• Nenhum resultado encontrado

ÁGAPE E ETHNOS - BENS RELACIONAIS E CAPITAL SOCIAL: O AMOR COMO PROTO-FUNDAMENTO DA SOCIEDADE E DAS INSTITUIÇÕES SOCIAIS E POLÍTICAS

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "ÁGAPE E ETHNOS - BENS RELACIONAIS E CAPITAL SOCIAL: O AMOR COMO PROTO-FUNDAMENTO DA SOCIEDADE E DAS INSTITUIÇÕES SOCIAIS E POLÍTICAS"

Copied!
22
0
0

Texto

(1)

15

ÁGAPE E ETHNOS - BENS RELACIONAIS E CAPITAL

SOCIAL: O AMOR COMO PROTO-FUNDAMENTO DA

SOCIEDADE E DAS INSTITUIÇÕES SOCIAIS E POLÍTICAS

Lucas Tavares Galindo Filho1

RESUMO: O artigo delineia novas perspectivas para as Ciências Sociais e para a

sociedade, seja do ponto de vista substantivo da ação e interação das pessoas na vida social, seja do ponto de vista do favorecimento da emergência de estruturas de geração de bens relacionais e consequente potencialização das possibilidades de maximização qualitativa do desempenho institucional, postulando a legitimidade da afirmação de que os “instantes” de gratuidade e reciprocidade gratuita constituem o proto-fundamento da relação social e seus derivados – a societas e a polis – pois, por quanto raros geram, potencializam, modulam, estabilizam e consolidam tanto o micro-social quanto o macro-micro-social, vital e ou institucional.

PALAVRAS-CHAVE: amor, gratuidade, reciprocidade gratuita, ação e interação.

RIASSUNTO: L’articolo delinea nuove prospettive per Le Scienze Sociali e per La

società, sia dal punto di vista mento dell’emergenza di strutture di generazione di beni relazionali e conseguente potenzializazzione delle possibilità di massimizzazione qualitativa della performance istituzionale, postulando la legittimità dell’affermazione degli momenti di gratuità e reciprocità gratuita, come proto-fondamento della relazione sociale e dei suoi derivati – la societas e la polis – poi che, per quanto siano rari

1 Mestre em Sociologia e Metodologia Cientifica pela Faculdade de Ciências Políticas “Cesare Alfieri” da

Universidade de Florença na Itália (2007) - Centro de Excelência Europeu - é Professor titular das disciplinas de Sociologia, Metodologia Cientifica, Ciência Política & Teoria Geral do Estado e Filosofia, possui o título internacional já oficialmente reconhecido em todo o território nacional pela Universidade Federal de Pernambuco – UFPE. Realizou pesquisas cientificas, com ênfase em Sociologia e Etnologia, pela Universidade de Florença e pela ONG “New Humanity” - membro integrante do ECOSOC (Conselho Econômico e Social das Nações Unidas), elevada ao mais alto grau de status consultivo da ONU - da qual é Colaborador permanente. Sua produção cientifica junto à Comunidade Acadêmica florentina, alcançou nota máxima na seção de discussão com conselho unânime de publicação da produção cientifica, e encontra-se em estudos para publicação na Europa. No Centro de Educação da Universidade Federal de Pernambuco - UFPE exerceu a função de professor substituto em 2008. Coordenou o Programa de Iniciação Científica, a Revista Acadêmica e o Núcleo de Estudos de Ciência Política, Relações Internacionais e Direitos Humanos na AESO - Faculdades Integradas Barros Melo. Atualmente é Secretário Nacional da Associação CIVITAS, é professor na Faculdade ASCES e, contemporaneamente, se dedica à Colaboração Permanente com as Instituições Internacionais supracitadas e é Diretor do Instituto Elíseos - Cultura & Arte, promovendo eventos culturais e acordos de cooperação com Comunidades Acadêmicas, Universidades e Organismos nacionais e internacionais, gerando produção intelectual e intervenção na realidade.

(2)

16 generano, potenziano, modulano, stabilizzano e consolidano sostantivo dell’azione e interazione delle persone nella vita sociale, sia dal punto di vista del favori sia il micro-sociale sia il macro-micro-sociale, vitale e o istituzionale.

PAROLE-CHIAVI: amore, gratuità, reciprocità gratuita, azione e interazione.

INTRODUÇÃO2

Radicado na tradição teórico-empírica do amor ágape3, o presente artigo

percorre sinteticamente um dos capítulos da dissertação intitulada “LA CITTADELLA. Teoria ed empiria del



. Fraternità, gratuità, amore, reciprocità, agape: nuove prospettive teorico-pratiche per le scienze sociali.”, aprovada com nota máxima pela banca examinadora do Departamento de Sociologia e Ciências Políticas da Universidade de Florença na Itália.

A poliedricidade do objeto de estudo da pesquisa que deu origem à supracitada dissertação - uma comunidade4 composta de aproximadamente 900 habitantes

provenientes mais de 70 nações dos 5 continentes – e a constatação de uma significativa vitalidade no tecido identitário sócio-cultural abalizada num profundo compartilhamento do patrimônio simbólico-valorial, instigaram e possibilitaram a

2 Para uma compreensão mais aprofundada do tema sugere-se a leitura do artigo GALINDO FILHO, Lucas Tavares.

“Fraternidade, gratuidade, amor, reciprocidade, ágape: novas perspectivas teórico-práticas para as Ciências Sociais.”. Revista da Faculdade de Direito de Caruaru. 40 (01), 2009.

3 Sorokin, Pitirim. The Ways and Power of Love. Chicago: Gateway, 1954; tradução italiana: Il potere dell’amore.

Roma: Città Nuova Editrice, 2005. Boltanski, Luc. L’Amour e la Justice comme compétences. Trois essais de sociologie de l’action. Paris : Métailié, 1990; tradução italiana : Boltanski, Luc. Stati di pace. Una sociologia dell’amore. Milano: Vita e pensiero, 2005. Outros trabalhos empíricos sobre o ágape são Boltanski, L. e Godet, M. N. “Messages d’amour sur le Téléphone du dimanche.” Politix, 31, 1995, p.p. 30-76; e Costa, G. Au cœur du travail social. Esquisse d’une sociologie de l’agapè en pratique. Tese de Doutorado em Sociologia. École des Hautes Études en Sciences Sociales. Paris. 2004. Bruni, Luigino. Il prezzo della gratuità. Roma: Città Nuova, 2006. Bruni, Luigino. Reciprocità. Dinamiche di cooperazione economia e società civile. Milano: Bruno Mondatori, 2006. Vigna, Carmelo e Zanardo, Susy (a cura di). La Regola d’Oro come etica universale. Milano: Vita e Pensiero, 2005. Galindo Filho, Lucas Tavares. La Cittadella. Teoria ed empiria del . Fraternità, gratuità, amore, reciprocità, agape: nuove prospettive teorico-pratiche per le scienze sociali. Dissertação de Mestrado em Metodologia Cientifica e Sociologia. Università degli Studi di Firenze. Firenze. 2007.

4 “Nascido durante a segunda guerra mundial, e hoje difundido mais de 180 nações nos 5 continentes, o Movimento

dos Focolares compreende hoje milhões de pessoas dos mais variados credos e também pessoas sem um referencial religioso. Conta com 33 cidadezinhas [originalmente “Cittadella” - comentário do autor] e 26 editoras espalhadas pelo mundo. Se multiplicaram e continuam a chegar reconhecimentos dos diversos governos e organismos internacionais - ONU, UNESCO, União Europeia, etc” (GALINDO FILHO, 2009: 184).

(3)

17 dedicação de um capitulo de estudo etnográfico, de onde emergiram perspectivas com uma significativa fecundidade potencial.

Ao lado dos princípios de agregação que operam a transfiguração simbólica dos elementos culturais – epos, ethos, logos - e naturais - genos e topos – a base empírica resultante do presente estudo de caso verificou indícios e evidencias de um princípio comum de fundo, anterior aos outros porque ontológico e constitutivo do ser humano5, e que atua gerando, potencializando, modulando, consolidando cada um

dos outros princípios: o ágape, que “conserva a sua força e a sua presença na sociedade... [e – acréscimo do autor] não é de modo algum irrelevante” (Boltanski, 2005: 17 e 33).

O quadro teórico de fundo é a teoria clássico-contemporânea sobre o amor-ágape6 unida à abordagem do realismo critico relacional (Donati, 2002).

Do ponto de vista do método e das técnicas a pesquisa se imposta numa complementariedade entre instrumentos da pesquisa qualitativa e quantitativa7.

O artigo é finalizado com o delineamento das perspectivas para as Ciências Sociais e para a sociedade, seja do ponto de vista substantivo da ação e interação das pessoas na vida social, seja do ponto de vista do favorecimento da emergência de estruturas de geração de bens relacionais8 e consequente potencialização das

possibilidades de maximização qualitativa do desempenho institucional (Putnam, 1997).

UM POVO9

5 “O interesse desta construção... é, antes de tudo, tratar o ágape como um dos estados aos quais as pessoas

podem aceder colocando em ação capacidades provenientes da própria competência ordinária [itálico do autor]” (Boltanski, 2005: 153-154).

6 Aristóteles e Platão, Pitirin Sorokin 1954, Luc Boltanski 2005, Luigino Bruni 2006, Vigna e Zanardo 2005. 7 “A pesquisa se imposta sobre a complementaridade nas diversas técnicas, esta impostação se mostrou adequada

a um objeto de estudo com uma tal multiplicidade de aspectos constitutivos. A instrumentação è constituída pela observação participante e, na perspectiva da complementaridade no método e nas técnicas, pela pesquisa documental, pelo focus-group, pela entrevista estruturada através de questionário, pela entrevista semi-estruturada em profundidade, pelo diário sobre percepção e sobre o uso do tempo, e enfim, pela entrevista narrativa ou histórias de vida. A forma de amostragem escolhida, para as técnicas que necessitavam, foi a da amostragem probabilística estratificada proporcional.” (GALINDO FILHO, 2009: 185).

8 Martha Nussbaum (1986), Pierpaolo Donati (1986), Benedetto Gui (1987), Carole Uhlaner (1989), Luigino Bruni

(2005).

(4)

18 Já na fase heurística dos estudos de preparação para esta pesquisa, associada ao conhecimento ordinário do objeto de estudo, emergiam elementos que legitimavam a consideração de que na “Cittadella” fosse possível verificar a existência, assim como no Movimento dos Focolares, de evidencias dos elementos constitutivos do “Ethnos” (Tulio-Altan, 1995: 8), ou identidade étnica.

Sendo o objeto do presente estudo uma comunidade estudada a partir de um olhar objetivo e subjetivo, isto é, no seu conjunto e nos indivíduos que a compõem, é fundamental iniciar retomando o conceito de comunidade

Nas Ciências Sociais o termo é usado com dois significados. Na sociologia clássica ele serve para definir um tipo particular de relações sociais postas à base da coletividade, que envolvem o indivíduo na sua totalidade: o termo evoca as pequenas comunidades do interior mas diz respeito também à comunidade nacional, compreende a família mas também qualquer unidade social em condições de alta integração; chega até mesmo a definir, de forma típica, a sociedade tradicional que precedeu aquela moderna. Na sociologia contemporânea, comunidade é, ao invés, frequentemente sinônimo de comunidade local. (Bagnasco, 1999: 17)

Caracterizado por um patrimônio conceitual e valorial comum profundamente radicado10 e consequentemente, por um forte tecido identitário sociocultural, o objeto

do presente estudo contem objetivamente e subjetivamente os elementos constitutivos de uma comunidade11, a primeira se refere à relação social, ou seja

O comportamento instaurado reciprocamente segundo o seu contendo de significado, e orientado em conformidade. A relação social consiste na possibilidade de que se aja em um determinado modo (dotado de significado), o qual seja a base sobre a qual repousa tal possibilidade12

em campo a consulta do texto original da dissertação que encontra-se arquivado nas seguintes bibliotecas: na biblioteca do Pólo de ciências sociais da Universidade de Florença, na biblioteca do Istituto Universitario Sophia em Florença e, brevemente, na biblioteca do Centro de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Pernambuco.

10 “O que é uma cultura se não existe consenso? ” (Geertz, 1999: 22).

11 Na intenção de trazer um importante enriquecimento ao conceito de comunidade considerado no presente texto,

são transcritos alguns trechos do pensamento weberiano: “uma relação social deve ser definida “comunidade” se, e na medida em que a disposição do agir social se apoia – no caso do indivíduo ou em média no tipo puro – sobre um comum pertencimento subjetivamente sentido (afetivo ou tradicional) pelos indivíduos que dela participam” e ainda “Uma comunidade pode repousar sobre toda espécie de fundamento afetivo ou emotivo, ou também tradicional” (Weber, 1980: 38-39).

(5)

19 Em seguida à transfiguração simbólica da memória comum; a presença e a sacralização de um conjunto profundamente compartilhado de princípios orientadores e valores; o típico modo comum de comunicar-se; o sentimento vital de família; a imagem simbólica do lugar como espaço relacional para além do espaço geográfico da “Cittadella” ou das “Cittadellas”; delineiam a fisionomia de uma etnia, de um pequeno povo representado nesta comunidade que compõem a “Cittadella”.

O percurso que é iniciado agora será assinalado pela “multiplicidade dos conteúdos e da polissemia dos produtos simbólicos... que dão lugar a... produtos concretos” (Tullio-Altan, 1995: 16).

Entre os componentes essenciais na construção do Ethnos, compreendido como “conjunto simbólico… constitutivo da identidade e como principio de agregação social” (Ibidem: 21), os primeiros três – epos, ethos e logos – resultam da transfiguração de elementos culturais. Os últimos dois – genos e topos – substanciados pelo elemento natural, são encontrados e estudados no objeto da presente pesquisa, também eles na dimensão cultural para além daquela natural, o que não enfraquece os componentes nas suas características fundamentais de constituir identidade comum e de gerar agregação social.

EPOS: A TRANSFIGURAÇÃO DA MEMORIA COMUM

O componente Epos é estreitamente ligado ao aspecto histórico ou historiográfico constituindo-se como memória comum transfigurada e celerada.

A história do Movimento dos Focolares, na qual se enxerta a “Cidadela”, é por si mesma “sacralizada”, de fato nasce com a descoberta de que “Deus é Amor” e a redescoberta do Evangelho como “palavra de vida” para ser colocada em pratica na cotidianidade. Os eventos ligados à genesis do Movimento dos Focolares e, consequentemente ao nascimento da “Cidadela” eram sublinhados pela fúria da segunda Guerra mundial. Os episódios da história do Ideal13, as datas importantes

13 Com o termo “Ideal” se entende considerar todo o patrimônio de vida e pensamento do Movimento dos Focolares,

que diz respeito suja à sua espiritualidade seja à sua estrutura, e ao mesmo tempo a “Luz do Alto” do qual é expressão, Cfr. Come un arcobaleno. Gli aspetti nel movimento dei focolari. Roma: Città Nuova Editrice, 1999, p.

(6)

20 que são recordadas e celebradas, os primeiros tempos, os personagens que deram vida ao Movimento, o pioneirismo e o heroísmo dos co-fundadores, etc.

Aqui nos encontramos diante de um primeiro elemento característico na historiografia do objeto de estudo, isto é o preciso momento no qual acontecem os eventos que são sacralizados e transfigurados.

Os fatos, abundantemente e cuidadosamente documentados aconteceram realmente, afirmação que encontra uma ulterior confirmação no “cruzamento” entre a história do Ideal e outros eventos históricos como a historiografia contemporânea da Igreja Católica e a historiografia também das outras Igrejas e Comunidades eclesiais, ou ainda nos relatórios de “Agencias Secretas” dos países da “Cortina de ferro” que se referem aos tempos do pós-guerra e que foram abertos anos depois da queda do Muro de Berlin14. Estes mesmos fatos são vistos, de uma significativa parte dos

pertencentes ao Movimento dos Focolares, como concretização de precisos “desígnios divinos de amor” e também os pertencentes de convicções não religiosas tendem a ver esta mesma história como impregnada pelo amor que gera uma nova civilização.

Os registros históricos oficiais são abundantes e muito cuidadosamente preparados e guardados e a história do Ideal è contada em vários momentos como por exemplo convenções, encontros e congressos. Canções comunicam a história de uma geração à outra e os episódios fundamentais e aqueles mais significativos são conhecidos “à memória” desde os anciãos até as crianças.

Ainda sobre o epos

Smith define bem sua qualidade especifica: “Os princípios básicos, que sustentam o sentido de pertencimento ao grupo e da sua unicidade e que coligam gerações sucessivas dos seus membros, constituem um ponto fundamental para distingui rum agrupamento étnico de outros tipos de agrupamentos sociais” (Tullio-Altan, 1995: 22)

17 (Ad uso interno del Movimento dei Focolari).

14 Se faz referência neste caso não somente aos reconhecimentos oficiais, mas também aos relatórios das

agencias secretas dos países para além da “cortina de ferro” nos tempos do pós-guerra. Os pertencentes ao Movimento dos Focolares em tais países eram seguidos e a sua vida registrada em relatórios oficiais, os quais, alguns anos depois da queda do Muro de Berlin, se tornaram documentação de alto valor.

(7)

21 Na entrevista estruturada, realizada através de questionário auto-ministrado, foram propostas aos entrevistados uma serie de técnicas de pesquisa ligadas a potenciais indicadores de frequência da reincidência na memória individual e coletiva dos componentes ligados à história do Movimento dos Focolares na qual se enxerta a história da “Cidadela”.

As respostas à primeira pergunta sobre a prevalência das recordações da história da Obra15 ou das recordações da história da Pátria de Origem demonstram

um percentual de 47% dos que recordam igualmente a história do Ideal e a história da própria nação e uma concentração de 48% sobre a dimensão do continuum que indica a prevalência da recordação da história do Ideal.

Foram feitas outras perguntas sobre a prevalência da reincidência na memória individual e comum, uma sobre os personagens históricos e uma outra sobre os personagens da vida atual da Obra e dos países de origem dos entrevistados.

As respostas à pergunta sobre a prevalência das recordações dos personagens históricos reportam um percentual de 42% entre aqueles que recordam igualmente os personagens da história do Ideal e os personagens da história do pais de origem. As mesmas respostas atentam a concentração de 49% dos respondentes na dimensão do continuum que vai desde a recordação tendencial até a recordação prevalente dos personagens da história da Obra.

Para a pergunta sobre os personagens da vida atual da própria nação ou da Obra as respostas afirmam uma ocorrência de 40% entre aqueles que recordam igualmente os personagens da vida atual do Pais de origem e da vida atual da Obra. Representam um total de 56% aqueles que afirmam recordar-se tendencialmente mais ou prevalentemente os personagens da vida atual da Obra.

Existem várias publicações historiográficas e bibliográficas produzidas de maneira particular pelas testemunhas, pelos co-fundadores e pelas co-fundadoras do Movimento dos Focolares e também sobre eles e elas.

Foi publicado um livro que recolhe as biografias de um significativo grupo de pertencentes ao Movimento que já são falecidos e foram impressos outros três

15 “Obra de Maria” é o nome oficial do Movimento dos Focolares, algumas vezes identificado também simplesmente

(8)

22 volumes, ainda não publicados, sobre a mesma linha. Em cada missa são recordados nas orações os nomes daqueles dos quais ocorre o aniversário.

São co-presentes a memória dos personagens históricos e também dos personagens contemporâneos a ao mesmo tempo a memória dos acontecimentos mais importantes e significativos da história do Ideal.

A celebração da memória histórica simbolicamente transfigurada è estreitamente ligada ao epos e à formação e à consolidação do tecido identitário como princípio de agregação social. De fato “Os gregos punham sob o símbolo da musa Clio a história como operação cultural especifica, Clio do verbo Klein, exaltar, celebrar; e somente com Heródoto se começou a falar de história do verbo hitoriem , indagar, pesquisar e relatar” (Tullio-Altan, 1995: 22).

A pergunta apresentada no questionário auto-ministrado sobre a celebração dos grandes momentos da história da Pátria de origem ou da Obra, apresentava também a categoria que compreendia a ausência de qualquer celebração não somente como categoria residual de resposta mas contemporaneamente para indagar sobre a possibilidade da presença desta atitude.

Um total de 52% afirma celebrar mais os grandes momentos da história da Obra do que os da história da própria Pátria, e chega a 38% o total daqueles que declaram celebrar igualmente os grandes momentos da história seja da Obra seja da Pátria de origem. O total daqueles que afirmam não celebrar é de 7%.

A pergunta, com resposta dicotômica, sobre a percepção de uma maior nobreza nas origens da Pátria de proveniência ou nas origens da Obra teve uma forte “reação ao objeto”. 58% dos respondentes se concentrou na categoria residual “Não responde”. Dos feedback colhidos durante o trabalho em campo é legitimo considerar que as prováveis explicações da reação à pergunta supracitada se devam à “obscuridade”16 e por outro lado à sua “obtusividade”17. A realidade completa e

múltipla contida no objeto de estudo se mostrou, em alguns de seus aspectos, mais

16 “complexidade ou obscuridade da pergunta (a pergunta não é formulada em termos claros e imediatamente

compreensíveis)” (Pitrone, 2002: 87).

17 “”obtusividade”: o conteúdo da pergunta pode pôr em embaraço o entrevistado, ou ser percebido como uma

(9)

23 atingível por formulações simples de perguntas, porque era necessário ter presente a multiplicidade de proveniências geográficas e a diversidade de graus de conhecimento da língua italiana por parte de seus habilitantes. Para outros casos, como o presente caso da “operativização” de um conceito complexo e polissemântico como “nobreza das origens”, são necessárias técnicas diversas e provavelmente mais indicadores.

Em todo caso o “desafio” configurado na aceitação – algumas vezes e por motivos contextuais dos quais não se podia prescindir – do risco trouxe contribuições ao patrimônio empírico conjuntural nascido do trabalho em campo, ou seja, o quadro formado pelos dados provenientes daqueles que responderam à pergunta oferece uma visão privilegiada de quanto estejam presentes nos habitantes da “Cidadela” o patrimônio simbólico e cultural da Obra, isto è, uma concentração de 95% dos respondentes que afirmam a percepção de uma maior nobreza das origens da Obra em relação às origens da própria Pátria.

ETHOS: FENOMEMOS CULTURAIS TRANSFIGURADOS E COMPORTAMENTOS DERIVANTES

Compõem o ethos os fenômenos culturais simbolicamente transfigurados relativos às relações do grupo social.

O ethos tem, de modo semelhante ao do epos, uma importância fundamental na construção e consolidação do tecido identitário e valorial que é constituinte imprescindível da identidade étnica.

De fato “os componentes do epos e do ethos são as duas colunas portantes do tipo ideal do qual estamos traçando os delineamentos, porque se esses componentes são frágeis, os outros não bastam para culmar o vazio de identidade que eles deixam no conjunto… da identidade étnica” (Tullio-Altan, 1995: 24) configurando assim uma conditio sine qua non do conjunto simbólico da identidade étnica.

Todavia é fundamental ter presente o quanto é estreito o “nexo entre identidade étnica e religião”, presente mesmo hoje na composição do tecido identitário de um povo. A presença constitutiva do componente “religião” existirá segundo os cânones tradicionais ou vai ser uma espécie de “religião civil” (Messina, 2001: 52).

(10)

24 De fato, o caráter simbólico-unitivo do patrimônio identitário dos grupos sociais configurado no componente religião é expresso também na origem da palavra que a um certo ponto propõe uma síntese para o conceito de religião18.

As características do amor contidas no Evangelho cristo de modo expressivo e também no patrimônio conceitual e valorial dos vários grupos sociais e na teoria clássica e contemporânea sobre o amor são os princípios orientativos do Movimento dos Focolares e consequentemente da “Cidadela”.

Se lê nos Estatutos Gerais da Obra de Maria – Movimento dos Focolares, do qual a “Cidadela” é expressão, que “mutua e continua caridade (amor – comentário do autor)”19 é o fundamento da vida do Movimento em cada um dos seus aspectos.

O mutuo e continuo amor constitui o princípio orientativo por excelência da vida no interior da Obra de Maria e no interior da “Cidadela”. Do estudo em campo se verifica que este princípio orientativo è realizado ou não pelos habitantes da “Cidadela” em graus notavelmente diversos de acordo com uma infinidade de elementos como por exemplo as características constitutivas da personalidade de cada indivíduo ou o momento de maturidade humana e afetivo-espiritual que vive. Todavia se verifica uma presença difusa e significativa de tensão no sentido da concretização desta meta.

O sentido de pertencimento e a presença verificada durante o estudo em campo e na consulta à base empírica e dos vários documentos na sede de analise (Corbetta, 1999: 5) é de uma força significativa e não ignorável.

À pergunta sobre a prevalência do sentimento de pertencimento à Pátria de origem em confronto com o mesmo sentimento em relação à Obra os respondentes do questionário auto-ministrado desenham um quadro de modo algum irrelevante.

Ou seja, 54% dos respondentes se concentram sobre a dimensão do continuum que indica a prevalência tendencial ou total do sentimento de pertencimento à Obra e ainda 40% afirma experimentar um igual sentimento de pertencimento seja à Obra seja à Pátria de origem.

À pergunta sobre a consideração da Obra como um povo, as respostas indicam

18 “Do latin religio – onis, der: de relegare [recolher juntos, amarrar, ligar, etc.] ‘ raccogliere ’ [colher – ex.: colher o

milho e amarrar os feixes]” (Devoto e Oli, 2002: 1716).

(11)

25 não somente o sentido de pertencimento, mas ao mesmo tempo uma difusa consciência do patrimônio vital e cultural comum, isto é 91% dos entrevistados, na amostragem responderam afirmativamente.

O questionário auto-ministrado continua em seguida uma pergunta aberta na qual era pedido o porquê de considerar ou não a Obra como um povo, e o elenco de respostas que explicam o “sim” são uma ulterior confirmação à presença difusa, além de um forte sentido de pertencimento, da consciência do patrimônio vital e cultural comum.

No que se refere aos princípios orientativos subjetivamente sentidos e que são também eles componentes fundamentais da identidade comum foi feita uma pergunta, no questionário auto-ministrado, que entendia indagar sobre a percepção da existência de princípios orientativos comuns a todos os pertencentes. Em seguida era proposta aos entrevistados uma outra pergunta que interrogava o sujeito sobre sentir-se à vontade ou não diante destes princípios orientativos comuns. As respostas afirmativas de 98% e 100% respectivamente às duas perguntas supracitadas demonstram a presença de princípios orientativos equivalentes a normas novas profundamente interiorizadas e conscientemente reconhecidas.

Se o sujeito se identifica com… uma norma nova, elevada a símbolo de renovação dos códigos morais, o sujeito realiza uma experiência ética de conservação ou revolução (Tullio-Altan, 1995: 15-16)

Durante o estudo da documentação não raramente se encontravam referências ao “mandamento novo”, ou seja “amai-vos uns aos outros como eu vos amei” e à “revolução de Amor”, isto è reflexos subjetivos e objetivos frequentemente verificados entre os habitantes da “Cidadela”.

LOGOS: COMUNICAÇÃO SOCIAL “VERBAL” E “NÃO VERBAL”

No interior de um fenômeno equivalente à Obra de Maria, composta de uma multiplicidade significativa de aspectos, um dos elementos que constitui um princípio de agregação social e que constrói, vivifica e fortifica o tecido identitário é o logos “através do qual se realiza a comunicação social” (Ibidem: 26).

(12)

26 A língua comum dos habitantes da “Cidadelas” é a língua italiana estudada algumas vezes ainda antes da chegada na “Cidadela” mesma, como confirmam os registros dos backtalk durante a observação participante. Na maior parte das vezes os novos habitantes a aprendem in loco.

A escolha da língua italiana como língua comum se fundamenta em dois princípios:

a) É a língua originaria da fundadora e das e dos co-fundadores e, por isso, aprende-la significa aumentar as possibilidades de poder colher diretamente o Ideal da fonte original;

b) Depois da expansão inesperada do Movimento dos Focolares com “fecundidade e difusão desproporcionais a toda força ou genialidade” (Fondi e Zanzucchi, 2003: 41–42) era necessária uma língua comum aos pertencentes sobretudo para a custodia do patrimônio de vida e pensamento e, depois concretamente pela comunicação – que impressiona pela intensidade e pela frequência – e para os congressos, também eles frequentes.

Considerada a multiplicidade das proveniências e, consequentemente, a multiplicidade das línguas de origem, a diversidade cultural, a idade dos habitantes, o período que transcorrem na “Cidadela”, etc., os graus de conhecimento da língua italiana são igualmente multíplices.

Do conhecimento ordinário (Corbetta, 1999: 425) sobre o objeto de estudo (Ibidem: 368-371) e pelo constante aprofundamento (Ibidem: 405) na literatura produzida pelo objeto de estudo (Ibidem: 437-468) e sobre o objeto de estudo (Ibidem), e ainda, pelo estudo de campo emergiu com clareza sempre maior que como neste grupo social, pela tensão tendencialmente constante à realização no cotidiano dos princípios orientativos que são as características do ágape, a comunicação social é realizada a partir de duas perspectivas principais:

a) Segundo os cânones conhecidos através do conjunto de regras gramaticais de uma língua que produzem a “comunicação verbal”;

(13)

27 “Ideal” com uma intensíssima “comunicação não verbal”20 realizada, em vários graus,

como expressão do ágape. Afirma Luc Boltanski no seu estudo sobre o ágape:

Quem está em estrado de ágape “se fala, é para passar ao ato, no modo no qual um gesto se prolonga em palavras e nunca para reportar a si mesmo o uso da palavra, para considerar-se e expor-se em uma forma discursiva. A sociologia, com métodos muitos dos quais dependem da análise dos textos, discursos indígenas escritos ou transcritos do oral, ou ainda relatórios nos quais um observador anota as próprias constatações, é com isto, pega em falha (Boltanski, 2005: 143)

De fato, em alguns casos, como se viu, alguns entre os habitantes não permanecem o tempo necessário para aprender a língua e outros ainda mesmo se permanecem por um período mais longo, as vezes não conseguem desenvolver o conhecimento da língua comum. O estudo de campo mostrou que a comunicação social e a intensidade do conjunto das relações sociais e a coesão do tecido identitário comum não são enfraquecidas por isso.

Um outro aspecto importante ligado ao logos é a produção literária no interior do Movimento dos Focolares e as suas publicações que vão desde a poesia até a historiografia, desde a literatura cientifica até a literatura infantil.

O peso especifico da língua no conjunto do Ethos varia de um povo para o outro, de acordo com o peso que cada um dá aos valores da própria produção poético-literária como momento do epos (Tullio-Altan, 1995: 26)

O estudo de campo e a base empírica da presente pesquisa demonstram a presença, em vários graus, do reconhecimento desta “língua não verbal” que juntamente às outras expressões da língua comum em quanto instrumento e custodia do Ideal, trazem uma impressionante vitalidade ao tecido identitário deste “pequeno

20 “”Na espécie humana – afirma o psicólogo Parisi – ao mapa ou modelo do mundo que o homem possui como

todos os outros animais … se acrescenta um segundo mapa… tornado possível pela linguagem… que… não substitui aquele de base, não lingüístico… [este ultimo] nasce da interação direta, não verbal, do homem com o ambiente físico e social… O mapa não lingüístico è a base para o mapa lingüístico… A ciência é uma atividade cognitiva que caramente entra no segundo mapa… é uma atividade consciente, sistemática, racional… Quando a ciência direciona a sua atenção à mente e à inteligência… o grande risco que se corre… é de que exista uma projeção do mapa lingüístico, consciente e racional, sobre o mapa não lingüístico… A atividade cognitiva do homem é vista como intrinsecamente ligada aos conceitos lingüísticos, aos procedimentos da lógica, ao modo consciente, sistemático, racional de raciocinar e agir” (1989, 119-121)” (Marradi e Veutro, 2001: 12).

(14)

28 povo” (Fondi, Enzo Maria e Zanzucchi, Michele, 2003: 543).

À pergunta no questionário auto-ministrado sobre a frequência com a qual os habitantes da “Cidadela” acompanham os noticiários da Obra, 88% afirma acompanhar “frequentemente” e “muito frequentemente” os noticiários do Movimento dos Focolares.

No que concerne à frequência da leitura de livros publicados pela Obra, de caráter artístico ou científico, historiográfico ou biográfico, etc., o percentual daqueles que afirmam no questionário auto-ministrado uma frequência que vai do “frequentemente” ao “muito frequentemente” é de expressivos 82%.

A última pergunta proposta, sempre no questionário auto-ministrado, que tem o intento de fazer emergir os graus de percepção subjetiva e objetiva da existência de uma “língua não verbal” comum aos habitantes da “Cidadela” e ao Movimento dos Focolares conjuntamente, que é componente constitutiva do patrimônio identitário da “Cidadela” e da Obra de Maria, demonstra uma concentração de 80% dos respondentes sobre o estremo do continuum os quais consideram que alguém que pertence à Obra “se exprime diversamente seja com atitudes seja com o modo de falar”21.

A língua comum e o patrimônio literário são componentes de fundamental importância para a vitalidade do tecido identitário e a “ligação entre língua e ethnos” (Tullio-Altan, 1995: 26) é estreita.

GENOS: TRANSFIGURAÇÃO SIMBÓLICA DAS RELAÇÕES DE PARENTESCO

Como “Símbolo fundamental da sociedade a nível etnográfico” (Ibidem: 27) o genos, desde a antiguidade, representou um fundamental componente da coesão dos grupos sociais e das comunidades étnicas. Todavia:

O genos veio perdendo muito do seu antigo primado simbólico, mesmo não cessando de valer nos novos contextos, em formas novas, bem distantes do seu antigo e genuíno significado histórico (Tullio-Altan, 1995: 27)

21 Pergunta com respostas graduadas, número 30 do questionário auto-administrado formulada na seguinte

(15)

29 A comunidade objeto de estudo e o fenômeno que deu origem a ela tem como um dos seus fundamentos basilares o conceito “ser como e mais do que uma família natural” (Lubich, 2001: 86-87). A palavra família, juntamente com outros termos que exprimem a vida no interior da Obra de Maria, como por exemplo: amor, unidade, etc., são pontos de referência da vida e do pensamento desta comunidade e são, em vários graus, percebidos e sentidos como metas a serem alcançadas na cotidianidade.

Se hoje eu devesse deixar esta terra e me pedissem uma palavra, como a última que exprime o nosso Ideal, eu diria a vocês – segura de ser compreendida no sentido mais exato - : “sejam uma família” (Lubich, 2001: 86)

Um outro indicador da força da presença deste conceito nesta comunidade é o modo com o qual foi chamado o setor jovem do Movimento, quando em 1966 se distinguiu dos adultos dando vida a um novo Movimento estreitamente ligado ao primeiro e animado por ele. Os jovens são chamados “Geração nova”, ou simplesmente Gen por dois motivos principais:

a) São a segunda geração do Movimento dos Focolares;

b) São uma geração nova porque renovada pelo amor evangélico.

No primeiro motivo emerge já a transfiguração simbólica da relação social22 em

relação familiar de descendência, isto é o contendo simbólico da relação entre a primeira geração das e dos co-fundadores com a segunda geração e geralmente entre as gerações e os pertencentes à Obra de Maria é uma relação de família.

De fato, o modelo do Focolare é da “casa de Nazaré”, isto é, uma convivência onde Casados (José = focolarinos (as) casados (as)) e virgens (Maria = focolarinos (as) consagrados (as) de vida comunitária) unidos em uma só família com a presença de Jesus em meio a todos (presença gerada pelo amor recíproco que gera o ágape)23.

22 “um comportamento de indivíduos instaurado reciprocamente segundo o seu contendo de sentido, e orientado

em conformidade. A relação social consiste portanto na possibilidade de que se aja em um dado modo (dotado de sentido)” (Weber, Max. Economia e società. 5 vol. Milano: Ed di Comunità, 1980, 1° vol., p.p. 23-24).

(16)

30 De fato, uma jovem habitante da “Cidadela”, proveniente da Europa Ocidental, durante a sua “história de vida”, em um momento no qual fala de uma viagem internacional feita na América do Sul, exprime com riqueza de contendo simbólico e concreto a “compresença objetivo-subjetiva” do conceito de família e os efeitos consequentes que derivam desta realidade24:

No segundo, terceiro dia em que eu estava ali em (-) foi no Focolare. No momento em que entrei no Focolare a sensação de estar em casa, completamente! é incrível! Isto foi incrível, realmente! E ali me apercebi de que, este Ideal de ser família, de criar relação de família, realmente verdadeira, de irmãos e irmãs é tangível onde quer que se vá e a mesma coisa aconteceu quando cheguei na “Cidadela” [de lá]

À pergunta no questionário auto-ministrado sobre a percepção de uma ligação relacional fundamentada sobre a transfiguração simbólica das relações sociais em relações de parentesco25 emergiu um percentual de respostas positivas de 91%:

E à pergunta sobre a intensidade do sentido de pertencimento à família natural ou à “família da Obra de Maria” mostra um percentual de 45% dos respondestes que sentem como tendencialmente prevalente o pertencimento à família da Obra. O total entre aqueles que declaram sentir-se igualmente pertencentes à família natural e à família da Obra somado àqueles que declaram sentir um prevalente pertencimento à família da Obra mais do que à família natural chega aos 90%.

Na sede de analises foram individualizados os sujeitos compreendidos na amostragem probabilística estratificada proporcional, que à pergunta sobre a vida em família classificaram a própria resposta sobre a dimensão do continuum que vai desde “vida em família equilibrada” (posição central do continuum) até a resposta “vida em família muito tranquila” (posição final na polarização positiva do continuum); foram 92 sobre 97, isto é, representavam 95% do total dos casos compreendidos na amostragem probabilística. Entre estes 92 casos, 82 entrevistados, ou seja, 85% do total dos casos e 89% entre os entrevistados, classificaram a própria vida em família como de “equilibrada” a “muito tranquila” e declararam no questionário auto-ministrado

24 “que o sociólogo, no momento no qual passa da (a) = porque casual a (b) = porque final, é chamado a verificar

(c) = efeitos. Sempre, é claro, que queira fazer sociologia e não sociografia, ou crônica, ou ideologia” (Donati, 2002: 191).

25 “A comunidade da qual todos como expoentes do “sentimento da estirpe”… é o produto de uma “comunidade

de cultura”, provocado por condições não puramente “étnicas”, a qual de sua parte suscita a crença no parentesco de sangue” (Weber, 1980: 96-97).

(17)

31 que se sentiam igualmente ligados ou até mesmo mais ligados à família da Obra do que à própria família natural.

Se considera aqui a potencial possibilidade de uma ulterior confirmação sobre quanto foi afirmado a partir do estudo de campo e da base empírica produzida consequentemente, porque sujeitos que consideram a própria vida em família como vivida com significativos níveis de qualidade, sentem como igual ou prevalente a ligação com a família do Movimento dos Focolares.

Considerando a centralidade da transfiguração simbólica das relações de parentesco como “momento central do ethnos” (Tullio-Altan, 1995: 27) é de fundamental importância considerar a significativa presença do componente genos – na base do patrimônio identitário, valorial e simbólico dos habitantes da “Cidadela” – com uma impostação e formas novas e diversas do seu antigo significado (Ibidem).

TOPOS: TRANSFIGURAÇÃO SIMBÓLICA DO ESPAÇO UTILIZADO PARA A VIDA

Na sua concepção clássica o componente topos é ligado ao “instinto territorial, de posse e de controle de um determinado espaço utilizado para a vida” (Tullio-Altan, 1995: 27). Transfigurado simbolicamente, este instinto se torna um valor entre os mais fortemente sentidos no ethnos (Ibidem: 27-28).

No objeto do presente estudo o componente topos é encontrado fundamentalmente em duas formas, uma primeira de impostação sobretudo abstrata e uma segunda de impostação sobretudo concreta:

a) Para os habitantes da “Cidadela” a vida encontra plenitude na vida do Ideal e por isso o “espaço utilizado para a vida” é o amor que procuram viver recomeçando sempre, ou seja, o espaço vital do qual se fala seria a plena transfiguração simbólica do estrado de ágape alcançado coletivamente, percebido como espaço relacional tornado quase “terra mãe” por excelência. Isto é, a pátria verdadeira é o ágape estabelecido no encontro entre dois ou mais pertencentes ao Movimento dos Focolares e, entre os habitantes da “Cidadela”;

b) A “Cidadela” é percebida pelos seus habitantes, e não somente [pelos seus habitantes] como “terra mãe” (Ibidem: 28), “espaço utilizado para a vida” (Ibidem: 27) e “lugar sagrado” (Ibidem: 28). Sendo frequentemente de uma

(18)

32 grande multiplicidade de proveniências geográficas, lingüísticas, culturais e religiosas, e compartilhando profundamente o patrimônio de vida e pensamento que fundamenta esta vida, os habitantes da “Mariápolis permanente”26 tendem a perceber o espaço concreto da “Cidadela” como

um lugar que é “um esboço de uma sociedade nova: étnica, multi-religiosa, poliédrica… e mesmo assim exprime unidade” (Fondi, E. M. e Zanzucchi, M.: 2003, 441) e tendem contemporaneamente a ter para com a “Cidadela” uma ligação simbólica.

As pessoas selecionadas casualmente para a entrevista estruturada através de questionário auto-ministrado, foi apresentada uma pergunta sobre a percepção da ligação à “Cidadela” em confronto com a ligação percebida com a cidade de origem. As respostas demonstram uma concentração daqueles que tendem a sentir uma ligação mais intensa com a “Cidadela” do que com a cidade de origem, que somados àqueles que declaram sentir uma ligação prevalentemente mais forte com a “Cidadela” do que com a cidade de origem de 58%, e aqueles que sentem uma ligação igual representam 30% dos casos.

A pergunta seguinte entendia relevar a percepção da “Cidadela” como espaço utilizado para a vida, proveniente da transfiguração simbólica do lugar. Aos entrevistados era proposta no questionário auto-ministrado a pergunta com resposta dicotômica que propunha, em paridade de condições socioeconômicas, de trabalho e de saúde, e escolha livre de habitar na cidade de origem o una “Cidadela”. A pergunta teve nos respondentes uma “reação ao objeto” de 30%, provavelmente fundamentada na baixa quantidade de categorias de resposta a uma questão onde é ativada uma significativa multiplicidade de princípios valoriais e concretos. Em todo caso entre aqueles que compõem os 70% que responderam à pergunta, o percentual daqueles que escolheriam viver em uma “Cidadela” chega a 81%.

Afirma Weber em referência à origem da crença na comunidade étnica:

Se se procura estabelecer em geral quais diferenças “étnicas” permanecem se se prescinde da comunidade linguística, não necessariamente coincidente, não um parentesco de sangue, objetivo ou putativo, e da comum da fé religiosa, também ela independente de tal parentesco – como também, para o momento, da ação de comuns destinos puramente políticos (o que, ao menos objetivamente, não tem nada a ver com o parentesco de sangue) –

(19)

33

então permanecem por um lado, como já foi dito, diferenças esteticamente aparentes do habitus exterior, e por outro lado as diferenças evidentes na conduta da vida cotidiana. Permanecem, isto é, aquelas coisas que de outro modo podem parecer de capacidade socialmente subordinada, dado que, no caso dos motivos da diferenciação “étnica”, jogam sempre drásticas diferenças reconhecíveis externamente. É claro que a comunidade da língua e, ao lado dela, a semelhança de regulamentação ritual da vida, condicionada por representações religiosas do gênero, constituem fatores, extraordinariamente fortes, ativos onde quer que seja, do sentimento de parentesco “étnico”; e isto especialmente porque a “compreensão” carregada de sentido do agir do outro é o pressuposto mais elementar para a formação de uma comunidade (Weber, 1980: 93-94)

No que concerne os múltiplos graus – de verificação subjetiva e de verificação objetiva – dos componentes do Ethos presentes na “Cidadela”, quem escreve compartilha o que disse Tullio-Altan:

O peso especifico de cada um dos componentes do Ethnos no multiforme conjunto das formas históricas de identidade étnica varia de uma para a outra no curso do tempo, em consequência da mudança de condições do equilíbrio histórico, que cada sociedade estruturalmente representa. E tal variedade de combinações constitui a sua irrepetível originalidade e ao mesmo tempo a sua chave de leitura, a sua cifra interpretativa (Tullio-Altan, 1995: 29)

Na “Cidadela” se verificam os componentes do ethnos, principalmente: epos e ethos, e também: logos, genos e topos. Se verifica um tendencialmente profundo e compartilhado patrimônio simbólico-valorial que conduz vitalidade e força ao tecido identitário comum, um forte e compartilhado sentimento de família, de comunidade e até mesmo de “povo”

O Movimento dos Focolares é um povo, um pequeno povo formado por alguns milhões de pessoas – as estatísticas não são e não podem nunca ser precisas – que decidiram livremente, nos modos e nos tempos mais diversos, colocar a própria pedra na construção da fraternidade universal. Este era e este é o focolare: um povo com uma sua visão de mundo, uma sua Weltanschauung, um seu “método”… (Fondi e Zanzucchi, 2003: 543)

CONCLUSÃO

O presente texto postula a possibilidade de legitimidade da afirmação de que os momentos onde o efeito de composição permite a emergência e a instauração de relações sociais fundamentadas no amor-ágape, isto é, na gratuidade, e ainda, nos

(20)

34 momentos onde dois ou mais atores sociais se encontram neste modelo de relação e compõem a configuração necessária ao estabelecimento dos “instantes” de ágape-puro ou reciprocidade gratuita (Galindo Filho, 2009: 193-202) - são proto-fundamento da sociedade e, portanto consequentemente, das instituições sociais e políticas27.

Novamente vem em relevo a faculdade ordinária das pessoas de agir e interagir ágapicamente, que afirma o aspecto ontológico desta competência mesma (Ibidem: 201, Nota 38) – contemporaneamente à ordinariedade constitutiva de todos os outros regimes de ação e interação mais largamente conhecidos e fundamentados numa racionalidade clássico-elementar – corrobora a afirmação sobre o amor como proto-fundamento da relação social e seus derivados – a societas e a polis – pois os momentos de gratuidade e de reciprocidade gratuita por quanto raros geram, potencializam, modulam, estabilizam e consolidam tanto o micro-social quanto o macro-social, vital e ou institucional.

Se é verdade que epos, ethos, logos, genos e topos fundamentam a constituição de uma identidade étnica a base empírica da presente pesquisa legitima a afirmação de que é igualmente verdade que relações sociais fundamentadas em uma perspectiva de amor-ágape podem potencializar estes elementos ou ainda gerá-los, como no caso especifico do objeto de estudo, isto é, muitos povos se tornam um só povo.

Antes do fundamento, algumas vezes reducionista, de uma lógica de calculabilidade racional e estratégica clássico-elementar, existe o fundamento que provem de uma racionalidade anterior, mais alta e complexa que é aquela da dádiva e – por efeito de configuração, na ativação das faculdades ordinárias de ser gratuito –

27 Importante ter presente o fato de o objeto de estudos ser uma comunidade composta de habitantes provenientes

de mais de 70 nações dos 5 continentes – com toda a diversidade e potencial conflitual que deriva deste fato - e que, pela ação e interação social na ativação da faculdade ordinária de amar, afirmam com palavras e com a vida a constituição de um agrupamento étnico, um povo. A propósito da faculdade ordinária do amor como fundamento da vida comunitária e social e até mesmo base para o compartilhamento dos bens, Aristóteles e Plutarco afirmam: “... acordo de sentimentos sobre o justo e sobre o honesto, acordo na vida que foi escolhida, acordo nos pensamentos e nos atos, semelhança de vida, sentimentos comuns. ... [o amor] ... está na base da vida comunitária dos Pitagóricos, os quais alcançavam uma plena comunhão de bens porque tinham uma plena comunhão de sentimentos. Portanto, ... [amor] é igual a unidade, a comunidade; é ... [o amor] ... que se exprime na participação “social” à mesma mesa: Aristóteles quer, entre os cidadãos de sua polis, banquetes comuns que favoreçam a amizade” (Foresi, 1965: 49).

(21)

35 de momentos de gratuidade, mais raros, mas que possuem porém uma enorme potência no que concerne à geração e à estabilização desde às relações interpessoais ao estabelecimento das sociedades, e a sua expressão máxima: a reciprocidade gratuita.

REFERÊNCIAS

ALICI, Luigi (a cura di). (2004). Forme della reciprocità. Comunità, istituzioni,

ethos. Bologna: Società Editrice il Mulino.

TULLIO-ALTAN, Carlo. (1995). Ethnos e civiltà. Identità etniche e valori

democratici. Milano: Feltrinelli Editore.

BIELA, Adam. (1996). “Una rivoluzione copernicana per le scienze sociali.” In: Nuova

umanità, XVIII, 108, Nov. – Dic.

BOLTANSKI, Luc. (2005). Stati di pace. Una sociologia dell’amore. Milano: Vita e pensiero.

BOURDIEU, Pierre. (1995). Ragioni Pratiche. Bologna: Società editrice il Mulino. BRUNI, Luigino. (2005). “Felicità, economia e beni relazionali.” In: Nuova umanità, XXVII, 159-160, Mag. – Ago.

BRUNI, Luigino. (2006). Il prezzo della gratuità. Roma: Città Nuova.

BRUNI, Luigino. (2006). Reciprocità. Dinamiche di cooperazione economia e

società civile. Milano: Bruno Mondatori.

CHÂTEL, Francesco. (2005). Creati in dono. Roma: Città Nuova Editrice.

COLLINS, Randal. (1992). Teorie sociologiche. Bologna: Società editrice il Mulino. Come un arcobaleno. (1999). Gli aspetti nel movimento dei focolari. Roma: Città Nuova Editrice.

CRESPI, Franco (a cura di). (2005). Tempo vola. L’esperienza del tempo nella

società contemporanea. Bologna: Il mulino.

DONATI, Pierpaolo. (2002). Introduzione alla sociologia relazionale. 6° ed. Milano: FrancoAngeli.

(22)

36 FORESI, Pasquale. (1965). L’agape in san Paolo e la carità in san Tommaso

d’Aquino. Roma: Città Nuova Editrice.

GALINDO FILHO, Lucas Tavares. (2009). “Fraternidade, gratuidade, amor, reciprocidade, ágape: novas perspectivas teórico-práticas para as Ciências Sociais.” In: Revista da Faculdade de Direito de Caruaru. 40 (01).

GEERTZ, Clifford. (1988). Interpretazione di culture. Bologna: Società editrice il Mulino.

IORIO, Genaro. (2005). “La nascita della sociologia e la relazione sociale.” In: Nuova

umanità, XXVII, 162, Nov. – Dic.

KIERKEGAARD, Sören. (2003). Atti dell’amore. Milano: Bompiani.

LUBICH, Chiara (a cura di Vandeleene, Michel). (2001). La Dottrina Spirituale. Milano: Arnoldo Mondadori Editore.

LYND, Robert S. e LYND, Helen Merrell. Middletown. Milano: Edizioni di Comunità, 1970.

MARRADI, Alberto. (2002). Concetti e metodo per la ricerca sociale. 3° ed. Firenze: La Giuntina.

MAUSS, Marcel. (2002). Saggio sul dono. Forma e motivo dello scambio nelle

società arcaiche. 3° ed. Torino: Giulio Einaudi editore.

PARSONS, Talkot. (1987). La struttura dell’azione sociale. Bologna: Società editrice il Mulino.

PUTNAM, Robert. (1997). La tradizione civica nelle regioni italiane. Milano: Arnoldo Mondadori Editore.

SOROKIN, Pitirim A. (2005). Il potere dell’amore. Roma: Città Nuova Editrice.

VIGNA, Carmelo e ZANARDO, Susy (a cura di). (2005). La Regola d’Oro come etica

universale. Milano: Vita e Pensiero.

Referências

Documentos relacionados

b) Execução dos serviços em período a ser combinado com equipe técnica. c) Orientação para alocação do equipamento no local de instalação. d) Serviço de ligação das

Segundos os dados analisados, os artigos sobre Contabilidade e Mercado de Capital, Educação e Pesquisa Contábil, Contabilidade Gerencial e Contabilidade Socioambiental

Este trabalho buscou, através de pesquisa de campo, estudar o efeito de diferentes alternativas de adubações de cobertura, quanto ao tipo de adubo e época de

Acreditamos que o estágio supervisionado na formação de professores é uma oportunidade de reflexão sobre a prática docente, pois os estudantes têm contato

O candidato deverá apresentar impreterivelmente até o dia 31 de maio um currículo vitae atualizado e devidamente documentado, além de uma carta- justificativa (ver anexo

17 CORTE IDH. Caso Castañeda Gutman vs.. restrição ao lançamento de uma candidatura a cargo político pode demandar o enfrentamento de temas de ordem histórica, social e política

O enfermeiro, como integrante da equipe multidisciplinar em saúde, possui respaldo ético legal e técnico cientifico para atuar junto ao paciente portador de feridas, da avaliação

Outro dos importantes funcionalistas ingleses e que trabalhare- mos em outra aula, é Radcliffe-Brown. Diferente de Malinowski, que se utiliza muito de explicações psicológicas,