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DISPUTA POR RENDA DA TERRA ENTRE PROPRIETÁRIOS/PRODUTORES RURAIS E AGROINDÚSTRIAS SUCROALCOOLEIRAS

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DISPUTA POR RENDA DA TERRA

ENTRE PROPRIETÁRIOS/PRODUTORES RURAIS

E AGROINDÚSTRIAS SUCROALCOOLEIRAS

FRANCIELLY NAVES FAGUNDES1

ANA CLAUDIA GIANNINI BORGES2

Resumo: O presente trabalho busca identificar e evidenciar a intensidade de apropriação e ou extração de Renda da Terra, pelos proprietários/produtores rurais e uma agroindústria sucroalcooleira, nas negociações de obtenção de cana-de-açúcar, a partir de revisão bibliográfica e de um estudo de caso. A partir disso, pôde-se concluir que há elementos que determinam a renda da terra, como: tipo de contrato; tipo e fertilidade dos solos da propriedade rural; localização da propriedade rural; nível de capitalização e organização do proprietário/produtor rural; e existência de componentes naturais da propriedade rural. Elementos, estes, que impactam no volume de renda da terra e na apropriação de renda pelos proprietários/produtores e agroindústria sucroalcooleira, na negociação da cana-de-açúcar.

Palavras-chave: Renda da Terra; Proprietários/Produtores rurais; Agroindústrias Sucroalcooleiras.

Abstract: This paper seeks to identify and evidence the intensity of appropriation and / or income extraction from land, by the owners / rural producers and a sugar and alcohol agroindustry, in the sugar cane negotiations, based on a bibliographical review and a study of case. Thereafter, it can be concluded that there are elements that determine the income of the land, such as: type of contract; rural land type and fertility; location of the rural property; capitalization level and the rural owner/producer organization; existence of natural components of rural property. These elements, which impact on the income of the land and the appropriation of income by the owners/producers and sugar and alcohol agroindustry, in the sugarcane negotiation.

Keywords: Income from the Earth; Rural Owners/Producer; Sugar and alcohol agro-industry.

1 – Introdução

O presente trabalho busca identificar e evidenciar a intensidade de apropriação e ou extração de Renda da Terra, pelos proprietários/produtores rurais e uma agroindústria sucroalcooleira, nas negociações de obtenção de cana-de-açúcar, a partir de revisão bibliográfica e de um estudo de caso.

Para tal, fez-se revisão bibliográfica sobre a Teoria da Renda da Terra, tratando da conceituação e características da renda, a partir de Marx (2008) e Oliveira (2007) e, para o caso específico do setor sucroalcooleiro, utilizou-se Reis

1 - Acadêmica do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual Paulista "Júlio de

Mesquita Filho" – UNESP Campus de Rio Claro - SP. E-mail de contato: fran_xadrez@hotmail.com

2 Docente da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" – UNESP Campus de Jaboticabal-SP e

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(2013). Após, foram evidenciados elementos que impactam as negociações de obtenção de cana-de-açúcar e a renda da terra, no caso objeto, a partir de entrevista (semiestruturada) com: agroindústria sucroalcooleira do estado de São Paulo; dois de seus proprietários/produtores rurais que firmam contrato do tipo Fornecimento de Cana-de-Açúcar3; e pesquisador da área de Ciências Agrárias.

2 - Revisão teórica sobre a Renda da Terra

A renda capitalista da terra, que aparece quando há propriedade privada da terra rural ou urbana, é classificada de quatro formas: “renda da terra diferencial I”, “renda da terra diferencial II”, “renda da terra absoluta” e “renda da terra de monopólio”. (MARX, 2008) Essas formas de renda da terra, conforme afirma Oliveira (2007), são a base do estudo da agricultura, sob o modo capitalista de produção.

Sobre a renda diferencial, Marx (2008, p. 867) destaca que esta se dá pela “diferença entre produtos de duas quantidades iguais de capital e trabalho, e esse lucro suplementar se converte em renda fundiária”; e também afirma que essas distinções ocorrem de “resultados desiguais de iguais quantidades de capital, aplicadas em terras diferentes, mas com áreas iguais”. (MARX, 2008, p. 868).

Assim, têm-se áreas de mesma proporção, com aplicação igual de investimentos de capital (maquinários agrícolas e insumos) e de trabalho (mão-de-obra), ou seja, com ambiente considerado semelhante, que apresentam resultados diferentes. A partir dessa constatação, pode-se inferir que há áreas de terra com fertilidades diferentes e, por tanto, produtividades distintas que, também, podem ser impactadas pela inversão de capital. Com isso, tem-se duas formas de classificação da renda da terra diferencial, sendo elas: Renda Diferencial I e Renda Diferencial II. (OLIVEIRA, 2007).

Na renda diferencial I, as distinções nos resultados decorrem da existência de elementos, específicos em cada porção de terra, sobretudo pela: fertilidade natural

3 Neste tipo de contrato, a responsabilidade da produção agrícola é do proprietário rural. Assim, este

assume responsabilidades nas etapas de: fornecimento de insumos agrícolas e cuidados e tratos em geral no solo. A etapa do plantio, a depender da combinação, pode ser de responsabilidade dos fornecedores, mas também pode ser realizada pela empresa. As atividades de colheita, carregamento e transporte (CCT), em grande parte dos contratos de Fornecimento, são realizadas pela empresa.

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dos solos e localização das terras, despontando ganhos de produtividade4. (OLIVEIRA, 2007).

O primeiro componente da renda diferencial I são os solos (tipo, classificações e fertilidade natural). Da fertilidade do solo, devem-se considerar as condições naturais intrínsecas e endógenas da terra. Oliveira (2007) destaca que a possibilidade de extração de renda diferencial I (desde que esteja produzindo) depende da fertilidade natural de cada solo. Para tal, exemplifica o caso do estado de São Paulo e a vantagem das propriedades rurais que possuem solos do tipo terra roxa5, com produtividade natural superior, por hectare, se comparado àquelas propriedades com solos do tipo areno-argilosos laterizados. Essa produtividade superior, por sua vez, traz ganhos na remuneração final, ou seja, ganhos a partir da renda da terra.

O autor destaca ainda que a localização, segundo componente da renda diferencial I, influencia na obtenção da renda por parte dos proprietários de terra, devido à proximidade das propriedades (terrenos) em relação ao mercado comprador (pontos ótimos de localização), o que representa custos menores de transporte. Esta constatação da localização é considerada em sua forma física absoluta no território. Além desta, deve-se apontar que a renda diferencial I, também, é extraída e impactada pela escolha do meio de transporte e da capacidade de carga deste.

Assim, para obter a renda diferencial I deve-se considerar a mesma área e custo de produção e a mesma margem de lucro. O preço de produção total seria igual para todos os tipos de terras, mas, como as terras têm produtividades diferentes, o preço da produção por produto (saca, tonelada) difere. Assim, aquelas que têm solo menos fértil apresentam um preço de produção por produto maior. Então, a Renda Diferencial I é definida pela diferença entre o preço da produção total (baseada no preço das menos férteis) e aquele preço total “próprio”, obtido efetivamente da condição da fertilidade da sua terra. No caso da localização, tem-se

4 Vale ressaltar que estas considerações sobre componentes naturais e de localização, também vale

para a renda diferencial II.

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a mesma lógica, porém toma-se como base o preço da produção por produto da terra mais distante ou daquela que escolheu o modo de transporte mais oneroso.

Sobre a renda diferencial II, Oliveira (2007, p. 52) define essa forma de renda da terra, como decorrente do aumento da produtividade por investimento de capitais, visando melhorias na fertilidade dos solos e na genética das sementes e mudas. Desse modo a renda diferencial II, conforme menciona Oliveira (2007, p. 52), é “uma causa eminentemente capitalista, pois se trata do efeito do investimento de capital”, ou seja, resulta diretamente da aplicação de capitais “[…] no processo de produção, lógica básica do próprio processo de produção capitalista na agricultura”. (OLIVEIRA, 2007, p. 55).

Complementando a definição, o autor esclarece que esta forma de renda da terra é reveladora de umas das principais ações na agricultura nos moldes capitalistas, que são os constantes investimentos de capitais, através de maquinários, insumos agrícolas, manejos de correção de solo e de aplicação de nutrientes, visando melhorias na produtividade dos solos das propriedades fundiárias.

Assim, para obter a renda diferencial II, considera-se a mesma lógica da apresentada na Renda Diferencial I, em que se considera o preço da produção por produto da terra menos produtiva. No entanto, é importante considerar que, para obter esta renda, o custo de produção difere entre as terras, visto os constantes investimentos de capital. Outra consideração é que se o investimento ocorrer apenas na terra menos fértil, está pode conseguir obter renda diferencial maior que a observada na terra mais fértil.

Para Marx (2008, p. 992), os “desembolsos de capitais”, ou seja, a “incorporação do capital à terra”, acarreta em impactos na produtividade. Em suas palavras “[…] o solo proporciona renda após o emprego de capital, não por nele ter sido aplicado capital, mas porque o investimento o tornou mais produtivo que antes”.

Os avanços da produtividade, decorrentes de melhorias na fertilidade do solo e na genética das sementes e mudas, se dão pelos avanços tecnológicos nas ciências agrárias e químicas, sobretudo agronomia e, na atualidade, na área de biotecnologia. Sobre isso, Marx (2008, p. 1018), em seu tempo, já admitia que “[…] o

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desenvolvimento das ciências naturais e da agronomia modifica a fertilidade do solo, ao proporcionar novos meios que possibilitam a exploração imediata dos elementos da terra”.

Assim, a geração da renda da terra diferencial II, que resulta diretamente da aplicação de capitais, evidencia a importância da condição econômica dos proprietários e produtores rurais para investir em tecnologia, como pela aquisição de sementes geneticamente modificadas, que apresentam excelência na produtividade.

Logo, as rendas da terra do tipo diferencial I e II são resultantes da concorrência entre produtores agrícolas capitalistas e da diferença dos preços de produção, dos excedentes, dos lucros extraordinários do trabalho em terras, mais férteis, ou melhor, localizadas. (OLIVEIRA, 2007).

Outro tipo de renda da terra é a absoluta. Esta é resultante da condição do sujeito ser possuidor, ou seja, de ser proprietário da terra. Oliveira (2007) assinala que através da renda da terra absoluta, até o proprietário rural, com solos de menor qualidade, poderá extrair alguma renda, pois o proprietário, ao adquirir uma porção de terra, compra o direito de auferir renda desta. (OLIVEIRA, 2007).

Além das formas de renda da terra diferencial e absoluta, existe a renda da terra de monopólio. Para Oliveira (2007, p. 58), esse tipo de renda é o

[...] lucro suplementar oriundo do preço do monopólio de uma mercadoria produzida em uma porção de superfície terrestre dotada de qualidades especiais. Este preço de monopólio é, por sua vez, determinado apenas pelo desejo e pela capacidade de pagamento dos compradores, não dependendo, portanto, do valor dos produtos (quantidade de trabalho necessário para ser produzida) ou mesmo do preço geral de produção.

Para Marx (2008), a forma de renda da terra de monopólio, aproxima-se da existência e disponibilidade de recursos naturais em uma localidade. Nesta forma de extração de renda da terra, destaca-se também o papel das especificidades e das qualidades excepcionais, provindas das terras.

Os tipos de renda da terra mencionados e considerados neste artigo, Quadro 1, são da forma capitalista (diferencial I e II, absoluta, e de monopólio)6.

6 Marx (2008) também comprova a existência de formas de renda da terra, pré-capitalistas, que na

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Quadro 1- Quadro síntese das formas de renda da terra capitalista.

TIPO CARACTERÍSTICAS

Renda Diferencial I Fertilidade natural e Localização Renda Diferencial II Aplicação de Capital

Renda de Monopólio Especificidades

Renda Absoluta Condição de proprietário das terras Fonte: Organizado pelas autoras a partir de Marx (2008) e Oliveira (2007).

Assim, há elementos (na terra e no processo produtivo) que os agentes podem se apropriar e ou extrair rendas. Os agentes podem extrair renda da: a) fertilidade natural dos solos; b) fertilidade artificial dos solos (consequente de investimentos); c) genética das sementes e mudas (consequente de investimentos); d) localização privilegiada das terras; e) elevação “artificial de preços”; f) particularidade de produzir algo em localidade geográfica dotada de qualidades especiais. Estes elementos acarretam impactos nas relações dos agentes como, por exemplo, na remuneração, no “preço” que os proprietários rurais cobram ou recebem pelo uso das terras, inclusive, pelo monopólio de produzir em local diferenciado, dentre outros. Merece mencionar também que a apropriação e ou extração de renda se dá de maneira distinta entre as partes envolvidas.

Portanto, a relação de obtenção de cana-de-açúcar, entre Proprietários/Produtores rurais e Agroindústrias sucroalcooleiras, pode ser influenciada pelas diferentes formas de renda da terra capitalista, o que impacta a remuneração – “preço” que os proprietários/produtores rurais cobram ou recebem pelo uso de suas terras nesta negociação.

3- Disputa pela Renda da Terra na negociação de obtenção da

cana-de-açúcar

Nas negociações de obtenção de cana-de-açúcar, do caso objeto, identificam-se elementos que impactam na intensidade de apropriação e extração da renda da terra, pelos proprietários/produtores rurais e agroindústrias sucroalcooleiras, e que merecem ser elucidados. No Quadro 2, tem-se a sistematização destes elementos. Quadro 2- Elementos que influem na renda da terra, a partir de estudo de caso.

RENDA DA TE R R A Tipo de contrato

Tipos e fertilidade de solos da propriedade rural Localização da propriedade rural

Capitalização e organização do proprietário/produtor rural Elementos naturais na propriedade rural

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O primeiro elemento identificado é o tipo de contrato. Este, segundo Pedroso Junior (2008), pode ser do tipo: Arrendamento7, Parceria Agrícola, Fornecimento com CCT8, Fornecimento sem CCT e À vista. As formas de negociação e os tipos de contratos, de obtenção de cana-de-açúcar no setor sucroalcooleiro, se diferenciam sobretudo pela: posse da terra e responsabilidade nas etapas produtivas (FELTRE, 2014); e formas de uso da terra e de negociação (PEDROSO JUNIOR, 2008).

Cada tipo de contrato apresenta características distintas e a adoção, por parte dos proprietários rurais, está relacionada com a aptidão e disposição9 (social e econômica) destes sujeitos à atividade. Isso se deve, pois há contratos que o proprietário rural é responsável por etapas agrícolas e, portanto, precisa arcar com custos produtivos (que por sua vez são elevados), enquanto em outros contratos não.

Sobre a aptidão e disposição às atividades agrícolas, um dos proprietários/produtores rurais entrevistados diz que, se por algum motivo (idade, saúde, morte, dentre outros) não conseguir ou poder dar continuidade ao contrato firmado de Fornecimento de Cana-de-açúcar (e a execução e realização de etapas produtivas), a opção seria firmar contratos mais integrados, como o de Parceria Agrícola ou Arrendamento, repassando a responsabilidade das etapas produtivas para a agroindústria. Em suas palavras:

[...] tenho um filho médico que não quer saber de roça [...] só que eu acho que o dia que eu parar, a família vai querer contrato de arrendamento, não vão querer cuidar sabe.

Merece, também, destacar os custos produtivos para a produção de cana-de-açúcar e a escolha do tipo de contrato. Outro proprietário/produtor rural entrevistado relata

[...] para você produzir cana, ser fornecedor, fica caro o investimento. Eu vou renovar agora, fazer novo plantio em uma área de 33 hectares, inclusive estou em cima da Usina para cortar rápido,

7 No Arrendamento e Parceria Agrícola, a empresa que realiza a produção agrícola, através da

execução das seguintes etapas: fornecimento de insumos agrícolas; cuidados e tratos no solo (preparação, amostragem, subsolagem, sulcação, adubação, correção); plantio (riscar o terreno, cobrir e cobrar) e a colheita, carregamento, transporte da cana-de-açúcar.

8 Corte, carregamento e transporte.

9 Propensão e disposição do proprietário rural em ser agricultor (produtor rural), ou seja, ser

responsável por realizar as etapas produtivas, por maquinários agrícolas (próprios ou contratados de terceiros), pela contratação de empregados (direta ou de empresas especializadas de serviço).

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e começar a preparar (arar, gladiar, calcariar, colocar gesso, inseticidas, fungicidas). Tudo isso são custos meus e eu acredito que isto deve ficar em torno de 250 mil reais para essa área, cerca de 8.000 reais por hectares para o plantio e você só vai ver parte do dinheiro daqui um ano na colheita.

Com isto, é possível evidenciar que a geração e apropriação de renda da terra é distinta, a depender do tipo de contrato escolhido pelo proprietário rural. Nesse sentido, em contratos menos integrados, a empresa é responsável por menor número de etapas produtivas, enquanto o proprietário/produtor rural é responsável por organizar a produção, objetivando apropriar renda (Renda da Terra) maior. Assim, ao realizar as etapas da produção, o proprietário/produtor rural tem clareza acerca dos dispêndios destas etapas e, portanto, mais condição de organizar e de negociar, o que possibilita maior apropriação da renda da terra.

As falas dos proprietários/produtores rurais entrevistados expõem e confirmam estas constatações.

O contrato de fornecimento dá muito mais lucro, o arrendamento é muito bom para ela [agroindústria].

Quando ela [pessoa-proprietário] fornece ganha um pouco mais do que o aluguel. Eu sou fornecedor [...] no fornecimento não, neste existe as seguintes opções: pagar para um terceiro a mão de obra no plantio, fornecemos tudo o que for necessário para este terceiro plantar, contrata os trabalhadores; ou pagamos para a Usina plantar para nós e pagamos para ela a mão-de-obra. No fornecimento parte é do produtor, é ele quem fornece insumos para o plantio, as mudas, prepara o solo, corrige, e na hora do plantio ele contrata um terceiro, ou a própria usina para riscar, plantar, cobrir. Contratamos então um terceiro, ou trabalhadores da Usina para a parte de mão de obra do plantio. Daí para frente nós cuidamos da cana até o momento de colher, que é da usina. [...] para mim então, mais rentável é o contrato na opção de Fornecimento.

O tipo e a fertilidade do solo da propriedade rural, donde se provem a cana-de-açúcar das negociações objetos, também é outro elemento a ser considerado para a determinação da renda terra. Assim, a apropriação da renda da terra pelo possuinte de uma propriedade rural, com solos adequados10 e de alto nível de fertilidade (natural ou artificial), deveria ser diferente, do dono de propriedade rural

10 Tipo de solo que apresente melhores resultados de produção e produtividade a depender do tipo

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com solos de qualidades inferiores, pois a produção, bem como a produtividade será diferente.

Sobre a renda diferencial I, em específico da diferença da fertilidade natural entre solos (terras), Reis (2013, p. 4) menciona que “um produtor de cana-de-açúcar, que possui extensões territoriais em solos do tipo massapê, tem uma produtividade natural, por hectare, superior àquelas que têm solos argilosos.”.

No entanto, a apropriação da renda da terra diferente (por causa da fertilidade natural da terra) não é observada, pois os contratos agrários do setor sucroalcooleiro, em sua maioria, consideram como variável de pagamento da produção de cana-de-açúcar, o teor de sacarose a partir do Açúcar Total Recuperável Relativo - ATR relativo11. Neste cálculo considera-se os valores da produção da propriedade rural contratada e o valor médio da produção adquirida nos últimos quinze dias, em diferentes propriedades, pela agroindústria.

A partir desta constatação, mesmo o proprietário/produtor rural com tipo de solo e nível de fertilidade (natural ou artificial) considerado adequado, pode ter desvantagem nesta negociação, ou seja, não extrair renda da terra, da atividade sucroalcooleira, conforme deveria, se a agroindústria utiliza o pagamento, por ATR Relativo. Por outro lado, aqueles proprietários/produtores rurais, que obtém baixa produtividade em suas terras, podem se apropriar de mais renda, do que na realidade deveria. Isto decorre, pois o ATR real do proprietário/produtor rural permanece encoberto pelas outras médias consideradas no cálculo.

Outro elemento que merece ser destacado, para a apropriação e extração da renda da terra no setor sucroalcooleiro, é a localização da propriedade rural nos contratos de obtenção de cana-de-açúcar.

A localização está diretamente relacionada com a Renda Diferencial I, da Renda da Terra, pois a renda líquida (descontado os custos de transporte), segundo Oliveira (2007), depende da proximidade da propriedade rural com a agroindústria sucroalcooleira.

Assim, em geral, as propriedades rurais localizadas próximas a sede das agroindústrias sucroalcooleiras têm custos e descontos menores de transporte e

11 ATR RELATIVO: Fórmula: ATR Relativo = ATR de Partida da safra + ATR do Produtor – ATR da

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frete, o que influência positivamente na obtenção da renda da terra pelo proprietário/produtor rural destas terras, ou seja, quanto menor a distância das terras à empresa, maior é a renda da terra, apropriada por este sujeito.

Sobre a localização um dos proprietários/produtores rurais entrevistados ressalta o risco de estabelecer contrato com agroindústrias distantes da propriedade rural e, com isso, uma das partes se desinteressar em continuar com o contrato, devido aos custos incorridos, principalmente, no processo de transporte.

[...] às vezes uma Usina que está em uma distância maior, se interessa pela cana, e na hora que ela precisa da cana, está tudo bem, mas e se por ventura em determinado momento não for mais interessante a cana naquela distância, aí o que ela faz é eliminar este fornecedor, então não é seguro. [...] essa questão da distância ocorre tudo em função do frete, a medida, em que aumenta a distância aumenta o frete e o produtor ganha menos, pois são muitos descontos.

A apropriação da renda da terra, também, depende de seu nível de capitalização e de organização. A capacidade de realizar investimento, segundo Marx (2008), origina a renda da terra Diferencial II e pode ser exemplificada pela adubação, canais de drenagem, bem como obras de irrigação, terraplanagem, construções de exploração rurais e mudas, como as variedades originárias de pesquisa e desenvolvimento.

A variedade de cana-de-açúcar influi no período de colheita (precoce, média ou tardia) e na produtividade da lavoura. O pesquisador de Ciências Agrárias afirma que não basta utilizar a variedade de cana-de-açúcar mais produtiva, mas há a necessidade que esta seja associada e aplicada considerando outras informações, como as características e composição do solo. Ressalta ainda que:

Como hoje tantos pequenos produtores quanto grandes empresas, seja elas familiares ou corporativas, não conhecem bem esse potencial dos solos, às vezes eles podem estar indicando a variedade errada para aquele lugar e tendo perda de [produtividade e] rentabilidade.

Assim, constata-se que proprietários rurais mais capitalizados e organizados são menos prejudicados nos contratos, devido à capacidade e maior condição e recursos para utilizar a seu favor, a fim de contratar advogados e outros técnicos,

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para melhor compreender sobre estas negociações e adotar as melhores técnicas de produção, do que os proprietários rurais menos capitalizados e organizados.

Reis (2013), em seu estudo, também destaca que a obtenção da renda da terra (Diferencial II) é resultado da aplicação de capitais para melhorias na produtividade, visto que traz melhorias nas condições da produção.

No caso do Vale do São Francisco, a extração da renda da terra se sobrepõe, pois o capital não está interessado apenas no lucro médio e sim na possibilidade de conseguir um lucro acima da média, no primeiro momento o capital se beneficiou com a extração da renda diferencial II, em detrimento [leia-se em razão] de um excessivo investimento, sobretudo do Estado, para produzir em uma região que não possui regularidade pluviométrica. (REIS, 2013, p. 18)

Por fim, vale também evidenciar que a existência de componentes naturais na propriedade rural, como nascentes, cursos d’ água, topos de morros, encostas, dentre outros biomas, resulta em perdas de renda da terra ao proprietário/produtor rural. Sobre isso, o representante da agroindústria sucroalcooleira em análise afirma que

Além desses detalhes, distância, tipo de solo, nós temos legislação ambiental, que estão barrando. Eu cheguei a devolver fazenda [...] chamamos a proprietária e dissemos, desculpa, mas não temos condição de levar todo o maquinário, fazer todo trabalho de colheita, toda essa logística para sua propriedade e perder 30% da área, então não é viável economicamente. (Representante agroindústria).

Esses componentes naturais que são regulados por legislação ambiental, portanto, são vistos como desvantagens às agroindústrias, pois são limitantes à expansão da lavoura de cana-de-açúcar.

Por fim, a partir da constatação desses elementos elencados, observa-se que a apropriação de renda da terra é distinta para os proprietários/produtores rurais e agroindústria sucroalcooleira, nas negociações de obtenção de cana-de-açúcar.

Considerações Finais

A partir dessa análise é possível constatar que as concepções teóricas da Renda da Terra são de importante contribuição para a análise da negociação de obtenção de cana-de-açúcar entre proprietários/produtores rurais e agroindústrias do setor sucroalcooleiro.

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Dos elementos que impactam estas negociações e a renda da terra, no setor sucroalcooleiro, foram identificados, em pesquisa de campo, os seguintes: a) tipos de contratos; b) tipos e fertilidade dos solos da propriedade rural; c) localização da propriedade rural; d) nível de capitalização e organização do proprietário/produtor rural, com destaque para variedade de cana-de-açúcar; e) existência de componentes naturais da propriedade rural.

Estes elementos determinam o tipo de renda da terra, a partir das definições de Marx e Oliveira, bem como influenciam no volume de renda da terra gerado e apropriado pelos proprietários/produtores rurais no processo de negociação da cana-de-açúcar com a agroindústria. Vale mencionar, também, que a utilização da Teoria da Renda da Terra, possibilita identificar as condições de disputas por rendas entre as partes e que em estudos futuros pode contribuir para explicar a dinâmica de territórios.

Referências Bibliográficas

FELTRE, C. Coordenação das transações de cana-de-açúcar das usinas sucroalcooleiras no oeste paulista: complementos contratuais e pluralidade. 2014. 191 f. Tese de Doutorado. Disponível em: <http://www.economia.esalq.usp.br /intranet/uploadfiles/4631.pdf>. Acesso em: Abr/ 2017.

MARX, K. O capital: crítica da economia política, livro terceiro: o processo global de produção capitalista, volume 6. Tradução Reginaldo Sant’ Anna. – Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008.

OLIVEIRA, A. U. Renda da Terra. Capítulo 6. In: Modo capitalista de produção, agricultura e reforma agrária. São Paulo. FFLCH/Labur Edições. 2007. Disponível em: <http://www.geografia.fflch.usp.br/graduacao/apoio/Apoio/Apoio_Valeria/Pdf/Livro_ari.pdf> Acesso em: Abr/ 2017.

PEDROSO JÚNIOR, Roberto. Arranjos institucionais na agricultura brasileira: um estudo sobre o uso de contratos no sistema agroindustrial sucroalcooleiro da região centro-sul. 2008. 209f. Dissertação (Mestrado) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008. Acesso em: Abr/ 2017.

REIS, L. C. A sujeição da renda da terra e as repercussões no campo: o contraste entre Petrolina-PE e Capela- SE. 2013. In: I Simpósio Baiano de Geografia Agrária e XI Semana de Geografia da UESB: O campo Baiano na relação Estado, Capital, Trabalho: Espaço de Contradições, Espaço de lutas. Contradições, Espaço de lutas. Disponível em: <http://www.uesb.br/eventos/sbga/anais/arquivo/arquivo%2019.pdf> Acesso em: Abr/ 2017. SOCICANA, ATR Relativo e a importância do ATR de Fechamento. 2016.

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