PRODUÇÃO CIENTIFICA SOBRE A SAÚDE DO TRABALHADOR: UMA PESQUISA BIBLIOGRÁFICA
Neide Tiemi Murofuse1 Rejane Rodrigues da Silva 2
INTRODUÇÃO: A área da Saúde do Trabalhador surge no contexto do Movimento da Reforma Sanitária, que tinha como proposta uma nova concepção de Saúde Pública para o conjunto da sociedade brasileira. Foi uma resposta institucional aos diversos movi-mentos sociais que, entre a metade dos anos de 1970 e os anos de 1990, reivindicava a Saúde do Trabalhador como parte do direito universal à saúde e não mais meras ações dissociadas da atenção individual, resumidas a campanha e programas (BRASIL, 2005). Com a Constituição Federal de 1988 os brasileiros conquistaram o direito universal à saúde tendo o Estado o dever de cuidar da saúde e da assistência pública, bem como proteger o meio ambiente e combater a poluição em quaisquer de suas formas. Previu-se que o direito à saúde, inalienável e irrenunciável, é instituído e deve ser garantido medi-ante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos (BRASIL, 2002). Atualmente as relações entre saúde e trabalho previstas cons-titucionalmente são disciplinadas em três esferas: a) do trabalho, b) da saúde e c) da pre-vidência social. A superação da fragmentação da responsabilidade pelas ações nas áreas de segurança e saúde dos trabalhadores será alcançada pela integração dessas esferas através de uma atuação intra e inter setorial. O processo de mundialização do capital e o papel assumido pelo Brasil apresentam repercussões diretas no modelo de desenvolvi-mento adotado no país com conseqüências sobre a saúde da população. A privatização, 1Enfermeira, Doutora, Profª do Curso de Enfermagem da Unioeste – Campus de Cascavel.
2 Administradora, Especialista, Técnica de Recursos Humanos da Unioeste. E-mail: rejanerodri@yahoo.com.br
terceirizações, mudanças organizacionais e tecnológicas, produzem impactos sobre a saúde, o meio ambiente e a vida dos trabalhadores. Frente às intensas e rápidas mudan-ças que tem marcado o atual contexto, a presente investigação constitui-se num momen-to inicial do processo de estudo a serem desenvolvidos nessa área visando buscar a com-preensão sobre as transformações ocorridas no mundo do trabalho e os seus impactos na saúde dos trabalhadores.
OBJETIVO: Analisar a produção científica sobre a saúde do trabalhador e identificar as principais temáticas objetivos, metodologia e resultados abordados pelos estudiosos. METODOLOGIA: Trata-se de uma pesquisa bibliográfica; definida por Lakatos; Mar-coni (1991, p.158) como aquela que realiza “um apanhado geral sobre os principais tra-balhos já realizados, revestidos de importância, por serem capazes de fornecer dados atuais e relevantes relacionados com o tema”. O levantamento bibliográfico foi realiza-do no períorealiza-do de 11de junho a 17 julho de 2005, através da Internet, na base de darealiza-dos da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração –ANPAD e no
Scientific Electronic Library Online –SciELO. Da ANPAD foram analisadas as publica-ções da Revista de Administração Contemporânea – RAC, do período de 1997 a 2005, disponibilizadas no site www.anpad.org.br/public_rac.html. No SciELO foi utilizado a versão em português do site www.scielo.org/index.php?lang=pt. Nessas bases de dados foram cruzadas as palavras-chaves: saúde do trabalhador, professor, ensino, saúde-doen-ça, universidade, docente, administração universitária, carreira acadêmica, qualificação do professor, condições de trabalho, aposentadoria, saúde ocupacional. A busca realiza-da na RAC resultou em 32 revistas contendo 264 artigos, 30 documentos e debates e 06 casos de administração. A busca no SciELO resultou em 94 periódicos de 05 áreas sen-do 49 revistas das áreas da saúde, 6 revistas de psicologia, 5 revistas de psiquiatria, 9 re-vistas da saúde pública e 25 rere-vistas das Ciências Sociais. Foram selecionados 18 arti-gos (5 da RAC e 13 da SciELO) com temáticas envolvendo trabalho, saúde e doença. A análise feita através da leitura seletiva foi registrada numa ficha bibliográfica, sendo fo-calizados a quantidade de artigos encontrados e a síntese dessas publicações com a
iden-tificação das publicações (periódico, volume, número e ano) e o conteúdo do artigo (ob-jetivo, metodologia e principais resultados).
RESULTADOS: No presente estudo analisou-se 18 artigos publicados em 13 periódicos, encontrados nas duas bases investigadas entre os anos de 1997 a 2005. Da análise dos artigos constatou-se que a maioria (94,5%) foi publicada a partir de 2000 e a minoria (5,5%) no ano de 1997. A partir de 2000 houve maior regularidade e aumento na quantidade de publicações e em periódicos diversos. Em 2000 foram publicados 11% dos artigos na RAC; em 2001 foram 17% das publicações em três periódicos: Reflexão e Crítica, Psicologia em Estudo e RAC; em 2002 obteve-se 11% dos artigos na Revista Salud Pública de México; em 2003 foi 5,5% das publicações na Revista da Associação Médica Brasileira; em 2004 obteve-se 28% dos artigos publicados em cinco periódicos distintos: Cadernos de Saúde Pública, Psicologia & Sociedade, Psicologia em Estudo, Revista de Ciências Sociais e Revista Estudos Feministas. Embora o resultado referente ao ano de 2005 seja parcial, já havia 22% dos artigos publicados em quatro periódicos: Ciência y Enfermería, Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul, Revista de Psiquiatria Clínica e Revista Panamericana de Salud Pública. O resultado obtido evidencia que a temática investigada tem sido abordada majoritariamente nos últimos cinco anos em revistas de diversificadas áreas como a administração, medicina, enfermagem, psiquiatria, saúde pública, psicologia e ciências sociais. Ao analisar as temáticas mais freqüentes constata-se qual tem sido o foco de interesse dos estudiosos da área. A relação da saúde e trabalho e o estresse registraram o mesmo índice com 17% das publicações, sendo o último abordado em seus aspectos psicossociais e relacionado ao trabalho (estresse ocupacional e como acidente de trabalho). Outros temas abordaram as condições de trabalho, mudanças na natureza do trabalho, qualidade total, dinâmica no mercado de trabalho, gênero e insegurança no trabalho, mulher no trabalho, qualidade de vida, aposentadorias por incapacidade, comprometimento organizacional, identidade ocupacional, desenvolvimento interpessoal no trabalho e ansiedade social. Entre os objetivos dos estudos realizados os principais foram conhecer a relação entre as
inovações organizacionais e a saúde dos trabalhadores; analisar as condições de trabalho, investigar os fatores de stress e sua relação com a saúde dos trabalhadores. Predominantemente utilizou-se como metodologia a pesquisa de campo envolvendo amostra de trabalhadores da construção civil, empresasucroalcooleiras, banco, refinaria de petróleo e universidades. Esta diversidade dos locais em que foram realizados os estudos confirma que há necessidade de estudos específicos, para abarcar a particularidade existente nas organizações e nos processos de trabalho, para compreender os problemas decorrentes do trabalho que afetam a saúde dos trabalhadores. Lacaz (2000) afirma que para alcançar a eficácia e a abrangência necessárias há necessidade da constituição de uma base mais sólida para a intervenção sobre os fatos geradores de agravos à saúde oriundos dos processos de trabalho. Para isso propõe como ponto de partida o conhecimento do território e das necessidades da população, considerando as áreas de risco e o espaço produtivo. Os estudos resultaram na indicação de que as políticas de recursos humanos e os programas de qualidade total estavam inseridos em organizações racionalistas que visam prioritariamente elevar os índices de produtividade e reduzir custos, sem uma preocupação efetiva com os trabalhadores e a saúde vista como questão estritamente biológica, individual e curativa. Enfatizou-se a necessidade de desenvolver ações preventivas para minimizar doenças e acidentes de trabalho e desenvolver medidas para superar as subnotificações. A importância da emissão da Comunicação de Acidentes de Trabalho foi reforçada para garantir os direitos do trabalhador, servir como instrumento para a vigilância em saúde e a prevenção de novos casos. A avaliação do impacto de estressores cotidianos no contexto de trabalho classificou a área pessoal como sendo a predominante, nas áreas de origem dos acontecimentos estressantes, porém os aspectos físicos do ambiente tiveram lugar preponderante na hora de gerar mal-estar. Em relação aos fatores próprios da tarefa, conjuntamente com os institucionais, indicaram-se aqueles aspectos de subutilização de capacidades ou desvalorização em relação à auto-estima do próprio trabalhador.
CONCLUSÃO: O estudo realizado evidenciou que as temáticas da área da saúde do trabalhador são amplas e objeto de distintas áreas do conhecimento que resultaram em publicações em periódicos da administração, medicina, enfermagem, psiquiatria, saúde pública, psicologia e ciências sociais. As produções científicas abordaram diferentes ambientes de trabalho num contexto marcado pelas mudanças introduzidas no mundo do trabalho. Evidenciou-se que aos problemas já existentes nessa área foram acrescidos novos elementos, decorrentes da reestruturação produtiva tais como o desemprego, a precariedade e a intensificação do trabalho, com conseqüências nefastas sobre a saúde dos trabalhadores. Esses novos elementos retratam uma clara mudança na forma de emprego tradicional, o trabalho em tempo integral por tempo indeterminado, seja nos setores da indústria ou de serviço, está sendo substituída pelas várias formas do chamado cost-free labor: trabalho temporário, por tempo determinado, em tempo parcial, esse, com predominância do trabalho feminino e concentrado principalmente em ocupações menos prestigiadas e qualificadas. O incentivo à desregulamentação de direitos trabalhistas, flexibilização dos contratos de trabalho, racionalização organizacional, substituição da mão-de-obra pela automação e a aceleração de variadas práticas de subcontratação, tem sido adotado pelas empresas, como forma de diminuir os custos. Os artigos analisados revelam que a mudança introduzida no trabalho terá reflexos na saúde dos trabalhadores e deverá ser ainda objeto de muitos estudos.
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
BRASIL. Ministério da Saúde. Texto de Apoio da 3ª Conferencia Nacional de Saúde do Trabalhador. Brasília: MS, 2005.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, Subsecretaria de edições técnicas, 2002.
LACAZ, F. Saúde do trabalhador:cenários e perspectivas numa conjuntura privatista. In: Seminário do Sintratel, 2000, São Paulo. Disponível em < http://www.rel-uita.org/old/home/ler/informes/saudedotrabalhador.htm
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LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. A.. Fundamentos de Metodologia Científica. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1991.
RAC. Revista de Administração Contemporânea. Endereço eletrônico disponível em:
http://www.anpad.org.br/public_rac.html. Acessado em 11 de junho a 17 de julho de
2005.
SciELO - Scientific Electronic Library Online - Endereço eletrônico disponível em: