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SAÚDE MENTAL, INTERNAÇÃO PSIQUIÁTRICA E CONSTRUÇÃO DE AÇÕES EM REDE: RELATO DE EXPERIÊNCIA

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Academic year: 2021

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SAÚDE MENTAL, INTERNAÇÃO PSIQUIÁTRICA E CONSTRUÇÃO DE AÇÕES EM REDE: RELATO DE EXPERIÊNCIA

Renata Rosolem* (Psicóloga do NASF-AB, Prefeitura do Município de Maringá, Maringá-PR, Brasil); Taiane Cristine de Jesus Garcia Scarparo (Assistente Social do NASF-AB, Prefeitura do Município de Maringá, Maringá-PR, Brasil); Valéria Cristina Sanzovo (Psicóloga do NASF-AB, Prefeitura do Município de Maringá, Maringá-PR, Brasil).

contato: re.rosolem@gmail.com

Palavras-chave: Rede de Atenção Psicossocial. Atenção à Crise. Intersetorialidade.

O movimento de Reforma Sanitária existente no Brasil logrou a incorporação do conceito de saúde ampliada na Constituição Brasileira de 1988 e tal conquista trouxe o entendimento da saúde para além de ausência de doenças, marcada por sua determinação social, construída e ofertada de modo universal, integral e com participação social. No contexto de derrocada do governo militar e de transição democrática que o país vivenciava ao final dos anos de 1980, o Sistema Único de Saúde (SUS) foi aprovado através do processo da Constituinte que promulgou a Constituição de 1988, denominada como “Constituição Cidadã”. A nova Carta Magna representava, naquele momento, o reconhecimento e garantia de direitos sociais frente à crise que se enfrentava e à grande desigualdade social que se vivenciava no país. Esta trouxe em seus artigos 196, 197, 198, 199 e 200 a legitimação do SUS e o reconhecimento da saúde como um direito de todos e dever do Estado, a ser garantida via políticas sociais e econômicas com o objetivo de acesso universal e igualitário às ações e serviços por intermédio principalmente de sua promoção e proteção, como também de sua recuperação através de práticas assistenciais. Para a execução de tais premissas, organizou-se legalmente que os serviços públicos de saúde devem integrar uma rede regionalizada e hierarquizada que sigam as diretrizes de integralidade do cuidado, descentralização das ações, porém com direção única em cada esfera governamental, e participação comunitária em todos os seus moldes.

Concomitante e complementar a este processo, temos também o movimento de Reforma Psiquiátrica Brasileira, que tem suas raízes nas décadas de 1960 a partir das denúncias de abusos, maus-tratos e internações compulsórias em hospitais psiquiátricos privados, custeados com recursos públicos, numa política de privatização massiva parte dos serviços de saúde do país. Na década de 1970 deu-se a organização do Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental

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(MTSM), que propunha o lema “Por uma Sociedade Sem Manicômios”, denunciando as diversas formas de violência, exclusão e abandono praticadas nos hospitais psiquiátricos, bem como as condições precárias de trabalho. O Movimento privilegiava a discussão e a adoção de experiências de desinstitucionalização, a partir de um processo iniciado na Itália na década de 1960, fruto das críticas provenientes dos próprios técnicos acerca do atendimento desumanizante ao qual eram submetidos os pacientes psiquiátricos, com proposta de modelos substitutivos à internação psiquiátrica. A crítica dos técnicos italianos referia-se, sobretudo, ao modelo da ciência psiquiátrica, baseado na relação de causalidade entre doença e cura, enfatizando a doença e relegando o sujeito a um segundo plano (Amarante, 1994).

Os questionamentos e práticas advindas do movimento italiano refletiram profundamente no cenário brasileiro, e fortaleceram as discussões que doravante levariam a promulgação da Lei n. 10.216/2001, conhecida como Lei da Reforma Psiquiátrica Brasileira, que reorganizou a assistência à saúde mental no país, levando à criação de uma rede de serviços de saúde mental em contraposição ao modelo manicomial até então vigente e hegemônico no cenário brasileiro.

Tais avanços promoveram uma profunda transformação do cuidado em saúde mental, com a criação de serviços como o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) – serviços de base territorial que visam o atendimento multiprofissional a pessoas com transtornos mentais severos ou persistentes. Além disso, com a Lei de Reforma Psiquiátrica, buscou-se enfatizar a necessidade de criação de leitos de internação psiquiátrica em hospitais gerais, de modo a garantir o atendimento de modo integral e não segregativo a usuários com demandas de saúde mental e, ainda, prescindir a utilização de leitos em hospitais psiquiátricos.

Em 2011, com a publicação da Portaria GM/MS n. 3088, que institui a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), novos avanços se somam ao cuidado prestado a pessoas com demandas de saúde mental. A RAPS tem como principais objetivos a promoção e ampliação do acesso à atenção psicossocial e a garantia de articulação e integração dos pontos de atenção da rede, qualificando o cuidado por meio do acolhimento, do acompanhamento contínuo e da atenção às urgências (Brasil, 2011). São pontos de atenção da RAPS a Atenção Básica (Unidades Básicas de Saúde e equipes de Consultório na Rua), a Atenção Psicossocial Especializada (Centros de Atenção Psicossocial, nas suas diferentes modalidades), a Atenção de Urgência e Emergência (SAMU, sala de estabilização, UPA 24 horas, portas hospitalares de atenção à urgência/pronto socorro, entre

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outros), Atenção Residencial de Caráter Transitório (Unidade de Recolhimento e Serviços de Atenção em Regime Residencial), Atenção Hospitalar (enfermaria especializada em Hospital Geral, serviço Hospitalar de Referência para Atenção às pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas) e Estratégias de Desinstitucionalização (Serviços Residenciais Terapêuticos e Reabilitação Psicossocial).

Tendo em vista a organização dos serviços em rede, lógica preconizada desde de criação do SUS, mas fortalecida com o estabelecimento da RAPS, bem como a função de ordenação da rede de serviços e coordenação do cuidado exercida pela Atenção Básica e materializada pela Estratégia Saúde da Família (ESF), o objetivo deste trabalho é relatar as experiências vivenciadas por trabalhadoras da política municipal de saúde de Maringá/PR, lotadas no Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica (NASF-AB), durante o desenvolvimento de reuniões da rede de saúde mental do município voltadas exclusivamente para discussão de casos e planejamento de ações disparados pela internação de usuários na emergência psiquiátrica do Hospital Municipal de Maringá (HMM).

Estas reuniões ocorrem semanalmente nas dependências do HMM, em dia e horário fixo, com duração de duas horas. São compostas por profissionais da Atenção Básica de Saúde – representados pelo NASF-AB –, profissionais dos quatro Centros de Atenção Psicossocial do município (CAPS II, CAPS III, CAPSi e CAPS AD), profissionais da emergência psiquiátrica do HMM, residentes de Psicologia (Residência Integrada Multiprofissional na Atenção à Urgência e Emergência/UEM) que tem como cenário de práticas este serviço, e, por vezes, pela coordenação de Saúde Mental da Secretaria Municipal de Saúde.

Estes encontros iniciaram em julho de 2017, após a reunião de representantes dos diversos serviços de Atenção Básica e de Atenção Psicossocial com o intuito de estabelecer estratégias de fortalecimento do trabalho em rede e, sobretudo, de diminuição das internações e reinternações psiquiátricas no município.

Embora a cidade de Maringá conte com uma rede de saúde mental significativa e mais de 70% de cobertura de Estratégia Saúde da Família, a atenção à saúde divide espaço com o modelo hospitalocêntrico. Rosolem (2016) aponta que metade dos usuários internados no Hospital Psiquiátrico de Maringá no período de 2013 a 2014, haviam sido internados anteriormente.

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Tal índice de recorrência pode indicar fragilidades no atendimento da crise e na capacidade de resposta da Rede. Para Dimenstein et al (2012) os leitos em hospitais gerais e a articulação com os serviços de atenção primária, bem como uma rede de suporte na comunidade, que ofereça apoio intensivo nos momentos críticos, com estratégias de fortalecimento do vínculo terapêutico, são fundamentais para evitar reinternações. Jardim e Dimenstein (2007) ressaltam a necessidade em se discutir os serviços de urgência, que por vezes não são considerados no debate com a intersetorialidade, apesar de se constituírem importante ponto de atenção à crise, e espaço privilegiado de reconhecimento das fragilidades de outros serviços.

As reuniões de rede de saúde mental aqui apresentadas buscam promover a troca de informações sobre os usuários internados na emergência psiquiátrica do hospital, bem como a pactuação de intervenções durante o período de internação (com familiares e/ou rede de suporte) e logo após a alta hospitalar, a fim de promover o acesso do usuário aos serviços, em busca da garantia de efetivação do cuidado compartilhado entre diferentes pontos de atenção. Além disso, o compartilhamento do cuidado tem proporcionado a diminuição de barreiras ao acesso dos usuários aos serviços, a revisão de intervenções inefetivas, a criação de estratégias de cuidado baseada em diferentes olhares sobre o sujeito, grupo social e/ou familiar.

A partir desta vivência, é possível compreender a necessidade de revisão e integração constante com as diretrizes norteadoras do SUS e da reflexão e viabilização de práticas como estas junto às equipes de saúde que estão na assistência direta aos usuários que passaram pelo delicado processo de institucionalização em internação psiquiátrica. Tal movimento deve ocorrer em busca de ampliar o olhar em saúde, que necessita cada vez mais de práticas participativas que objetivem a integralidade do cuidado e a potencialização de medidas de promoção e prevenção dentro do SUS. Cabe aqui frisar que nos últimos anos, as ações de promoção e proteção à saúde, práticas essenciais e preconizadas por este sistema desde sua criação, tem sido subutilizadas pelos trabalhadores dos serviços de saúde.

REFERÊNCIAS

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Baptista, T. W. F. H. (2007). História das políticas de saúde no Brasil: a trajetória do direito à saúde. In: Matta, G. C.; Pontes, A. L. M. (Org.). Políticas de Saúde: a organização e a operacionalização do Sistema Único de Saúde. Rio de Janeiro: EPSJV/FIOCRUZ, pp. 29-60. Bravo, M. I. S. (2009). Política de saúde no Brasil. In: Mota, A. E. et al. (Org). Serviço Social e Saúde: formação e trabalho profissional. 4ed. São Paulo: Cortez, pp. 88-110.

Constituição da República Federativa do Brasil. (1988, 5 de outubro). Recuperado em 12 de abril, 2018, de http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

Dimenstein, M.; Amorin, A. K. A,; Leite, J; Siqueira, K; Gruska, V; Vieira, C; Brito, C. Medeiros, I. & Bezerril, M. C. (2012). O atendimento da crise nos diversos componentes da rede de atenção psicossocial em Natal/RN. Polis e Psique (2). Número temático.

Jardim, K & Dimenstein, M. (2007). Risco e crise: pensando os pilares da urgência psiquiátrica. Psicologia em Revista (13), 1. 169-190.

Lei n. 10.216. (2001, 6 de abril). Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. Brasília, DF: Presidência da República.

Portaria n. 3.088. (2011, 23 de dezembro). Institui a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília, DF: Ministério da Saúde. Rosolem, R. (2016). Entre idas e vindas ou sobre reinternações psiquiátricas. Dissertação de mestrado. Universidade Estadual de Maringá, Maringá.

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