente, aos funcionários que se mostraram sempre atenciosos e respeitosos.

À professora Drª Eliana Albuquerque, da UFPE, pela dedicação e atenção ao meu trabalho.

À professora Drª Leila Nascimento, pela qual tenho admiração e respeito por sua trajetória profissional.

Às formadoras da IES e as orientadoras de estudo de Recife e São Lourenço que participaram desta pesquisa de forma acolhedora.

Aos professores e diretores das escolas municipais das cidades de Camaragibe e Recife, em que trabalho, pela compreensão em todos os momentos.

Aos meus amigos de antes e de hoje: Carina Tamires, Carla Barbosa, Júlia Souza, Suzaní Rodrigues, Fabiana, Priscila Angelina, Maria José, Sirlene Souza, Edineide Souza, Ywanosca, Suelany, Luciana, Juliana Barros e tantos outros que estão em meu coração.

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Sim, sou eu, eu mesmo, tal qual resultei de tudo... Quanto fui, quanto não fui, tudo isso sou... Quanto quis, quanto não quis, tudo isso me forma...

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O Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC), como programa de formação continuada, busca promover uma reflexão sobre o processo de alfabetização e sobre a prática docente. Levando em consideração a criação desse Programa e a sua proposta, esta pesquisa teve por objetivo analisar a prática do orientador de estudo no processo de formação continuada dos professores alfabetizadores a partir do PNAIC. A fim de responder nosso objetivo, realizamos observação participante das formações dos formadores da IES com os orientadores de estudos de Recife e de São Lourenço da Mata e, destes com os professores alfabetizadores em seus respectivos municípios, entrevistas semiestruturadas com duas orientadoras de estudos e análise documental de cadernos do PNAIC. Todas as formações foram gravadas em aparelho de áudio e anotados em diário de campo e, posteriormente, transcritos integralmente. Ao todo foram observados três seminários (II, III e IV) dos formadores com os orientadores de estudos de Recife e de São Lourenço da Mata, quatro encontros de orientadores de estudos de Recife (IV, V, VI, X) e quatro dos orientadores de São Lourenço da Mata (IV, V, VI, X) com os professores alfabetizadores. Os dados foram tratados a partir da análise de conteúdo (BARDIN, 2010). Os resultados revelaram que o orientador de estudos se apresenta no documento do Pacto como elemento fundante, pois é através dele que a proposta do PNAIC chega aos espaços de formação, é ele que vai tomar as decisões, organizar e planejar situações de aprendizagem sobre a língua portuguesa com os alfabetizadores. Nossa análise evidenciou que as orientadoras de estudos observadas priorizaram estratégias formativas relacionadas aos aspectos teóricos da formação, como estudo de texto e as questões práticas como nos momentos de retorno da tarefa de casa, variando em relação à recorrência, que ao transferi-las para a formação nos municípios fabricaram “táticas” para reconstruírem sua prática. Em relação ao tratamento dispensado na formação às práticas da sala de aula, verificamos que se tornaram objeto de análise e aprendizagem coletiva dos orientadores de estudos, tanto nas suas formações com os professores da IES, como nas formações com os professores alfabetizadores.

PALAVRAS-CHAVE: Formação continuada. Alfabetização. Orientador de estudo. Professor alfabetizador. Estratégias formativas.

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Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (henceforth PNAIC), as a continuous training programme, aims at promoting reflection about literacy process of Brazilian basic school students and teachers practice. Taking into account the aforementioned programme and its goals, the present study aims at analysing Study Counselor's practices regarding continuous training programme for teachers in charge of developing students literacy skills. In order to attain the goal of this study we attended and observed pre-service training programme for Brazilian Universities' trainers in which Study Counselors from Recife and São Lourenço da Mata participated, and we also attended continuous training programme workshops held by Study Counselors. We conducted semistructured interviews to two Study Counselors in additon to analysing PNAIC official document and guidelines. We voice-recorded the workshops, wrote down notes and also transcribed recordings in its entirety. We attended three seminars held by Study Counselors for teachers of both Recife and São Lourenço da Mata (II, III and IV), four meetings of Study Counselors for Recife's (IV, V, VI, X), and four meetings of Study Counselors for São Lourenço da Mata's literacy teachers (IV, V, VI, X). Data were processed according to Bardin's content analysis theory (2010). Results showed that Study Counselors are considered a fundamental element in PNAIC official document and guidelines because the programme proposal is to be delivered by means of them in the workshops, and Study Counselors are also in charge of making decisions, organizing and planning learning situations with literacy teachers concerning Portuguese language. Our analysis made evident that Study Counselors prioritized formative strategies related to theoretical aspects, such as scholarly articles study, as well as practical matters, such as those concerning students turning in assigned homework. When teaching strategies at workshops for literacy teachers, these strategies turned into "tactics" in order for literacy teachers to be able to apply them in a classroom environment. As far as classroom teaching practices are concerned, it was made evident that these became Study Counselors' study element for both analysis and collective learning in seminars designed for Brazilian universities trainers, as well as in workshops for literacy teachers.

KEY-WORDS: Continuous training programme, Literacy, Study Counselor, Literacy teacher, Formative strategies.

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CNE/CP Conselho Nacional de Educação/Conselho Pleno

FAFICA Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras

de Caruaru

FAFIRE Faculdade Frassinetti do Recife

FUNDEB Fundo de Manutenção e Desenvolvimento

do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério

FUNDEF Fundo de Manutenção e Desenvolvimento

do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério

GT Grupo de trabalho

IES Instituição de Ensino Superior

LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Básica

LDBEN Lei de Diretrizes e bases da educação

Nacional

MEC Ministério da Educação

PNAIC Pacto Nacional pela Alfabetização na

Idade Certa

PNE Plano Nacional de Educação

PDE Plano de Decenal da Educação

PNBE Programa Nacional Biblioteca da Escola

PNLD Programa Nacional do Livro Didático

PNUD Programa das Nações Unidas para o

Desenvolvimento

PROFA Programa de Formação de Professores

Alfabetizadores

RENAFOR Rede Nacional de Formação Continuada

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SEB Secretaria de educação Básica

SEF Secretaria de Educação Fundamental

SEE/SP Secretaria da Educação do Estado de São

Paulo

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LISTA DE QUADROS

Quadro 01 Perfil da Rede de Ensino do Município de Recife ...72

Quadro 02 Perfil da Rede de Ensino do Município de Recife...73

Quadro 03 Perfil da orientadora de estudo de Recife Lúcia...75

Quadro 04 Perfilda orientadora de estudo de Recife Paula...77

Quadro 05 Perfil da orientadora de estudos de São Lourenço da Mata Bia..79

Quadro 06 Estratégias Formativas utilizadas pela formadora Ana...84

Quadro 07 Estratégias Formativas utilizadas pelas orientadoras de estudos de Recife com os professores alfabetizadores...108

Quadro 08 Estratégias Formativas utilizadas pela orientadora de estudo Bia com os professores alfabetizadores Bia...153

Quadro 09 Relações entre as estratégias formativas utilizadas nas formações da IES com os orientadores de estudo de Recife e destes com os professores alfabetizadores...170

Quadro 10 Relações entre as estratégias formativas utilizadas nas formações da IES com os orientadores de estudo de São Lourenço da Mata e destes com os professores alfabetizadores...177

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1. INTRODUÇÃO ... 15 2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ... 19 2.1 A Formação Continuada de Professores: para além dos aspectos curriculares e disciplinares ... 19 2.2.Alfabetização, formação de professor e prática pedagógica 28

2.2.1 Concepções de alfabetização e Formação continuada de professores .... 28 2.2.2 Formação continuada e Prática docente ... 39 2.3 Programas de formação continuada de professores e pesquisas na área ... 41 2.3.1 O que dizem as pesquisas sobre formação do professor alfabetizador ... 51 3. PERCURSO METODOLÓGICO DA PESQUISA ... 70 3.1. Campo de pesquisa... 70

3.1.1 Perfil da Rede de Ensino do Município de Recife e de São Lourenço da Mata ... 72 3.2. Procedimentos metodológicos...73 3.3. Participantes da pesquisa... 75 3.3.1. Perfis das orientadoras de estudo de Recife e São Lourenço da Mata... 75 3.4.Os espaços de formação dos orientadores de estudo do PNAIC de Recife e de São Lourenço da Mata ... 80 3.4.1.Espaço da formação dos orientadores de Recife com os professores alfabetizadores ... 80 3.4.2.Espaço da formação dos orientadores de estudo de São Lourenço da Mata com os professores alfabetizadores ... 81 3.5. Coleta de dados... 82 4. ANALISANDO OS DADOS... 83 4.1 A rotina das formadoras Ana e Maria com os orientadores de estudo do município de Recife/PE ... 84 4.2 A rotina das orientadoras de estudos do município de Recife com os professores alfabetizadores ... 108 4.3 A rotina da formadora Suzi com os orientadores de estudos de São Lourenço da Mata/ Seminário II ... 135

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4.5 Aproximações e distanciamentos: as fabricações dos orientadores de estudos

do Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa/PNAIC ... 169

4.5.1 Entre o pensado e o vivido: o lugar das fabricações no espaço da formação continuada dos orientadores de estudo de Recife com os professores alfabetizadores ... 169

4.5.2 Entre o pensado e vivido: o lugar das fabricações no espaço da formação continuada dos orientadores de estudo de São Lourenço da Mata com os professores alfabetizadores ... 176

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 185

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 190

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1. INTRODUÇÃO

As pesquisas sobre formação continuada e profissão docente apontam para uma revisão da compreensão da prática pedagógica do professor, que é visto, na atualidade, como um mobilizador de saberes. Considera-se, assim, que este, em sua trajetória, constrói e reconstrói seus conhecimentos conforme a necessidade de utilização dos mesmos, a partir das suas experiências, seus percursos formativos e profissionais.

A formação continuada tem, entre outros objetivos, propor metodologias e colocar os profissionais a par das discussões teóricas atuais, com a intenção de contribuir para as mudanças que se fazem necessárias para a melhoria da ação pedagógica da escola e, consequentemente, da educação. É certo que conhecer novas teorias, faz parte do processo de construção profissional, mas não bastam, se estas não possibilitam ao professor relacioná-las com seu conhecimento prático construído no seu dia-a-dia (NÓVOA, 1995; PERRENOUD, 2000).

Nesta esteira argumentativa, a formação continuada aparece associada ao processo de melhorias das práticas pedagógicas desenvolvidas pelos professores em sua rotina de trabalho e em seu cotidiano escolar.

Na literatura educacional, testemunhamos um consenso em torno da ideia de que nenhuma formação inicial, mesmo a oferecida em nível superior, é suficiente para o desenvolvimento profissional (CANDAU, 2001; SANTOS, 1998). Esse consenso põe em relevo a necessidade de se pensar uma formação continuada que valorize tanto a prática realizada pelos docentes no cotidiano da escola quanto o conhecimento que provém das pesquisas realizadas nas universidades, de modo a articular teoria e prática na formação e na construção do conhecimento profissional do professor.

As mudanças na ordem do saber, no como ensinar, no como se aprende, numa nova perspectiva de alfabetização, de práticas pedagógicas que problematizam e que promovem o pensar e o refletir do aluno, no que tange ao aprendizado da língua materna, em detrimento de “receitas” prontas e de um ensino pautado num aprendizado sem reflexão, inautêntico, transmissivo, trouxeram mais um desafio aos docentes no seu cotidiano escolar, no seu fazer pedagógico, na relação professor-aluno-conhecimento.

Os estudos realizados por Emília Ferreiro e Ana Teberosky (1979), desde os anos de 1980, que resultaram na “teoria da psicogênese da língua escrita” – bastante

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difundidos nas formações iniciais e continuadas de professores e que fazem parte da fundamentação de documentos do MEC (Ministério da Educação), como, por exemplo, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de Língua Portuguesa, de primeira a quarta série, instituídos em 1996 – contribuíram para a construção de uma nova concepção de como se aprende a ler e a escrever, de como se alfabetiza, provocando uma verdadeira revolução no debate sobre a alfabetização em nosso país.

Paralelamente, na década de 1990, surge um novo desafio aos docentes que terão que pensar e desenvolver uma prática pedagógica que não só alfabetize seus alunos, mas que, também, os tornem letrados. Sobre isso, Magda Soares nos ensina que,

Alfabetizar e letrar são duas ações distintas, mas não inseparáveis, ao contrário: o ideal seria alfabetizar letrando, ou seja: ensinar a ler e escrever no contexto das práticas sociais da leitura e escrita, de modo que o indivíduo se tornasse, ao mesmo tempo, alfabetizado e letrado (SOARES, 1998, p. 47).

Contudo, tais descobertas propõem uma mudança radical nas formas de compreendermos como se aprende a escrita alfabética, de modo a propiciar aos docentes grandes dificuldades, por vezes, resistências, para inovar o ensino da alfabetização. Sabemos que, atualmente, alguns programas de formação continuada propõem a associação e o diálogo entre a academia e os saberes construídos e produzidos pelos professores advindos de sua experiência em sala de aula dando vez e voz a sua ação docente. E é justamente para essa perspectiva de formação, de prática pedagógica, de conhecimento, de aprendizagem, de alfabetização, que lançaremos nosso olhar para compreendermos como, de fato, o processo formativo, que tem como proposta envolver todos esses elementos, ocorre. Para isso, tomaremos o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC), lançado em 2012, pela presidente Dilma Rousseff, como o programa de formação a ser investigado por nós, já que traz uma perspectiva de formação continuada de professores voltada para alfabetização e para formar professores alfabetizadores.

O PNAIC tem a intenção de garantir uma reflexão mais cuidadosa, mais explícita sobre o processo de alfabetização e sobre a prática docente. Discute, dentre outras coisas, sobre concepções de alfabetização, formação do professor alfabetizador, tema que nos interessa, tendo como base os conhecimentos prévios dos professores participantes. Dentro dessa proposta formativa, destacamos a figura do orientador de estudos, cuja função, segundo o Pacto, é auxiliar o professor na sua prática docente

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atuando como aquele professor que está mais próximo da realidade cotidiana do professor alfabetizador, discutindo com ele a partir de sua própria sala de aula, dos colegas, promovendo a construção de práticas, a troca de experiência.

Conforme a organização do Programa, na primeira etapa, o professor orientador de estudos passará por um processo formativo com professores ligados às instituições de Ensino Superior (IES); a partir dessa formação com os professores formadores, os orientadores de estudos encaminharão o processo formativo junto aos professores alfabetizadores participantes das formações continuadas presenciais em seus respectivos municípios.

Por formar os outros professores do seu município, numa perspectiva articuladora, de diálogo e de mediação do conhecimento, consideramos que o orientador de estudos vem ganhando um papel de destaque, como demonstraram alguns programas1 de formação continuada destinados a professores alfabetizadores que possuem os mesmos moldes.

Assim, percebendo o professor orientador de estudos no âmbito do PNAIC como habitante desses dois campos, questionamos: Quem é esse orientador? Como é feita a formação destinada a ele? Como ele realiza o processo formativo junto aos professores alfabetizadores? Qual é o papel do orientador de estudos no processo de formação?

Diante dessas indagações, esta pesquisa tem como objeto de investigação o orientador de estudos no processo formativo do professor alfabetizador. O nosso objetivo geral é: analisar a prática do orientador de estudos no processo de formação continuada dos professores alfabetizadores a partir do PNAIC. Os objetivos específicos são: analisar o papel do orientador de estudos no documento do PNAIC; analisar as estratégias formativas utilizadas pelos formadores das IES nas formações com os orientadores; analisar as práticas formativas dos orientadores com os professores alfabetizadores; identificar como as práticas da sala de aula são tratadas na formação.

Nosso trabalho está dividido em três partes. A primeira compreendendo três tópicos. No primeiro tópico, apresentaremos a fundamentação teórica que nos baseou, com as discussões acerca da Formação Continuada de Professores ao longo do tempo, nos atendo ao que está além dos aspectos curriculares e disciplinares. O segundo, está

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reservado às discussões sobre a alfabetização, a formação de professores e as práticas docentes. No terceiro estão as considerações acerca dos programas de formação continuada de professores e as pesquisas nessa área.

Na segunda parte, apresentaremos a metodologia utilizada para a realização desta pesquisa, contemplando o campo de pesquisa, os procedimentos metodológicos, os sujeitos envolvidos na pesquisa e como se deu a coleta dos dados analisados na pesquisa. Posteriormente, estão as análises dos dados, onde apresentaremos as impressões acerca das formações das formadoras das IES e os orientadores de estudos, destes com os professores alfabetizadores e quais as aproximações e distanciamentos encontrados nas fabricações das práticas formativas dos orientadores de estudos do PNAIC. E, por fim, nossas considerações finais.

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2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 A Formação Continuada de Professores: para além dos aspectos curriculares e disciplinares

Alguns termos, tais como, reciclagem, treinamento, aperfeiçoamento, capacitação, dentre outros, marcaram época, eles eram (são) utilizados para se referir às ações voltadas à qualificação de profissionais em serviço, incluindo o profissional docente. O que estas diferentes nomenclaturas nos fazem pensar? Como uma possível explicação para tal questionamento, temos a de que a formação continuada de professores no Brasil possui uma trajetória histórica, marcada por diferentes tendências e abordagens metodológicas, que não se constituíram a priori, mas que vêm emergindo das diferentes concepções de educação e sociedade presentes na realidade brasileira, pois entendemos que todo e qualquer processo se situa historicamente no contexto político e cultural no qual está inserido.

Essas diferentes nomenclaturas estiveram fortemente presentes no período que compreende os fins dos anos de 1970 e início dos anos de 1990. Destacamos os trabalhos de Fusari e Rios (1995) e Marin (1995), que trataram dessa temática. Os primeiros pontuam que é preciso chamar atenção para “a necessidade de se problematizar a expressão capacitação de recursos humanos, pois o ser humano não é um recurso, ele possui recursos e cria recursos”. Essa preocupação vem marcar uma necessidade de se olhar o professor como sujeito participante do seu processo de formação, refutando a velha postura de quem apenas recebe o que para ele foi pensado e criado.

Marin (1995, apud Araújo e Silva, 2009, p. 3), “enfatiza a exigência de uma análise permanente de termos, como reciclagem, treinamento, aperfeiçoamento, capacitação, educação continuada, etc.” Iremos discorrer, sumariamente, sobre como Marin trata os termos acima citados. Ela argumenta que o termo reciclagem revela implicações derivadas do sentido descartável atribuído à atualização dos conhecimentos, como cursos rápidos, descontextualizados e superficiais. O treinamento está relacionado com a modelagem de comportamentos, que, conforme Marin é incompatível com a atividade educacional. Sobre o termo aperfeiçoamento, a autora diz que pode significar tornar capaz, habilitar ou convencer. Ela aproxima o significado de capaz com a ideia de

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educação continuada, rompendo, inclusive, com a ideia de vocação natural para o magistério. Quando o assunto é capacitação, Marin pontua o termo da seguinte forma:

[...] parece-me congruente com a ideia de educação continuada, pois aceitamos a noção de que para exercer as funções de educadores é preciso que as pessoas se tornem capazes, que adquiram as condições de desempenho próprias à profissão (MARIN, 1995, p.17).

Quando se refere à educação permanente e à formação continuada, esta mesma autora argumenta que elas são como componentes de um conjunto de ações caracterizadas pela valorização do conhecimento docente e pela proposição de dinâmicas institucionais e que os avanços advindos da concepção de educação continuada possibilitam a compreensão da educação como prática social mobilizadora, especialmente quando apontam o local de trabalho como base do processo, considerando as vivências e os saberes profissionais presentes no cotidiano escolar.

Acreditamos que o termo formação continuada responde a um conjunto de ações voltadas e articuladas ao desenvolvimento profissional, a fim de propor perspectivas inovadoras de valorização dos saberes docentes, da reflexão na e sobre a prática, de capitalização das experiências inovadoras, do “miudinho” da sala de aula. Concordamos com Nóvoa (1995) quando ele assevera que a formação continuada,

[...] implica a mudança dos professores e das escolas, o que não é possível sem um investimento positivo das experiências inovadoras que já estão no terreno. Caso contrário, desencadeiam-se fenômenos de resistência pessoal e institucional, e provoca-se a passividade de muitos atores educativos. É preciso conjugar a ‘lógica da procura’ (definida pelos professores e pelas escolas) com a lógica da oferta’ (definida pelas instituições de formação), não esquecendo nunca que a formação é indissociável dos projetos profissionais e organizacionais (NÓVOA, 1995, p. 30-31).

Duas tendências conceituais estiveram fortemente presentes na década de 1990, no que diz respeito à formação continuada de professores. Uma delas, de cunho mais conservador, concebe o professor como sujeito passivo do processo formativo, compreendendo que a formação continuada “está fundamentada na existência de um vazio deixado pela formação inicial que deve ser preenchido” (LIMA, 2002, p. 39). Essa concepção mais conservadora concebia o professor como aquele responsável por apenas transmitir, passivamente, o que a universidade, os especialistas e estudiosos pensaram para ele, para seu cotidiano escolar, não levando em conta as especificidades

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do seu contexto escolar, de sua sala de aula, de seus saberes e, consequentemente, o excluindo do processo de construção do conhecimento. Nessa perspectiva, além de não legitimar seus saberes, estes ainda eram diminuídos frente aos conhecimentos oriundos das universidades, verticalizando, desta forma, a relação entre a academia e a Escola. Essa hierarquização favoreceu a polarização entre os conhecimentos advindos das universidades e os produzidos, construídos, fabricados no cotidiano escolar.

A segunda tendência, de caráter emancipatório, tem a preocupação com o envolvimento do professor, de forma mais significativa, no processo formativo. Esta tendência entende que a formação inicial, mesmo em nível superior, embora necessária, não seria uma condição suficiente para garantir o desenvolvimento profissional dos docentes. A partir desse novo olhar sobre a profissionalização docente, “o professor passa a ser visto como sujeito que possui sua história e cuja trajetória de vida está, de uma forma ou de outra, vinculada a sua profissão, o que o diferencia da simples visão do professor como executor de modelos pré-elaborados” (FERREIRA, 2010, p.38).

Nesta concepção, a formação inicial e continuada é concebida de forma interarticulada, em que a primeira corresponde ao período de aprendizado nas instituições formadoras e a segunda diz respeito à formação dos professores que estejam no exercício da profissão, mediante ações dentro e fora das escolas, denominado pelo MEC de formação permanente.

Aqui a formação é entendida como um processo contínuo e permanente de desenvolvimento, o que pede ao professor disponibilidade para a aprendizagem; da formação, que o ensine a aprender; e do sistema escolar na qual ele se insere como profissional, condições para continuar aprendendo. Ser profissional implica ser capaz de aprender sempre (SEF/MEC, 1999, p.63).

A partir dessa concepção de formação, “o professor é visto como um intelectual e um prático da educação em processos permanentes de construção, de desconstrução e de reconstrução de si mesmo, de sua identidade profissional e, consequentemente, reconfigurando sua prática pedagógica” (SILVA e ALMEIDA, 2010, p.14). Desse modo, o processo formativo desse profissional requer um pensamento crítico e de superação do modelo clássico de formação continuada, tendo em vista a construção de uma formação contínua que possibilite a constituição de uma postura docente crítica, criativa, transformadora e reflexiva, que leve em conta, que considere as

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demandas sociais, os conhecimentos forjados e acumulados pelos professores nos seus contextos escolares.

Sob a égide dessa tendência emancipatória de formação, alguns elementos, antes nunca pensados como constituintes e constitutivos do fazer docente, começaram a ser desvelados e considerados como objetos de estudo relevantes para a ampliação da compreensão do universo escolar e das questões dele suscitadas.

Os saberes docentes, o cotidiano escolar, o professor crítico-reflexivo, autônomo, as questões psicossociais, as angústias, os conflitos, a incompletude do ser humano, passaram a ter vida, vez e voz nas pesquisas de vários estudiosos que têm se dedicado a investigar estes temas que permeiam a formação continuada de professores. Tardif (2002), Nóvoa (1995), Freire (1987), Schön (2000), Zeichner (1993), dentre outros, representam acadêmicos que deslocaram o debate sobre formação de professores de uma perspectiva centrada nos aspectos curriculares e disciplinares para uma perspectiva mais centrada no campo do terreno do profissional, enfatizando o percurso histórico da formação da profissão docente para pensar a formação de professores. Este discurso inovador figurou nos escritos de vários pesquisadores, dentre eles os acima referidos, ampliando a divulgação de um novo paradigma na formação dos educadores no decorrer dos anos de 1990.

Destacamos, em princípio, os estudos de Tardif (2001) que tratam sobre os saberes forjados, acumulados pelos professores em suas experiências pessoais, profissionais, os denominados saberes docentes. Este pesquisador defendeu a necessidade de se repensar a formação dos professores levando em consideração seus saberes e as realidades específicas de seu trabalho cotidiano, favorecendo um diálogo equilibrado e articulado entre os conhecimentos produzidos pela academia e os saberes construídos pelos professores em suas práticas cotidianas. Surge a problemática do saber docente que busca indicar caminhos que nos aproximem das possíveis respostas, em relação à natureza dos saberes docentes.

Sobre tais saberes, Tardif (2002) corrobora que o saber docente é composto de vários saberes advindos de diferentes fontes e assegura que a relação dos docentes com eles não se reduz a uma função de mera transmissão dos conhecimentos constituídos e define o saber docente “como um saber plural, formado pela amálgama, mais ou menos coerente, de saberes oriundos da formação profissional, de saberes disciplinares, curriculares e experienciais” (TARDIF, 2002, p. 36).

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Os estudos de Tardif (2005) contribuíram para a compreensão do trabalho docente como uma atividade social. De acordo com ele, o trabalho docente é uma prática social porque seu saber integra saberes cognitivos, de experiências, curriculares e disciplinares que são adquiridos dentro do seu contexto de socialização profissional:

O saber dos professores não é um conjunto de conteúdos cognitivos definidos de uma vez por todas, mas um processo em construção ao longo de sua carreira profissional na qual o professor aprende progressivamente a dominar seu ambiente de trabalho, ao mesmo tempo em que se insere nele e o interioriza por meio de regras de ação que se tornam parte integrante de sua consciência prática (TARDIF, 2005, P.14).

A partir dos estudos desse autor, podemos perceber a relação entre os saberes profissionais dos professores, a questão temporal e o aprendizado do trabalho docente. Tardif (2013) ainda corrobora que:

Os saberes profissionais dos professores eram plurais, mas também temporais, ou seja, adquiridos através de certos processos de aprendizagem e de socialização que atravessam tanto a história de vida quanto a carreira (2013, p. 102).

As questões temporais trazidas por Tardif colocaram em relevo os diferentes aspectos da história individual e profissional do docente. Passou-se, então, a reconhecer e considerar a existência desses variados saberes e a relacioná-los a sua formação. Olhar para o trabalho docente, para sua prática pedagógica, para seus saberes, nos faz acreditar que o trabalho do professor vai além do acadêmico/científico. Ele se encontra no terreno do individual, do coletivo, no campo didático e pedagógico, além de suas experiências educativas ao longo de sua vida, constituindo-se, por isso, como sujeito.

Nessa esteira argumentativa, Nóvoa (1997) discorre sobre as práticas tradicionais de formação, enfatizando que elas têm sido construídas sob a lógica da racionalidade técnica que privilegia a interlocução entre o saber das disciplinas e o saber especializado em educação. Assim como Tardif (2013), ele destaca também a necessidade de acrescentar a estes saberes um terceiro, o saber da experiência dos professores, construindo assim o que denominou “triângulo do conhecimento”. Esse triângulo tem em seus vértices os três saberes citados como pontos de interlocução. Este novo ponto – a voz do professor – significa o reconhecimento do saber da experiência, assumido como legítimo potencial de formação.

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Compreendemos que Nóvoa (1995) refutou os estudos que reduziam a profissão docente a um conjunto de competências técnicas. Segundo ele, essa redução a qual se opunha produzia uma crise de identidade dos professores em decorrência dessa separação entre o profissional e o eu social. A partir dessa nova perspectiva em relação ao trabalho docente, o professor é tomado como sujeito ativo, histórico, político e social. O pessoal e o profissional, ao invés de se separarem, dialogam. É chegado o momento de devolver a voz do professor, ouvi-lo, conhecer sua trajetória, sua história de vida.

Essa vez e voz defendidas por Nóvoa (1992) trazem subjacente uma perspectiva crítico-reflexiva que “forneça aos professores os meios de um pensamento autônomo e que facilite as dinâmicas de formação autoparticipada” (1992, p. 25). Para Nóvoa (1992), isto significava considerar três processos na formação docente: o primeiro deles diz respeito ao desenvolvimento pessoal que implica valorizar, como prática de sua formação, seu trabalho crítico-reflexivo sobre as práticas que realiza e sobre suas experiências compartilhadas. O segundo - o desenvolvimento profissional – assegura que os problemas da prática profissional docente não são meramente instrumentais, mas comportam situações problemáticas que requerem decisões num terreno de grande complexidade, incertezas, singularidade e de conflito de valores e, o último, o desenvolvimento organizacional, apresenta a formação de professor como um projeto único que engloba a inicial e a contínua, envolvendo um duplo processo: o de autoformação dos professores – reelaboração constante dos saberes que realizam em sua prática, confrontando suas experiências nos contextos escolares; e o de formação nas instituições escolares em que atuam, colocando a escola como espaço de trabalho e formação.

Paulo Freire (1996) advoga um pensamento de formação continuada que dialoga ao invés de impor, que aguça a reflexão e não traça roteiros. Esse movimento de diálogo e reflexão permanente, segundo ele, pode conduzir qualquer indivíduo a um nível crítico elevado que gera uma ação, que é capaz de emancipá-lo em conjunto. Contrapondo-se à tendência conservadora, para a qual o saber é algo pronto e acabado, o professor coloca o ser humano na condição de incompletude, de permanente construção, pois advoga que sendo ele (o ser humano) inacabado e inconcluso tem a possibilidade de evolução, transformação.

Esse educador, em seus escritos, advoga uma formação que possibilite a reflexão crítica sobre a prática, ou seja, o professor, enquanto investigador de sua ação

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pedagógica, possa olhar sua prática, refletir criticamente e voltar a ela, de modo que esse movimento de ação-reflexão o torne capaz de perceber seus acertos e “erros” e, a partir daí, transformar, concretizar mudanças no seu pensar e agir em seu cotidiano escolar. Para Freire (1996), “na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática” (p.44). Essa práxis de que fala Freire corresponde à ação e à reflexão dos homens sobre o mundo de modo a modificá-lo, transformá-lo.

A “reflexão na ação” constitui a proposta teórica do pedagogo americano Donald Schön, que teve suas obras divulgadas no Brasil quando da publicação do livro Os Professores e sua Formação, de 1992 – uma coleção de artigos organizada pelo pesquisador português António Nóvoa, professor da Universidade de Lisboa. Um dos artigos deste livro, intitulado “Formar professores como profissionais reflexivos”, traz a proposta de incluir a prática da “reflexão na ação” e indica uma questão importante para a discussão sobre a formação de profissionais, a crítica à racionalidade técnica.

Para Schön (2000), as questões do mundo real não aparecem para os profissionais com contornos tão bem definidos, previsíveis. Não há essa linearidade em relação a um problema e sua resolução. As situações complexas presentes no cotidiano escolar e enfrentadas pelos docentes não são uma aplicação da teoria à prática, não dependem unicamente desse conhecimento, mas a resolução de tal problemática passa pela valorização da experiência e da “reflexão na experiência”. Ou seja, não bastaria, para o profissional preocupado em desempenhar bem seu trabalho, o conhecimento prévio do qual se apropriou durante o tempo em que frequentou a universidade.

A “reflexão na ação”, segundo Schön (2000), pode habilitar o profissional a criar um repertório de soluções que seriam mobilizadas em situações semelhantes (mas não idênticas). Ele defende ainda que é preciso investir positivamente nos saberes de que o professor é portador, trabalhando-os de um ponto de vista teórico e conceitual. Os problemas da prática profissional docente não são meramente instrumentais; todos eles comportam situações problemáticas que obrigam a decisões num terreno de grande complexidade, incerteza, singularidade e de conflito de valores (Schön, 1990). A proposta desse autor se concentra na reflexão na ação, basicamente em três ideias: o “conhecimento na ação”, a “reflexão na ação” e a “reflexão sobre a reflexão na ação”.

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Segundo seu pensamento, “o conhecimento na ação” é o conjunto de saberes interiorizados (conceitos, teorias, crenças, valores, procedimentos), que são adquiridos através da experiência e da atividade intelectual, mobilizados de forma inconsciente e mecânica nas ações cotidianas do professor, em situações reais do exercício profissional.

A segunda ideia diz respeito à “reflexão na ação”, que é a reflexão desencadeada durante a realização da ação pedagógica, sobre o conhecimento que está implícito na ação. Schön (1990) a considera como o melhor instrumento de aprendizagem do professor, pois é no contato com a situação prática que o professor adquire e constrói novas teorias, esquemas e conceitos, tornando-se um profissional flexível e aberto aos desafios impostos pela complexidade da interação com a prática.

E, por fim, a “reflexão sobre a ação”, que é a reflexão desencadeada após a realização da ação pedagógica sobre essa ação e o conhecimento nela implícito. As ideias de Schön contribuíram (contribuem) e influenciaram (influenciam) o campo educacional, marcadamente a formação de professores.

A partir de Schön (1990), Perrenoud (2002) discute o paradigma reflexivo como um processo de mudanças no modo ou na maneira de agir do docente, na relação com seu aluno, no cotidiano da sala de aula, na forma de compreender a realidade, nas situações complexas, na resolução dos problemas diários. A ideia defendida por Schön acerca da reflexão na e sobre a ação, conforme Perrenoud está atrelada à experiência de mundo e não se aprende na escola em que o professor se formou ou está se formando, o autor afirma que a prática reflexiva tem relação com os valores, as normas, o poder. Ele elencou pontos que acredita serem necessários para formar os professores para refletir sobre suas práticas (PERRENOUD, 2002):

Compensação da superficialidade da formação profissional;

Favorecimento da acumulação de saberes de experiência (empirismo);

Favorecer uma evolução rumo à profissionalização; Preparar para assumir uma responsabilidade política e ética; Permitir enfrentar a crescente complexidade da tarefa; Ajudar a vivenciar um ofício impossível; Oferecer os meios necessários para trabalhar sobre si mesmo; Aumentar a cooperação entre colegas; Aumentar as capacidades de inovação (p. 48).

Percebemos que tais pontos pressupõem que é por meio da prática, das trocas de experiências entre os pares, que o exercício da reflexão vai se construindo, se transformando num instrumento em favor do homem, do profissional. Perrenoud

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advoga a concepção de “prática reflexiva” como fundamental para a profissionalização docente, para ele:

A prática reflexiva [seria importante] porque, nas sociedades em transformação, a capacidade de inovar, negociar e regular a prática é decisiva. Ela passa por uma reflexão sobre a experiência, favorecendo a construção de novos saberes (PERRENOUD, 2002, p.15).

Tanto os estudos de Schön (1990), quanto os de Perrenoud (2002), vinculam a ideia de profissionalização a uma organização do trabalho pedagógico com base na reflexão sobre e na ação, colocando em relevo uma epistemologia da prática, numa perspectiva de formação caracterizada pela construção do conhecimento prático profissional mediado pela reflexão.

Só um formador reflexivo pode formar professores reflexivos, não só porque ele representa como um todo o que preconiza, mas porque ele utiliza a reflexão de forma espontânea em torno de uma pergunta, de um debate, de uma tarefa ou de um fragmento de saber (PERRENOUD, 2002, p. 72).

Entretanto, na concepção de prática reflexiva empregada por Perrenoud, surge um paradoxo quando esta é tomada como “natural”, comparando-a, inclusive, com o ato de respirar. Por considerar o ato de refletir natural, Perrenoud (2002) faz o seguinte questionamento: “por que formar para a reflexão se isso parece ser tão natural quanto é natural respirar?” (p.47). A prática reflexiva, em suas palavras,

Deve passar por uma sistematização, ou seja, uma metodização, ao mesmo tempo em que só pode ser adquirida com base em um treinamento. Portanto, ao propor treinar a reflexão, essa dimensão da subjetividade humana passa a ser concebida como reações cerebrais (respostas) a estímulos captados do meio externo por intermédio do sistema sensorial e codificados pelo sistema nervoso, proposição que faz do desenvolvimento da prática reflexiva um processo condicionado pela instrumentalização ou tecnificação do pensamento.

O paradigma dominante na área de formação de professores, na atualidade, segundo Perrenoud (2002), é representado por um professor que reflete sobre a sua prática, que pensa e que elabora em cima dessa prática.

Também em diálogo com Schön (1990), Zeichner (1993) nos diz que o agir do professor na sala de aula é informado pelas suas teorias pessoais, mas ele adianta que a reflexão constitui uma dimensão do trabalho do professor que, para ser entendida, precisa integrar as condições de produção desse trabalho. As escolhas e as opções que

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os professores fazem têm implicações nas oportunidades que são proporcionadas às crianças e, neste sentido, na justiça social. Assim, os esforços de um professor que não reflete sobre o ensino, que atua de acordo com a rotina, aceitando a realidade da escola, vão no sentido de encontrar as soluções que outros definiram por ele. Assim, Zeichner (1993) ratifica que “o importante é o tipo de reflexão que queremos incentivar nos nossos programas de formação de professores, entre nós e os nossos estudantes e entre os estudantes” (1993, p. 50). Portanto, a ação reflexiva do professor lhe confere o poder emancipatório.

É com esse novo olhar, marcadamente na década de 1990, que a formação continuada de professores enxergou elementos vitais para se pensar e repensar os processos pelos quais os professores se constituem como profissionais reflexivos, como sujeitos históricos e produtores de saberes.

Nessa época, a teoria da “Psicogênese da língua escrita”, construída por Ferreiro e Teberosky, já havia sido amplamente divulgada no Brasil, refutando concepções de alfabetização e, com isso, modificando a forma de conceber a criança e como ela aprende. Discutiremos, sem a pretensão de esgotar o tema, sobre essas mudanças de concepções no tópico a seguir.

2.2. Alfabetização, formação de professor e prática pedagógica

Como já foi explicitado neste estudo, a tendência crítico-reflexiva deu lugar a uma discussão para a formação continuada de professores não antes vista no sentido de considerar a relação e o diálogo entre a teoria e a prática, os saberes docentes e o cotidiano escolar, visando a prática docente. Sobre esse “novo olhar” discutiremos a seguir.

2.2.1 Concepções de alfabetização e Formação continuada de professores

Quando falamos sobre alfabetização logo surgem em nossa mente lembranças de como fomos alfabetizados. Dependendo da época, a forma como essa aprendizagem aconteceu assume diferentes configurações: se aprendemos repetindo, memorizando, ou se pensando, refletindo sobre o sistema de escrita alfabética. Dependendo de como isso ocorreu, pressupomos quais concepções estavam (estão) subjacentes a tal ensino-aprendizagem. Essa relação entre tempo histórico e perspectiva teórica deixa claro que

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as concepções sobre o processo de alfabetização são uma construção social. Ao longo desse processo de construção, percebemos grandes avanços tanto no que diz respeito ao termo, bem como às práticas de formação continuada e de ensino da alfabetização.

Durante muito tempo, as discussões sobre a alfabetização se deram, basicamente, no âmbito do ensino, já que a preocupação estava na escolha do melhor método. Conforme Soares (1991), principalmente nos anos de 1950 e 1960, havia uma intensa presença de estudos e pesquisas voltadas para a discussão sobre quais métodos seriam mais eficazes, se os métodos sintéticos ou analíticos. Estes estavam baseados numa visão associacionista/empirista, em que a escrita alfabética era considerada como um código no qual a criança, para aprender, bastaria decorar “a equivalência entre as formas gráficas (letras) e os sons que elas substituem (fonemas), os aprendizes viriam a ser capazes de “decodificar” ou “codificar” palavras” (MORAIS, 2012, p. 46).

Até a década de 1980, a prática do professor seguia o passo a passo dos métodos de ensino para alfabetização. Tais métodos estavam divididos em: sintético, analítico e misto ou eclético. Apresentaremos, sumariamente, suas principais características.

Começaremos pelo método sintético, considerado o mais antigo. O ponto inicial da aprendizagem nesse método são as unidades linguísticas menores e ele pressupõe o aprendizado da relação grafema/fonema pela identificação sonora, para, em seguida, chegar às palavras ou frases. Para Souza (2003, p. 22), este método lida com a “comunicação como se fosse realizada apenas por meio de fragmentos gráficos e sonoros, sem considerar o aspecto semântico”. De acordo com Frade (2007), os métodos sintéticos priorizam a decoração de sinais gráficos e as correspondências fonográficas.

Conforme Morttati (2006), os chamados métodos de marcha sintética partiam da parte para o todo: a soletração (alfabético) parte do nome das letras; o fônico parte dos sons correspondentes às letras, e a silabação (emissão de sons), como o próprio nome já indica, parte das sílabas. Para iniciar o ensino da leitura, o professor começava pela apresentação das letras e seus nomes (método alfabético), ou de seus sons (método fônico), ou das famílias silábicas (método da silabação), seguindo, rigorosamente, certa ordem crescente de dificuldade. Após esse processo, trabalhava-se com frases isoladas ou agrupadas. Em relação à escrita, esta se restringia “à caligrafia e ortografia, e seu ensino, à cópia, ditados e formação de frases, enfatizando-se o desenho correto das letras” (ibidem, p. 5).

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Em contraposição ao método sintético surge o método analítico. Este valoriza intensamente o aspecto visual da palavra, frase ou texto, em detrimento do fonético. Pressupõe a compreensão do texto, destacando a análise do “todo” para as “partes”, seguindo a ordem inversa do método sintético, ou seja, partindo das unidades maiores (palavras, frase, texto) para as unidades menores (letras, sílabas), no sentido de romper com o princípio da decifração, propondo a percepção do todo antes das partes, entendendo, dessa forma, que o educando deve ter uma percepção total da palavra para posteriormente compreender seus aspectos menores, as sílabas e as letras. A leitura é concebida como um ato global e audiovisual.

Destacamos também os métodos mistos (analítico-sintéticos) ou ecléticos. Por meio dele, “o aluno analisa e compreende textos e frases, reúne sílabas para formar palavras e, ao mesmo tempo, agrupa palavras e forma frases” (ALMEIDA, 2008, p. 5). Em síntese,

Os métodos sintéticos, analítico e misto são chamados também de métodos tradicionais ou cartilhescos, os quais consistiam apenas em cópias, ditados, listas e mais listas e exercícios do tipo siga o modelo. Assim, quando o professor solicitava aos alunos que lessem o alfabeto (todos liam) e ao pedir para escreverem ou formar uma palavra, esses não sabiam. Percebe-se aí que o (re) conhecimento das letras que formavam as famílias silábicas eram “decoradas” na sua ordem (ibidem, p. 6).

Marcado como território de disputas, os métodos de alfabetização acima citados, concebem a criança numa visão adultocêntrica, ou seja, como se pensassem igualmente a um adulto. Tanto os métodos sintéticos, quanto os analíticos:

Partem do pressuposto de que as crianças, naturalmente e sem dificuldades, já pensariam desde cedo, que as letras “substituem sons das palavras que pronunciamos”. Essa visão simplista é o que justificaria a solução de, simplesmente, transmitir-lhes, de forma pronta, as informações sobre correspondências som-grafia (MORAIS, 2012, p.31).

Em diálogo com os métodos de alfabetização, a concepção do ato de alfabetizar corrente nesta época resumia-se apenas à aquisição da língua escrita como a transcrição de sinais sonoros. Compreendia-se a escrita como um código e o ato de ler como uma simples decodificação desses códigos, ou sinais. A aprendizagem da escrita

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acontecia mediante treinamentos, imitações de modelos, repetições. Tudo isso ocorria de forma mecânica, descontextualizada, sem relação com a vida da criança.

No olhar dos métodos de ensino, a criança era tomada como um ser passivo, um depósito, onde o professor depositava os conhecimentos prontos. O erro era abominado, proibido, pois era um comportamento negativo e, portanto, deveria ser excluído. Os problemas relativos à aprendizagem, a culpa pela reprovação, na visão dos métodos, era dos educandos, já que os professores cumpriam rigorosamente com todas as instruções prescritas para aplicação dos conteúdos na sua sala de aula e, portanto, os responsáveis pela não aprendizagens seriam as próprias crianças. Muito tempo depois, vários estudos revelaram que o problema do fracasso em alfabetizar não se dava por causa dos métodos, mas pela precária preparação e formação dos professores, como afirma Cagliari (1998):

Como as escolas de formação de professores para o magistério, guiadas por estranhas ideias oriundas das faculdades de educação, não conseguem dar a formação necessária para os professores, os órgãos públicos encarregados da educação passaram a dar periodicamente “pacotes educacionais”, de acordo com os modismos da época. (...) os professores, atormentados com tantas mudanças, vítimas da própria incompetência, foram experimentando todos os “pacotes” (p.33). A alfabetização, no período entre os anos de 1970 e 1980, se deu por meio de uma sistematização dos conteúdos. O recurso didático utilizado para desenvolver o método era a cartilha escolar e o professor atuava como transmissor do conhecimento. De posse da cartilha, os docentes levavam as crianças a identificar os sinais gráficos (letras, sílabas e palavras) e a fazer associações aos sons correspondentes. A prática pedagógica do professor e as cartilhas escolares por ele utilizadas condiziam com os postulados presentes nas metodologias tradicionais de ensino, que defendiam um ensino pautado apenas na codificação e decodificação dos sinais gráficos. Com isso, fica notório que, ao alfabetizar o aprendiz com embasamento nesta perspectiva, valorizava-se o produto final do ato de ler e escrever, concebendo o educando como simplesmente um decodificador de letras. Nessa perspectiva,

O professor era concebido como um organizador dos componentes do processo de ensino-aprendizagem (objetivos, seleção de conteúdo, estratégias de ensino, avaliação, etc.) que deveriam ser rigorosamente planejadas para garantir resultados instrucionais altamente eficazes e eficientes. Consequentemente, a grande preocupação, no que se refere

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à formação do professor, era a instrumentalização técnica (PEREIRA, 2000, p. 16).

O modelo de formação de professores estava marcado por uma concepção de professor como aquele que simplesmente aplica o conteúdo produzido por outrem, a formação se configurava como “pacote” de conhecimentos com conteúdos sem relação com as práticas pedagógicas cotidianas que os produzem, a denominada formação tecnicista. De acordo com Contreras (1997),

Na racionalidade técnica a competência profissional está associada ao domínio de técnicas, tornando o professor dependente de diretrizes elaboradas por especialistas. Assim, a atuação docente necessita da prévia elaboração de recursos técnicos e de saberes básicos que são produzidos em outro contexto institucional. Essa dicotomia pessoal e institucional entre a criação do conhecimento e sua aplicação é hierárquica e representa distinto reconhecimento e status tanto acadêmico como social para as pessoas que produzem os diferentes tipos de conhecimento e para os que aplicam, assentando-se assim uma clara divisão do trabalho (p.92).

Os métodos de ensino marcaram a história da alfabetização no Brasil, mas, a partir da década de 1980, o debate sobre qual melhor método para alfabetizar perdeu espaço para o construtivismo, um novo paradigma educacional que coloca em relevo que o processo de alfabetização necessita ser organizado através de uma linguagem contextualizada, significativa, em detrimento de uma aprendizagem mecânica, passiva, descontextualizada. A pesquisa desenvolvida por Emília Ferreiro e Ana Teberosky (1999), baseada nas teorias de Jean Piaget, reconhece a criança como principal sujeito de seu processo de aprendizagem.

Não seria exagero, portanto, dizermos que a história da alfabetização no Brasil é marcada por dois momentos: antes e depois da divulgação da teoria da psicogênese da língua escrita, desenvolvida por Ferreiro e Teberosky (1979), em que o paradigma construtivista de aprendizagem da leitura e da escrita conquista um largo espaço no cenário nacional educacional. Mas, o que queremos dizer com antes e depois? Bem, sabemos que subjacente a toda prática humana há uma concepção de homem, de conhecimento, de aprendizagem, de mundo, dentre outras coisas, que fundamentam, orientam a ação do ser humano, pois nada está no vazio, nada é neutro. Partindo desse pensamento, consideramos como divisor de águas da história da alfabetização no Brasil a teoria da psicogênese da língua escrita, criada por Ferreiro e Teberosky (1979), pois, como escreveu Soares (2003),

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Modificou profundamente a concepção do processo de aquisição da língua escrita, em aspectos fundamentais: a criança, de aprendiz dependente de estímulos externos para produzir respostas que, reforçadas, conduziriam a aquisição da língua escrita – concepção básica dos métodos tradicionais de alfabetização – passa a sujeito ativo capaz de construir o conhecimento da língua escrita, interagindo com esse objeto de conhecimento; os chamados pré-requesitos para a aprendizagem da escrita, que caracterizariam a criança “pronta” ou “madura” para ser alfabetizado – pressuposto dos métodos tradicionais de alfabetização -, são negados por uma visão interacionista que rejeita a ordem hierárquica de habilidades, afirmando que a aprendizagem se dá por uma progressiva construção de estruturas cognitivas, na relação da criança, no processo de aprendizagem da língua escrita (SOARES, 2003, p.89).

Os estudos mencionados sinalizaram para aspectos como o fracasso em alfabetizar e tinham a função, conforme a própria pesquisadora, afirma “mostrar e demonstrar que as crianças pensam a propósito da escrita, e que seu pensamento tem interesse, coerência, validez e extraordinário potencial educativo” (FERREIRO, 2002, p. 36).

Nessa perspectiva, ser alfabetizado perpassa a capacidade de escrever o próprio nome ou um pequeno bilhete. O termo assume uma nova concepção, como se pode constatar nos relatórios da UNESCO (2002):

O alfabetizado é uma pessoa capaz de ler e escrever, com compreensão, uma breve e simples exposição de fatos relativos a vida cotidiana, formando indivíduos competentes para o exercício de todas as atividades em que a alfabetização é necessária para que ele atue eficazmente no seu grupo e na sua comunidade e cujos resultados alcançados em leitura, escrita e cálculo lhe permitam continuar a colocar suas aptidões a serviço de seu desenvolvimento próprio e do desenvolvimento da comunidade e de participar ativamente da vida de seu país (p. 46).

Ferreiro e Teberosky (1979) evidenciaram e colocaram em discussão questões antes ignoradas como, por exemplo, a de que as oportunidades sociais afetam o ritmo de apropriação do Sistema de Escrita Alfabético (SEA). Com base em resultados de pesquisas, as pesquisadoras supracitadas constataram que as crianças oriundas de grupos socioculturais diferentes apresentam mesmo processo evolutivo, refutando uma concepção de que a apropriação da escrita alfabética depende da maturação biológica. Concordando com Ferreiro e Teberosky, Morais pontua que:

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As oportunidades de vivenciar práticas de leitura e escrita influenciam muitíssimo o ritmo do processo de apropriação do sistema de escrita alfabético e dos conhecimentos sobre a linguagem usada ao escrever (2012, p.75).

Essa constatação foi (é) muito importante, pois demonstraram que a alfabetização é de natureza conceitual e não perceptual. Isso que dizer que a criança pensa sobre a escrita, participa ativamente do processo de aprendizagem, não chega à escola como uma tábula rasa, convive com a escrita em seu cotidiano e participa de diversas práticas sociais em que a leitura e a escrita se fazem presentes. A ideia de que a criança precisa pensar sobre a escrita para tornar-se alfabetizada, de privilegiar o “como se aprende”, conceber a escrita com um objeto sociocultural de conhecimento, qualificou o estudo como uma revolução conceitual. Conforme Ferreiro (1989, apud FERNANDES et al., 2009, p. 7),

A construção do código linguístico não se dá pelo cumprimento de uma série de tarefas ou pelo conhecimento das letras e das sílabas, mas pela compreensão do funcionamento desse código, mostrando que os educandos têm ideias e hipóteses e, que as confrontam com sua realidade e com as ideias de outras pessoas, e, por isso, a contribuição de Emília Ferreiro é essencial para que o educador repense todo o processo de ensino-aprendizagem.

A “revolução” promovida pela teoria da psicogênese construída por Emília Ferreira e Ana Teberosky (1989) teve como consequência mudanças na concepção de professor, aprendizagem, na ampliação do conceito de alfabetização. Surge uma nova concepção de formação continuada – com a racionalidade prática em oposição à racionalidade técnica e, principalmente, na forma como os métodos tradicionais de alfabetização concebiam a atividade do aprendiz, assim como a concepção de escrita como um código.

Com o advento da teoria da psicogênese da língua escrita, o professor, antes visto como um mero executor de tarefas, passa a ocupar o papel de promotor da construção do conhecimento, orientador, mediador da aprendizagem que deve ter como ponto de partida um contexto real, no qual o educando possa interagir com o objeto do conhecimento de modo significativo. Tanto o professor quanto o aprendiz, nessa perspectiva construtivista, constituem o centro do processo de ensino aprendizagem.

O construtivismo, então, enfoca que o processo de alfabetização precisa ser organizado por intermédio de uma linguagem

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contextualizada e significativa, tornando a assimilação do código linguístico uma atividade de pensamento e não mecânica. No construtivismo, a preocupação deve ser desenvolver a linguagem escrita e não a escrita de letras (FERNANDES et al., 2009, p. 5). A escrita é concebida como objeto conceitual e a aprendizagem passa a se orientar para a compreensão da natureza dessa representação, superando a visão de alfabetização como um domínio de uma técnica. As produções escritas das crianças ganham um novo sentido, um novo significado. O erro, tão criticado pelo ensino tradicional, passa a ser compreendido como uma etapa significativa do percurso do aluno, isso implica uma mudança de atitude do professor em relação às respostas do aluno. Indica-se um uso social da leitura, em detrimento do uso, exclusivamente, escolar. A alfabetização passa a ser concebida como um processo de interação e reflexão sobre a língua.

Dentre as contribuições da teoria construída por Ferreiro e Teberosky (1979), destacamos as citadas por Morais (2012),

Aprendemos que os métodos tradicionais de alfabetização tinham uma visão errônea sobre a atividade do aprendiz. Descobrimos que a escrita não é um código [...], aprendemos que não é preciso controlar as palavras com que a criança se defronta [...], aprendemos, também, que o processo de letramento [...], começa fora da instituição escolar, bem antes do ano de alfabetização, e que deve ser bem conduzido na escola, e pela escola, desde a educação infantil [...]. Evidenciou que as oportunidades de vivenciar práticas de leitura e escrita influenciam muitíssimo o ritmo do processo de apropriação do sistema de escrita alfabético [...]. Não existe “prontidão” para a alfabetização [...] passamos a entender que todos têm o direito a se alfabetizar (p.74 – 75).

Ainda conforme Morais (2012), a referida teoria trouxe muitas contribuições, mas ao lado delas vieram alguns problemas e equívocos. Um deles diz respeito à denominada “desinvenção” da alfabetização. Conforme este autor, com a ampla divulgação da teoria, nas décadas de 1980 e 1990, nos cursos de formação inicial e de formação continuada, se instalou “um discurso segundo o qual as crianças, espontaneamente, aprenderiam a ler, desde que pudessem participar de situações onde se lessem e escrevessem textos cotidianamente” (ibidem, 77).

A introdução da concepção construtivista nas práticas escolares, por meio das formações continuadas, significou a inserção da escola e dos saberes nela forjados num movimento constante de análise e reflexão sobre seu fazer pedagógico, com o objetivo de oportunizar aos aprendizes aulas mais significativas.

Referências

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