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CARACTERIZAÇÃO HIDRODINÂMICA DE DISPOSITIVOS PARA DRENAGEM EXTERNA DE LÍQUIDO CEFALORRAQUIDIANO

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CARACTERIZAÇÃO HIDRODINÂMICA DE DISPOSITIVOS PARA DRENAGEM EXTERNA DE

LÍQUIDO CEFALORRAQUIDIANO

Camila Bim1*, José Ricardo Camilo2*, Angelo L. Maset2†, Sérgio Said Mansur1†, Edson Del Rio Vieira1†† 1-UNESP Universidade Estadual Paulista– Ilha Solteira, Av. Brasil Centro, 56, Ilha Solteira, Brasil, email: *ca_bim@hotmail.com, {mansur,

††delrio}@dem.feis.unesp.br

2-Ventura Biomédica, Av. Francisco Chagas de Oliveira, 1100, São José do Rio Preto, Brasil, email: {*camilo, maset}@venturaneuro.com.br Palavras chave: Líquido cefalorraquidiano, Drenagem do LCR, Liquor, Hidrocefalia

Resumo

No interior dos ventrículos cerebrais, nos chamados plexus coroidais, é continuamente produzida uma solução salina incolor, com baixa concentração de células e proteínas, denominada líquido cefalorraquidiano (LCR), ou simplesmente liquor. Escoando através de pequenos orifícios denominados foramens, o liquor é conduzido até a parte externa do cérebro, recobrindo todo o cérebro e a coluna espinhal, sendo absorvido nos vilos aracnóides. Em um adulto normal e saudável, cerca de 500 ml de LCR é continuamente produzido e reabsorvido diariamente. Problemas na produção ou na absorção do LCR podem induzir sensíveis alterações na pressão intraventricular (PIV), dando origem a uma fisiopatologia conhecida como hidrocefalia. A hidrocefalia pode ocorrer em adultos e crianças, em consequência de malformação congênita, tumores, inflamações, infecções, encefalite, hemorragias intracranial, hematomas subdural ou epidural, abscessos, traumatismos, cistos aracnóides, aneurismas, além de várias outras causas não esclarecidas. Um aumento da PIV acima de valores críticos pode produzir danos cerebrais irreversíveis, podendo, até mesmo, levar o paciente à morte. Sobreviventes, em geral, apresentam sérias idiopatias. Estudos têm mostrado que, a partir de 1960, quando a drenagem do LCR passou a ser realizada através de um cateter adequadamente implantado nos ventrículos cerebrais, houve uma redução de 54 % para 5 % na ocorrência de óbitos devidos à hidrocefalia e de 62% para 30% nos casos de perda de habilidades cerebrais.

Um sistema de drenagem do LCR é composto por diferentes componentes, tais como, válvulas reguladoras, cateter, tubos e válvulas direcionais. No presente trabalho, inserido no contexto da bioengenharia, diferentes testes de componentes individuais utilizados para drenagem externa do LCR são apresentados, caracterizando o comportamento hidrodinâmico destes componentes para diferentes regimes de escoamento ou situações de utilização. Os resultados obtidos mostram que o desempenho desse tipo de dispositivo é altamente dependente do projeto de engenharia e evidencia a necessidade de extensas baterias de testes, antes que um produto desta natureza possa ser posto no mercado.

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1. Introdução

O fluido cefaloraquidiano (LCR), também chamado de liquido cérebro espinhal ou liquor, é um fluido aquoso intracraniano, produzido pelos plexos coróides, dentro das das cavidades intracerebrais, chamadas de ventrículos cerebrais. Embora seu propósito principal esteja relacionado à proteção do tecido cerebral e da coluna espinhal contra choques mecânicos, o LCR também exerce um importante papel na proteção biológica do sistema nervoso, distribuindo nutrientes, proteínas e agentes de defesa contra infecções. Devido ao fato que o cérebro não possui um sistema linfático próprio, o LCR ainda é responsável pela retirada de material metabolizado do interior da cavidade craniana.

O liquor normalmente flui através de fendas estreitas, denominadas foramens, que comunicam os ventrículos entre si e se exteriorizam no sistema nervoso central por orifícios localizados no tronco cerebral. A Fig. 1 mostra uma vista lateral do cérebro humano com a disposição dos ventrículos e foramens.

Figura 1: Vista lateral do cérebro humano e os ventrículos cerebrais [3].

O liquor recobre também a medula espinhal, onde circula até sua parte mais inferior e retorna à cavidade cerebral, para ser absorvido por tecidos especializados em lançá-lo na corrente sanguínea. Em indivíduos normais, o líquido cefalorraquidiano é renovado é produzido a uma taxa aproximada de 500 ml/dia e renovado mais de três vezes ao dia [1] e [2]. O volume do espaço ventricular normal é de aproximadamente 20 ml, enquanto que o volume de liquor presente em uma pessoa adulta normal é de 120 a 150 ml [1]. Na Fig. 2, pode-se visualizar, em um esquema frontal do cérebro e da coluna espinhal, o caminho percorrido pelo LCR, desde o interior dos ventrículos cerebrais, passando pelo foramem de Magendie e preenchendo o espaço entre o cérebro e a caixa craniana, até sua circulação pela coluna espinhal e retorno à cavidade cerebral.

Em termos de aparência e composição química, o LCR é semelhante ao plasma sanguíneo ultra filtrado. Diversos autores concluíram que sua formação advém de um simples processo de filtragem do sangue [4]. O LCR, entretanto, contém maiores concentrações de magnésio e íons clorídricos e menores concentrações de glucose, proteínas, aminoácidos, ácido úrico, cálcio, fosfato e íons de magnésio que o plasma humano. Em razão dessas diferenças de concentração e da energia necessária à criação destes componentes, o autor concluiu que a formação do líquor deve resultar de um processo bem

mais complexo que a simples ultrafiltragem do plasma sanguíneo [4].

Figura 2: Vista frontal do cérebro humano mostrando também a coluna espinhal e o caminho percorrido pelo LCR [3].

Os plexos coróides estão constantemente produzindo LCR, aparentemente, por meio de um mecanismo semelhante ao dos glomérulos renais, o que implica na necessidade de sua reabsorção, pois, do contrário, se instalaria a chamada hipertensão intracraniana. A reabsorção do LCR se processa, provavelmente, nas granulações de Pacchioni da aracnóide e também nas bainhas das raízes dos nervos espinhais [5]. O acúmulo excessivo de LCR pode ocasionar variações incontroláveis na pressão intraventricular (PIV), dando origem a uma fisiopatologia conhecida como hidrocefalia. O acúmulo de LCR no interior dos ventrículos faz como que a PIV aumente significativamente, pressionando a massa cerebral contra a caixa cefálica. No caso de neonatos, onde as soldaduras da caixa cefálica ainda não foram totalmente estabelecidas, ocorre um significativo aumento do perímetro cefálico. Apesar da maior incidência de hidrocefalia em crianças, a sua ocorrência pode ser constatada em pacientes de todas as faixas etárias e, sobretudo, em indivíduos mais idosos, como frequentemente relatado na literatura médica. Qualquer que seja o caso, se não tratada de maneira adequada, a hidrocefalia poderá resultar em danos neurológicos irreversíveis, ou, até mesmo, no óbito do paciente. O diagnóstico da hidrocefalia é simples e pode ser efetuado com ajuda da tomografia computadorizada ou por meio de imagens de ressonância magnética. Ambos os exames são capazes de mostrar, com nitidez e clareza, a dilatação volumétrica ocasionada nos ventrículos. A título de ilustração, a Fig. 3 permite comparar, com o auxílio representações esquemáticas, o cérebro de uma criança normal (esquerda) com o de uma acometida de hidrocefalia (direita).

2. Causas da hidrocefalia

Basicamente, a hidrocefalia pode ser causada pelo aumento na produção do LCR (muito raro), pela absorção insuficiente do LCR, por distúrbios na circulação do líquor (hidrocefalia comunicante) ou, ainda, em virtude de obstruções nas vias de drenagem (hidrocefalia obstrutiva). Em todos os casos, os ventrículos se tornam maiores e como conseqüência, o cérebro é dilatado, comprimido-se dentro da caixa craniana.

As causas mais comuns para que esse fenômeno ocorra são:

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Hidrocefalia congênita: presente, desde o nascimento e, freqüentemente, a causa exata não pode ser determinada, não implicando em hereditariedade. Nos países em desenvolvimento, este tipo de hidrocefalia acomete, em média, de um a três neonatos para mil nascimentos [8].

Figura 3: Paciente infantil normal e com hidrocefalia.

Meningite: infecção das membranas que recobre o cérebro passível de ocorrer em qualquer faixa etária. O LCR circula entre as membranas denominadas pia mater e membrana subracnóide. No processo inflamatório causado pela infecção, esses tecidos criam debris e tornam-se fibrosos, dificultando a circulação do LCR e causando, assim, hidrocefalia comunicante.

Prematuridade: bebês nascidos prematuramente são mais suscetíveis à hidrocefalia do que bebês nascidos a termo, uma vez que alguns tecidos ainda não adquiriram maturidade.

Espinha bífida: a maioria dos bebês portadores de espinha bífida apresenta hidrocefalia. Além das anormalidades que ocorrem no cordão espinhal, também existem anormalidades na estrutura física de certas partes do cérebro que se desenvolvem, antes do nascimento, comprometendo, assim, a absorção do LCR.

Tumores: tumores intracranianos podem causar compressão e edema dos tecidos vizinhos, dificultando a circulação liquórica. Essa dificuldade para a circulação liquórica pode ser transitória, havendo a necessidade de medidas de controle temporário da hidrocefalia, com a drenagem temporária externa de líquor.

Outras causas da hidrocefalia podem ser hemorragia intracranial, má formação, inflamações e infecções, traumas, cistos e até parasitas que se alojam nos foramens. O tratamento da hidrocefalia requer procedimento cirúrgico, que consiste na implantação de um sistema valvular que drena o líquor dos ventrículos cerebrais para um local alternativo do corpo humano. O sistema valvular (shunt) controla a pressão intracraniana por meio da drenagem do excesso de LCR, prevenindo que a doença avance. Com isto, os sintomas e efeitos da hipertensão intracraniana são totalmente eliminados permitindo uma excelente qualidade de vida ao implantado.

3. Derivação do LCR

Quase todas as técnicas de tratamento da hidrocefalia são cirúrgicas. Uma das principais é a chamada derivação do LCR, que consiste na introdução de um cateter no interior dos ventrículos, para possibilitar a remoção do excesso de fluido, estabilizando, assim, a pressão intraventricular.

Desde 1960, quando os procedimentos de drenagem conhecido como shunt foram estabelecidos, a taxas de mortalidade por hidrocefalia sofreram um declínio de 54% para apenas 5%, enquanto as perdas de habilidades cerebrais de pacientes diminuíram de 62% para 30% [6]. Uma derivação semipermanente do LCR é um procedimento cirúrgico delicado, envolvendo a introdução da ponta de um cateter interno aos ventrículos laterais, para produzir a drenagem de excesso de fluido para outra parte do corpo humano, mais comumente para a cavidade abdominal. Tal procedimento é também chamado de derivação interna, onde uma válvula controladora de pressão permite manter a PIV em valores aceitáveis e uma tubagem subcutânea conduz o excesso de liquor para ser absorvido na cavidade abdominal, conforme mostrado na Fig. 4.

Figura 4: Derivação interna do LCR para a cavidade abdominal.

Infelizmente, o de shunt interno está sujeito a diferentes tipos de complicações, e seu funcionamento deve ser periodicamente controlado. Para aprimorar este tipo de implante neurológico, um grande esforço de pesquisa vem sendo permanentemente realizado em diferentes laboratórios ao redor do mundo.

Sistemas provisórios de drenagem, onde o excesso de fluido é conduzido a uma bolsa posicionada externamente ao corpo do paciente, podem ser utilizados em uma primeira etapa do tratamento da hidrocefalia, sendo que, logo a seguir, devem ser substituídos por sistemas internos (ou semi permanentes) de drenagem do líquor, geralmente o peritoneal. Os sistemas de drenagem externa do líquido cefalorraquidiano (ou provisórios), compostos basicamente de cateter ventricular, tubagem e bolsa de drenagem, têm seu funcionamento regido pelo princípio de vasos comunicantes, como ilustrado na Fig. 5. No coletor, pode-se medir o fluxo de LCR drenado do interior dos ventrículos. A parte superior do coletor encontra-se aberta para a atmosfera e a PIC deve ser equilibrada pela altura (h), entre o paciente e o coletor. Alterando-se a altura manométrica (h), que é cuidadosamente determinada pelo cirurgião, torna-se possível controlar a PIV a níveis aceitáveis, fazendo-se a drenagem do excesso de fluido.

A drenagem externa em pacientes com hidrocefalia obstrutiva é utilizada rotineiramente em muitos centros cirúrgicos como um procedimento temporário, com uma acentuada queda nas taxas de mortalidade. Em [7], os autores relatam 59 casos de hidrocefalia obstrutiva associadas a tumores cerebrais e diagnosticados por CT,

cateter válvula

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que foram tratados com shunt externo. Em somente 6 casos – pouco mais de 10% – um shunt interno foi necessário. A taxa de infecção foi de 10% e a mortalidade total de 8%. O uso da drenagem provisória externa durante e após a remoção do tumor causador da hidrocefalia mostrou-se uma alternativa efetiva ao sistema de drenagem interno. A utilização da drenagem externa também permitiu, na fase pós operatória, uma monitoração eficaz da PIV e a drenagem de sangue, aumentando a segurança e reduzindo a possibilidade de incidência de meningite.

Figura 5: Derivação externa do LCR.

Nos dois sistemas descritos, na drenagem interna semipermanente e na drenagem externa provisória, o controle da PIV deve ser cuidadosamente realizado. Dessa forma, o estudo hidrodinâmico dos sistemas de drenagem e de seus componentes individuais torna-se de importância fundamental para garantir o sucesso dos procedimentos médicos. No presente trabalho, os diversos componentes dos sistemas de drenagem externo de LCR são analisados do ponto de vista de seu desempenho hidrodinâmico.

4. Comportamento hidrodinâmico do cérebro

Em virtude das dificuldades de se medir com precisão e de forma contínua a pressão e a vazão em válvulas implantadas, modelos mecânicos artificiais do cérebro são construídos, com a finalidade de facilitar o estudo do desempenho de válvulas, sistemas anti-sifão e outros componentes empregados em dispositivos de drenagem. Alternativamente, modelos matemáticos são, em alguns casos, ser empregados para esta finalidade.

Um modelo simplificado do funcionamento hidrodinâmico do cérebro foi proposto por [9], o qual pode ser compreendido com o auxílio da Fig. 6. Neste esquema, os ventrículos são representados por um compartimento dotado de duas conexões, uma de entrada e outra de saída. A produção de líquor pode ser simulada ajustando-se uma vazão constante na entrada do sistema, podendo-se, na saída, impor uma resistência hidrodinâmica capaz de representar a condição fisiológica do paciente.

Figura 6: Representação esquemática do comportamento da pressão ventricular no cérebro [9].

No funcionamento deste aparato, podem-se identificar três fases distintas no preenchimento dos ventrículos. Na primeira delas, ocorre um rápido crescimento da pressão, com pequeno incremento no volume de líquor. Na segunda fase, o acréscimo da pressão se dá com grande aumento no volume de líquor. Na fase final, o comportamento se assemelha ao da fase inicial.

Outro parâmetro importante é a característica de compressibilidade dos ventrículos. Na Fig. 7 pode-se observar em (1) o comportamento dos ventrículos considerados com um sistema rígido e em (2) considerando-os como um sistema complacente.

Figura 7: Gráfico da pressão versus volume, considerando o sistema rígido (1) e o sistema complacente (2) [9].

Existe considerável evidência que comportamento hidrodinâmico dos ventrículos decorre de suas características elásticas. Na fase inicial, os ventrículos se comportam como se fossem totalmente inelásticos, o que justifica o aumento significativo da pressão para um pequeno aumento no volume de líquor. Na segunda fase, os ventrículos adquirem elasticidade, permitindo uma considerável mudança no volume, enquanto que a

cateter

bolsa

coleta

de

pressão a atmosféric válvula vias de 3 coletor

H

válvula check 3 fase 2 fase 1 fase entrada saída volume pressão [ml] [mmHg]

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mudança da pressão é lenta e pequena. Finalmente, na terceira fase, os ventrículos retornam seu estado semirígido.

O sistema de drenagem externa deve proporcionar a drenagem do excesso de líquor presente nos ventrículos. Considerando-se que a vazão de entrada desse fluido é constante e que pressão de interna do sistema também deve ser mantida constante – segundo [8], de 5 a 15 mmHg em indivíduos saudáveis –, a bolsa de coleta deve estar sempre situada acima da posição de referência preestabelecida. Caso a bolsa coletora seja colocada abaixo dessa posição de referência, devido ao efeito sifão, poderá ocorrer a hiperdrenagem do fluido contido no reservatório ventricular, causando sérios danos ao cérebro do paciente.

5. Pressão intra ventricular

O funcionamento do sistema de drenagem externa depende fortemente da pressão intra-ventricular (PIV). Essa pressão hidrostática dentro dos ventrículos cerebrais sofre alterações significativas segundo as condições fisiológicas e a posição em que se encontra o indivíduo – se ereto (vertical) ou em decúbito (horizontal).

A pressão em um indivíduo adulto, em decúbito horizontal, é a mesma nos ventrículos, na cisterna magna e no fundo do saco lombar, variando entre 50 mm e 200 mm de coluna d’água. Freqüentemente, emprega-se, como referência, uma pressão intraventricular (PIV) de 150 mm de coluna de água de acordo com [10].

O monitoramento das pressões intra-ventriculares, feita em 80 pacientes em um estudo detalhado da hidrodinâmica do sistema de derivação, demonstram que a alteração das pressões durante a mudança postural, da posição horizontal para a vertical, levam em torno de apenas 30 segundos para se estabilizarem em seus novos valores. Em outras palavras, a estabilização da pressão intra-ventricular frente a mudança da postura corporal é bastante rápida. Os valores médios encontrados para a PIV são, na posição horizontal, 4,6 ± 3 mmHg, e, na posição vertical, –14,2 ± 6,3 mmHg [11].

Os sistemas de drenagem externa funcionam segundo o princípio de vasos comunicantes. No interior da caixa craniana atua a pressão intraventricular; na entrada da bolsa de drenagem atua a pressão atmosférica local. A bolsa de drenagem é interligada ao ventrículo cerebral por meio de uma tubulação flexível, sendo, em geral, posicionada ao lado do paciente e 15 cm acima do ponto de referência, tomado na altura do ouvido do paciente, quando este se encontra na posição horizontal. Em questões de ordem fisiológica, sempre que a pressão intraventricular for superior a 15 cm de coluna de água, o fluido deverá ser drenado para a bolsa de coleta externa. Quando a pressão intraventricular for menor, não ocorrerá drenagem. Para isto possa ocorrer, a tubagem é equipada com uma válvula unidirecional anti-refluxo, que impede o retorno do líquido para o ventrículo cerebral do usuário.

Entretanto, se ocorrer um abaixamento ou queda acidental da bolsa de drenagem, ou, ainda, uma elevação súbita do paciente, a uma altura (H) entre a bolsa de coleta e o paciente tornar-se-á negativa (vide Fig. 5). As condições hidrostáticas propiciarão, então, uma vazão excessiva de LCR, em virtude do sifonamento, ou efeito

sifão, condição conhecida também por hiperdrenagem. Como o volume de líquido presente dentro dos ventrículos é bastante pequeno, a ocorrência de uma drenagem excessiva, mesmo que por poucos instantes, pode ser suficiente para causar danos irreversíveis ao sistema nervoso do paciente, incluindo o óbito.

6. Aparato Experimental

No presente trabalho, para a realização dos ensaios hidrodinâmicos, foi empregada uma bancada de teste, descrita em [12], capaz de gerar dados confiáveis para o estudo das variações produzidas na vazão do sistema de drenagem, ou em seus elementos, em função da altura manométrica da tubagem.

Diversos autores, como [9], [13] e [14], utilizam sofisticados dispositivos de testes para o estudo de sistemas de drenagem do LCR, equipados com sofisticados instrumentos de medição de vazão. No presente trabalho, a vazão foi determinada monitorando-se a variação temporal da massa do fluido de trabalho coletada em um pequeno reservatório, o que diminuiu significativamente o custo do aparato, sem, contudo, comprometer a precisão dos dados.

Devido às características do líquor serem semelhantes às da água, sobretudo no que diz respeito à sua massa específica, alguns autores utilizam a água esterilizada à temperatura ambiente como substituto do líquor em seus experimentos [13] e [14]. Este mesmo procedimento foi empregado nos ensaios aqui realizados.

A Figura 8 apresenta um desenho esquemático do dispositivo de testes hidrodinâmico de sistemas de drenagem externo do LCR, constituído, entre outros elementos, por um mecanismo de elevação (A), acionado por um motor de passo (B) controlado por micro-computador (C). O mecanismo de elevação permite o deslocamento controlado da saída da tubagem (M), que está acoplada a um recipiente de coleta (D) exposto à pressão atmosférica. Todo o fluido depositado no recipiente (D) é drenado, posteriormente, pela saída situada na parte inferior do reservatório (E). A Fig. 9 apresenta uma vista fotográfica do aparato experimental.

Figura 8: Bancada de simulação hidrodinâmica [12].

Para a determinação da vazão do sistema, utilizou-se uma balança digital com precisão de um centésimo de grama (F) com uma interface digital IEEE1384, que envia os valores lidos a um sistema de aquisição de dados (C).

Sobre o prato da balança, é colocado um reservatório Frasco de Mariotte (G) contendo o fluido de trabalho.

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Este constitui um dispositivo bastante engenhoso, capaz de manter a pressão de saída constante, mesmo com a diminuição do nível do reservatório. Um tubo de vidro (K), posicionado na tampa do frasco e imerso no fluido de trabalho, permite que a vazão seja dada pela diferença de altura entre a extremidade inferior do tubo de vidro e a posição do recipiente de coleta (D), independentemente do nível do fluido de trabalho no interior do frasco. O dispositivo a ser testado é acoplado, através da saída (J), entre o cateter ventricular inserido no recipiente (G) e a tubagem (M) que conduz o material escoado para a bolsa de drenagem, aqui simbolizada pelo recipiente de coleta (D). O dispositivo de drenagem deve ser sustentado por suportes (N), para que a movimentação da tubagem, imposta pelo mecanismo de elevação, não cause interferência na balança de precisão. Durante os testes, a altura (H) mostrada na Fig. 8 deve ser ajustada no aparato experimental, de maneira a para corresponder exatamente à altura (H) imposta pelo cirurgião ao paciente, representada na ilustração da Fig. 5.

Figura 9: Bancada de simulação hidrodinâmica em operação [12]. 7. Caracterização do aparato experimental

Para a determinação do número de Reynolds máximo, utilizou-se um sistema de drenagem equipado com uma tubagem de 3,2 mm de diâmetro interno e considerou-se um paciente levantando-se subitamente. Sob estas condições, a vazão máxima calculada levou a um número de Reynolds menor que 530, caracterizando, ainda assim, um escoamento laminar.

Para realizar uma medição, impõem-se, no frasco de Mariotte, uma pressão equivalente à PIV e, através do sistema posicionador, ajusta-se a altura (H) do recipiente de coleta. No registrador da balança, é possível determinar a massa drenada em função do tempo e, consequentemente, a vazão do sistema.

Esse tipo de ensaio, onde se fixa uma determinada condição experimental e aguarda-se até que o sistema entre em regime permanente, é chamado de ensaio estático. Um ensaio estático produz resultados muito confiáveis, mas o tempo necessário para realizar centenas de medições torna-se excessivamente grande. Para contornar este inconveniente, pode realizar ensaios dinâmicos, o que implica na aquisição contínua de dados, enquanto a altura (H) varia com o tempo, seja de forma crescente ou decrescente. Se a taxa de variação da altura (H) ajustada no mecanismo posicionador for pequena, os resultados obtidos aproximam-se significativamente dos resultados estáticos. Dessa forma, deve-se determinar a

máxima taxa de variação da altura (H) para que esta aproximação ainda seja válida.

Uma série de testes estáticos foram efetuados, ajustando-se a PIV em 100 mmH2O, para três diferentes alturas (H), -50, -100 e -150 mm. Os ensaios dinâmicos, por sua vez, foram conduzidos com diferentes taxas de variação da altura (H), v1 = 0,72 m/h, v2 = 1,07 m/h e, finalmente, v3 = 2,10 m/h. A Fig. 10 apresenta, a título de exemplo, os resultados obtidos no ensaio de uma válvula anti-hiperdrenagem. A taxa de amostragem da balança é de 253 pontos por minuto.

Figura 10: Comparação de resultados obtidos de um ensaio estático (Vref) com três diferentes taxas de variação do posicionador – ensaios

dinâmicos[12].

Embora a realização de ensaios agilize sobremaneira a coleta de dados, pequenas imprecisões no cômputo do intervalo de tempo podem ocasionar grandes imprecisões no cálculo da vazão. Assim, foi necessária a estimativa do intervalo de tempo mais apropriado para minimizar as incertezas experimentais.

Os valores de v2 = 1,07 m/h foram os adotados no presente trabalho. O mecanismo de deslocamento linear vertical produz uma velocidade constante de 1,073 m/h, isto é, 17,89 mm/min. Sendo a taxa de transmissão de 253 pontos por minuto, tem-se que, entre cada massa registrada pela balança, o mecanismo para deslocamento vertical tem sua plataforma deslocada em 0,07 mm. Portanto, para cada valor registrado de massa, será calculada a vazão média, considerando esse valor central em um determinado intervalo equivalente em milímetro deslocado linearmente. Verifica-se que, para um intervalo linear de 4 mm, são necessários 57 registros de massa. Calculando-se a vazão média para cada ponto registrado, que representa o valor central, considera-se como m1 o valor do 28o registro anterior, e m2o valor do 28o registro posterior. Esse intervalo foi indicado, por encontrar-se em uma condição de boa estabilidade. A Tabela 1 apresenta as incertezas associadas às medidas efetuadas utilizando-se o dispositivo de testes.

Tabela 1: Incertezas associadas ao dispositivo de teste [15].

Variável Incerteza

sistemática estatística Incerteza Incerteza total

Peso < 0,123% < 10-3 % < 0,12 % Frequência amostragem < 10 -4 < 10-4 < 10-4 Deslocamento < 10-2 mm < 0,04 mm < 0,05 mm Tempo < 10-3 - < 10-3

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8. Resultados 8.1. Válvulas anti sifão

Nos presentes ensaios, três diferentes protótipos de válvula antisifão foram ensaiados, para diferenciais equivalentes um abaixamento da bolsa de drenagem de até 70 cm de altura (H). Os componentes típicos de uma válvula deste tipo são apresentados na Fig. 11.

(a): Vista de uma protótipo de testes de uma válvula anti sifão

(b): Vista explodida do protótipo de uma válvula antí sifão. Figura 11: Protótipo de uma válvula antisifão [12]

A Fig. 12 mostra o gráfico da vazão em função da altura (H), obtido para os três protótipos (M9, M10 e M11), ensaiados para uma PIV de 50 mmde coluna de água. As curvas marcadas por “inv” referem-se à válvula conectada de forma invertida, o que pode ocorrer acidentalmente, mas que implica no seu funcionamento inadequado.

Figura 12: Vazão em 3 diferentes válvulas anti sifão em função da altura (H) para uma PIV de 50 mmH2O [12].

Observa-se, aqui, que, em todos os casos, a vazão cresce rapidamente com o aumento da altura (H). Assim, um paciente exposto a essa situação, em curto período de tempo ocorrerá uma hiperdrenagem e, consequentemente, uma hipopressão ventricular. Uma baixa pressão intraventricular apresenta exatamente os mesmos sintomas de uma hiperpressão, no entanto, a exposição do paciente a essa situação, mesmo que por curtos períodos

de tempo, pode ser fatal. Entretanto, para uma válvula corretamente instalada, a um determinado valor de (H), o mecanismo antisifão atua convenientemente, impedindo o fluxo e protegendo o paciente.

A abertura e o fechamento da válvula ocorre pela pressão exercida pelo fluido sobre a membrana. Na entrada da válvula, o fluido exerce uma pressão que tende a empurrar a membrana para cima, enquanto que na saída o escoamento exerce uma força que tende a empurrar a membrana para baixo. As áreas de exposição da membrana na entrada e na saída da válvulas são diferentes, permitindo determinar a vazão de fechamento da válvula. Normalmente, para baixas vazões, a membrana permite o fluxo. Com o aumento da vazão, a membrana sofre uma deflexão e fecha a saída da válvula, interrompendo o fluxo e evitando uma drenagem excessiva.

A análise dos diferentes protótipos ensaiados levou à construção do protótipo de pré série, sobre o qual foram realizados os testes finais, a partir dos quais foram também definidos os primeiros procedimentos de fabricação em série da válvula.

A Fig. 13 apresenta a vazão de uma válvula antisifão pré série, ensaiada para diferentes taxas de variação temporal da altura (H), mostrando uma resposta adequada do dispositivo, mesmo para uma rápida variação da altura (H).

Figura 13: Vazão em função da altura H do protótipo pré série [15]

A Figura 14, por sua vez, mostra o comportamento hidrodinâmico do mecanismo antisifão, frente a diferentes pressões (P) impostas à montante da válvula e o deslocamento da bolsa necessário para a interrupção do escoamento. Os resultados obtidos para as pressões (P) na entrada do mecanismo de 5, 10, 15 e 20 cm de coluna de água implicaram, respectivamente, em deslocamentos de 17,5; 25,0; 34,0 e 46,1 cm de altura manométrica da bolsa coletora para a interrupção do escoamento.

Deve ser ressaltado que o principal fator para análise da eficácia do mecanismo antisifão é a altura H, correspondente ao deslocamento vertical da bolsa de coleta no sentido descendente, que proporcione um diferencial de pressão suficiente para o acionamento do dispositivo e, consequentemente, a interrupção do escoamento em relação às diferentes pressões impostas na entrada do mecanismo.

O bloqueio do escoamento deve ocorrer quando, para um valor pré determinado de pressão a montante da válvula, a altura H gerar uma pressão sobre a membrana elástica próximo à PIV. Entretanto, o movimento da membrana pode ocorrer de forma muito lenta relativamente ao

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aumento absoluto da altura H. Na Fig. 15, é mostrado um ensaio de uma pressão a montante da válvula de 20,0 mm de coluna de água e o escoamento é cuidadosamente medido na região próxima ao fechamento da válvula. A variação da altura H, para esse caso, foi muito pequena para que fosse desterminado o momento exato do início de fechamento da válvula. No presente caso, o início do movimento da membrana ocorreu em H igual a 458,0 mm e o fechamento completo da válvula em 462,5 mm. A diferença entre o início e término do fechamento é de apenas 3,5 mm. O ponto de fechamento, nos casos avaliados, foi considerado sempre como o valor médio.

Figura 14: Vazão em função da altura H parametrizado para diferentes pressões (P) na entrada do mecanismo anti sifão [16]

Figura 15: Vazão volumétrica em função da altura – detecção do ponto de abertura e fechamento da válvula anti sifão [17]

A maioria dos os sistemas de drenagem externa disponíveis comercialmente encontra-se sujeito à ocorrência da hiperdrenagem. A inserção do mecanismo anti-sifão apresenta um forte diferencial, oferecendo proteção adicional ao paciente usuário desse sistema de drenagem alternativa. A simplicidade de operação, a ausência de partes metálicas, construção totalmente em material plástico e operação independente da ação gravitacional faz da válvula antisifão ensaiada um dispositivo barato, confiável para evitar o efeito sifão. O presente dispositivo de testes mostrou-se plenamente adequado para os ensaios de engenharia para investigação experimental do funcionamento das válvulas antisifão permitindo colaborar significativamente com esse tipo de projeto, minimizando o tempo necessário para obter um resultado e mostrando que o protótipo construído funciona adequadamente.

De uma maneira geral, as complicações mecânicas associadas aos sistemas de drenagem ventricular externa têm sido subestimadas e poucos trabalhos abordando este tópico são disponíveis atualmente na literatura neurocirúrgica [18]. Independentemente de dados estatísticos, a ocorrência do fenômeno de sifonamento era uma constante fonte de falha mecânica na operação dos dispositivos de drenagem externa do LCR, acarretando problemas nos implantados. A atual prevenção dos efeitos do sifonamento na drenagem externa do LCR é um notável avanço nos procedimentos neurocirúrgicos.

8.2 Válvula anti retorno de membrana

A Fig. 15 apresenta o esquema de uma tubagem de drenagem externa fabricada e comercializada pela empresa Ventura Biomédica, instalada na cidade de São José do Rio Preto, Brasil. A função da tubagem é conduzir o LCR até a bolsa de coleta e abrigar alguns dispositivos necessários aos procedimentos médicos, dentre os quais se inclui uma válvula de três vias e uma válvula unidirecional, conhecida na literatura inglesa como one-way ou check valve. A principal função desta válvula antiretorno é impedir que o LCR retorne ao interior da caixa cefálica, protegendo o paciente do aumento indesejado da PIV ou contra possíveis infecções.

Figura 14: Tubagem da Ventura Biomédica LCR 500 .

Existem muitos modelos de válvulas unidirecionais descritos na literatura, a maioria dos quais abriga somente duas portas, uma de entrada e uma de saída. Tais válvulas operam automaticamente, acionadas exclusivamente pelo gradiente de pressão entre a entrada e a saída do elemento. Existem várias concepções de válvulas unidirecionais, aplicadas em diferentes campos da engenharia, mas a mais conhecida é a do tipo bola-e-mola. Em sistemas de drenagem externa, o tipo mais comumente empregado é o de membrana, onde uma fina película elástica em forma de disco é montada sobre um assento rígido, abrindo e fechando em função da diferença de pressão existente entre a entrada e a saída da válvula. Se, por qualquer razão, houver uma tendência de inversão no sentido do escoamento, a membrana é comprimida contra o assento da válvula, interrompendo imediatamente o fluxo.

A Fig. 15 apresenta um desenho esquemático típico de uma válvula antiretorno de membrana. A vista em corte da Fig. 15(a) mostra a válvula submetida a um gradiente favorável de pressão (negativo), que produz o deslocamento a membrana no sentido de propiciar a abertura da válvula. Na Fig. 15(b), a válvula encontra-se sob a ação de um gradiente de pressão desfavorável (positivo) e a membrana desloca-se contra seu assento, impedindo o fluxo. Finalmente, na Fig. 15(c) é mostrado um desenho em vista explodida desse tipo.

Vazão H [cm] [ml/min] vias torneira 3 conectorY nal unidirecio válvula

(9)

a)Válvula aberta b)Válvula fechada

c) Vista explodida

Figura 15: Válvula anti retorno de membrana.

Como conseqüência de sua concepção, no processo de fechamento das válvulas unidirecionais ocorre, quase que sempre, uma forte regurgitação, também conhecida como refluxo. Quando os valores de pressão na entrada da válvula são ligeiramente menores que a coluna de água na saída, o gradiente de pressão gerado pela altura H é positivo e existe a tendência do aparecimento de um indesejável fluxo reverso na direção dos ventrículos cerebrais.

Os testes preliminaries (Fig. 16) foram executados impondo-se um gradiente de pressão inicial de -15,0 mm de coluna de água (gradiente favorável) e encerrando-se com um gradiente final de +33,0 mm de coluna de água em um longo intervalo de tempo de 250 segundos, representando um levantamento muito lento da bolsa de drenagem. As medições foram feitas com incerteza de 1,0% para as pressões e 0,12% para as vazões. A Fig. 16 mostra a massa drenada dos ventrículos em função do tempo, para uma ascensão lenta da bolsa de drenagem (altura H), para um dos tipos de válvulas ensaiados (#4).

Figura 16: Massa drenada do interior dos ventrículos em função do tempo para um levantamento lento da bolsa de drenagem da válvula #4 [19].

Na Fig. 16, quando a massa drenada permanece constante com o tempo, ocorre o bloqueio completo do escoamento. Na válvula #4, o bloqueio ocorre próximo

de 95 segundos, para um gradiente de pressão da ordem de 3,0 mm de coluna de água.

Os valores de massa drenada do interior dos ventrículos mostrados na Fig. 16 podem facilmente ser convertidos em fluxo volumétrico ou de massa. Nesse caso, um fluxo de massa com valores negativos aponta para uma drenagem dos ventriculos, um fluxo nulo representa o completo bloqueio da válvula e, finalmente, um fluxo positivo representa fluxo reverso para o interior dos ventrículos.

A Fig. 17 mostra o gráfico da vazão em massa como uma função do gradiente de pressão aplicado na válvula#4. Pode-se observar que a vazão decresce significativamente à proporção que a bolsa de coleta externa é levantada lentamente, representando um teste muito próximo das condições estáticas. Observe-se que o fechamento da válvula se inicia com uma pressão ainda negativa. Provavelmente, as características elásticas da válvula contribuem para que, mesmo diante de um pequeno gradiente negativo, a válvula inicie seu processo de fechamento. O fato da válvula iniciar seu fechamento diante de um gradiente negativo próximo do zero colabora, em muito, para que a quantidade de massa regurgitada seja bastante pequena.

Figura 17: Vazão mássica em função da diferença de pressão para um levantamento lento da bolsa de drenagem da válvula #4 [19].

Outros testes foram ainda realizados em condição de dinâmica, com alta taxa de içamento das válvulas, mais precisamente de -100 para +100 mmH2O, com velocidade de ascensão de 1,0 mm/s e 1,6 mm/s. Os resultados obtidos são mostrados na Fig. 18, para a válvula #1.

Figura 18: Vazão mássica em função da diferença de pressão para um levantamento rápido da bolsa de drenagem da válvula #1 [19].

] [s tempo ] [mmH2O pressão de Gradiente 1 # válvula ] [mmH2O pressão de Gradiente Va o [m g /s] M a ss a d re n a d a [g ] Va o [m g /s]

(10)

A Fig. 18 revela que a operação da válvula de membrana apresenta um baixo nível de regurgitação, independentemente da velocidade de içamento utilizada nos testes dinâmicos. Nos testes quasi-estáticos, os efeitos de aceleração do escoamento são praticamente imperceptíveis, podendo-se considerar, com boa aproximação, que o regime seja permanente. No entanto, a variação da vazão que ocorre para diferentes velocidades de aumento do gradiente de pressão implica em forte influência da aceleração do escoamento. Finalizando os testes, as válvulas foram submetidas a um abrupto aumento do gradiente de pressão e os resultados são mostrados na Fig. 19. Uma elevação súbita de pressão pode ser causada por uma ascensão rápida do reservatório de coleta, gerando um gradiente de pressão hidrostática adverso, que força o retorno do fluido ao seu local de origem. Um aumento repentino no gradiente de pressão, iniciandose com uma pressão de -15 mm de coluna de água e encerrando-se a +200 mm, em um intervalo de tempo de somente 2,5 segundos, foi aplicado nos ensaios da válvula #5. As medições de vazão extenderam-se, neste caso, muito além do tempo de fechamento, para que fosse possível identificar eventuais oscilações da membrana ocasionadas pelo fechamento brusco.

Figura 19: Massa drenada em função do tempo para um levantamento abrupto da bolsa de drenagem da válvula #5 [19].

O instante zero corresponde ao momento em que tem início o içamento da bolsa de. Observa-se que, como o esperado, a vazão diminui gradativamente até o fechamento da válvula. A válvula #5 mostrou um baixo índice de regurgitação, mas com uma perda de carga relativamente elevada, sem mostrar qualquer instabilidade quando submetida a fechamento abrupto. Estas características tornam este tipo de válvula recomendável para utilização em implantes externos de LCR.

8.3 Micro válvula antiretorno bola-e-mola

Em geral, as válvulas de membrana elásticas são maiores que as do tipo bola-e-mola, que podem ser fabricadas em dimensões bastante reduzidas. Do ponto de vista de implantes internos, as minúsculas microválvulas do tipo bola-e-mola são desejáveis, uma vez que devem ser alojadas no interior do paciente. Do ponto de vista de engenharia, o conhecimento detalhado do desempenho hidrodinâmico desse tipo de dispositivo torna-se útil nos projetos de sistemas internos e externos de drenagem. A Fig. 20 mostra um diagrama da operação de uma válvula

unidirecional do tipo bola-e-mola. Na Fig. 20(a) a diferença de pressão existente entre a entrada e a saída da válvula pressiona a esfera contra sua sede, impedindo o escoamento. Na Fig. 20(b), a diferença de pressão comprime a esfera contra a mola, permitindo o fluxo na direção desejada.

(a)fechado (a)aberto

Figura 20: Diagrama de operação de uma válvula bola-e-mola.

Uma válvula de esfera de rubi, com um diâmetro de tubulação de 2 mm, foi ensaiada para aplicação em sistemas de drenagem do LCR. A Fig. 21 apresenta dados referentes a um ensaio típico de uma microválvula unidirecional do tipo bola-e-mola, mostrando que esse tipo de válvula é bastante adequado para aplicações na drenagem de LCR.

Figura 21: Massa de fluido no interior do frasco de Mariotte em função da pressão na saída da válvula para uma PIV = 150 mmH2O [3].

9. Conclusão

O emprego de drenagem do LCR no tratamento da hidrocefalia tem um longo histórico de avanços. Nas últimas décadas, grandes esforços de pesquisa foram despendidos, propiciando desenvolvimento científico, inovações clínicas e a colocação de novos produtos no mercado. A possibilidade de implante de um sistema de drenagem de LCR alterou substancialmente o quadro de pacientes infantis acometidos de hidrocefalia. Nos dias atuais, os indivíduos implantados podem levar uma vida normal, praticamente sem prejuízo ao seu desenvolvimento físico e intelectual. Adicionalmente, os modernos tratamentos cirúrgicos para a hidrocefália são realizados através de procedimentos minimamente invasivos, provocando traumas mínimos. Assim, dado o aumento da confiabilidade dos produtos e dos procedimentos, o período necessário à realização de revisões tem aumentado consideravelmente, propiciando maior conforto aos pacientes.

] [s tempo ] [g drenada Massa 5 # válvula

(11)

A drenagem do LCR é, hoje, um procedimento cirúrgico absolutamente corriqueiro em neurocirurgia encefálica. Entretanto, uma taxa relativamente elevada de falhas, sobretudo de ordem mecânica ou infecciosa, ainda ocorre. Do ponto de vista de engenharia, as falhas mecânicas devem obrigatoriamente ser avaliadas em detalhes. Critérios explícitos de projetos devem ser desenvolvidos, para oferecer maior confiabilidade ao produto.

Os sistemas de drenagem internos, mais precisamente, o peritonial, têm sido intensamente estudados após os anos sessenta e numerosos projetos de válvulas de controle encontram-se disponíveis na literatura. Entretanto, a utilização de sistemas externos se mostra, ainda hoje, um procedimento absolutamente necessário em diversas atividades neurocirúrgicas e, aparentemente, pouco esforço tem sido realizado no desenvolvimento de sistemas para esta finalidade.

A literatura médica descreve diversos aparatos para testes de válvulas de sistemas internos de drenagem, como em [9] onde os sistemas proposto podem apresentar sofisticados dispositivos eletrônicos para a medição da pressão e da vazão volumétrica. Entretanto, na maioria dos trabalhos avaliados, os detalhes construtivos são omitidos, como em [6], [13] e [14].

No presente de trabalho, um aparato para teste de dispositivos de drenagem externa de LCR foi proposto e extensivamente testado no estudo do escoamento em função das diferenças de pressão. A vazão mássica do escoamento foi obtida com o auxílio de uma balança eletrônica e um simples, mas eficaz, processamento de dados. Tal inovação permitiu a obtenção de resultados confiáveis e de elevada precisão, com custo bastante reduzido.

Outro ponto importante a ser destacado refere-se ao emprego do frasco de Mariotte. Esse engenhoso dispostivo permite manter a pressão constante na saída do reservatório de alimentação do sistema, independentemente do decaimento do nível de fluido, facilitando sobremaneira a obtenção dos dados.

A utilização de um motor de passo controlado digitalmente permitiu a imposição precisa da velocidade de ascensão da bolsa de coleta. Nessa situação, os testes puderam ser realizados de um modo quase estático, possibilitando a obtenção de dados consistentes em um curto perído de tempo. A realização de ensaios estáticos, como relatado na literatura, mostra-se um processo extremamente lento, onerando desnecessariamente a atividade de pesquisa.

10. Agradecimentos

O presente trabalho foi desenvolvido com recursos da FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), da Fundunesp (Fundação para o Desenvolvimento da UNESP) e da Ventura Biomédica Biomédica de São José do Rio Preto, Brasil.

Referências

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(12)

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