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O ataque dos consumidores emergentes

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Academic year: 2021

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O ataque dos consumidores emergentes

As marcas dos produtos de consumo das empresas multinacionais mantiveram-se na liderança de seus mercados e na mente dos consumidores brasileiros durante décadas. Algumas marcas tornaram-se sinônimos de categorias de produtos, como Gillette, Band-Aid, Danone, Maisena, Hellmann’s e OMO. No entanto, na virada do milênio, essa liderança passou a ser ameaçada. Não se tratava de uma batalha entre Coca-Cola e Pepsi.

Os novos desafiantes eram pequenas e médias empresas nacionais, oferecendo produtos até pela metade do preço das fabricantes. Eram os produtos chamados marcas B ou marcas econômicas. No início de 2001, estimava-se em mais de 30% a participação das marcas B no mercado brasileiro. Nos Estados Unidos e Europa, essa participação era de 20%.

 Entre 1998 e 2000, as marcas líderes perderam participação em volume em 63% de 157 categorias de produtos pesquisados. As maiores perdas ocorreram nas categorias de bebidas não alcoólicas alimentos doces e limpeza caseira.

 Apenas 12% das líderes ganharam participação no período analisado.

 As marcas de baixo preço avançaram em seis de cada 10 categorias. No caso dos biscoitos de 250 gramas, as marcas passaram a 41% das vendas, um acréscimo de sete pontos percentuais.

 Em setores como alimentos e bebidas, higiene pessoal e limpeza, as empresas brasileiras vinham crescendo mais que as multinacionais.

 Os cereais Kellogg’s tinham 72% de participação em 1995. De 1995 até 2002, perderam 25% pontos percentuais, num mercado em que cada ponto valia 1,6 milhão de reais. A Kellogg’s passou a sofrer a concorrência da Nestlé, que chegou a 2002 com 21% das vendas. No entanto, a vice-liderança era do conjunto das marcas mais baratas. De cada 100 pacotes de cereais consumidos no Brasil, 32 eram de nome pouco conhecidos.

 Em 10 anos, o número de marcas de achocolatados em pó chegou a 40, ganhando 22% de participação. Até a metade dos anos 90, o líder Nescau detinha 63% das vendas. Em novembro de 2001, era de 52%.

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Consumidores Emergentes

Uma combinação de crescimento do mercado, produtos tradicionais vulneráveis e consumidores insatisfeitos aconteceu nos anos seguintes ao Real. A população de baixa renda passou a ter mais dinheiro para gastar e aumentou o consumo de alimentos e outros itens domésticos. Não faltaram oportunidades para novas marcas de produtos como leite longa-vida, biscoitos, adoçantes, refrigerantes, amaciantes e fraldas.

As vendas de leite longa-vida mais do que triplicaram. As de suco pronto, de adoçantes e até rações para cães dobraram. A demanda por esses produtos estava mais reprimida entre consumidores mais pobres do que entre os de renda mais alta. A hegemonia das marcas principais já vinha sendo ameaçada desde 1995, ano que se seguiu à implantação do Real. A figura abaixo mostra a distribuição das classes de renda no Brasil no ano de 2000. A classe C teve crescimento de 37% em relação a 1992.

CLASSE Renda Mensal = Consumo em Milhões de Salários Mínimos Bilhões de Reais Domicílios A/B Mais de 10 428 (52%) 19% = 7,98 C de 4 a 10 226 (28%) 30% = 12,60 D/E de 1 a 3 163 (20%) 51% = 21,00 Distribuição das classes de renda em 2000.

Uma vez que a renda e a disposição para o consumo aumentaram, por que não ocorreu o mesmo com a participação das marcas principais? Segundo um estudo do Boston Consulting Group, as multinacionais orientaram-se, durante décadas, pela noção errônea de um piso de consumo restrito às classes A e B. De acordo com um executivo da Elma Chips, essa noção vigorou, porque foi possível construir grandes negócios, fornecendo apenas uma parte da população do Brasil. Nos três anos que se seguiram ao Real, o faturamento da Elma mais do que dobrou, mas a empresa perdeu participação.

A explicação: o mercado informal das feiras livres e camelôs, que tomaram conta da periferia das grandes cidades, cresceu mais rápido do que o mercado oficial. Esse executivo acreditava que o mercado informal era 2,5 vezes superior ao oficial, movimentando cerca de quatro vezes por ano o faturamento da Elma. As grandes marcas como a Elma, tinham-se preparado para atender à ponta da pirâmide, mas não haviam investido para produzir em escala de grandes massas. Com a explosão do consumo, pequenos e médios fabricantes regionais ocuparam o vazio deixado pelas grandes Marcas.

As grandes redes e o pequeno comércio varejista

Com a estabilização, o poder de barganhar preços e impor condições passou para o lado varejista. Contribuiu para isso o processo de concentração das redes de supermercados. Em

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1992, as cinco maiores redes geravam 27,7% das vendas. Em 2002, a proporção subira para 40,7%. As grandes empresas industrias, que já haviam feito cortes em seus custos desde o início da década de 90, começaram a perder rentabilidade, devido às crescentes exigências das grandes redes varejistas: promoções de preços, propaganda cooperada, compra de espaço nas lojas, promotores e mercadorias grátis na inauguração das lojas.

A grande indústria passou ainda a enfrentar o crescimento das marcas próprias dos varejistas. No início de 2001, eram 12.854 itens embalados como marcas próprias, mais que o dobro do que havia em 1999. Além de fazer concorrência, esses itens ocupavam espaços nas prateleiras. As marcas próprias respondiam por 6% das vendas nos supermercados. Em 2003, deveriam chegar a 17% movimentando 7,9 bilhões de reais.

Parte da distribuição dos produtos das grandes indústrias já havia sido terceirizada para atacadistas e distribuidores. Com os impostos em cascata, os produtos chegavam a preços pouco competitivos nas lojas tradicionais da periferia e pequenos supermercados, freqüentados por consumidores de baixa renda. De 1997 a 2002, esse foi o segmento que mais proliferou. O número de lojas com quatro ou menos caixas aumentou 35% nesse período, chegando a 52 mil. Os pontos-de-venda populares eram ideais para a introdução das marcas B. Na rede Econ, com 30 lojas para a classe D na periferia de São Paulo, as marcas principais ficavam expostas para que o consumidor fizesse comparações. De seus 231 fornecedores, 180 eram de marcas B.

As classes de baixa renda revelavam-se pouco fiéis às marcas. Quando a situação financeira ficava difícil, 43% das consumidoras optavam pela marca conhecida mais barata, mas 30% a substituíram por outro produto. Menos da metade das entrevistadas de uma pesquisa com classe C consumia a marca que seria sua primeira opção.

As marcas B também tinham a vantagem da informalidade. Estimava-se que, no setor de refrigerantes, os informais já seriam responsáveis por quase um quarto, dos 12 bilhões de reais faturados anualmente pela indústria. Com a carga tributária de 40% sobre uma empresa, não pagar imposto representava grande vantagem.

A reação

Uma estratégia para reagir a essa situação poderia ser o lançamento de marcas B, como fizeram diversas empresas.

Unilever – Na Índia, a Unilever perdeu, na década de 1990, expressiva participação no mercado de detergentes para uma marca popular. Depois de estudar o universo do consumo emergente, a empresa fez uma completa revisão de seus processos e lançou uma marca competitiva, vendida por quase um terço do preço da marca mais cara. Com essa marca, a empresa recuperou sua participação. No Brasil, esse projeto serviu de modelo para o produto Ala, o primeiro sabão em pó para os consumidores emergentes, vendido no Nordeste pela metade do preço do Omo, principal marca da Unilever.

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Outro exemplo era o xampu Seda. Lançado em 1968, o Seda chegara a 1995 com 7% de participação. As vendas de xampu aumentavam, mas o Seda estava estacionado. Para conhecer os consumidores emergentes, a Unilever mandou 40 gerentes entrevistarem famílias em lares de classe C. Essa equipe descobriu, por exemplo, as diferentes necessidades dos biótipos raciais dos brasileiros. Surgiram assim produtos específicos para cabelos ondulados e crespos, antes só fabricados por empresas de segunda linha. Para garantir a distribuição às milhares de lojas do comércio tradicional, a Unilever contratou distribuidores especializados em produtos de higiene pessoal, que vendiam pequenos lotes em pontos-de-venda nas localidades mais distantes. Em 2002, a marca Seda alcançava 25 % do mercado de xampu.

Mabesa – Outra empresa a usar a mesma estratégia era a mexicana Mabesa, que atua no mercado brasileiro de fraldas, que, desde 1995, crescia em média 21,7% anuais em volume. A Mabesa já se tornara a segunda do mercado. Quando começou, o índice de bebês que usavam fraldas era de apenas 15%. Suas fraldas para classe D eram vendidas em pacotes com menor número de unidades. Em 2001, a Mabesa passou a deter uma fatia de 18% das vendas de 3,8 bilhões de unidades, contra 22% da Kimberly Clark, a líder do mercado. Além de suas marcas, a Mabesa produzia 75% de todas as marcas próprias de fraldas das redes varejistas, o que rendia 20% de sua receita.

Coca-Cola – Em poucos anos, o número de fabricantes de tubaína cresceu de 55 para 750. Foi à embalagem Pet de dois litros, sem retorno, inventada pela Coca-Cola, que viabilizou o negócio dos tubaineiros, que tinham 33% do mercado. Para se defender, a Coca-Cola comprou o guaraná Jesus, que tinha expressiva participação no mercado do Nordeste.

Nestlé – Nem sempre a estratégia funcionava. O número de fabricantes de biscoito cresceu de 100 para 540 nos anos 90. A Nestlé, além de reduzir seus preços, o que diminui sua rentabilidade, lançou em 1996 a marca Bônus, cuja produção foi interrompida. Segundo um executivo da empresa, era difícil uma corporação produzir ao mesmo tempo marcas de prestígio e marcas B. Para isso funcionar, seria necessário ter duas organizações, com culturas diferentes, aproveitando algumas áreas comuns, como logística e informática. Apesar disso, a Nestlé preparava-se para lançar econômicas de biscoitos e modificaria o visual e o tamanho das embalagens, para tornar seus produtos mais acessíveis à classe C. Também procuraria aumentar sua distribuição, para atingir padarias e lojas tradicionais.

O crescimento das marcas B mudou os paradigmas de marketing. As marcas líderes, que ensinaram aos brasileiros os primeiros passos do marketing e dos produtores como margarina, sabão em pó e maionese, não conseguiram reconhecer o poder de consumo das classes C e D. Também concentram as vendas nas grandes redes varejistas, abrindo mão de atender ao pequeno e ao médio varejo do interior, o que mais cresce atualmente.

No início de 2001, tudo indicava que as grandes marcas iriam enfrentar prolongada e surpreendente guerra de guerrilha.

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Algumas das empresas que ameaçavam a liderança das grandes marcas eram as seguintes:

 Sabão Fontana, do Encantado (RS), fabricante dos sabonetes Iara, Encanto e Anafont e do detergente líquido Font. Com 17 mil clientes ativos em 2001, pretendia chegar a 25 mil em 2002. Fechou o ano de 2001 com faturamento de 75 milhões de reais.

 Aroma do Campo, de Nova Iguaçu (RJ), fabricante da tintura de cabelo Luminous Colour e de produtos de beleza específicos negros, xampus, condicionadores, cremes e maquilagem. Faturou 60 milhões de reais em 2001.

 Coelho, fabricante de macarrão e biscoito, de Sobral (CE), faturou 9 milhões de reais em 2001, com foco no mercado nordestino.

 Comércio de Doces Lucky, de São Paulo (SP), produz diariamente 100 toneladas de salgadinhos. Desde 1998, suas vendas crescem 50% ao ano.

 Asa, de Recife (PE), fabricante de detergente líquido, massa de tomate, fralda descartável e flocos de milho, faturou 100 milhões de reais em 2001, atuando principalmente no Nordeste. Questões

1 – Explique por que as grandes marcas perderam a oportunidade de explorar o mercado das marcas de preço baixo.

2 – Como se explica o sucesso das marcas B?

3 – O que pode ameaçar o desempenho das marcas B?

4- Se você fosse consultado sobre o que as grandes marcas deveriam seguir para combater as marcas B, quais estratégias consideraria? Apresente as vantagens e desvantagens de cada alternativa que considerar, inclusive a de não fazer nada e deixar as marcas B atuarem em seus nichos.

5 – Que estratégias você recomendaria para as marcas B preservarem suas posições e alavancarem ainda mais o mercado das grandes marcas? Apresente os fundamentos de sua recomendação.

Referências

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